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Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


sábado, 4 de outubro de 2014

Provável vitória de Dilma Rousseff fortalecerá governos progressistas na América Latina



Por Marcela Belchior
Adital.



Dois dias antes dos brasileiros e brasileiras irem às urnas para escolherem seu próximo Presidente da República, a Adital coloca em debate alguns dos movimentos políticos em torno dos três principais candidatos: a atual presidente, Dilma Rousseff (do Partido dos Trabalhadores - PT), sucessora de Luiz Inácio Lula da Silva, que tenta a reeleição; Aécio Neves (do Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB), representante dos setores mais elitizados e conservadores do país; e Marina Silva (do Partido Socialista Brasileiro - PSB), ex-ministra do Governo Lula, que rompeu com o ex-presidente e, após a morte de Eduardo Campos, alcançou a chance de tentar, pela segunda vez, assumir o comando o país.



Para analisar o contexto da campanha eleitoral do 1º turno e apontar perspectivas para um eventual 2º turno, o jornalista e analista político Nicolas Chernavsky avalia os fenômenos de "petismo” e do "antipetismo” que circundam a candidatura de Dilma, a controversa e criticada postura política de Marina e as chances de Aécio na disputa.
Produtor da página de análise política nacional e internacional culturapolitica.info, Chernavsky é articulista da Adital e colunistas em outros meios de comunicação on-line e, em 2002, recebeu o Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos pelo documentário "Muito além da razão”, produzido em grupo por cinco integrantes. Nesta entrevista, ele diferencia os rumos que podem tomar a política brasileira a partir da construção de cada candidatura e como elas dialogam com a sociedade brasileira.
ADITAL - A candidata Marina Silva (PSB) é vista por muitos como uma alternativa à política polarizada — entre a esquerda de Dilma Rousseff (PT) e a direita de Aécio Neves (PSDB). Como você avalia esse posicionamento da ex-ministra do Meio Ambienta? Ela, de fato, pode ser situada nesse meio-termo político?
Nicolas Chernavsky - Não, Marina Silva não é, de forma alguma, equidistante politicamente de Dilma Rousseff e Aécio Neves, como um meio-termo. Isso ocorre porque, se eleita presidenta, ela formaria uma coalizão no parlamento que abrangeria, praticamente, todo o espectro político conservador, incluindo um pouco do espectro político progressista, situação muito semelhante a um governo de Aécio Neves. Portanto, Marina Silva e Aécio Neves formariam governos conservadores.
Já Dilma Rousseff formaria uma base no Parlamento, abrangendo praticamente todo o espectro político progressista, incluindo um pouco do espectro político conservador. Assim, Dilma Rousseff formaria um governo progressista.
Se Marina tivesse um outro perfil de candidatura, com outros aliados, outro discurso, outro posicionamento político etc., poderia, talvez, tentar ser sim um meio-termo entre Dilma e Aécio e, neste caso, ela teria de formar uma base no Parlamento que abrangesse a maior parte do espectro conservador e a maior parte do espectro progressista do Parlamento, deixando uma pequena parte tanto do espectro conservador quanto do espectro progressista de fora da base do governo.
Como essa alternativa incluiria o PT como partido dentro dessa base do governo, vemos que essa opção é praticamente inviável, uma vez que, em uma eventual disputa do segundo turno entre Dilma e Marina, os setores conservadores apoiariam em massa Marina, forjando alianças e, até pela dinâmica polarizadora do segundo turno, inviabilizariam a entrada do PT como partido em sua base de governo.
Portanto, se Dilma formaria um governo progressista, e Marina e Aécio formariam governos conservadores, a candidatura de Marina Silva é muito mais próxima politicamente da candidatura Aécio do que da candidatura Dilma, estando assim a candidatura Marina muito longe de ser equidistante, como um meio-termo.
ADITAL - Marina Silva tem sido classificada como representante de uma "direita disfarçada". Como analisa isso?
NC - Para responder a essa pergunta é preciso diferenciar a pessoa da candidatura. A candidatura Marina Silva representa uma tentativa dos setores mais conservadores do Brasil de vencerem os setores mais progressistas liderados pelo PT, já que o PSDB de Aécio Neves teria muitas dificuldade para vencer, especialmente pela avaliação relativamente ruim que a população faz dos oito anos de governo de Fernando Henrique Cardoso em comparação com os governos de Lula e Dilma.
Assim, Marina, na disputa com Dilma, tem o apoio da grande maioria dos meios de comunicação conservadores do Brasil, dos setores ultraconservadores religiosos, dos interesses externos, que não querem que o Brasil aumente sua influência no mundo e, em geral, das forças políticas claramente conservadoras do Brasil.
A pessoa Marina Silva tem uma história, na qual esteve muitos anos no PT, como senadora e ministra do Meio Ambiente do governo Lula. Entretanto, já nas eleições de 2010, ela apresentou um perfil mais conservador, mas não tanto quanto agora, em 2014. Portanto, seria uma ilusão sim acreditar que não só a Marina Silva de 2014 é a Marina Silva de 2004, por exemplo, como também acreditar que o governo dela seria influenciado apenas por ela, sem se perceber que há uma gigantesca coalizão política e social por trás de um governo.



ADITAL - Percebemos no Brasil fenômenos políticos de "petismo” e "antipetismo”. Votar na candidata Dilma representa votar pelo petismo ou sua campanha segue outras representações além dos sentidos que envolvem o partido?
NC - Votar em Dilma não significa, necessariamente, votar pelo petismo. Votar em Dilma, a rigor, significa votar para que o Brasil tenha um governo progressista, e não conservador. Isso ocorre porque das três candidaturas com chances de vitória, a de Dilma, de Marina e a de Aécio, Dilma formaria um governo progressista, e Marina e Aécio formariam um governo conservador. Inclusive, a candidatura Dilma é apoiada por muitos partidos, não só o PT. Isso não significa que não haja uma grande parcela do eleitorado que vota em Dilma que votará pelo petismo.
Votar pelo petismo seria votar em Dilma no primeiro turno, mesmo que o PT concorresse sozinho, sem alianças. O voto pelo petismo é muito mais claro, por exemplo, nas eleições para deputados e deputadas, em que a pessoa tem, praticamente, infinitas opções e escolhe alguém do PT.
ADITAL - No que se refere ao fenômeno petismo/antipetismo, esta polarização se reflete também nas classes sociais, como entre pobres e ricos/classe média? Isso pode decidir a eleição?
NC - O padrão observado nas últimas três vitórias do PT em nível presidencial indica, de uma forma geral, que na classe média a disputa é bastante equilibrada, enquanto que entre os pobres, a vitória do PT é por grande margem. É bom lembrar que, numericamente, ou seja, em termos de número de votos, os ricos do Brasil têm uma porcentagem muito pequena e, portanto, são os pobres e a classe média que, numericamente, decidem a eleição.
Por isso, apesar do antipetismo ser mais forte nos ricos, em termos de análise eleitoral, é o antipetismo nos pobres e na classe média que deve ser mais focado. Assim, os resultados eleitorais mostram que o antipetismo é menor entre os pobres que entre a classe média, especialmente porque a melhoria do padrão de vida dos pobres foi extraordinária desde que Lula assumiu em 2002, tanto que grande parte deles deixou de ser pobre.
O padrão de vida da classe média também melhorou bastante, mas não tanto quanto dos pobres, e por isso ainda há mais antipetismo na classe média, antipetismo insuflado especialmente pelos meios de comunicação mais conservadores, muitos dos quais se estruturaram durante a ditadura militar.
A questão do antipetismo pode sim decidir a eleição, mas favorecendo a reeleição de Dilma, pois o antipetismo é cada vez mais um sentimento desgastado e minoritário na sociedade brasileira, uma vez que o desempenho do PT no governo vai derrubando os preconceitos construídos ao longo de décadas em relação ao partido.
ADITAL - No caso de vitória da candidata Dilma, o Brasil tende a seguir uma política cada vez mais progressista?
NC - Sem dúvida, especialmente porque quanto mais o tempo passa, mais a Internet vai se consolidando como um importantíssimo meio de comunicação no Brasil e no mundo. Inclusive, nos próximos anos, a Internet deve superar a televisão como o meio de comunicação mais influente do Brasil.
Uma vez que são os meios de comunicação fora da Internet que estruturam na opinião pública os setores mais conservadores do Brasil, o aumento de influência da Internet vai favorecer os setores mais progressistas do país e do mundo. Além do mais, Dilma pretende estimular, especificamente, a universalização da Internet no Brasil, o que acentuaria ainda mais esse processo.
Outro fator que pode impulsionar o progressismo de um segundo governo Dilma é o desempenho nas eleições para o Parlamento do PT, do PCdoB [Partido Comunista do Brasil] e dos partidos mais progressistas que formariam a base de governo de Dilma. A tendência é um fortalecimento do progressismo no Parlamento, dando a Dilma possibilidades de avançar mais na resolução dos problemas do país.



ADITAL - Uma política brasileira progressista, no caso de um segundo mandato da presidente Dilma, aponta para uma maior ingerência dos Estados Unidos no Brasil?
NC - Os Estados Unidos, após a Segunda Guerra Mundial, dividiram o poder mundial com a União Soviética, numa polarização que exacerbou o conservadorismo desse país americano. Após o fim da Guerra Fria, os Estados Unidos assumiram sozinhos o poder no mundo, e o poder militar interno gestado durante a Guerra Fria acabou gerando um conservadorismo quase que estrutural na relação dos Estados Unidos com o resto do mundo.
Apesar disso, conforme passam os anos, e já passou um quarto de século desde o fim da Guerra Fria, os Estados Unidos vão, gradualmente, mudando o seu papel no mundo, saindo de uma situação de poder único para uma multipolaridade, com Índia, Brasil, China, a própria América Latina, os BRICS, a União Europeia, o sudeste asiático etc., funcionando como novos polos de poder em um sistema que tem que ser organizado pela ONU [Organização das Nações Unidas].
Como esse é um processo lento, os Estados Unidos ainda podem tentar influir na política brasileira durante algum tempo, especialmente se vencer as eleições lá um governo conservador, provavelmente do Partido Republicano. Enquanto o Partido Democrata permanecer no poder nos Estados Unidos, especialmente com governantes com o perfil de Barack Obama, a influência dos Estados Unidos na política brasileira será relativamente moderada.
ADITAL - Quais seriam as perspectivas para os movimentos sociais, no caso de um segundo mandato de Dilma?
NC - Os movimentos sociais são importantíssimos para que o governo Dilma seja o mais progressista possível, porque os políticos, todos eles, precisam de uma base social: se não forem os movimentos sociais, vão ser interesses mais conservadores. Ou seja, os movimentos sociais teriam de se relacionar fortemente com o governo Dilma, com o PT, com o PCdoB e com outros partidos da base de governo de Dilma, a fim de trazer o governo o máximo possível para políticas progressistas, para que se continue melhorando, acentuadamente, a vida do povo brasileiro.
Isso não quer dizer que os movimentos sociais têm que se subordinar ao governo. A relação tem que ser de igual pra o igual, de colaboração. Afinal, os políticos não surgem do nada, e os movimentos sociais têm de se acostumar a gerar candidatos para todos os cargos, porque sem a política, se torna muito mais difícil toda a atividade dos movimentos sociais.
ADITAL - Como podemos avaliar o governo do PT no Brasil em relação a outras gestões de esquerda da América Latina?
NC - No Brasil, às vezes, não fica tão claro, mas o fato é que o Brasil é hoje em dia, na prática, o país líder da América Latina. Se o conservadorismo vencer no Brasil, as consequências para os países da América Latina, politicamente, serão avassaladoras, com a vitória de inúmeros governos conservadores.
Inversamente, uma vitória do governo liderado pelo PT no Brasil incentivaria os setores e governos progressistas da América Latina a continuarem conseguindo maiorias eleitorais e seguirem melhorando a vida dos latino-americanos que, desde que os governos progressistas de espalharam pelo continente, vêm melhorando seu padrão de vida em termos de indicadores sociais, sendo um exemplo para o mundo quanto à redução da fome, da miséria e da pobreza, além da manutenção de forma quase generalizada da democracia e da paz.



ADITAL - Na campanha eleitoral do 1° turno, percebemos uma discussão mais centrada nos candidatos e menos nos projetos políticos, com estratégias de campanha focadas muito em ataques pessoais. No caso de eventual 2° turno, haverá espaço para debater propostas?
NC - Em geral, no segundo turno presidencial há mais espaço para debater propostas, porque a existência de duas candidaturas apenas faz com que fique muito mais claro para qual candidatura tendem fortemente os setores progressistas e para qual candidatura tendem fortemente os setores conservadores. Ou seja, aumenta a clareza política no segundo turno.
Assim, creio que, no segundo turno, o povo vai perceber mais claramente, mais além das características pessoais, quais programas governamentais estão mais ligados a quais candidaturas, ou seja, que a candidatura Dilma está mais ligada ao Minha Casa Minha Vida, ao ProUni, ao Bolsa-Família, ao aumento do salário mínimo etc., e que a candidatura Marina ou Aécio estão mais ligadas ao estabelecimento de mandatos fixos para o Banco Central, à redução da influência dos bancos estatais na economia, a um aumento em ritmo menor do salário mínimo etc.
ADITAL - Com a morte de Eduardo Campos e a ascensão de Marina Silva como candidata pelo PSB, o candidato Aécio Campos tem ocupado um espaço obscurecido do debate. O PSDB ainda tem força política nesta eleição?
NC - Uma considerável força política, pelo menos na eleição presidencial, o PSDB ainda tem. Creio que conforme se solidifique a percepção, inclusive pelas pesquisas eleitorais, de que Marina perderia o segundo turno para Dilma, o eleitorado mais conservador pode inclinar seu voto para Aécio, pois votar em Marina não mais seria quase uma garantia de derrota do PT. Portanto, Aécio Neves é um candidato que tem chances reais chegar ao segundo turno.
Em relação ao PSDB, em geral, como partido, a situação é pior do que a de Aécio, com menos perspectiva. Eu diria que, mesmo com Aécio tendo muitas dificuldades na eleição presidencial, ele ainda é praticamente a única esperança do PSDB se recuperar politicamente. Se Aécio não for para o segundo turno, aí sim o PSDB perderá muito mais sua força política.
ADITAL - Pesquisas eleitorais apontam resultados díspares sobre a votação do próximo domingo, 05 de outubro. O que podemos esperar das urnas?
NC - O significado das pesquisas é bastante pouco compreendido em geral. Em primeiro lugar, é preciso avaliar sua confiabilidade. Em repetidas eleições, nas últimas décadas, pudemos observar como muitas pesquisas simplesmente se afastaram muito da realidade do voto, mesmo quando feitas um dia antes da votação.
Assim, é preciso sempre se perguntar quanto à sua confiabilidade, em termos até de manipulação intencional. Isso não quer dizer que todas as pesquisas sejam assim, mas que é um fato a se considerar na avaliação. Tirando a questão da confiabilidade em termos de manipulação intencional, deve-se avaliar até que ponto o eleitorado que responde à pesquisa vai aumentar seu grau de consciência da eleição até o dia da votação.
Por exemplo, candidatos que disputam uma eleição pela primeira vez, como o candidato do PT ao Governo de São Paulo, Alexandre Padilha, tendem a crescer, acentuadamente, no final. Padilha tem uma porcentagem baixíssima dos votos nas pesquisas e, por isso, seria extremamente didático se o eleitor se lembrar da porcentagem dada agora a ele pelas pesquisas, de menos de 10%, e comparar com sua votação em 05 de outubro. Aprender-se-ia muito sobre as pesquisas com isso.
De uma forma geral, as pesquisas são um dado a mais somente, que tem de ser analisado juntamente com muito outros dados para se prever, minimamente, o resultado de uma eleição, que é algo dificílimo.
ADITAL - Num eventual 2° turno, que temas deverão ser mais abordados na campanha eleitoral?
NC - O segundo turno é uma eleição mais enxuta, no sentido de que não há eleição para deputado estadual, deputado federal, senadores e muitos governos estaduais. Basicamente, é o segundo turno presidencial e o de alguns estados. Como a eleição presidencial vai ser a que vai atrair mais atenção, acho que o tema da crítica ao antipetismo pode emergir, até surpreendentemente.
Muito se falou, nos últimos anos, quanto à rejeição ao PT, mas pouco se falou quanto à rejeição ao antipetismo. O fato é que os resultados dos governos liderados pelo PT em termos de redução da fome, da miséria e da pobreza são tão extraordinários, mesmo em termos mundiais, que o PT tem sim um trunfo muito forte para apresentar ao eleitorado, e o segundo turno pode acabar discutindo fortemente esse assunto.
Afinal, valeu a pena ter votado em um governo liderado pelo PT em 2002, 2006 e 2010? Ou era melhor ter elegido [José] Serra ou [Geraldo] Alckmin? E, agora, valeria a pena voltar ao PSDB com Aécio? Valeria a pena eleger Marina para que ela governe com o PSDB, o DEM [Democratas], talvez tendo em seus ministérios políticos como FHC, e deixando o PT como partido de fora da base do governo?
Foi ou não foi um avanço histórico impressionante e extremamente progressista a saída de 36 milhões de pessoas da pobreza e a ascensão de 40 milhões de pessoas para a classe média nos governos liderados pelo PT, de 2002 a 2014? Creio que essas questões deverão ser abordadas muito mais em um eventual segundo turno.