"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


terça-feira, 30 de junho de 2015

Jesús Santrich: “Se há firma do Acordo Final, o que vem é uma etapa de implementação na qual já não deve haver confrontação"



DICK EMANUELSSON, ANNCOL (DE): Há uns dias foi publicada em vários meios colombianos e internacionais a notícia de que os comandantes do Secretariado das FARC que atualmente se encontram em Havana já teriam cidadania nicaraguense no caso de que o processo da paz fracassasse ou que o eventual acordo implicaria cárcere para os comandantes. Que comentário têm as FARC sobre essa declaração?
JESÚS SANTRICH (JS): A temática a que se refere em sua pregunta faz parte de uma grande mentira midiática da qual não sabemos sua finalidade. Porém, os que a puseram a andar parece que não têm a menor ideia sobre como as FARC pensam. Não nos conhecem.
Viemos a Havana para tratar de chegar a um entendimento com o governo, que permita resolver os imensos problemas de ordem política, econômica e social que nosso país tem e que têm afetado as maiorias durante várias décadas. Esse é o propósito e nisso trabalhamos com todo nosso empenho e com as máximas esperanças em que conseguiremos alcançar um acordo final que permita ao povo continuar no caminho da construção de uma Colômbia diferente na qual se supere a desigualdade, a miséria e a carência de democracia. Cremos que está claro, então, que este não é nem pode ser um processo de submissão da insurgência. Neste sentido, não é possível o cenário de guerrilheiros purgando penas de prisão por terem exercido o direito à rebelião contra um regime injusto, e tampouco é sequer imaginável ver a direção revolucionária partindo para o exílio. O destino da Colômbia não pode ser o da guerra e por isso trabalhamos pela paz. Não é positivo pensar agora em rupturas ou em que não conseguiremos firmar o acordo. Há que pôr otimismo e fazer os máximos esforços para que todos os colombianos e colombianas possamos acabar com a confrontação e forjar o país sem exclusões.


O AVANÇO NO TEMA DAS VÍTIMAS
DE: Você crê que neste Ciclo se possa chegar à conclusão das discussões em torno do quinto ponto da Agenda sobre Vítimas?
JS: Esse é nosso desejo e cremos que há elementos suficientes sobre a Mesa para chegar a um entendimento em breve. Os avanços alcançados durante o Ciclo 37, que foi o anterior, são de grande significado dentro deste propósito. Relembre que pudemos apresentar um acordo sobre Comissão de Esclarecimento da Verdade, da Convivência e da Não Repetição nos aspectos fundamentais, porém sem ainda encerrá-lo totalmente porque tal instrumento faz parte de um “Sistema de Verdade, Justiça, Reparação e Não Repetição” em relação ao qual, agora, o que estamos é precisando dos elementos que integram tal mecanismo. Isto se faz analisando as propostas que as vítimas do conflito levaram até o cenário dos diálogos. Estamos empenhados em levar adiante um Acordo sobre as reivindicações essenciais que beneficiem as vítimas, e isso certamente implicará fortalecer programas existentes, criar novos, corrigir procedimentos que não foram efetivos etc. Já veremos, não obstante e para não trazer a debate aspectos que são ainda internos da Mesa, podemos dizer que grande parte de nossas propostas públicas, por exemplo, isso da criação do Fundo Especial para a Reparação Integral [FERI], ou o concernente à elaboração de um “Plano Nacional para a Reparação Integral” serão elementos a levar em conta.
Haveria que acrescentar que os dias dos ciclos não são usados somente em abordar o ponto quinto da Agenda. Simultaneamente, estamos tratando do tema da cessação do fogo, ou o que tem a ver com o plano de descontaminação de restos explosivos, ou iniciativas de desescalada que são urgentes para evitar que a confrontação continue se aprofundando, e tudo isto consome tempo.


CESSAR-FOGO BILATERAL?
DE: A propósito da desescalada e da busca do fim do conflito, ainda creem que seja possível conseguir o cessar-fogo bilateral antes de se chegar à firma do Acordo Final?
JS: Isto seria o correto, porque é óbvio que, se há firma do Acordo Final, o que vem é uma etapa de implementação na qual já não deve haver confrontação. Porém, do que se trata agora é de fazer um esforço de sensatez e entender que, se não criamos um clima de concórdia que alivie as dores da guerra, sobretudo no campo, o que estamos fazendo é colocar obstáculos no caminho que podem ser perigosos para o processo. Não tem sentido que continue havendo destruição e morte se estamos sentados numa Mesa de Diálogo.
Enquanto durou o cessar-fogo unilateral declarado pelas FARC, é absolutamente comprovável que, apesar dos assédios da força pública tantas vezes denunciados pela insurgência, o país pôde observar um ambiente de tranquilidade. Os combates e as mortes alcançaram os níveis mais baixos e até o empresariado pôde realizar com folga seus propósitos. Então, não entendemos porque persistir nessa posição guerreirista e absurda que se resume nesse mito de que se pode dialogar em Havana como se não houvesse guerra na Colômbia, e que se pode manter a guerra como se não houvesse conversações em Havana. A realidade tem mostrado que esse argumento é um sofisma. O cessar-fogo bilateral se converteu numa necessidade e num dever que já não aguenta mais adiamentos.
DE: As FARC pensaram em algum momento em se levantarem da Mesa de Conversações?
JS: Nunca. O mandato que temos de parte de todos os nossos combatentes, homens e mulheres, é empenhar-nos ao máximo na busca da paz, porque esse é o clamor majoritário do povo colombiano.
fonte anncol.eu

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Equipe ANNCOL - Brasil

Presidente Santos.....Até Quando?.....Meu Deus!!!


Na segunda-feira passada, 22 de junho, Enrique Bastidas foi assassinado por efetivos militares do batalhão José Hilario López, que lhe metralharam no ponto conhecido como a Curva del Tigre, em imóveis da Reserva de Santa Rosa, em San Andrés, município de Inzá, Cauca.
O assassinato de Enrique ocorreu entre as quatro e quarenta e cinco e as cinco e trinta da manhã.
O corpo sem vida de Enrique foi observado com impactos de bala. Horas depois, as unidades militares expressaram que abriram fogo contra Enrique porque este não acatou a ordem de parar.
É de se anotar que este questionado batalhão é responsável por execuções extrajudiciais nesta região que limita com o Huila.



Bogotá, D.C. 26 de junho de 2015

Comissão Intereclesial de Justiça e Paz

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Equipe ANNCOL - Brasil

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Golpe: a derrubada em marcha


Dê-se a isso o nome que se quiser. Estamos em meio a um processo de derrubada do governo da Presidenta da República, Dilma Rousseff.

por: Joaquim Palhares - Diretor de redação
Todos sabemos qual é a hora congelada no relógio da história brasileira neste momento.

Certamente não é hora de reiterar platitudes.

Ou de repetir lamentos, ainda que justos, pertinentes. Tampouco de replicar constatações.

Todas as constatações que de forma procedente apontam a cota de equívocos do governo e do PT na crise atual já foram feitas. Não será a sua reiteração que levará o partido assumi-las ou equaciona-las.

Os fatos caminham à frente das ideias: a história apertou o passo.

A dinâmica política assumiu a vertiginosa transparência de um confronto em campo aberto no país.

Trata-se de escolher um dos lados e tomar posição para o combate. Este que já começou e avança de forma acelerada.

É o seu desfecho que decidirá o aluvião das pendências, críticas, autocríticas, repactuações, concessões e escolhas estratégicas que vão modelar o passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.

De um modo direto: o desfecho desse confronto vertiginoso consolidará o novo ponto de equilíbrio da correlação de forças que se esgarçou e caminha para definir seu novo ponto de coagulação.

Qual será esse ponto?

Depende do discernimento histórico, do sentido de urgência e da capacidade de articulação das forças progressistas nessa hora decisiva.

Estamos em meio a um processo de derrubada do governo democraticamente eleito da Presidenta da República, Dilma Rousseff.

Dê-se a isso o nome que se quiser.

Todos aqueles ensaiados pela direita latino-americana nos últimos anos:  golpe constitucional; derrubada parlamentar; golpe em câmera lenta. Ou as marcas de fantasia da mesma ofensiva, todas elas embrulhadas no rótulo de uma peculiar luta anticorrupção.

A singularidade dessa maratona ética é ter o PT como único grande alvo; Lula como meta antecipada, a mídia como juiz do domínio do fato e a consagração do financiamento empresarial como a nota de escárnio e desfaçatez a desnudar toda lógica do processo.

Tudo isso já foi dito pelos canais disponíveis, que não são muitos, e dentre os quais Carta Maior se inclui com muito orgulho.

Vive-se um adestramento da resignação brasileira para o desfecho golpista deflagrado no processo de reeleição de Lula, em 2005/2006, quando ficou claro que a direita brasileira não tinha capacidade de voltar ao poder pelas urnas.

Passo a passo vem sendo cumprido desde então o objetivo histórico a que se propôs a elite brasileira e internacional.

Trata-se de um objetivo ancorado em três metas:
a) desqualificar o Partido dos Trabalhadores e tornar suas lideranças sentenciadas e inelegíveis;

b) inviabilizar, levar ao impeachment o governo da Presidenta Dilma; e

c) desmontar e fazer regredir todos os avanços populares obtidos na organização da economia, do mercado de trabalho, das políticas públicas e sociais e da soberania geopolítica.

Em uma palavra: completar o trabalho iniciado no ciclo de governo do PSDB nos anos 90, com o desmonte do Estado, a regressão dos direitos sociais democráticos e a substituição desses direitos por serviços pagos, acessíveis a quem puder compra-los.

A crispação da escalada, agora aguda, valeu-se de um componente da correlação de forças intocado em todos esses anos naquele que talvez tenha sido o erro superlativo dos governos liderados pelo PT: a hegemonia do aparato comunicação nas mãos da direita brasileira.

Esse trunfo sabotou cada iniciativa do projeto progressista e coordenou o cerco que ora se fecha.

Alimentou, ademais, a disseminação do ódio na opinião pública, que se expressa na agressividade inaudita observada nas redes sociais desde a campanha de 2014.

É nessa estufa de preconceito e ódio de classe que brotam os esporos da ofensiva fascista, traduzida na escalada em curso.

Inclui-se nessa espiral as agressões públicas a ministros e ex-ministros de Estado, o ataque à reputação de lideranças progressistas e a de seus familiares, a onda de boatos e acusações infundadas contra o governo, as lideranças petistas e populares; enfim, o adestramento progressivo e diuturno do imaginário social para a aceitação passiva, ou engajada, da derrubada do governo da Presidenta Dilma.

Iludem-se os que confundem esse aluvião tóxico como evidência da banalidade do mal.

É de luta de classes que estamos falando. Não de Hannah Arendet.

É de intolerância fascista a pavimentar a derrubada de um governo escolhido por 54 milhões de brasileiros.

Os que pautaram o grito de ’escravo’ no desembarque dos cubanos engajados no ‘Mais Médicos’, agora conduzem o jogral que grita ‘corruptos e impeachment’.

Não sejamos ingênuos.

É curta a ponte que leva o ódio antipetista a se propagar em ódio anticomunista,  em intolerância religiosa e desta para a demonização da livre escolha sexual e daí para a higienização social.

Em nome do combate ao crime e à violência ultimam-se as providências legais para lotar penitenciárias com adolescentes pretos e pobres.

Quando uma sociedade simplesmente interna o seu futuro assim, em jaulas, qual futuro reserva a sua gente?

Um futuro nascido do intercurso entre a intolerância fascista e a livre mobilidade dos capitais chama-se regressão.

É esse o programa da derrubada em marcha do regime democrático brasileiro.

Não errará quem encontrar pontos de identidade com outras escaladas em curso na política latino-americana, marmorizada  de redes sociais, movimentos e  lideranças jovens treinados e financiados por fundações de extrema direita dos EUA. Os novos  braços privados da CIA e do Departamento de Estado.

O processo que ora avulta na caçada ao PT culminará com a caça a todo e qualquer desvio à norma de conduta que determina a subordinação esférica da sociedade à lógica rentista local e global.

Carta Maior nasceu como um espaço de reflexão da intelectualidade progressista brasileira.

Seu compromisso explícito com a construção da democracia social  torna-a um veículo imiscível com a derrubada em marcha do governo do país –em relação ao sustenta um apoio crítico claro e independente.

Elegemos uma prioridade diante das provas cruciais que nos impelem –os progressistas , democratas e nacionalistas sinceros—ao engajamento nesse divisor que se aproxima.

Exortamos os intelectuais a irem além do debate convencional.

Estamos propondo a incômoda operação de concretizar o geral no particular.

Trata-se de uma exortação à Universidade pública, para que ela volte a ser um ator do desenvolvimento. E não apenas um cronista da crise. Ou um coadjuvante do mercado.

Não basta mais produzir manifestos contra os golpistas.

É preciso afrontar o projeto de país embutido no golpe com um outro projeto.

E, sobretudo, com um outro método de escrutiná-lo .

Estamos exortando a universidade brasileira a se declarar uma trincheira em vigília permanente contra a derrubada do governo da Presidenta Dilma Rousseff.

E de fazê-lo transformando essa trincheira na rede da legalidade dos dias que correm.

Uma rede debruçada no debate do projeto de desenvolvimento que rompa os gargalos e as subordinações responsáveis pelo impasse atual.

E que transforme em práxis anti-golpista a costura das linhas de passagem do Brasil que somos, para o país que queremos ser.

O desafio de vida ou morte nesse momento consiste em restaurar a transparência dos dois campos em confronto na sociedade.

Na aparente neutralidade de certas iniciativas pulsa a rigidez feroz dos interesses estruturais que impulsionam a derrubada em marcha do governo.

A universidade pode, deve e precisa assumir a sua cota como um solvente, capaz de devolver à sociedade a clareza sobre as escolhas em confronto agudo nas horas que correm.

É essa urgência que CM quer compartilhar com a comunidade universitária, à qual se oferece como um canal de expressão democrático e progressista.

Mãos à obra.

Os acontecimentos de Argelia e Inzá, no estado do Cauca


Os acontecimentos dos últimos dias no corregimento de El Mango, município de Argelia-Cauca, assim como os do município de Inzá, no mesmo estado, mostram claramente que o cansaço da guerra nos colombianos e nas colombianas começa a se transformar em rebelião civil contra a Força Pública em zonas onde sua presença hostil granjeou o rechaço da população civil.



Em Argelia, campesinos e campesinas, fartos de suportar dentro de suas casas policiais confinados pelo temor de serem atacados –convertendo-se em fator de risco para a vida dos habitantes-, procederam a expulsá-los do perímetro urbano, exigindo sua reinstalação longe da população.
Em Inzá, o assassinato de um comuneiro por uma patrulha do Exército resultou na retenção de trinta soldados por parte da comunidade indígena que exige o cessar das operações e que os militares abandonem o território.
A explicação dos fatos e a reação dos altos mandos policiais e militares foi a de acusar aos campesinos e indígenas de serem guerrilheiros infiltrados vestidos de civil e ameaçaram processá-los judicialmente e aumentar o contingente policial.
Ao instalar estações de polícia e unidades militares no meio dos moradores, o Estado colombiano está violando normas do Direito Internacional Humanitário [DIH], do qual é signatário, mais precisamente do Protocolo Adicional aos Convênios de Genebra, Artigo 58 – Precauções contra os efeitos dos ataques, o qual diz:
a) Se esforçarão, sem prejuízo do disposto no artigo 49 do IV Convênio, por distanciar da proximidade de objetivos militares a população civil, as pessoas civis e os bens de caráter civil que se encontrem sob seu controle;
b) Evitarão situar objetivos militares no interior ou nas proximidades de zonas densamente povoadas;
c) Tomarão as demais precauções necessárias para proteger contra os perigos resultantes de operações militares a população civil, as pessoas civis e os bens de caráter civil que se encontrem sob seu controle.”
O repúdio da população à Força Pública, manifestado em Argelia e Inzá, é a demonstração clara do fracasso da mal chamada política de “segurança democrática” que já cumpre 13 anos de implementação e que ainda hoje se insiste em manter com a falsa crença de que servirá de pomada milagrosa para resolver a profunda crise social que nossa pátria vive.
Até quando poderá manter a mal chamada classe dirigente esta falácia? A nação colombiana necessita e quer a paz e está disposta a construí-la com sua participação direta, essa é a mensagem que devemos decifrar das ações das comunidades de Inzá e Argelia.
O tempo da solução militarista de crise se esgotou e já começa a trincar-se esse pretenso apoio à solução militarista.
É hora de abrir a via da democracia ouvindo e dando protagonismo ao povo. O atual momento histórico demanda receptividade e sensatez daqueles que se encontram na condução do Estado.
Isto devem também internalizar esses setores que ficaram mumificados pedindo mais guerra, quando não arriscam uma migalha nela, porém, sim, obtêm vultosos benefícios da corrupção e do rio revolto que gera a repressão e a violência.
O Governo, por sua parte, deve meditar também sobre isto e abrir a via a acordar o cessar-fogo bilateral que as maiorias nacionais e a comunidade internacional exigem. Assim se poderia facilitar a construção de um acordo final de paz: Há que desescalar a guerra, não há outro caminho.


DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP


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Equipe ANNCOL - Brasil

FARC-EP pedem a Santos desescalar conflito em Colômbia



As FARC-EP e o governo se encontram em conversações desde 2012 para pôr fim ao conflito social e armado que aflige a Colômbia.
As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Exército do Povo [FARC-EP] fizeram um chamamento nesta quinta-feira ao Governo do presidente Juan Manuel Santos para desescalar o conflito em Colômbia, no contexto do ciclo 38 dos diálogos de paz que as partes desenvolvem em Havana [Cuba] desde 2012. Fabiola López, correspondente de teleSUL em Havana, informou que a guerrilha fez referência ao cansaço que o conflito armado de mais meio século gerou, o qual está dessangrando a população.
Através de um comunicado, as FARC-EP narraram os acontecimentos dos últimos dias marcados pela resistência da população civil à Força Pública. Asseguraram que, na zona colombiana de Argelia, campesinos, fartos de suportar dentro de suas casas a policiais confinados pelo temor de serem atacados, procederam a expulsá-los da zona urbana, exigindo sua reinstalação longe da população. Não deixe de ler: FARC-EP e Governo colombiano continuam os Diálogos de Paz. Enquanto isso, em Inzá, o assassinato de um comuneiro por uma patrulha do Exército resultou na detenção de trinta soldados por parte da comunidade indígena que exige o cessar das operações e que os militares abandonem o território.
Nesse sentido, a guerrilha relembrou que, ao instalar estações de polícia e unidades militares em áreas urbanas, escolas, campos desportivos etc., o Estado viola normas do Direito Internacional Humanitário, das quais é signatário.
Em contexto: Representantes do governo colombiano se reúnem com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Exército do Povo [FARC-EP] para conversar em Havana desde o ano de 2012, tratando de conseguir uma saída combinada à confrontação, que dura mais de meio século.
Como resultado dos diálogos de paz, foram alcançados acordos parciais em temas como a reforma rural integral, participação política e garantia para a oposição, o tema das drogas ilícitas, ademais de um programa para o desminado e a criação de uma comissão da verdade.

Fonte: 
www.telesurtv.net
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Equipe ANNCOL - Brasil

domingo, 28 de junho de 2015

Cúpula Agrária anuncia mobilizações "a partir de agosto" após encontro com Santos


Fonte: Colombia Informa

Depois de se reunir anteontem, quinta-feira, com o presidente Santos por cerca de três horas, os líderes da Cúpula Agrária caracterizaram o modelo de negociações que já leva mais de um ano como “um fracasso” e chamaram as organizações a que “comecem a se mobilizar por acordos descumpridos em temas estruturais e de política social”.
A reunião que a delegação da Cúpula sustentou com o primeiro mandatário contou, ademais, com a presença dos ministros do Interior e da Agricultura, do Assessor Presidencial para os Direitos Humanos, dos vice-ministros de Minas e Defesa; de um delegado do Departamento Nacional de Planejamento e do vice-fiscal geral da Nação. O encontro teve como propósito revisar o estado da negociação da lista de exigências e o cumprimento dos acordos assumidos pelo governo nacional; de igual forma, abordou a situação dos direitos humanos das comunidades e das garantias para a mobilização. Jimmy Moreno, porta-voz nacional do Congresso dos Povos e integrante da Cúpula Agrária, explicou: “Expressamos ao presidente nossa preocupação pela pouca vontade política assumida por seu gabinete para a solução das reivindicações e o cumprimento dos acordos pactuados desde o ano passado”.
Esta foi a oportunidade para reiterar a Santos que as políticas refletidas no Plano Nacional de Desenvolvimento, a agenda legislativa proposta por seu governo, a violação sistemática de direitos humanos e a falta de garantias vão na contramão das reivindicações construídas pelas organizações inscritas na cúpula e da paz que os colombianos tanto ansiamos”, ressaltou Moreno.
Frente ao tema de garantias para a mobilização e direitos humanos, os delegados da cúpula foram enfáticos. Enquanto o modelo continuar atuando de maneira agressiva, o número de violações de direitos humanos continuará crescendo no país. Prontamente se solicitou agilizar os processos de investigação pelas 19 pessoas assassinadas durante as jornadas de paralisação do ano anterior; além disso, proceder com o esclarecimento de diferentes ameaças às comunidades e a vários dirigentes sociais. Finalmente, se pactuou um compromisso para buscar fórmulas que destravem os processos judiciais das pessoas detidas durante os protestos dos anos 2013 e 2014.
Com relação ao Fundo de Fomento Agropecuário, recurso que se acordou depois das negociações da Paralisação Nacional Agrária, o presidente Santos se comprometeu em garantir os duzentos e cinquenta bilhões de pesos para a viabilidade e execução dos projetos formulados pelos processos e pelas organizações sociais.
Outro tema crucial na discussão com o governo nacional teve a ver com o fracasso do modelo de negociação da lista de exigências assumida depois da Paralisação Agrária de 2014. Jimmy Moreno explicou que até o momento a equipe de negociação do governo não expressou vontade política para cumprir os acordos, comportando-se nas reuniões com uma atitude indiferente e de pouco compromisso com as comunidades. Ante esta situação, se criará uma comissão entre delegados do governo e delegados da Cúpula Agrária, com mediação da Organização das Nações Unidas –ONU-, para construir uma nova metodologia que permita avançar de forma diligente nos oito pontos da relação de exigências. “Se bem que se tenha avançado em dois pontos [mineiro-energético e economia própria], há uma série de propostas às quais não se lhes deu resposta. Por tal situação, lhes demos um prazo de quinze dias a um mês para que nos respondam sobre as inquietações que saíram em relação a estes pontos”, explicou Moreno.
A mobilização não dará espera
A cúpula é clara neste tema e sua assembleia assim o definiu. Se insistirá na negociação com o governo, porém esse cenário não limitará as organizações para convocar a futuras mobilizações; toda vez que se vêm implementando uma série de políticas como o Plano Nacional de Desenvolvimento, não cessam as ameaças, a militarização e o despojo dos territórios. “Necessitamos que as organizações comecem a se mobilizar por uma série de acordos descumpridos em temas estruturais e política social. Fazemos um chamamento às comunidades e às distintas mesas regionais para que nos juntemos a partir de agosto aos processos de mobilização, protesto e exigência de nossos direitos”, concluiu Moreno.
Equipe ANNCOL - Brasil

sábado, 27 de junho de 2015

Quem torna impossível um cessar-fogo bilateral?


Por Comandante Joaquín Gómez
Integrante do Secretariado das FARC-EP
A morte de Jairo Martínez e mais 25 guerrilheiros, assim como a do coronel Alfredo Luis Clavijo e do patrulheiro Juan Davi Marmolejo, constituem perdas de valiosas vidas humanas que bem poderiam ser evitadas.
Como teriam sido evitadas? Com um acordo sobre o cessar-fogo bilateral, que desde o princípio mesmo das conversações em Havana foi proposta das FARC ao governo. Santos sempre respondeu o mesmo, que não, porque a Guerrilha aproveitaria o cessar-fogo bilateral para se fortalecer.
Este argumento é de uma fragilidade tal que não resiste a uma análise lógica. Se subentende que, se se pactua um cessar-fogo bilateral, deverá haver uma comissão que verificará o cumprimento do mesmo pelas partes; comissão que deverá estar integrada por destacados personagens da vida nacional e internacional, mais representantes de cada uma das partes enfrentadas e membros das comunidades.
Pelo acima exposto, esse argumento do presidente Santos não é convincente, porque está divorciado da lógica expressada no sentido comum.
Quando as FARC-EP decretaram o “cessar-fogo unilateral, por tempo indeterminado e verificável”, as forças estatais, principalmente o Exército, só viram neste gesto inequívoco de boa vontade e desejo de paz a oportunidade única de obter vantagens militares sobre a Guerrilha, a qual acolheu com plena subordinação a ordem ministrada por sua Instância Superior, e cujo objetivo primordial era aliviar, dentro do possível, a angústia, os sofrimentos e incertezas em que se move o campesinato colombiano frente ao conflito interno que o país vive, e que tem sua expressão principalmente no campo.
Durante a trégua unilateral decretada pelas FARC caíram vilmente assassinados pelas balas oficiais 30 guerrilheiros e uma dezena de feridos, entre os quais vários comandantes, um deles o camarada Gilberto [El Becerro], integrante do Estado-Maior Central, e a quem, depois de morto, trataram de enodoar seu prestígio de revolucionário, qualificando-o de narcotraficante, para tratar de justificar ante a opinião pública sua injustificada morte.
A denúncia das FARC pelas constantes operações ofensivas do Exército contra suas unidades em trégua se tornou obsessiva por reiterada. 5 comunicados públicos denunciaram o que estava sucedendo e em todos eles se advertia que o cessar-fogo unilateral estava em perigo; que a situação estava insustentável, porque estavam matando os guerrilheiros. Estas denúncias também as fizemos ante os delegados plenipotenciários do Governo na Mesa de Havana. Todos eles acabaram enfermos de “surdez coletiva”, ninguém quis escutar.
Essa atitude provocou os lamentáveis e dolorosos fatos da vereda Buenos Aires [Cauca], onde morreram 11 militares e outros 21 terminaram feridos. Era algo que estava por vir, porque uma das leis mais antigas, tão antiga como a própria existência da humanidade, é a lei natural do direito a se defender. Neste caso concreto, é preciso reconhecer que a guerrilha disparou primeiro, porém forçada a isso pelos desembarques de tropa e dos avanços por terra, que pressagiava a iminente morte das vítimas de sempre, os guerrilheiros.
Dados estes fatos, o presidente Santos, de maneira rápida, expressa sua “irreprimível ira unida aos lamentos pelos militares caídos”, tornando-se visível uma atitude que não é sincera. Se verdadeiramente lhe doessem as mortes de soldados anônimos, todos filhos de “Juan Pueblo” [João Povo], há tempos que haveria pactuado o cessar-fogo bilateral. É claro que como em nenhuma dessas patrulhas se encontra Esteban, seu filho, a quem mostrou a todo o país desde Tolemaida, não lhe parece urgente uma decisão de parar a guerra de imediato. Estou quase certo de que Esteban Santos, após o show publicitário, se encontra novamente na casa paterna, desfrutando do privilégio de ser filho do Presidente da República e de pertencer à família Santos.
Se me equivoco e Esteban ainda se encontra no Exército, peço perdão pela grave imprecisão. Porém, sugeriria ao presidente Santos pedir aos generais que destinem Esteban à ordem pública. Assim, dona María Clemencia e o Presidente talvez conheceriam em carne própria, sem demagogia nem populismo, a inigualável dor, por profunda, que todos os dias sentem os humildes campesinos, ao receberem a notícia de que perderam seu filho num combate entre pobres.
O outro, que se deve ter em conta, é que de repente Santos queira um cessar-fogo bilateral, porém não possa pactuá-lo pela oposição do Pentágono. É bem sabido, e disto podem dar fé os generais colombianos, que nossos governantes não dão um passo sem consultar e pedir aprovação do Governo gringo, o qual não creio que esteja interessado em que o conflito se solucione. Sem conflito interno ficaram sem pretexto para a ingerência, hoje em dia, quando a meta do império consiste em desestabilizar, a partir de sua plataforma em Colômbia, os governos democráticos alternativos de Latino-América e do mundo.
Neste último caso, peço compreensão para com o Presidente Santos. Não é culpa sua que a classe dominante em Colômbia tenha a vocação servil de, como dizia Jorge Eliécer Gaitán, permanecer de joelhos ante o império norte-americano.

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Equipe ANNCOL - Brasil

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Santos não vai ganhar nenhuma guerra em meio à paz.


Por Alberto Pinzón Sánchez
O informe de Human Rights Watch [HRW], tornado público ontem 23.6.2015, sobre a responsabilidade do “generalato” colombiano nos chamados “falsos positivos”, ocorridos durante o governo de Uribe e seu ministro de Defesa JM Santos [fuzilar jovens desempregados ou deficientes físicos vestidos de guerrilheiros para dizer que vai ganhando a guerra e cobrar as recompensas da contagem de corpos ou “body conter”], sem dúvida nenhuma se conhecia há vários meses, pois a informação sobre a qual se baseia está sacada das investigações promovidas desde há anos na promotoria colombiana.
São mais de 3.000 casos sobre os quais há informações sustentadas e declarações que comprometem “massivamente” a 180 batalhões do glorioso exército colombiano; quer dizer, como vimos dizendo desde há décadas, “não são umas quantas maçãs apodrecidas mas todo o pomar de macieiras”, e com o agravante de que seus dois responsáveis diretos e aqueles que deram as ordens, presidente e ministro de Defesa, continuam impunes na Casa de Nariño, protegidos por todas as blindagens legais imagináveis.
Segundo as “superficiais” notas jornalísticas que conseguiram vir a público, o governo dos EUA, primeiro grande implicado, e alguns dos senadores protetores dos militares colombianos conheceram em primeira mão, há meses, o informe, que aparentemente é tão óbvio e evidente que não puderam evitar sua publicação final.
Agora gritam a plenos pulmões acusando a seus protegidos: “!!! Ao ladrão. Esse é o ladrão. Agarrem-no!!!!”
E tudo parece indicar que a saída forçada e contra o mesmíssimo presidente do hercúleo ministério de Defesa Pinzón, quem era a garantia de que ninguém ia se meter com seus dois chefes Uribe e Santos, e sua lenta substituição [para evitar mais surpresas] pelo empresário Villegas, ex-embaixador colombiano em Washington, previamente instruído sobre o que tem e deve fazer com o generalato colombiano, para lavar o sangue do coletivo militar, é uma parte do roteiro anterior.
Porém, já é um pouco tarde, porque com um exército assim de assassino e sem nenhuma moral, por mais tecnologia de última geração, drones e bombas de 250 quilos que tenham para despedaçar guerrilheiros, não vão ganhar nenhuma guerra em Colômbia, nem sequer com o pretexto de querer a paz. Pelo contrário, a cada se afundará mais no pântano da degradação e desmoralização que estamos vendo.
Ficou claro finalmente porque o hercúleo Pinzón atuou como fez: como um “francoatirador sem controle” contra a Mesa de Havana, vazando todo tipo de informação para Uribe com o visto bom de Santos.
Ficou claro que Pinzón não era uma roda solta em toda esta estratégia, para proteger e arrancar a seus dois chefes junto com o generalato e a cúpula militar impunes, ante um possível acordo sobre justiça bilateral em Havana, mas sim o contrário: uma peça mestra da estratégia militarista de negociar em meio à guerra.
Ficou claro porque Santos se apega como “última ratio” [último recurso] a esse modelo militarista viciado e perverso de “negociar em meio à guerra”. Também há luz nas razões pelas quais Uribe [com seus acólitos] insiste em continuar sugando a teta suculenta e oceânica dos dólares americanos que sustentam a guerra contra insurgente “eterna” em Colômbia; pois, enquanto haja guerra, não será possível encontrar a verdade para fazer justiça, ou, dito de outra maneira: a justiça será impossível e a impunidade continuará sendo a lei, como até agora tem sido.
O farol ou blof de Santos de apresentar-se ameaçador e muito poderoso ante seus opositores e inclusive ante seus “amigos de ocasião” como o presidente venezuelano Maduro, finalmente ficou desinflado. Forçou as Farc a suspenderem a trégua unilateral que estas haviam decretado, fazendo saltar em pedaços a meia centena de guerrilheiros, incluído o delegado de Paz Jairo Martínez, para depois sair a se sentir saudoso daqueles meses em que a confrontação diminuiu ostensivamente.
Forçou diplomaticamente o cerco contra o governo legítimo de Venezuela, erguendo o espanhol com passaporte colombiano Felipe González para que fosse desestabilizar o Presidente Maduro, seu “amigo de ocasião”, inclusive enviou um avião oficial destinado à presidência da Colômbia [sem autorização de ninguém] para que fosse arrancar Felipe González sub-repticiamente e às pressas de Caracas, e agora, que Venezuela é agredida e submetida a uma guerra diplomática oriunda da Colômbia, traça soberanamente os limites de sua defesa militar, então manda razõezinhas lacrimejantes para que se jogue para trás o decreto venezuelano.
Por acaso, Uribe não ameaçou com seu poderoso exército e com a guerra a Venezuela de Hugo Chávez, por algo mil vezes menos importante?
Muito simples: o heroico e gigantesco exército colombiano, contrário ao mandato de nosso pai Simón Bolívar, não pode defender a soberania de seu país porque está encharcado em seu interior fuzilando seu próprio povo para fazê-lo passar como inimigo interno ou como guerrilheiro, para cobrar recompensas sobre seus cadáveres.
E por isto o povo humilde o expulsa de seus povoados, como passou ontem em Argelia Cauca. Porque é um exército de ocupação estrangeira, desmoralizado e politicamente arrebentado que já não pode ganhar nenhuma guerra, nem sequer contando com o pretexto da paz, ou tendo às mãos a imensa ajuda militar, tecnológica, econômica e política que lhe dão as 9 bases dos EUA em Colômbia.
Sempre fui muito cuidadoso com os informes de HRW, porém, desta vez, assim como as denúncias sobre a lei do foro militar aprovado recentemente pelo congresso em Colômbia, realmente devo felicitar a seu diretor Vivanco. São dois informes corajosos que são muito bem-vindos na opinião democrática colombiana e um inestimável insumo para encontrar a paz baseada na verdade em nosso martirizado país. Oxalá o escutem e o ponham em prática. Então, haverá motivo para voltar a ser otimista e voltar a crer.

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Equipe ANNCOL - Brasil

Volta Cuba ao capitalismo?


Por Roger Keeran y Thomas Kenny, ResumenLatinoamericano /Marxism-LeninismToday, maio 2015.-

Em 2011, as autoridades cubanas adotaram algumas Diretrizes audazes [lineamentos] para fazer frente aos problemas econômicos de Cuba. Modificadas após o debate público e aprovadas pelo Parlamento de Cuba, as Diretrizes têm agora força de lei e se encarnam em regulamentos. Em maio de 2011, depois de uma visita a Cuba, publicamos um artigo, “Para onde vai Cuba?”, no qual argumentamos que, apesar de certas semelhanças entre os problemas de Cuba em 2011 e os problemas soviéticos em 1985, e apesar de certas semelhanças entre as soluções perseguidas por Mikhail Gorbachev conhecidas como perestroika e as reformas cubanas [Atualização], as diferenças nas duas situações e os dois conjuntos de reformas eram muito maiores que as similitudes. Portanto, existia pouca razão para supor que Cuba se dirigia pelo caminho que finalmente destruiu o socialismo soviético. Em fevereiro de 2014 visitamos Cuba novamente. Desta vez entrevistamos a trabalhadores, jornalistas, dirigentes sindicais, intelectuais e acadêmicos. Estas discussões, junto com um exame do material escrito não nos fizeram mudar de ideia, senão que aprofundaram nossa apreciação dos problemas que Cuba enfrenta e os desafios que enfrentam as novas reformas e as diferenças com a história soviética. Neste ensaio, vamos voltar à questão de se as reformas assinalam um retorno ao capitalismo em Cuba e acrescentar alguns novos pontos de vista.


Os Problemas
Mediante a nacionalização de praticamente toda a propriedade produtiva e a regulação da atividade econômica graças à planificação centralizada em lugar do mercado, da competição, da exploração e da busca do benefício, o socialismo cubano conseguiu vitórias monumentais para o povo trabalhador, incluindo o crescimento econômico, o pleno emprego, a atenção sanitária e a educação gratuitas, o acesso a moradia e a alimentação, e um alto nível cultural.
O socialismo, no entanto, não cria automaticamente uma utopia. A propriedade estatal e a planificação centralizada engendraram seus próprios problemas. Sem a temível disciplina do mercado, o socialismo se defronta com problemas de motivação, de produtividade, eficiência e qualidade dos bens e serviços. Proporcionar a todas as pessoas um emprego pode conduzir ao excesso de pessoal e à ineficiência. A administração de um Estado de grande tamanho de acordo com regulações pode conduzir à burocracia, ao excesso de papelada e outras protelações.
Garantir a todas as pessoas uns mínimos padrões de vida decente pode conduzir ao racionamento, filas, e a limitações na qualidade e variedade de bens de consumo. O racionamento e a escassez podem, por sua vez, conduzir à corrupção e ao mercado negro. A planificação centralizada pode conduzir a uma falta de iniciativa e responsabilidade no âmbito local. Ainda que este tipo de problemas possam ser inerentes à natureza do socialismo, têm sido exacerbados pelas condições de seu nascimento. Nunca uma revolução socialista teve o privilégio de desenvolver-se livremente em seus próprios termos. Nenhum país socialista pôde evitar os intentos imperialistas para sufocá-lo mediante invasão, o isolamento diplomático, a guerra econômica [sanções, bloqueio, sabotagem e a pressão militar], o terrorismo dos imigrados, o assassinato, a guerra psicológica, e mais recentemente o fomento “dos movimentos democráticos”, e o uso da guerra cibernética e dos meios sociais. Os Estados socialistas sempre tiveram que manobrar num mundo hostil, um mundo ainda mais hostil depois do desaparecimento do campo socialista na União Soviética e no Leste Europeu.
Ao lidar com seus problemas econômicos, Cuba sempre teve que se enfrentar com duas desvantagens que a União Soviética ou a China não tinham. Em primeiro lugar, apesar de abundantes terras de cultivo, belas praias, bosques e níquel, Cuba não possui abundantes recursos naturais. Carece de gás, petróleo, carvão, ferro, estanho, e da maioria do restante de recursos. [Ainda que os últimos descobrimentos de reservas de petróleo em alto-mar podem abrandar uma destas deficiências no futuro.] Em segundo lugar, teve que suportar um bloqueio dos Estados Unidos durante cinquenta anos que privou Cuba dos mercados de exportação e importação e em grande medida aumentou o custo dos medicamentos importados, dos alimentos, dos bens de equipamento e de consumo. Segundo algumas estimativas, em meio século, o bloqueio custou a Cuba 975 bilhões de dólares, e sem o bloqueio a qualidade de vida cubana se pareceria bastante com a da Europa Ocidental. [i]
Nenhum destes problemas obscurece as vantagens inequívocas do socialismo para o conjunto do povo, e nenhum deles condena o projeto socialista. No entanto, cria problemas e se requer uma atenção constante, assim como soluções criativas. Cuba revisou seu modelo socialista por várias vezes num intento de fazer frente a seus desafios econômicos. Às vezes, os novos modelos tiveram que corrigir as deficiências geradas pelos anteriores.
  1. Primeiro Modelo, 1960-1970. No primeiro período da Revolução, Cuba nacionalizou as grandes empresas estrangeiras, distribuiu terras aos campesinos sem-terra, desenvolveu um sistema de planificação e lidou com o bloqueio dos Estados Unidos, desenvolvendo o comércio com os países socialistas. Neste período, Cuba destacou os incentivos morais sobre os incentivos materiais e estabeleceu objetivos ambiciosos para uma rápida industrialização financiada mediante a produção intensiva de açúcar e sua exportação.
  2. Um modelo como o do Leste Europeu, 1970-1985. Neste período, Cuba se uniu ao CAME, o Conselho de Ajuda Mútua Econômica, uma organização de Estados socialistas europeus projetados para coordenar as atividades econômicas e o desenvolvimento da cooperação econômica, técnica e científica. Neste período, Cuba desenvolveu seu primeiro Plano Quinquenal que fez finca-pé na produção de açúcar e que pôs mais ênfase nos incentivos materiais, seguindo o modelo dos países socialistas do Leste Europeu.
  3. Retificação, 1985-1990. Neste período, Cuba trata de retificar os erros da aplicação acrítica das receitas econômicas soviéticas à situação cubana. Cuba abandonou alguns mecanismos de mercado que havia intentado e tentou melhorar a centralização econômica. Também tratou de diversificar a economia mais além do açúcar mediante a promoção da biotecnologia, dos produtos farmacêuticos, do turismo e da produção de níquel.
  4. O Período Especial, 1991-2010. O colapso da União Soviética e do Leste Europeu significou a perda repentina de mais de dois terços de suas exportações e uma contração drástica de toda sua economia. A crise econômica se viu agravada pela intensificação do bloqueio dos Estados Unidos através da lei Torricelli [1992] e da Lei Helms-Burton [1996]. Em resposta, Cuba idealizou um novo modelo para apertar o cinto, conservar divisas, transformar as granjas estatais em cooperativas, permitir de maneira limitada que a empresa privada gestione o setor varejista, admitir que as remessas dos exilados cubanos e, sobretudo, desenvolveu fortemente o turismo. Para assegurar-se de que as remessas e o turismo trouxessem as desejadas divisas de que tão desesperadamente necessitavam, Cuba instituiu um sistema de dupla moeda.
O período especial resultou ser uma forma muito criativa de lutar contra a crise de extrema gravidade decorrente do colapso da União Soviética e do recrudescimento do bloqueio. Com as políticas do Período Especial, junto com a ajuda em forma de empréstimos da China e do petróleo de Venezuela, Cuba conseguiu levar sua economia e seu nível de vida novamente aos níveis anteriores à crise. Enquanto isso, no entanto, surgiram novos problemas econômicos. Em primeiro lugar, a recessão econômica mundial de 2008 golpeou os mercados de exportação de Cuba, e isto continua sendo um problema. Ademais, em 2007-2010, vários furacões causaram uma destruição generalizada. Além destes problemas, as políticas do Período Especial deram lugar a algumas consequências não desejadas e prejudiciais, relacionadas com o sistema de dupla moeda.
Devido à diferença entre a moeda cubana universal [CUC], [que foi utilizada pelos turistas e por aqueles que enviam remessas do estrangeiro] e o peso cubano que foi de aproximadamente 1 a 25, Cuba foi capaz de obter as divisas de que tanto necessita. Porém esta diferença de valor também fez o acesso aos CUC muito desejável, dando a seus possuidores vantagens consideráveis. Por exemplo, o trabalho em restaurantes, hotéis, táxis e outras partes da indústria turística com acesso a pagamento ou gorjetas em CUC se converteu, em muitos casos, em algo muito mais atrativo e mais lucrativo que o trabalho nas profissões para as quais a pessoa tinha sido livremente formada. Há, pois, uma “fuga de cérebros” desmoralizante e ineficiente do ensino e outras profissões para o turismo. Também contribuiu para a desigualdade, o mercado negro e a corrupção. Por exemplo, dada a preponderância de que dois milhões de cubanos-americanos que vivem nos Estados Unidos são cubanos de origem europeia ou mestiça, a preponderância dos milhares de milhões de dólares das remessas foi e continua indo para seus familiares de antecedentes europeus ou mestiços em Cuba. Isto exacerbou as diferenças econômicas raciais.
A única maneira de sair destas dificuldades requer a eliminação da dualidade monetária. Para não causar uma tremenda deslocação econômica, a dupla moeda só pode ser eliminada gradualmente aumentando os salários cubanos e reduzindo a necessidade de divisas. Isto, por sua vez, requer o aumento da produtividade e da eficiência para fazer produtos cubanos mais competitivos e reduzir a necessidade de importação de energia e matérias-primas. Também requer o aumento da autossuficiência, em especial nos alimentos, já que Cuba gasta cerca de um bilhão de dólares ao ano na compra de alimentos no estrangeiro. Do mesmo modo, recuperar os mercados de exportação perdidos com a crise de 2008 requer aumentar a produtividade e a eficiência.
Todas estas considerações –abordar alguns dos problemas endêmicos do socialismo e combater contra os problemas causados pela crise de 2008, assim como os gerados pelo Período Especial- proporcionam o impulso às reformas de “atualização” inauguradas em 2011. Outra circunstância que fomenta as reformas é a incerteza da situação internacional. Graças à China, à Revolução Bolivariana de Venezuela e aos governos progressistas social-democratas de Brasil, Bolívia e outros países, Cuba agora tem mais amigos e conta com mais apoio no estrangeiro que no passado recente, porém nenhum deles tem garantias para durar. O apoio da China aos países socialistas irmãos vacilou antes. A Revolução Bolivariana não se consolida. E os governos social-democratas vão e vêm.
Tanto Fidel como Raúl Castro destacaram a urgência da reforma. Fidel disse: “o modelo cubano já não funciona nem para nós outros.” [ii] Em dezembro de 2010, Raúl Castro afirmou: “Ou retificamos as coisas ou ficamos sem tempo para continuar margeando o abismo [e] nos afundamos.” [iii] A compreensão da natureza e gravidade dos problemas que Cuba enfrenta é um componente importante na hora de fazer uma avaliação política das reformas cubanas. A essência do oportunismo, segundo a definição de Lênin, não está em fazer compromissos ou concessões com o inimigo de classe e sim em fazer compromissos e concessões desnecessárias.
Na nossa opinião, o xis da questão da perestroika e da glasnost de Gorbachev era que implicavam concessões desnecessárias ao imperialismo norte-americano e compromissos com a ideologia e as práticas capitalistas. As políticas de Gorbachev foram menos uma exigência da situação objetiva que dos interesses de classe de um setor pequeno burguês que haviam se desenvolvido na sociedade soviética arraigada após anos de crescimento da segunda economia.
Ainda que o sistema soviético tinha problemas que necessitam ser abordados, as políticas de Gorbachev implicaram 5 políticas desnecessárias de corte oportunista:
  • A liquidação do Partido Comunista da União Soviética,
  • A entrega dos meios de comunicação às forças anti socialistas,
  • O desencadeamento do separatismo nacionalista e
  • A rendição ante o imperialismo estadunidense,
  • A privatização por atacado e a mercantilização da economía socialista.
Ainda que os primeiros 4 processos não estejam sucedendo em Cuba, se está produzindo uma certa redução do papel do Estado e um certo aumento da atividade econômica privada e do mercado.
Ainda que as reformas cubanas atuais podem ser estimuladas pelos que estão conectados com a segunda economia cubana e por aqueles que desejam sufocar o socialismo, são uma resposta a problemas muito reais que, se não se tratam, ameaçam o futuro do socialismo cubano. Na medida em que as reformas são compromissos com o mercado e as ideias capitalistas, são compromissos necessários. A meta a curto prazo é eliminar o déficit de balança de pagamentos, melhorar os fluxos de receitas externas, substituir importações com produtos nacionais e aumentar a eficiência econômica, a motivação no trabalho e nas rendas.
O objetivo a longo prazo é conseguir a autossuficiência alimentar e energética, o uso eficiente dos recursos humanos, uma maior competitividade e as novas formas de produção. [iv]
As Políticas de Atualização
No entanto, surge a pregunta: inclusive, se são mais necessárias as reformas cubanas de hoje que as reformas de Gorbachev de fins dos 1980s, não são os movimentos cubanos semelhantes em muitos aspectos às de Gorbachev e não apresentam o mesmo perigo para o socialismo?
Muitas das diretrizes parecem ter um ar [semelhante] às políticas de Gorbachev e estas tiveram mais publicidade. Sem dúvida, muitas das diretrizes têm por objetivo aumentar o papel do mercado, da empresa privada e da autonomia local, e, portanto, reduzir o papel da planificação estatal, do emprego estatal e dos subsídios estatais. Um caminho que aumenta o tamanho dos interesses da pequena burguesia e cria perigos. Invariavelmente, surgirão vozes que queiram levar as coisas mais rápido e mais longe para o capitalismo. No prólogo da tradução em espanhol de nosso livro Socialismo traído [Socialismo traicionado], Ramón Labañino, um dos Cinco cubanos encarcerados, fala da necessidade neste momento de “estar alerta e vigilante para evitar erros e fraquezas que nos poderiam levar ao fracasso”.
O que na hora de enfrentar riscos no manejo da atualização, homens como Labañino sejam conscientes da história soviética, da confiança de que Cuba pode evitar as armadilhas que condenaram o socialismo soviético.
O mais importante, na adoção do Projeto de Orientações Gerais de Política Econômica e Social do Partido Comunista de Cuba, é que o Sexto Congresso do Partido Comunista de Cuba [PCC] reafirmou o compromisso do governo com o socialismo e com a preservação do meio de vida, da segurança e do nível de vida do povo cubano. Em palavras do PCC, o governo vai “continuar preservando as conquistas da Revolução, como o acesso à atenção médica, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, às pensões e à seguridade social para aqueles que o necessitam.”
Também de crucial importância é a formulação e aplicação das diretrizes que ocorreram e ocorrem num processo que difere amplamente do que ocorreu na União Soviética. A “atualização” cubana surgiu de um processo altamente democrático e do grau de participação de massas e de quadros comunistas e operários. Em Cuba, o desenvolvimento das diretrizes de até sua aplicação em 2014 incluiu a consulta popular e o debate e a construção de consensos enormes. O processo se iniciou em dezembro de 2010 e foi até fevereiro de 2011, com discussões de todo o povo, seguidas de discussões no Partido em todas as províncias e, na sequência, por debates no VI Congresso do PCC em abril. No total, tiveram lugar 163.079 reuniões, nas quais participaram 8.913.838 pessoas. Estes debates modificaram ou incorporaram 68% dos 291 lineamentos originais, modificaram outros 181 e criaram 36 novas diretrizes. A discussão das diretrizes também se produziu em cartas ao diretor do Granma, chamadas radiofônicas, blogs de Internet, e nos sindicatos. Um observador assinalou: “Um ponto chave aqui é que a redação da nova lei de emprego implica um processo de consulta com a CTC [a Confederação Central de Sindicatos], de maneira tão detalhada e extensa que os sindicatos têm de fato o direito ao veto”. [v]
Devido a esta participação massiva, o povo cubano está unido e confiante na direção da atualização. A questão de se Cuba vai voltar ao capitalismo é mais prevalecente fora que dentro de Cuba. Ninguém com quem falamos expressou o menor temor de que a atualização faria danos aos interesses dos trabalhadores ou ameaçaria o futuro do socialismo.
A “atualização” de Cuba é um esforço multifacetado e radical que implica 291 diretrizes que tocam em quase todos os rincões da vida econômica. Em outra das diferenças com o enfoque de Gorbachev, as reformas cubanas estão orientadas quase exclusivamente às mudanças econômicas e não a mudanças na política, na ideologia, nos meios de comunicação ou na política externa. Por outra parte, muitas das diretrizes estão orientadas a condições peculiares de Cuba e não têm nenhuma parecida com a perestroika de Gorbachev.
Por exemplo, algumas das diretrizes têm a ver com o fomento do cultivo de terras atualmente sem uso e o desenvolvimento das zonas rurais, dando as terras agrícolas ociosas do Estado em usufruto para aqueles que podem produzir alimentos para o consumo nacional. Algumas das diretrizes têm a ver com uma volta ao princípio socialista de distribuição –“de cada qual segundo sua capacidade, a cada qual segundo seu trabalho”-, isto é, a recompensar aos trabalhadores por sua produtividade, um princípio do qual se haviam distanciado os cubanos durante o Período Especial.
Para aumentar a produtividade e a eficiência, se devolverá às províncias e aos municípios a responsabilidade de várias empresas estatais. Estes níveis inferiores terão o controle sobre suas rendas e se espera que operem sobre a base da rentabilidade financeira. Na indústria do açúcar, por exemplo, se reduzirá o número de pessoal e cada usina se converterá numa empresa independente. A descentralização implica um distanciamento da planificação central, e isto pode causar complicações ao que resta de planificação centralizada, e também pode introduzir desigualdades, dado que algumas localidades gozam de condições mais favoráveis que outras. Ainda assim, a descentralização não implica a modificação dos fundamentos da propriedade socialista e a provisão das necessidades sociais. Todos os países socialistas experimentaram com diversas formas de centralização e descentralização.
O Estado planeja reduzir outras atividades que abarcam a quase um milhão de postos de trabalho. O Estado também eliminará as cafeterias de trabalhadores com comidas subsidiadas que se transformarão em restaurantes comerciais. O Estado vai limitar o número de meses de elegibilidade e o valor dos subsídios por desemprego. O Estado também planeja eliminar a caderneta de racionamento subsidiada para aqueles que podem se permitir o luxo de comprar alimentos. A ideia é fazer estas mudanças de uma maneira gradual e sistemática, a fim de que aqueles que perdem o posto de trabalho estatal possam encontrar emprego no fortalecido setor privado.
Ainda que as reformas impliquem uma expansão da empresa privada e das relações do modo de produção capitalista, a expansão está muito regulada. Segundo uma estimativa, desde 2014, 450.000 cubanos trabalham no setor privado nas granjas, cooperativas e pequenas empresas. [vi] Em dezembro de 2013, 78% da força trabalhadora estava no setor público e 22% no setor privado. O objetivo da atualização é que o setor público conte com 60% e o privado com 40%; [vii] O setor privado e cooperativo abarcará quase a metade da força de trabalho no ano de 2015. Neste processo, o Estado vai arrendar para particulares empresas tais como os restaurantes particulares [paladares], padarias, barbearias, salões de beleza, lojas de consertos de relógios, bicicletas e automóveis. O Estado está aumentando o número de clientes permitidos nos restaurantes particulares de 12 para 50 e isentando do pagamento de impostos durante um ano aqueles paladares que empreguem a mais de 5 pessoas.
As relações de mercado estão se expandindo. As pessoas com acesso às divisas poderão utilizar as instalações turísticas e comprar telefones móveis e computadores. O povo poderá comprar e vender automóveis, casas e apartamentos e construir habitações particulares e contratar equipes de construção privadas.
As diretrizes tratam de manejar os aspectos mais discutidos, tais como a privatização e o investimento estrangeiro, de maneira que garantam a qualidade de vida dos trabalhadores e o futuro do socialismo. Por exemplo, a expansão dos cuentapropistas [trabalhadores por conta própria ou autônomos] está se fazendo não só para absorver aos que perdem o emprego estatal como também para estimular aos trabalhadores da segunda economia ilegal a formar parte da economia legal. Um dirigente sindical nos contou a história de um parente que havia trabalhado como taxista ilegal, onde era frequentemente detido, não pagava impostos e não tinha benefícios sociais. Agora, como cuentapropista, conduz um táxi legalmente, paga impostos e recebe benefícios sociais, incluindo uma pensão chegado o momento. [viii] Por outra parte, todos os cuentapropistas podem se filiar a sindicatos. Os sindicatos estão idealizando estratégias para recrutá-los e para se prevenir contra o pensamento pequeno burguês que poderia surgir com a expansão do trabalho por conta própria.
A atualização busca ampliar o investimento estrangeiro, mais além do que estava permitido por uma lei de 1979. Já há planos para um novo porto de contêineres em Mariel financiado pelo Brasil. Ao mesmo tempo, a atualização busca minimizar as consequências potencialmente prejudiciais do investimento estrangeiro. Por exemplo, a lei cria incentivos para as empresas mistas. Exclui o investimento dos exilados cubanos. Exige empresas conjuntas e outras formas de empresa para contratar mão de obra através das agências estatais cubanas. Se obriga os investidores estrangeiros a seguirem o Código de Trabalho em matéria de meio ambiente, saúde e proteção de segurança trabalhista e social. Com a exceção da gestão de alto nível, as empresas devem empregar cidadãos e residentes cubanos em todas as posições.
Ainda que todas estas mudanças sejam impressionantes em sua amplitude e aspirações, Raúl Castro e o PCC estão implementando-as com cautela e com vistas a frustrar consequências indesejáveis. No VI Congresso do PCC, disse Castro: “O desafio é claro: o aumento de produção na produção material, por volume e eficiência, são essenciais, porém tem que ser feito no contexto de relações socialistas de produção, relações socialistas de propriedade.” [ix] Na concessão de licenças às cooperativas, segundo Castro, “Não podemos ir às pressas na aprovação constante destas cooperativas. Vamos ir num ritmo adequado.” Em 2013, Castro emitiu uma severa advertência aos empresários na hora de lançar-se de cabeça a descumprir as diretrizes. [v]
Numa linha similar, o partido advertiu que não se espere que a atualização conduza à privatização da economia. Em 2010 o PCC declarou: “Nas novas formas de gestão não estatal, não se permitirá a concentração da propriedade em pessoas jurídicas ou naturais”. [xi]
Em julho de 2013, Marino Murillo, um funcionário de alto nível econômico do governo cubano, reforçou esta ideia ante a Assembleia Nacional do Poder Popular: “Não é correto dizer que em Cuba hoje está ocorrendo uma transformação da propriedade estatal em privada. A atualização do modelo econômico cubano pressupõe, antes de tudo, a propriedade social sobre os meios fundamentais de produção. Atualizar o modelo não muda a base estrutural da propriedade sobre os meios fundamentais de produção.” [xii]
O que se está transferindo para mãos privadas não é propriedade e sim a gestão dos bens de propriedade social. [xiii]
Claramente, o caminho daqui pra frente tem perigos. Referindo-se à Comuna de Paris, Karl Marx disse: “Desde logo, seria muito cômodo fazer a história universal se a luta pudesse ser empreendida só em condições infalivelmente favoráveis.” [xiv] O mesmo sucede com a atualização cubana. Os cubanos estão empreendendo um caminho com certos riscos e sem possibilidades infalivelmente favoráveis, porém estão fazendo-o pouco a pouco e com cuidado, com os olhos bem abertos e com toda a população envolvida. É um curso que é contraditório, porém é necessário. Estão fazendo com a convicção de que, como disse Raúl Castro, não fazer nada implica no risco de cair no abismo.
Os que estão nos Estados Unidos e estão observando os acontecimentos com grande interesse e uma esperança sem limites poderiam ajudar de maneira concreta ao processo de atualização cubana redobrando os esforços para [...] pôr fim ao criminal bloqueio dos Estados Unidos.

Notas:

[i] Entrevista com Manuel Yepe, La Habana, Cuba, 18 de fevereiro de 2014.
Yepe é um ex-diplomata e agora jornalista. Quandoe jovem foi assistente do Che Guevara. Ver também: Cuba vs Bloqueio: Informe de Cuba sobre a resolución 65/6 da Assembleia Geral das Nações Unidas intitulado “Necessidade de pôr fim ao bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos de América contra Cuba” (julho de 2011), 54.[ii] Citado por Anton L. Allahar y Nelson P. Valdés: //cuba-1blogspot.com/2014_05_01archive.html#6955777, 36.
[iii] www.economist.com/sites/default/files/20120324_Cuba.pdf 24 de marzo de 2012.
[iv] Allahar y Valdés, 41.
[v] Steve Ludlam, “Estrategia de desarrollo socialista de Cuba,” Ciencia y Sociedad 76, no.1 (enero de 2012), 2.
[vi] TheEconomist, 15 de febrero 2014
[vii] Entrevista a Marta Núñez, La Habana, Cuba 18 de febrero de 2014.
[viii] Entrevista del Lic.Anibal Melo Infante, Departamento de Relaciones Internacionales, Centro de Trabajadores de Cuba, (CTC) Feb.17, 2014.
[ix] Raúl Castro, en el VI Congreso del Partido Comunista de Cuba.
[x] “Cuba: Raúl Castro Cuestiones Advertencia para Emprendedores”, AssociatedPress (21 de diciembre de 2013).
[xi] Citado por Allahar y Valdés, 41.
[xii] http://www.cubadebate.cu/especiales/2013/10/15/marino-murillo-el-modelo-cubano-es-socialista/ .
[xiii] Carta, Marce Cameron, verde LeftWeekly, 1 de julio de 2012. Marce Cameron ha producido un blog útil, “Renovación Socialista de Cuba.”
[xiv] Marx a L. Kugelmann 17 de abril de 1871 https://www.marxists.org/espanol/m-e/cartas/m17-4-71.htm
Traducción: jaimelago
Tradução do espanhol: Joaquim Lisboa Neto