"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Carlos Lozano, ativista de paz, responde: “A paz, há que impô-la aos cavaleiros da inércia”


Entrevista com Carlos Lozano Guillén, diretor de Voz e destacado membro de Colombianas e Colombianos pela Paz, movimento que a ex-senadora colombiana Piedad Córdoba lidera. Conversação com jornalistas de redes alternativas.
Que percepção tem, depois de fazer seu próprio balanço, desta primeira etapa dos diálogos de Havana entre o Governo do presidente Juan Manuel Santos e a guerrilha das FARC-EP?
“É um balanço positivo, sem exagerações. Está demonstrado que, sim, é possível sentar-se a dialogar numa mesa pela paz, apesar das diferenças e escassas coincidências das duas partes. Ainda que, todavia, não há resultados concretos conhecidos do primeiro ponto em debate [o tema agrário], se ganhou com a participação cidadã. Ainda que o Governo Nacional era relutante a ela, ao final se deu como uma conquista democrática e o resultado é bom, grêmios e organizações populares debateram e fizeram propostas que não poderão ser ignoradas. Assim que o balanço é positivo, ainda que há fixações e obstáculos.”
Como, quais?
“Segue sendo um erro dialogar em meio de conflito. Se requer um cessar bilateral de fogos para evitar que os atos da guerra alterem a boa marcha do processo. Porém, ademais, o Governo está fechado à participação popular, segue vendo-a como um ‘ruído’ na mesa e isso é negativo, porque a mesa há que legitimá-la com participação da sociedade, ao fim e ao cabo estão discutindo temas de interesse nacional e não particular. Também o governo tem um conceito estreito da agenda. Fez um Acordo Geral e agora quer desconhecê-lo, porque crê que o modelo não pode ser mudado e que a democracia é perfeita. São fixações que dificultam avançar em bom ritmo e correta direção.”
O doutor De La Calle disse ao término das sessões deste ano, no dia de hoje, que não haverá mudança do modelo econômico nem do sistema democrático.
“Aí está a fixação. Que é o que querem mudar então? No tema agrário, creem com arrogância que estão fazendo uma revolução agrária e que as FARC e o povo têm que apoiar a lei de terras e suas políticas agrárias que não vão ao fundo de problemas substanciais como a posse da terra, o latifúndio, o uso do solo e até de situações que afetam o território e as regiões agrárias como a exploração mineira energética em mãos de transnacionais inescrupulosas. E creem que a democracia é plena. Nos querem obrigar a viver com a parapolítica, a violência desde as alturas do poder, a exclusão, o clientelismo e o vantajismo dominante”.
Porém, em Colômbia há eleições, sufrágio universal aceitável...
“Aceitável para quem? Para a classe dominante, para a política tradicional que detém o poder ao longo da história republicana depois de Simón Bolívar. São eleições à la colombiana, sob as condições e as vantagens da oligarquia dominante. Por isso temem as reformas, não aceitam modificar as regras da política, porque são suas regras.”
Segundo você, por que temem a democracia?
“Porque no dia em que neste país haja democracia plena e garantias para todos, igualdade ante a Constituição e a lei, cambaleará este poder. É um problema de classe. A classe dominante prefere a violência porque lhe permite impor a ‘sangue e fogo’ seus desígnios. [Eles] o têm dito de maneira aberta e pública. Por isso, não consideram conveniente mudar o sistema político imposto à força. É decepcionante ouvir a gente da burguesia, que a pessoa acredita decente, por exemplo, defender até à morte o governo de Álvaro Uribe Vélez e até o qualificam de segundo libertador de Colômbia, fazendo caso omisso dos ‘falsos positivos’, das chuçadas, a proteção ao narcoparamilitarismo, a parapolítica, a corrupção e outros atos vergonhosos de corrupção. Lhes parece um grande personagem porque defendeu a sangue e fogo seus interesses econômicos. O modelo econômico, aliás em crise no mundo, consideram-no inalterável, lhes permite enormes utilidades e lucros às expensas do sacrifício do povo.”
No entanto, há ex-guerrilheiros na política e em administrações...
“Sim, são gestos pluralistas e democráticos na aparência. Porém, na realidade, propaga a intolerância para os movimentos e partidos que eles representam, os cooptam no melhor dos casos ou os perseguem com furor, como está ocorrendo com Gustavo Petro, prefeito de Bogotá. Apenas este tocou calos nos negócios dos poderosos, colocou como fundamental o interesse público e afetou o lucrativo negócio particular dos lixos, partiram para cima dele e de que maneira. Querem arrancá-lo. A campanha midiática é grosseira e antidemocrática. Veja a ‘grande imprensa’ como o ataca e o agride sem nenhum respeito. É um problema de classe, algo que a classe trabalhadora deve entender, que se divide estimulada pela mesma oligarquia quando ela, sim, se une para defender o seu. Isto deve mudar se se quer a paz. Do contrário, será difícil conquistá-la”.
Porém, voltamos aos foros. Com a experiência do foro agrário, são estes válidos como mecanismo de participação?
“São válidos, claro que sim. Devem repetir-se nos pontos seguintes. Como também são úteis as mesas regionais promovidas pelas comissões de paz do senado e da Câmara de Representantes. É que sem a participação cidadã e popular não é possível chegar à paz. Esta se constrói com o concurso de todos e todas. De alguma maneira, a paz, há que impô-la a seus inimigos e aos cavaleiros da inércia que interpõem as fixações.”
No foro agrário participaram os grêmios. Como lhe pareceu?
Bem e foi positivo. Entre outras coisas, em seus enfoques os porta-vozes da Andi e da Sac, por exemplo, demonstraram mais realismo e amplitude que o Governo Nacional. Escutaram com atenção as propostas e análises das organizações sociais e populares. Ficaram isoladas as posições ultra direitistas e guerreiristas de Fedegan, que representam o setor mais comprometido com o latifúndio e a violência. Sabemos muito bem por que se opõem à paz.”
Por quê?
“Porque representam ao uribismo recalcitrante que é o setor mais apodrecido da classe dominante; se apoiam no terror, na guerra. Na carta de Fedegan que publicaram nos meios escritos há uns dias, há umas assinaturas que produzem terror, são os que promoveram o paramilitarismo, representam associações ligadas à violência contra os campesinos e a esquerda. Não há que esquecer que o anterior presidente de Fedegan está julgado por paramilitarismo; e o atual é investigado. Que se pode esperar desse tipo de gente?”
Como vê as duas delegações?
“Bem, cada um apropriado de seu papel. Cada um faz seu trabalho. O importante é que tenha suficiente sensatez e criatividade para encontrar os pontos de convergência não para satisfazer ao ‘outro’ mas sim ao país, ao povo colombiano, que será o maior usufrutuário da paz estável e duradoura. Ainda que é indispensável que o Governo tenha uma só linha. A atitude do ministro Pinzón é provocadora, guerreirista. É um ministro dinamite. Alguns porta-vozes do Governo dizem que se sai do libreto, porém ambas partes devem ter um só libreto, o que seja, porém um só, coerente e comprometido com o Acordo. Pinzón faz tempo que sobra no Governo. A não ser que seja a velha e desgastada tática em que uns se fazem de ‘bom’ e outro de ‘mau’. Isso, o Governo deve aclarar bem.
Crê que, ao final, se conquiste a paz?
“É possível, se há vontade política de ambas partes e o apoio da sociedade. No entendido que deve ser uma paz digna, com democracia e justiça social. O Governo deve baixar-se da nuvem da vitória, abandonar o conto de que a guerrilha está derrotada. Não parece que a insurgência esteja derrotada; ao contrário, o fracasso da segurança democrática é o fracasso da linha militar. Só os uribistas a defendem com teimosia. É importante o critério de mudança. O conflito obedece a causas e enquanto elas subsistam não haverá paz. A democracia e a justiça são essenciais para levar a cabo o ‘Acordo Geral para a terminação do conflito e a construção de uma paz estável e duradoura’. Para a esquerda, a paz é indispensável, porque obrigará à unidade dos setores democráticos e populares para que surja uma opção de poder do povo com a capacidade de transformar a Colômbia. A paz é uma bandeira dos revolucionários na medida em que está estreitamente ligada à construção da Nova Colômbia.”
Bogotá, 21 de dezembro de 2012