"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


domingo, 31 de maio de 2015

Samuel Pinheiro: Impeachment, golpe de Estado e ditadura de “mercado”



Desde 2003, as televisões, em especial a TV Globo; os maiores jornais, como O Estado de S. Paulo, a Folha de S. Paulo e O Globo; e as principais revistas, quais sejam a Veja, Isto É e Época, se empenham em uma campanha sistemática para desmoralizar o Partido dos Trabalhadores e os partidos progressistas e para tentar “provar” a ineficiência, o descalabro e a corrupção dos Governos do PT, inclusive de seus programas sociais, que retiraram 40 milhões de brasileiros da miséria e da pobreza.

Agora, com a ajuda de membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal, os meios de comunicação, tendo seu candidato perdido as eleições, tentam criar um clima político e de opinião que venha a derrubar ou imobilizar a presidenta e, assim, anular a vontade da maioria do povo brasileiro.

Fazem isto divulgando dia a dia, a conta gotas, as declarações de delatores, criminosos confessos, e de procuradores, policiais e juízes que as “vazam”, seletivamente, para os meios de comunicação, cometendo notória ilegalidade, e publicando notícias sobre o extraordinário descalabro e corrupção em que viveria o país.

Diante da instabilidade política gerada por esta campanha, a Presidenta Dilma, com o objetivo de conter as manobras golpistas (recontagem de votos, acusações de fraude, ameaças diversas, etc.) e de apaziguar o “mercado”, anunciou um programa de austeridade, de equilíbrio orçamentário, de contração de gastos do Estado, de redução de investimentos, na esperança de conquistar a “confiança dos investidores”, seu principal objetivo, e de “acalmar” seus opositores políticos.

É preciso notar que o “mercado” não é uma entidade da sociedade civil, mas sim, na realidade, um ínfimo grupo de multimilionários, investidores, especuladores e rentistas, e seus funcionários, quais sejam os chamados economistas-chefe de bancos e fundos, os jornalistas e articulistas de economia, e seus associados no exterior.

Há economistas e jornalistas que são notável exceção a esta afirmação, mas são eles minoria.

Quando foi apresentado o programa de ajuste, declarou-se, com ênfase, que ele não iria afetar as conquistas dos trabalhadores (a legislação sobre horário de trabalho, férias, aposentadoria, seguro desemprego etc.), nem os programas sociais, mas que iria ele equilibrar o orçamento através do contingenciamento, da contenção de despesas e do aumento de impostos, com o objetivo de fazer um superávit primário que permitisse pagar os juros da dívida pública e conquistar a “confiança do mercado, a confiança dos investidores”.

Conquistar a “confiança dos investidores” significa fazer com que tomem a decisão de realizar investimentos (para obter lucros) e assim ampliar a capacidade instalada, gerar empregos, condição para a retomada do desenvolvimento.

A “confiança dos investidores”, todavia, tem a ver com a expansão da demanda, pois só com essa expansão (sustentada) podem surgir oportunidades de investimentos lucrativos.

A construção de “confiança” e a realização de investimentos são improváveis em uma conjuntura em que se elevam os juros dos títulos públicos e das aplicações financeiras para torná-los os mais altos do mundo, o que atrai os capitais para o setor financeiro, especulativo ou rentista, e os afasta do setor produtivo e, portanto, dos investimentos.

Outros fatores que afetam negativamente a “confiança” dos investidores são a competição predatória e destrutiva das importações; taxas cambiais inadequadas; a redução dos investimentos públicos em infraestrutura; o aumento das taxas de juros dos financiamentos de longo prazo do BNDES; a redução da demanda e o aumento do desemprego (que alguns esperam poderia criar as condições políticas para um clima favorável ao impeachment) devido à redução da atividade econômica.

Há um mantra, repetido sem cessar, sobre competitividade e produtividade, entoado por autoridades públicas, acadêmicos, jornalistas especializados, economistas-chefe de consultoras, de empresas, de bancos.

Segundo esses especialistas, a solução dos problemas internos, isto é a retomada do crescimento, e o afastamento para longe da crise externa latente e cada vez mais ameaçadora, dependeriam não somente da “confiança dos investidores” mas também do aumento da produtividade (isto é, da produção por trabalhador) e do aumento da competitividade das empresas brasileiras diante das chinesas, americanas e europeias, e da redução do “Custo Brasil”.

No caso da produtividade, alguns afirmam que seu aumento resultaria de grandes investimentos em educação, como teriam, segundo argumentam, feito os países desenvolvidos, tais como os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a Coréia e que teria sido, segundo eles, uma razão importante, e talvez a principal, para explicar o seu desenvolvimento.

Os paladinos da educação defendem a educação primária geral, a atenção especial à primeira infância, a inclusão de todas as crianças e jovens (e os adultos?) no sistema. Não se fala muito na preparação de professores nem no horário integral nem nos efeitos, negativos, da televisão e da internet sobre o sistema de ensino em seu cerne, que é o tempo dedicado aos estudos pelos jovens. Pode-se perguntar quando estes brasileiros, hoje infantes e jovens, entrariam no mercado de trabalho para tornar a mão de obra mais produtiva e o Brasil mais competitivo: daqui a 10 anos? Daqui a 15? E até lá?

Outros argumentam que os “custos do trabalho” (parte do “Custo Brasil”) seriam muito elevados (em comparação com os “custos” em que países? Na China? Nos Estados Unidos? Na Alemanha?) e que, portanto, seria necessário reduzir esses “custos”, impedindo aumentos “artificiais” do salário mínimo (já que não haveria escassez de mão de obra), reduzindo os benefícios da legislação trabalhista, estimulando a rotatividade da mão de obra, etc.

Quanto ao “Custo Brasil”, argumentam com os altos custos de transporte e de energia, com a carga tributária elevada, com a multiplicidade de impostos, com a burocracia “infernal”.

Reclamam, também, da intervenção “excessiva” do Estado (empresas estatais e regulamentação) e pedem, ainda que até agora apenas insinuem, a privatização dessas empresas e a “desburocratização”, isto é, menos lei e mais liberdade para o capital.

Segundo os defensores do programa de austeridade, em decorrência do aumento da produtividade interna, a competitividade internacional seria alcançada, com todas as suas vantagens, tais como um superávit comercial estável, a diversificação dos mercados e o aumento das exportações de manufaturados.

Assim, a crise atual seria superada. Todavia, a verdade é outra.

A crise atual, em parte verdadeira e em parte fabricada, decorre da revolta conservadora devido ao fato de a Presidenta Dilma ter cometido dois “pecados mortais” à luz dos interesses do “mercado”, isto é, daqueles indivíduos beneficiários da concentração de riqueza, de renda e de poder político no Brasil, que são os grandes multimilionários, os latifundiários rurais e urbanos, os rentistas, os banqueiros, e seus representantes na mídia, no Congresso, no Judiciário.

O primeiro “pecado” foi a política de redução, ainda que temporária, das taxas de juros; o segundo “pecado” foi o apoio, ainda que tímido, à democratização dos meios de comunicação.

O sistema financeiro e bancário é o principal instrumento de concentração de riqueza no Brasil. Ao reduzir as taxas de juros dos bancos públicos e ao forçar a redução dos juros dos bancos privados (que foi logo compensada pelo aumento das “taxas” de administração) a Presidenta diminuiu a transferência de riqueza da sociedade e do Estado para os bancos privados, seus acionistas e os detentores de títulos públicos. A Presidenta atingiu o cerne do mecanismo de concentração do sistema econômico e provocou a ira dos setores conservadores que hoje pedem a privatização dos bancos públicos.

O sistema de comunicações no Brasil é o instrumento das classes dominantes para construir o imaginário do povo, para manipular as informações e para justificar o sistema econômico e social vigente e desmoralizar aqueles que lutam por mais igualdade, mais liberdade, mais fraternidade e pelos direitos das minorias, em um contexto de desenvolvimento.

A concentração do poder midiático condena os que ele acusa ao difundir e repetir incansavelmente “informações” antes de julgamentos e transformou o mensalão em julgamento prévio contra o qual não soube resistir o STF ao aceitar a conduta imprópria de seu presidente da época e a intimidadora campanha de imprensa.

O mesmo ocorre com a operação Lava Jato. Não há nenhuma iniciativa do Poder Judiciário para impedir a formação de uma opinião pública contra os acusados, gerada pelas denúncias, sem provas, feitas por criminosos confessos que denunciam a torto e a direito quando, no caso dos procedimentos de delação premiada, as investigações deveriam ser feitas sob o maior sigilo, já que se trata de denúncias feitas por criminosos em busca de vantagens pessoais. A mídia transformou o pedido da Procuradoria Geral da República de investigar determinados indivíduos em prova de sua culpa. Aqueles indivíduos, políticos ou não, que vierem a ser investigados e julgados culpados devem ser punidos com rigor, mas a imprensa não pode substituir o Poder Judiciário nem constrangê-lo, por motivos puramente políticos.

Ao ameaçar aqueles dois pilares da ordem conservadora, o sistema financeiro e a mídia, a Presidenta Dilma se tornou “culpada” e a oposição insiste, ainda veladamente, e à vezes já abertamente, em que deve ser punida pela destituição do cargo por um processo de impeachment.

Seria importante que o Governo compreendesse que o que está de fato ocorrendo é uma manobra política cujos objetivos são pela ordem:

1. fazer o Governo adotar o programa econômico e social do “mercado”, isto é, da minoria multimilionária e de seus associados externos;

2. ocupar os cargos da administração pública (Ministérios, Secretarias Executivas, agências reguladoras) com representantes do “mercado”;

3. enfraquecer política e economicamente o Governo;

4. enfraquecer o PT e os partidos progressistas com vistas às eleições de 2018;

5. aprovar leis de interesse do “mercado”;

6. e, se nada disso ocorrer, fazer o Governo “sangrar” e aí, então, se necessário e possível, exigir o impeachment da Presidenta.

Contra esta enorme e múltipla ofensiva econômica, midiática e política do “mercado” e de seus representantes somente há uma estratégia possível: a ação política intensa junto aos movimentos populares, junto às organizações da sociedade civil, junto ao Congresso, junto à Administração Pública e aos Governadores, enfim, a mobilização da sociedade pelo seu esclarecimento para a defesa da democracia em toda sua integridade.

É indispensável que, na distribuição de suas verbas de publicidade, o Governo leve em consideração a existência de televisões comunitárias, universitárias, educativas, de rádios comunitárias, de blogs e sites, e dos pequenos e médios jornais e emissoras regionais e deixe de concentrar a distribuição de verbas e anúncios apenas na grande mídia, o que fortalece os oligopólios que atuam de forma ostensivamente partidária e contra a maioria do povo, estimulando antagonismos violentos e radicalizando a sociedade.

As manifestações populares contra o Governo e contra a Presidenta Dilma têm reunido cidadãos que, em sua maioria, votaram contra a reeleição da Presidenta em 2014.

Hoje, insuflados pela mídia e por organizações de identificação e origem nebulosa, através das redes sociais, inconformados com a derrota e a pretexto da denúncia de corrupção, iniciam o processo político de “Fora Dilma”, que é, de fato, uma campanha pró-impeachment.

O impeachment é o golpe de Estado do “mercado”. Aqueles que defendem hoje o impeachment e criam o clima de instabilidade e de radicalização são os mesmos golpistas históricos de 1954 e de 1964: as classes privilegiadas que temem o progresso e os resultados da democracia e não os aceitam, apesar de ter o Brasil uma concentração de renda que se encontra entre as dez piores do mundo, enquanto seu PIB é um dos dez maiores do mundo, e de ser urgente deter o processo de concentração de renda (que a crise acentua) para que seja possível construir uma sociedade mais justa, mais democrática, mais próspera, mais estável.

Para que este objetivo possa ser alcançado, é preciso que a sociedade brasileira não se submeta à ditadura do “mercado”, cujos integrantes tem sido os grandes beneficiários da crise, que se iniciou em 2008 e não apresenta sinais sólidos de fim.

Estudantes dos EUA nas escolas de Medicina de Cuba


Cerca de 250 estudantes norte-americanos transitam pelas escolas de Medicina e constroem com sua presença uma convivência proveitosa entre as duas nações.


José Jasán Nieves Cárdenas - Progreso Semanal (Miami) (via adital)

Já parecem cubanos pelo efeito do sol sobre a pele. À simples vista só os delata o inconfundível acento gringo em sua fala, por muito que os cubanismos mais rotundos façam parte habitual dos seus diálogos.

Cerca de 250 estudantes norte-americanos transitam pelas escolas de Medicina e pelo sistema sanitário desse arquipélago desde o ano 2000 e constroem com sua presença uma das páginas mais reveladoras de convivência proveitosa entre ambas as nações.

Os primeiros doutores surgidos de um programa sonhado entre o Caucus Negro Congressional (CNC) do Congresso estadunidense e o ex-presidente Fidel Castro, e canalizado depois pela organização Pastores pela Paz (IFCO), já estão voltando para as comunidades do seu país, enquanto que nas aulas caribenhas ainda se formam várias dezenas e a cada ano chegam novos alunos.

Na interação são quebrados preconceitos e estereótipos. Assumirem-se iguais e diferentes parece o ensino maior.

Cassandra

O ritmo asfixiante da havaneira rua Monte desaparece enquanto se sobe as escadas até a casa. Na sala se entretém com a avó o desperto Atuey Fénix (cujo nome de aborígene rebelde os pais registraram sem H, para que soe foneticamente igual em espanhol e inglês) enquanto o computador reproduz antigos capítulos da série Vila Sésamo.

É a paisagem do lar de Cassandra Cusack Curbelo, uma das poucas cubano-americanas beneficiadas com bolsas gratuitas para formar-se doutora no país de sua mãe.

"Sou bastante cubana para não ser extraterrestre aqui, mas bastante americana para que me vejam como uma louca”, diz sorrindo enquanto prepara para Atuey hambúrgueres vegetarianos feitos de grãos moídos.

Nascida em Hialeah, mas criada em Chicago, aos 30 anos Cassandra decidiu sair do seu trabalho de relações públicas em uma organização de ativistas.

"Eu queria fazer algo sustentável. Os conhecimentos da Medicina nunca estarão fora de moda nem se fossilizarão”, recorda enquanto evoca um amigo da família que lhe facilitou obter uma vaga entre as capacidades outorgadas aos grupos de solidariedade pelo Ministério de Relações Exteriores de Cuba.

Ao chegar, em 2008, a situaram como todos os estadunidenses na Escola Latino-Americana de Medicina (Elam), em Praia Baracoa, a oeste de Havana ("no fim do mundo”, gargalha Cassandra) e daí passou a completar matérias no hospital mais próximo, Salvador Allende, ainda nomeado segundo a virgem catalã de seus construtores: "La Covadonga”.

"Não gosto da Medicina elitista e, nos Estados Unidos, os médicos quase todos são brancos, de famílias ricas, que estudam em idades precoces, não querem ter trabalho e, geralmente, não te escutam, nem te olham, nem te tocam e cobram 100 dólares só para aparecer (…). Encanta-me a forma como falam os médicos daqui. Meus professores são muito naturais e amistosos”, assegura.

"O programa não obriga a fazer nada a ninguém”, responde Cassandra à pergunta sobre a possível exigência de um gesto político em troca do seu título. Não seria extraordinário nem raro para os costumes de Cuba: pedir, como pagamento pela ensino gratuito, um tempo de dedicação a uma zona desfavorecida. Mas Cassandra insiste em negar.

"Entre nós há pessoas que não interessa servir ninguém. Dizem: saio daqui, faço minha residência e depois "o bilhete” [a carteira]. Mas outros, a maioria, temos sonhos. Eu quero montar com amigos uma clínica em Nova Orleans, e outros pensam em Detroit e, inclusive, temos pensado em colocar uma clínica em um terceiro país pobre, pela qual passemos em nossas férias e possamos ajudar um pouco”.
 

Joanna
 

Quem a conheceu em Havana a recorda por seu espírito inquieto e vocação de serviço. Foi uma ativa e reconhecida estudante em seus anos cubanos. Portanto, não surpreendeu seus professores e amigos saberem que apenas conseguiu entrar no difícil sistema de especialidades médicas do seu país, Joanna Mae Sauers se alistou como voluntária para combater o Ebola na África.

Ao Cooper Hospital, de Monróvia, na Libéria, chegou Sauers depois de tratar de inserir-se na brigada médica cubana que trabalhou lá.

"Estive interessada em trabalhar voluntariamente com os doutores cubanos, mas me disseram que não estavam recebendo nenhum graduado da Elam, dadas as circunstâncias da epidemia. Sem dúvidas, é o exemplo deles e a minha experiência em Cuba o que me inspirou a fazer este trabalho”, assegura direta em nossa troca de mensagens.

A ideia de integrar-se a uma brigada cubana não era nova para Joanna, aluna de especialistas que viajaram para lugares tão diferentes, como Paquistão, Angola, Venezuela ou Haiti, e em alguns casos inseriram médicos nativos graduados em Cuba como parte da sua "missão”. A ela, ademais, a proximidade com o arquipélago caribenho chegou desde sempre através da solidariedade.

"Escutei sobre o programa por um amigo e solicitei as bolsas através do IFCO/Pastores pela Paz. Existem alguns requisitos básicos para entrar, por exemplo, um pagamento pela solicitação, uma entrevista e uma orientação. Primeiro, deve ser aprovado pela organização e depois aceito dentro do programa pela Escola. O que se busca, sobretudo, são solicitantes que tenham uma provada dedicação para servir aos necessitados”.

"A maioria das pessoas que me conhecia nos Estados Unidos se surpreenderam muito quando souberam que eu iria estudar em Cuba. Não sabiam que fosse possível e se assombravam mais quando descobriam que o programa é uma bolsa completamente gratuita, garantida pelo governo cubano. Todos ficavam intrigados de que uma oportunidade assim existisse”.

Mae Sauers viveu no campus da Elam quase como todos os estudantes estrangeiros de primeiro a terceiro ano, mas logo buscou alugar perto do hospital "La Covadonga”. Conhecer a fundo a cultura dos cubanos e também os valores de outros amigos, provenientes da África, América do Sul e do Caribe, foi para ela uma aprendizagem tão importante quase como o próprio treinamento médico..

"Não havia nada melhor do que visitar meus amigos nas províncias e compartilhar com eles uma boa comida típica cubana, sobretudo, esse prato de "yuca” [tubérculo] com molho, arroz com feijão, banana frita, salada e porco assado… Me dá água na boca quando penso nisso!”, confessa.

Instrumentos para a normalização

Cassandra e Joanna são, como seus compatriotas graduados e por graduar, pequenas superfícies de interação entre dois países com um antigo enfrentamento ideológico. Elas vivem a experiência de conviverem sem traumas e mostram que é possível manter relações de mútuo benefício.

Por exemplo, o fechado sistema médico estadunidense (qualificado por muitos como endogâmico e elitista) começa a aceitar os diplomados em Cuba, como atesta Joanna, um dos mais recentes 13 estadunidenses da Elam que passaram nas provas para cursar especialidades médicas em seu país.

"Para mim, não foi particularmente difícil conseguir a residência nos Estados Unidos”, assegura Mae Sauers. "Tive que seguir os passos dos exames USMLE, que é exigido para qualquer estudante de Medicina e requer conhecimentos rigorosos. Fiz tudo o que pude para conseguir tanta experiência clínica nos Estados Unidos, como a que pude experimentar em Cuba. Isso supôs passar boa parte das minhas férias de verão em observações e rotações clínicas no meu país. Tive muitos programas de especialidades competitivas interessados em mim como bolsista, porque a Elam já é reconhecida pelos vários graduados que regressaram antes do que eu, y aqueles que conhecem sobre nós e sobre o sistema médico cubano valorizam muito a nossa formação”.

Essa percepção positiva também se nota, inclusive, no Estado da Flórida, acredita, por sua parte, Cusack Cuberlo, que afirma conhecer hospitais nortistas interessados em captar doutores como ela. "Eu sei do Baptist Hospital e do Miami Jackson”, revela.

Jogando essas cartas, a maioria dos nortistas retornam ao terminar o sexto ano, de dezembro de 2014 para cá a meio caminho entre receosos das promessas e esperançosos com a possibilidade de contar por fim com sua própria embaixada.

"Eu como americana sou muito cínica, e digo que enquanto nada esteja escrito, nada está acontecendo, e pode se falar tudo o que se fala, mas tudo pode ser apenas palavras”, se arrisca a dizer Cassandra: "Esta é a virgem do Caribe e todos os lobos estão salivando para entrar”, acrescenta.

"Penso que a aproximação é útil para os dois países”, termina Joanna. "Cuba é um exemplo para o mundo em atendimento e educação médica de alto nível. Os Estados Unidos e boa parte do mundo têm uma necessidade desesperada de doutores para a atenção primária. Como graduados desse programa, nós podemos prover serviços de saúde para os necessitados e compartilhar nossa experiência com o restante do mundo”. Da experiência sai também um novo tipo de médico. E uma nova fonte de interação.

Em Guapi (Cauca).- Massacre de guerrilheiros em trégua


Por Carlos Lozano Guillén, Diretor do Semanário VOZ
Santos não cumpre com os eleitores que votaram nele para levar adiante o acordo de paz. O pérfido assassinato de 27 guerrilheiros em trégua unilateral no Cauca deixa ferida a paz. Cessar-fogo bilateral é indispensável.
A quinta-feira 21 de maio do presente ano foi um dia fatídico para a paz da Colômbia. Antes do meridiano, em horas da madrugada, sobre um acampamento da Frente 29 das FARC-EP no meio da selva, na jurisdição de San Agustín, município de Guapi, Cauca, ao sudoeste do país, com costa no Oceano Pacífico e banhado pelo rio Guapi, vários aviões Tucano de fabricação brasileira lançaram toneladas de bombas que caíram sobre a humanidade dos insurgentes, que dormiam desprevenidos nas condições do cessar-fogo unilateral decretado pela organização guerrilheira desde o dia 20 de dezembro do ano passado.
No acampamento se propagou a dor e a morte. Não houve combate. Foi um massacre de homens e mulheres inermes que estavam em trégua. Os restos despedaçados dos 27 guerrilheiros assassinados ficaram espalhados em vários metros nas redondezas pelo efeito letal das bombas militares. Um menor de idade ficou ferido vítima do demencial bombardeio. A operação foi batizada como “Marcel 19” e quis ser justificada com falsas historietas pelos mandos militares, ainda que alguns meios oficialistas a assinalem como a necessária resposta aos fatos trágicos em Buenos Aires, Cauca, quando a guerrilha das FARC-EP atacou unidades da Força Pública que promoviam ações ofensivas contra insurgentes.


Afetam a população civil
O Governo, os militares e a “grande imprensa” que celebram o massacre como “golpe contundente” para nada registram os chamados efeitos colaterais, denunciados pela comunidade. Devido aos bombardeios e metralhamentos indiscriminados, que se prolongaram durante os dias 21, 22 e 23 de maio, criando medo e aflição nos territórios ancestrais dos Conselhos Comunitários de Alto Guapi e Baixo Guapi, veredas San Agustín, La Junta, San Vicente, El Rosario, El Naranjo e Temuey, há 352 pessoas deslocadas, entre elas numerosas mulheres, menores de idade e anciãos. A maioria procede das veredas San Agustín, Las Juntas e Balsitas.
O presidente Juan Manuel Santos apresentou, rodeado pelo ministro de Defesa demissionário Juan Carlos Pinzón e dos altos mandos militares, “o êxito da operação, ação legítima do Estado”. Mais tarde anunciou que os bombardeios continuarão, como de fato ocorreu na sexta-feira 22 de maio em jurisdição do município de Remedios, Antioquia, e desafiante disse que “estamos preparados” ante a ruptura do cessar-fogo unilateral.
Em aparente mudança de tom perguntou às FARC: “Quantos mortos mais necessitamos para entender que chegou a hora da paz?”. Para alguns, a frase, plagiada, cheirava a cinismo. Depois da ruptura dos diálogos do Caguán, o comandante Alfonso Cano, assassinado também no governo de Santos nas montanhas do Cauca quando era interlocutor para a aproximação na perspectiva de diálogos de paz com o Governo, foi ele quem disse essa mesma frase lapidar: “Com certeza tornaremos a nos reunir depois de milhares de mortos mais”. São esses vaivéns na chamada política de paz do Governo. Fala de paz em Havana, porém faz a guerra em Colômbia e não só contra a insurgência como também contra as organizações sociais; um dia fala em tom conciliador, outro com agressividade e ameaças. Assim é difícil construir a paz.
O massacre de Guapi está em estudo de expertos e analistas sobre o Direito Internacional Humanitário. Foi um ato desproporcionado e assimétrico numa guerra em que o Estado crê que vale tudo para acabar com a insurgência. As guerras têm limites legais e éticos, este ato se afasta destes parâmetros. Sob a doutrina gringa da segurança nacional, em Colômbia se impôs o conceito do “conflito de baixa intensidade” e consequentemente do “inimigo interno”, o mesmo que os Estados Unidos aplicam nas guerras de rapina no Oriente Médio e outras latitudes. Se atua sem nenhum critério de proporcionalidade e sem respeitar o DIH. Santos reconhece o conflito porém não aceita as obrigações que essa decisão lhe impõem.

Artificio e estatística oficial
O artifício do Governo Nacional, apoiado pela “grande imprensa”, é simples: “Estamos dialogando em meio à guerra”, diz; porém, quando os resultados lhe são adversos, fica colérico e adota medidas que lesam o processo. É a antiga e banal lei da farsa. Se lhes disse o comandante Pastor Alape: “[Nossa posição] é completamente diferente das incoerências do governo, que por uma parte diz que o debate da paz se deve dar em meio à confrontação, porém, quando se dá um fato em que as estruturas do Estado não saem exitosas, adota petulância”.
Outro artifício é o argumento de que foram as FARC-EP as que violaram o cessar-fogo unilateral, como o assegura o ministro do Interior Juan Fernando Cristo, ou que nunca a acataram segundo o informe do Centro de Recursos para a Análise do Conflito [Cerac]. Ambos desconhecem outras versões mais sérias, não próximas às FARC-EP, como a Fundação Paz e Reconciliação e a Defensoria do Povo que reconhecem que a intensidade do conflito diminuiu com o cessar unilateral. A Frente Ampla pela Paz, vedora de que este fora acatado por todos os integrantes da guerrilha, certificou, pelo menos em três ocasiões, o respeito à mesma.


O dano está feito

Ambas as partes asseguraram que permanecerão na mesa, em meio a um país polarizado, porque, enquanto uns apoiam ao presidente Santos, entre estes, de maneira indecente, os grandes meios de comunicação que usam e abusam de seu poder; outros creem que o governo se equivocou. “Há coisas que são valorizadas só quando são perdidas e possivelmente é o que passará com esta trégua”, diz a revista Semana em circulação com a manchete de que “A paz está ferida”. No país crescem os chamados ao cessar-fogo bilateral, a baixar a intensidade do conflito e a persistir nos diálogos de Havana. Disseram-no as Nações Unidas e outros organismos internacionais. Mais que pressionar “soluções prontas”, como diz a chanceler Maria Ángela Holguín, agora assessora da delegação governamental, o que a comunidade internacional quer é que não se perca esta oportunidade de pactuar o acordo de paz definitivo.
Porém o dano está feito. Em sua prepotência, Santos pensou que o cessar-fogo unilateral era um sinal de fraqueza da guerrilha. As FARC-EP decidiram suspender o cessar unilateral de fogos. Desde janeiro do presente ano, o Secretariado vinha advertindo que em várias regiões a Força Pública estava atacando os acampamentos de guerrilheiros em trégua. Os militares aproveitaram-na para obter vantagem militar. Demonstraram que na cúpula há aqueles que se opõem à saída política dialogada.
Não estava em nossa perspectiva a suspensão da determinação do cessar-fogo unilateral e por tempo indeterminado proclamado a 20 de dezembro de 2014 como um gesto humanitário e de desescalada do conflito, porém a incoerência do governo Santos conseguiu-o, depois de 5 meses de ofensivas terrestres e aéreas contra nossas estruturas em todo o país”, assinala o comunicado do Secretariado das FARC-EP.
Demonstrando que não existe nenhum espírito de revanche, o mesmo comunicado registra: “Doem-nos por igual as mortes de guerrilheiros e soldados, filos de um mesmo povo e procedentes de famílias pobres. Devemos parar este dessangramento. Contra nossa vontade, temos que prosseguir o diálogo em meio à confrontação. Ainda que Santos anuncia que manterá a ofensiva, insistiremos na necessidade de acordar o quanto antes, para a saúde do processo de paz e evitar novas vitimizações, o cessar-fogo bilateral que com tanta insistência as maiorias nacionais têm reivindicado”.
Cabe relembrar nestes momentos difíceis dos diálogos de Havana as proféticas palavras de Otto Morales Benitez, homem de paz, falecido no sábado 23 de maio do presente ano: “Há inimigos ocultos da paz, dentro e fora do Governo”. Que os há, os há!
Fonte: wwwpcc.org
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Equipe ANNCOL - Brasil

PROCESSO DE PAZ: O RISCO FATAL


Por Luz Marina López Espinosa

Dentro do muito –excessivo- que se escreve sobre o processo de paz em curso entre o governo da Colômbia e a insurgência das FARC há um elemento que, salvo os analistas e comentaristas claramente de esquerda, a grande maioria cuida muito de mencionar: o do verdadeiro risco que as conversações de paz têm, e conspiram contra seu resultado exitoso.


Quase todos os analistas, na verdade apenas “opinadores”, generosamente acolhidos pelos meios de imprensa, são funcionais à missão essencial destes como aparelhos ideológicos do regime político-econômico. E assim centram suas “análises” em dizer coisas tão ineptas e por fora da história como que “o governo está entregando o país à guerrilha”, que esta na mesa atua “de maneira soberba e impositiva frente a uma delegação oficial timorata e claudicante”, que “o modelo militar e o econômico já se negociou em segredo para implementar o da subversão” etc. Na verdade, puras sandices.


Há algo que o Estabelecimento, cuja estirpe é claramente autoritária e depreciativa dos clamores das maiorias desfavorecidas de cujas angústias é responsável, se empenha em desconhecer contra toda evidência: é que as FARC têm sido as que sempre tiveram a iniciativa da solução negociada do conflito. Porém, ademais, e é o mais significativo, que elas, ao sentarem-se a dialogar, já renunciaram ao que desde sempre foi a justificativa da sempiterna direita governante para desqualificá-las política e moralmente: sua pretensão de chegar ao poder pela via armada.


Porém, somado ao anterior, também renunciaram a ver já realizado seu sonho revolucionário de um estado comunista ou socialista –de verdade-, sem donos dos meios de produção afogados no ouro e milhões catando comida nas latas de lixo; sem bancos que se resgatam com dinheiros públicos e hospitais que se fecham “por não serem rentáveis”, sem um exército “nacional” a serviço do capital, e sem uma Chancelaria dependência menor servil ao Departamento de Estado. Renunciaram a muito, e o fazem sinceramente. Por isso, soam hipócritas e mentirosas as queixas da extrema-direita –ela, tão ditatorial, militarista e tão indolente às convulsões sociais- no sentido de que “a guerrilha, que tem dado?, “a guerrilha, em que transige?”. Tem dado tudo na mesa: renunciar à via militar para seu projeto político, obtendo a que em troca disso o Estado tampouco vai adotá-lo como fruto do acordo de paz. Isto o tem demasiado claro, entre outras coisas porque não são iludidos nem ignorantes, não creem que Humberto de la Calle e os generais Mora Rangel e Naranjo representem o pensamento libertário, socialista e anti neoliberal.


E o risco fatal? Que é o que a cada minuto põe as conversações de paz às portas do fracasso iminente, do qual o resgatou não uma senão que muitas vezes a honrada teima da guerrilha em pactuar a paz? A resposta a tão crucial pergunta não é outra que a posição do governo, que nucleia a todas as frações do bloco de poder –cada uma mais direitista que a outra-, de não consentir com nenhuma das legítimas pretensões da insurgência em matéria política e social. Que há que dizê-lo e reiterá-lo com ênfase, não fazem referência a privilégios para ela, senão que –vergonha para o governo!- a pagar algo da imensa dívida do Estado com as grandes maiorias carentes de condições dignas de vida, e a fazer autêntica a democracia para que esta palavra deixe de ser a fachada de um regime autoritário e desconhecedor dos direitos fundamentais da população. Reivindicações estas que precisamente apontam para as causas objetivas das insurgências em Colômbia, causas que os beneficiários do regime tanto se empenham em desmentir e quer acabam de ter o aval dos respeitados acadêmicos integrantes da Comissão Histórica do Conflito.


E esse risco fatal que espreita as conversações de paz tem todos os dias manifestações que, repetimos, só a persistência da delegação guerrilheira em levar adiante o acordo tem permitido passar por sobre elas. Ou, se não, relembre-se o assassinato de Alfonso Cano ordenado pelo próprio presidente Santos quando tratava com ele sobre o início de conversações. E foram tão agressivas essas atitudes, tão contra não só do estipulado no Acordo Geral marco das conversações, senão que ainda do pouco acordado, que qualquer pessoa teria direito a tomá-las como uma bofetada sobre a mesa por parte do governo.


Vejamos algumas dessas manifestações a contrapelo da vocação alardeada nos discursos sobre a decisão de fazer a paz: a mais insólita, a aceitação do veto militar à implementação da lei que criou as Zonas de Reserva Campesina, uma das reivindicações favoráveis a um setor vitimizado como o que mais e cuja injustiça secular tanto tem a ver com o nascimento da insurgência. Outra, inaudita, a decisão de que o exército e em geral a força pública formada para a repressão cidadã sob as doutrinas da “segurança nacional” e do “inimigo interno” imposta em prol de seus interesses pelos Estados Unidos, ideologia cunhada na tristemente célebre Escola das Américas –conhecida como Escola de Assassinos-, não mudará uma migalha sua doutrina. Isto, emparelhado com o fato de que essa mesma força pública, aumentada em mil por cento nos últimos vinte anos “para combater a guerrilha”, não se diminuirá num só homem a guerrilha desmobilizada. Quem compreende? Não será que com isso se desvela que o exército o que há de combater são as mobilizações campesinas, as marchas contra a grande mineração, as greves por salários, a reivindicações por vias de penetração e preços de sustentação, ou as paralisações agrárias contra os ruinosos TLCs?


Igualmente, vai contra o mais elementar propósito de paz que, sendo a injustiça no campo, em particular a posse da terra, um dos temas essenciais a resolver, o governo tramite no Congresso uma contrarreforma agrária consistente em que as terras ociosas da nação possam ser entregues a grandes empresas do capital nacional ou transnacional. E pensar que essa era a reserva assegurada para os sem-terra! E se a isso lhe somamos a lição “da tal paralisação agrária” de 2013, resolvido a física bala pelos comandantes do exército e da polícia, teriam que ser cegos, surdos e mudos os representantes da guerrilha na mesa para não se dar conta de qual é o futuro que lhe espera a suas demandas de mudanças em matéria social e política se elas se deixam à boa vontade da classe dominante.


E a todo o anterior se soma que na segunda quinzena deste mês de maio de 2015 mais de 40 guerrilheiros foram mortos pelos traiçoeiros e desleais bombardeios do exército, enquanto estavam em seus acampamentos, se pode dizer sem que se possa ilustrar de cínica a expressão pacificamente, em exercício do cessar unilateral de hostilidades decretado pelo Estado-Maior das FARC-EP. Quer dizer, 40 guerrilheiros não caídos em combate, mas sim baleados talvez enquanto dormiam -os guerrilheiros também dormem!-, ação ordenada pelo ministro de Defesa Juan Carlos Pinzón com o entusiasta respaldo do presidente da República e sua consabida celebração do sangue derramado.


E se se considera que dentro dessa quantidade de insurgentes assassinados estão o comandante da Frente XVIII e integrante do Estado-Maior, Alfredo Alarcón Machado "Román“ Ruiz” e Pedro Nel Daza “Jairo Martínez”, combatente histórico e intelectual da organização que havia estado em Havana nas negociações e se encontrava socializando com as frentes do Sul o estado das mesmas, temos que o processo de paz pende por um fio. A insurgência o havia advertido com grande sentido comum: as atrocidades da guerra são incompatíveis com o ânimo sereno e espírito altruísta de uma negociação de paz. Porque cada bomba que cai sobre os combatentes em trégua, ademais dos corpos destroçados que deixa, salpica de sangue e ameaça girar a mesa de negociações. Porém, é o modelo Santos de fazer a paz. Ou talvez de não fazê-la.



Alianza de Medios por la Paz


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Equipe ANNCOL - Brasil

sábado, 30 de maio de 2015

UMA LEITURA SENSATA DA SITUAÇÃO



Por Timoleón Jiménez
Chefe do Estado Maior das FARC-EP



Os avanços do processo de paz e os reiterados gestos da nossa parte, deixaram em evidência a necessidade de diminuir a intensidade da confrontação armada. Vigente o Cessar de Fogo unilateral, reconhecido por todos os setores, com excepção da extrema direita enferma de ódio, era a vez do governo dar seu aporte correspondente e, Santos o fez, porém, de forma ambivalente.



Porque suspender os bombardeios aéreos e, ao mesmo tempo, intensificar ao máximo as operações militares por terra, resultava algo extremamente perigoso. Isso ficou demonstrado com o sucedido em Buenos Aires, Cauca. A patrulha atacada nesse lugar fazia parte de um ampla operação de guerra ofensiva. Disso não cabe dúvida.



Esses infortunados fatos de guerra ocorreram em forma paralela aos encontros entre militares das duas forças enfrentadas em La Habana, com o objetivo de aperfeiçoar fórmulas de desescalamento do conflito, que entre outras coisas, almejavam, e muito, as esperanças. O acordo de descontaminação do território de artefatos explosivos era o primeiro passo desses encontros. Por isso, o sucedido é realmente um franco retrocesso.



A estrema direita, com amplo eco na grande imprensa, que ataca impiedosa o êxito das Conversações, disparou com todo seu furor contra os avanços até agora alcançados.



Sem desconhecer suas indecisões, incoerências e desacertos, é evidente que há uma campanha de desprestígio contra o governo de Santos dirigida a debilitá-lo e obrigá-lo a romper o processo de paz.



As dinâmicas de toda guerra são cruentas e dolorosas. Falar de guerra é falar de mortos, feridos, esquartejados, sem mencionar os terceiros afetados, esquecidos por muitos de seus apologistas. E isso vale para os das duas forças enfrentadas. Hoje choramos os nossos mortos, do mesmo modo que choram os seus os nossos adversários.



É por isso que buscamos com os Diálogos em La Habana terminar de vez e para sempre, com a guerra. Não nos parece válido que si falamos de reconciliação, e nossa pretensão é alcançá-la, se esteja a toda hora culpando à guerrilha de ser a única responsável pelos desastres bélicos, apresentando-a todo o tempo como um bando de criminosos e chamando-a de narcotraficantes.



O mesmo que propagando todos os dias em público a ordem de intensificar a ofensiva militar, de não dar nenhum tipo de respiro, de pressionar até conseguir a assinatura na Mesa de Conversações do que supõe deve ser produto de um acordo civilizado e não de uma imposição. Nosso processo de paz deve ser original, não se trata de repetir aqui fórmulas de outros lugares.



Insistimos em perseverar por encima de todas as dificuldades. Assim como em afirmar que a decisão do governo de dialogar ao meio da confrontação armada ameaça seriamente a possibilidade de chegar a um acordo. Se queremos avançar pelo caminho que nos leve à paz com justiça social, devemos considerar com toda seriedade a possibilidade de pactar um armistício, uma trégua ou um Cessar do Fogo bilateral.



Confiamos na função que o senhor Luís Carlos Villegas, amplo conhecedor do processo, pode jogar ao interior das Forças Armadas, ao tempo que lamentamos que o relevo na carteira de defesa, um feito de positivas repercussões para a Mesa de Conversações, tenha coincidido com o atual grau de agudização bélica. Queremos interpretar a presença do doutor Villegas na carteira de defesa como um alento para os diálogos em curso.



Na troca do Ministro da Defesa e nos reforços oficiais para a Mesa vemos um maior compromisso do Presidente na busca de entendimentos. Gonzalo Restrepo, uma das vozes mais representativas do setor empresarial e petroleiro e a Chanceler Maria Ángela Holguín, chegam desde hoje à Mesa de Conversações. Seu peso e jerarquia contribuirão na luta por vencer muitas prevenções.

Os Países Garantes do Processo de Paz, Cuba e Noruega, têm expressado sua preocupação pelo escalonamento da confrontação e convidado as partes a se esforçar por salvar os diálogos. No mesmo sentido tem-se expressado a União Europeia. Acreditamos que a experiência diplomática da Chanceler Holguín pode incorporar a dose de tranquilidade necessária. Seja bem-vinda!



Montanhas da Colômbia, 29 de maio de 2015

sexta-feira, 29 de maio de 2015

Resposta das FARC-EP À DECLARAÇÃO DOS GARANTES DO PROCESSO DE PAZ, Cuba y Noruega



La Habana, Cuba, sede dos diálogos de paz, maio 28 de 2015
Dando-lhe toda a transcendência que merece, recebemos a profunda preocupação dos governos de Cuba e Noruega -Garantes das conversações de paz-, pelo intempestivo escalamento do conflito armado na Colômbia.

Carece de sentido que nos sigamos matando em meio de um diálogo de paz. É necessário interpor urgentemente um dique à perda de valiosas vidas humanas.

Entendemos que a estas alturas do processo, quando temos alcançado importantes Acordos Parciais, quando estamos abordando os temas mais sensíveis da Agenda e avançando em medidas conjuntas de desescalamento que nos aproximam ao fim do conflito, não é conveniente dialogar sob o fogo, porque perderíamos definitivamente o logrado até agora.

Muito importante a exortação dos governos de Cuba e Noruega às partes a continuar os esforços pela concórdia, buscando, incluso, fórmulas que permitam chegar a um acordo de Cessar do Fogo bilateral e definitivo

A resposta das FARC é afirmativa. Estamos dispostos a convir com o Governo os termos de um Cessar do Fogo bilateral, que evite mais vitimizações e, envolva ao mesmo tempo , com atmosfera mais favorável, as conversações de paz e a marcha da Colômbia rumo à reconciliação, sobre a base da democracia, a justiça social e soberania


DELEGAÇÂO DE PAZ DAS FARC-EP

DECLARAÇÃO DOS PAÍSES GARANTES, CUBA E NORUEGA



La Habana, 27 de Maio de 2015



Os Governos de Cuba e Noruega, Garantes da Mesa de Conversações entre o Governo da Colômbia e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exército do Povo (FARC-EP), expressam sua profunda preocupação pelo atual escalamento do conflito armado na Colômbia. Lamentam as perdas de vidas humanas que têm-se produzido.



Os avanços obtidos na Mesa, com importantes acordos sobre três dos pontos da Agenda, devem ser preservados. Nunca antes desde o início do conflito armado os colombianos tinham estado tão perto de alcançar a paz.



O escalamento das ações violentas também põe em risco as ações práticas que têm-se implementado para o desescalamento do conflito e o incremento da confiança, como das referidas à limpeza e descontaminação do território, de minas antipesoal, artefatos explosivos sem explotar e restos de explosivo de guerra.



Fazemos um chamado às partes a que continuem seis esforços para seguir avançando na discussão das questões pendentes, incluindo a adoção de um acordo para o Cessar do Fogo bilateral e definitivo e as hostilidades.



Cuba e Noruega reiteram sua plena disposição para continuar contribuindo em todo o possivel ao avanço das conversações e a adoção de um acordo final para a terminação do conflito e a construção de uma paz estável de duradoura na Colômbia.

O destino da Colômbia não pode ser o da guerra


Houve um número de combatentes dispostos a dar tudo pela causa revolucionária,
e por isso Marquetalia se cresceu na resistência e assentou as bases políticas, militares
e morais do que seriam um pouco mais tarde as FARC”. Jacobo Arenas.

No último 21 de maio o presidente Juan Manuel Santos deu a orden de bombardear um acampamento da 29ª Frente das FARC-EP em Guapi.

O resultado desta ordem, executada com uso excessivo da força, foi um massacre. Morreram 27 guerrilheiros, a maioria por efeito das bombas e, segundo depoimento dos sobreviventes, vários feridos foram liquidados com tiros de misericórdia pela tropa oficial quando reclamavam auxílio.

O presidente sabe muito bem, e sobretudo depois do sucedido com nosso comandante Alfonso Cano, que não se pode matar a ninguém em estado de indefensabilidade, nem a combatentes prisioneiros, porque se incorre em crime de guerra, conduta proscrita pelo Direito Internacional Humanitário e pelo Direito Penal Internacional.

Em meio ao luto que nos invade, informamos ao país e ao mundo que o companheiro Jairo Martínez, integrante da Delegação de Paz das FARC-EP em Havana, quem estava em missão de Pedagogia de Paz na referida Frente, se encontra entre os guerrilheiros assassinados. Uma flor vermelha de homenagem a sua memória depositamos hoje sobre a digna tumba dos companheiros e companheiras caídos.

Já que os cadáveres foram entregues à Medicina Legal em Cali, solicitamos a quem corresponda que estes sejam inspecionados por forenses nacionais e internacionais, sob o olhar neutro do CICV, para que os colombianos possamos ter acesso a um informe confiável em torno às circunstâncias de suas mortes.

Seja este o momento para enviar aos familiares dos guerrilheiros caídos, em nome de todo o conjunto das FARC-EP, nossa mais profunda condolência. Caíram eles enquanto empunhavam a bandeira da causa mais justa: a paz com justiça social e democracia para todos os colombianos

Quando tentamos em Havana resgatar o valor da vida e da dignidade humana, nos vemos forçados a falar de mais mortes ordenadas a partir do Palácio de Nariño. A 23 de maio, em Segovia, foram assassinados pelo exército outros 10 insurgentes das FARC-EP pertencentes à Quarta Frente, e em 25 de maio, no Chocó, num ataque do exército foi assassinado o comandante da 18ª Frente e integrante do Estado-Maior Central, Román Ruiz, e três de seus acompanhantes. Desde este tablado, lhes rendemos honras, disparando uma salva estrondosa de Até Sempre companheiros.

Queremos afirmar de maneira enfática que se equivocam aqueles que pensam que com os corpos destroçados e o sangue de nossos companheiros vão impor-nos uma justiça que não persegue a responsabilidade dos poderosos, que só fixa seu olhar punitivo nos de baixo, nos que tiveram que tornar-se rebeldes contra a injustiça, numa luta que já se prolonga por 51 anos, quando numa data como hoje, 27 de maio, foram atacados em Marquetalia.

Este tema, o de justiça, deverá ser abordado pelas partes em seu devido momento. Não o evitamos. Temos fórmulas para buscar a reconciliação da família colombiana. Não viemos a Havana para negociar impunidades. Porém primeiro se deverá dar uma resposta ao pacote de propostas mínimas sobre vítimas do conflito que apresentamos ao governo na Mesa de Conversações e que recolhem as formuladas desde há anos pelas organizações de vítimas e de Direitos Humanos.

É urgente cumprir o mandato da Agenda que ordena, entre outros, o esclarecimento do fenômeno do paramilitarismo, e especialmente seu ataque e desarticulação definitiva. Temos que estudar as responsabilidades deste longo conflito, retratadas no informe da Comissão Histórica do Conflito e suas Vítimas.

É imperativo conjurar o fogo da guerra que ameaça com reativar-se no território nacional, quando até há pouco avançava a passo seguro a desescalada do conflito. As conversações de paz não progredirão com banhos de sangue, presidente Santos.

Como gente que sinceramente quer a paz e a reconciliação para a Colômbia, pensamos que há que restabelecer a confiança e retomar o esforço das partes tendentes a concretizar as medidas de desescalada do conflito que estávamos analisando. Temos que sair desta turbulência para entregar ao povo colombiano um horizonte transparente que nos permita transitar, livre de intrigas, o caminho para o Acordo Final. Não mais perdas de valiosas vidas humanas. Não mais assassinatos de militantes da Marcha Patriótica e do Congresso dos Povos, de reclamantes de terras, de defensores de direitos humanos, de líderes do movimento social e sindical. Não podemos, os colombianos, atirar pela borda os importantes avanços conquistados na Mesa de Conversações.

A Colômbia necessita do concurso e da solidariedade da América Latina, dos governos e povos do mundo para sair da horrível noite da qual fala nosso hino nacional. O destino da Colômbia, como dizia nosso comandante Jacobo Arenas, não pode ser o da guerra.

Delegação de Paz das FARC-EP



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Equipe ANNCOL - Brasil

quinta-feira, 28 de maio de 2015

A paz é pôr fim à geração de novas vítimas


Nestes dias, as vítimas do conflito novamente foram revitimizadas. Frustradas ante o esquecimento a que foram condenadas, ocuparam os escritórios em Bogotá da chamada “Unidade de Vítimas”, denunciando a falta de vontade política dos sucessivos governos colombianos para repará-las e garantir medidas efetivas de não repetição.

Somente o Estado tem a capacidade -ademais da responsabilidade e da obrigação-, de garantir de forma efetiva o direito das vítimas à reparação e à restituição, contando para isso com sua capacidade de legislar e de disponibilizar os recursos da administração pública para atender àqueles que padeceram por causa do conflito pessoalmente. Porém o Estado descumpridor vem se negando a isso, como claramente tem posto de manifesto o desesperado grito de frustração de umas vítimas que já não sabem como fazer para obter o que em justiça lhes corresponde.

No mês de setembro de 2014, as FARC-EP apresentamos na Mesa de Diálogos a proposta “Para uma nova Colômbia sem vítimas”. Em março de 2015 apresentamos nossas “66 propostas mínimas sobre Direitos Integrais das Vítimas para a paz e a Reconciliação Nacional” e as 140 “Propostas das FARC-EP e da sociedade colombiana para a construção de uma nova Colômbia sem vítimas”. Até a presente data nem uma só proposta sobre vítimas foi apresentada pelo Estado infrator na Mesa de Diálogos. Tampouco formulou solução alguma às citadas propostas, talvez com a pretensão de que esta re-vitimizadora omissão faça com que as vítimas esqueçam seu drama e sua angustiante situação.

Pensa talvez o Estado que tem cumprido com suas obrigações políticas, legais e éticas só por permitir que 60 vítimas do conflito tenham comparecido em Havana para verter seus pungentes depoimentos? Treze delas foram ameaçadas de morte ao regressar à Colômbia, sem que até agora o Estado cúmplice tenha adotado medida alguma para pôr os vitimários à disposição dos tribunais de justiça.

De forma sumamente infeliz, o Presidente Santos se vangloriou na sexta-feira passada de um irresponsável, covarde e desproporcional bombardeio aéreo que massacrou 26 rebeldes, filhos e filhas da Colômbia. Este fato que, somado à ofensiva militar sustentada contra as frentes guerrilheiras, acabou também com a trégua unilateral mantida por 5 meses pelas FARC-EP ao preço das vidas de outros guerrilheiros e freou as medidas de desescalada do conflito tecidas com paciência pelas partes durante o último ano. Porém não foram estas as únicas e trágicas consequências dessa inexplicável atuação. Centenas de campesinos e campesinas das zonas onde se realizam as operações foram deslocados em consequência desta ação das Forças Militares. São estas, novas vítimas do conflito, responsabilidade exclusiva do Estado vitimário, que não têm merecido nem uma só linha nos triunfalistas comunicados do Governo.

No passado mês de abril as Nações Unidas assinalaram que, desde o início das conversações de paz, em novembro de 2012, uma média de 16.400 colombianos foram deslocados a cada mês; houve 713 vítimas por artefatos explosivos, um milhão e meio de pessoas sofreram confinamento e limitações à mobilidade e ao acesso a bens básicos e se registraram mais de 700 delitos contra a integridade e a liberdade sexual, tudo isso no marco do conflito armado. Somente no primeiro trimestre de 2015 –indicam as NNUU- mais de 25 líderes sociais, políticos e defensores de Direitos Humanos foram assassinados. A isso acrescentamos que desde o início dos Diálogos foram exterminados mais de 100 militantes da Marcha Patriótica, uma sinistra conta que cada vez mais relembra o genocídio cometido contra a União Patriótica após o frustrado processo de paz de La Uribe.

As vítimas do conflito colombiano existem e continuam aumentando, não estão sendo reparadas nem atendidas suas justas reivindicações, nem lhes têm sido reconhecidos os mínimos e insuficientes direitos que as leis colombianas estabelecem.

Esperamos que um acordo em torno ao ponto 5 referente a Vítimas contemple soluções efetivas a esta dramática situação.

DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP

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Equipe ANNCOL - Brasil


quarta-feira, 27 de maio de 2015

ESCALAR A GUERRA NÃO É O CAMINHO.


Frente à arremetida governamental destes dias, com dois massacres de guerrilheiros e guerrilheiras, a primeira em Guapi [Cauca] e a segunda em Segovia [Antioquia], num contexto de intensificação de operações militares e de perseguição, a Delegação de Paz das FARC-EP expressa frente ao país e ao mundo:
Dói constatar que uma parte da Colômbia se acostumou a uma guerra que já dura mais de 50 anos e ainda não tem vencedores nem vencidos.
Neste momento, por um acordo da Mesa de Havana, se iniciava a implementação do Acordo sobre descontaminação do território de artefatos explosivos e se trabalhava na adoção de outros acordos bilaterais de desescalada do conflito que nos aproximassem a um cessar-fogo bilateral, à espera da firma do definitivo acordo de paz.
E quando já nos dispúnhamos a anunciar ao país o início e a implementação desse acordo, o massacre de 27 guerrilheiros da Frente 29 das FARC-EP no município de Guapi, ao qual se somam outros 10 guerrilheiros mortos em Segovia [Antioquia], conduziu inevitavelmente à suspensão de nossa decisão de manter a medida do cessar-fogo unilateral que já se fazia insustentável pela incoerência de um governo que ainda não se decide a adotar com convicção e decisão o caminho da paz.
Para piorar as coisas, o presidente Juan Manuel Santos tem atuado ante a atual conjuntura com total ausência de bom senso e com um discurso contrário ao propósito de reconciliação, de diálogo e de paz combinada que ele apregoa, propalando uma mensagem que só pode favorecer aos que desejam a perpetuação da guerra em Colômbia.
Um chefe de Estado não pode regozijar-se com a morte de compatriotas, muito menos quando estas representam golpes diretos contra sua principal bandeira de governo: O fim do conflito.
Em Colômbia, em consideração ao bando no qual combatam, os mortos ou feridos produzidos em idênticas condições saõ apresentados por parte do governo nacional ante a opinião pública como de primeira ou de última categoria, como “heróis” ou como “vilãos”, como “assassinados” ou como “neutralizados”, quando na realidade não há mortos que doem mais que outros, todos eles são pais, mães, filhos, filhas, irmãos ou irmãs, todos somos povo colombiano.
Sem lugar a dúvidas, os lutuosos acontecimentos ocorridos na semana passada são um passo atrás no avançado até agora na Mesa de Havana.
O povo colombiano clama pela paz. Santos foi reeleito em seu segundo mandato para que alcançasse a paz. Nossa Delegação de Paz foi mandatada por todos os guerrilheiros e guerrilheiras do país para a mesma empreitada.
Nós outros atuaremos com suma responsabilidade frente a esta instrução recebida de nossas bases e o anseio das maiorias nacionais. Procederemos sempre com cabeça fria e o coração ardente, não podemos lançar pela borda os esforços empenhados em já quase três anos de conversações.
A construção de um acordo de paz exige a todos nós sindérese, realismo e coerência.
Em Havana se discute o futuro da Colômbia e só os mais estúpidos, os ultramontanos e os guerreirista poderiam confundir esta obrigação com fragilidade das partes.
Nem o governo nacional nem o presidente Santos podem atuar sob o vaivém de interesses ultra direitistas, nacionais e estrangeiros, pressões militaristas, ou cálculos eleitoreiros oportunistas para subir nas pesquisas. Pelo contrário, um governo sério deve focar-se nos problemas concretos e nos objetivos superiores.
As FARC-EP vimos trabalhando pela paz, propondo medidas para alcançá-la e assumindo as responsabilidades que nos dizem respeito ao ocorrido durante este longo conflito.
Porém, não se pode pretender que através da pressão militar ou das ameaças se possa dobrar nossa vontade de luta. Esse é um caminho equivocado e é óbvio que não se alcançará nunca a paz escalando o conflito.
Nas FARC-EP não nos alegramos pela morte de nenhum compatriota. Nos doem os onze soldados de Buenos Aires e nos dói a morte de todos os nossos camaradas.
Nos dói profundamente a situação do menino indígena Yerman Vázquez Campo, ferido gravemente em 12 de maio por um artefato do Exército abandonado na Fazenda “La Ucrania”, corregedoria El Jagual de Corinto, Cauca, pela força-tarefa Apolo, fato que foi silenciado por todos os meios de comunicação. E nos dói também a morte da menina indígena de Buenos Aires, morta por um artefato explosivo e que sem nenhuma prova se creditou a nós outros.
Para isso estamos em Havana, para deter estas mortes e comprometer-nos a construir um país onde nenhuma família de compatriotas tenha que repetir a dor de fatos como estes.
Rendemos uma profunda homenagem aos camaradas caídos nos últimos bombardeios, eram dignos filhos da Colômbia que deram sua vida por seus ideais e pelo bem-estar de todo o povo colombiano.
Acompanhamos a seus familiares na dor que os invade.
Honra e glória a todos e a cada um destes/as homens e mulheres comprometid@s com as mudanças sociais, que sacrificaram tudo por lutar desde as trincheiras guerrilheiras. Seu legado vive e viverá na coragem de toda a guerrilheirada.
Exigimos do governo nacional que os corpos de nossos companheiros e companheiras assassinados em bombardeios recentes sejam entregues com diligência a seus familiares e que recebam um enterro digno como qualquer ser humano merece. Ao mesmo tempo, solicitamos a devida vedoria aos entes e organismos humanitários nacionais e internacionais.
Os diálogos de paz necessitam de um forte impulso, e este só poderá vir de uma trégua bilateral.
As FARC-EP chamamos ao Governo e aos meios de comunicação colombianos a que atuem com a responsabilidade e o sentido patriótico a que estão obrigados, para de uma vez por todas criar as condições que ponham fim ao conflito que dessangra o nosso povo desde há mais de 50 anos.
Manteremos em alto nossas bandeiras de paz com justiça social, cessar-fogo bilateral e Assembleia Nacional Constituinte. Por este caminho é possível uma alternativa à guerra.
La Habana, Cuba, sede dos diálogos de paz, 25 de fevereiro de 2015
DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP.



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Equipe ANNCOL - Brasil

terça-feira, 26 de maio de 2015

Santos não foi capaz com a guerra, menos com a paz


Por Horacio Duque Giraldo
A Santos se lhe esgotou sua paz neoliberal. A natureza oligárquica de seu projeto político estancou o processo de paz e ameaça suas conquistas principais. Não foi capaz com a guerra, menos com a paz. O país não pode se afundar na perplexidade, a saída é a Assembleia Nacional Constituinte pela paz e a democracia que construa uma Nova Colômbia para o Século XXI. Que Santos e sua corrupta classe politiqueira, saqueadora das regalias e dos patrimônios estatais sumam para bem longe.
As FARC suspenderam a trégua unilateral que havia ordenado a suas Frentes e Blocos desde fins de 2014. Decisão que teve um alto impacto no clima político do país, pois os eventos da guerra diminuíram substancialmente, nos primeiros meses do ano em curso, dando grande alívio à população campesina das regiões onde o conflito social e armado é vivido com maior intensidade desde há muitos anos.
A determinação é produto do bombardeio aos acampamentos da Frente 29 da insurgência, no município de Guapi, localizado no estado do Cauca/Costa do Pacífico, em desenvolvimento da ordem presidencial de reativar as operações da Força Aérea devido aos lamentáveis acontecimentos ocorridos na localidade, também caucana, de Buenos Aires, no 14 de abril último, quando morreram 20 integrantes das Forças Armadas governamentais em avançado estado de embriaguez. Morreram, na noite de quinta-feira 22 de maio, 26 combatentes por efeito das potentes bombas descarregadas pela aviação oficial.
Regressamos à plenitude do conflito e sem um cessar bilateral e permanente do conflito com impacto imprevisível nos diálogos da Mesa de Havana, Cuba.
Sobre as características e o rumo que tomou a cruenta guerra civil colombiana; sobre o sentido e os alcances das conversações de paz dos últimos 45 meses; sobre as possibilidades de concretizar um acordo certo de paz, se pode bem recorrer a diferentes teorias relacionadas com a solução e o manejo de conflitos e a infinidade de experiências internacionais. Recurso que não se deve descartar sem esquecer que encaixar a realidade nacional em formulações abstratas não contribui muito.
Há que ater-se aos fatos pontuais e avaliá-los politicamente. Mirar o curso real do Estado, do governo, da sociedade e do cenário internacional. Imaginar saídas.
O certo é que o processo de paz ingressou há alguns meses numa zona turbulenta de tormentas e incertezas derivadas da densa crise que afeta o regime político e a administração do senhor Santos. A referida crise foi disparada pela debacle econômica da sociedade e fiscal do Estado, por ocasião da queda dos preços internacionais do barril do petróleo que proporcionava mais de um quarto das receitas do governo. Santos ficou sem dinheiro e com um gigantesco vermelho na conta corrente da balança comercial, que o conduziu a buscar fórmulas inconvenientes e a determinações absurdas, como oferecer a venda de bens estratégicos do Estado, como Isagen, a empresa emblemática da energia elétrica.
O quadro da crise orgânica de Santos é bastante condenado. Sua legitimidade está no chão e a confiança da sociedade civil se evaporou, depois de desconhecer descaradamente o apoio da Esquerda democrática que o salvou com seus dois milhões de votos de uma quase certa derrota nas votações presidenciais por conta do uribismo.
A justiça está paralisada e perdida na bancarrota ética e profissional. A educação, que recém sai de uma potente greve de educadores, traída pelos dirigentes da Federação Colombiana de Educadores (FECODE), que se entregaram por prebendas e prestações jurídicas menores, é um desastre total. A saúde não supera o desastre que arrasta desde há vários anos.
Mais recentemente, por ocasião da calamidade natural que acabou com a vida de quase 100 pessoas em Salgar, Antioquia e de 20 mineiros em Riosucio/Caldas, a sem saída de Santos se fez mais notória. Os instrumentos de planificação urbana, como os Planos de Ordenamento Territorial/POT, voaram pelos ares como cacos, pois, com quinze anos de vigência, só mostraram ser um perfeito lixo neoliberal. A crise ambiental e o aquecimento global ameaçam centenas de municípios e grupos populacionais vulneráveis localizados em zonas de alto risco, pois os dinheiros apropriados para tomar as medidas de previsão correspondentes foram levantados pelos políticos oficialistas mediante o controle das Corporações Autônomas Regionais. Ninguém crê na promessa de Santos de ressarcimento aos humilhados moradores de Salgar, quando se conhece que com quase 8 anos de tragédia em Gramalote não colocaram uma só pedra na reconstrução do mesmo município do Norte de Santander, cujos habitantes estão à deriva em barracos e favelas em Cúcuta.
O mais grave é a grande crise moral do estabelecimento. Milhões de cidadãos estão indignados porque a recente bonança petroleira e mineira que o país viveu praticamente foi furtada pelos senadores, representantes, governadores e prefeitos seguidores da unidade santista. Diretamente o Chefe da Casa de Nariño e seu hoje gerente da Estatal Ecopetrol perfilaram um perverso mecanismo de distribuição das regalias petroleiras dos hidrocarbonetos. O novo regime de regalias, vigente desde 2011, estabeleceu um sistema de Órgãos Colegiados de Aprovação e Decisão/OCAD, em que os políticos dividem entre si estes dinheiros a vontade e sem controles fiscais e sociais. Chefes e caciques oficialistas adjudicam a dedo, denuncia recente informe de Transparência Colômbia, junto com governadores e prefeitos da mesma corda, contratos fraudulentos que não resultam em obras concretas para o serviço da comunidade. É o que faltou em Salgar, Antioquia e em Riosucio, Caldas.
Há dois casos que são um escândalo inocultável. No estado do Quindío se embolsaram 150 bilhões girados nos últimos 48 meses por Planificação Nacional; um dos chefes do regime está comprando com esses dinheiros toda a parte rural de Génova, o município onde nasceu Manuel Marulanda Vélez.
No Cauca, principal cenário da guerra, o mesmo fez o governador Temistocles Arteaga, quem, em conluio com o senador liberal Velasco, dividiu estes dinheiros e este último pressiona para pra completar privilégios burocráticos com grandes cotas na Promotoria Geral, cujo titular deveria denunciar, pois não aceita mais a chantagem do destacado malandro de colarinho branco.
No pico de sua crise, Santos tem pretendido pressionar, pela enésima vez, uma pax express.
Para o efeito, recentemente enviou seu Chanceler, em companhia de um empresário antioquenho, para que se somasse à delegação governamental na Mesa de Diálogos de Havana. Seu argumento central é que a paz deve ser firmada imediatamente porque o tempo internacional da mesma se esgotou. Abunda em sofismas e piruetas retóricas que carecem de fundamento para exigir a firma de um acordo de fim do conflito omitindo pontos cardeais relacionados como o fenômeno paramilitar auspiciado pelas Forças Armadas, a depuração e reestruturação destas, a reforma do Estado, a situação dos presos políticos, os TLCs, o ordenamento territorial, a eliminação do Esmad, a erradicação do neoliberalismo, a democratização dos meios de comunicação, a anistia, o indulto e a liberdade dos 10 mil presos políticos vítimas de montagens judiciais e policiais.
Argui que o contexto internacional é adverso a um acordo de paz, quando o que está ocorrendo no campo geopolítico é a emergência de tendências e blocos favoráveis a uma saída democrática da prolongada guerra civil colombiana. Não há necessidade de estender-se em explicações nesse sentido, pois a visita do Primeiro-Ministro Chinês a Bogotá nas últimas horas assim o está demonstrando.
O que sucede é que Santos, em razão de seus velhos e dessuetos interesses oligárquicos, quer impor à resistência campesina revolucionária a paz dos vencidos, a paz dos falsos positivos, a paz do cárcere. Pretende uma paz neoliberal com a ditadura perpétua dos mercados.
Prova disso é seu recém aprovado Plano Nacional de Desenvolvimento que não é mais que uma vulgar cópia do receituário neoclássico da OCDE, no qual se desconhecem olimpicamente os três acordos alcançados na Mesa de Havana. Rasga as vestimentas com sua falsa revolução, com sua fracassada lei de restituição de vítimas e terras, quando o único efetivo é que seu governo trabalha para favorecer os poderosos burgueses do estabelecimento [Sarmiento, Ardila, Restrepo, Carvajal, Marval, Urbanas, Ospinas etc], às máfias da droga enquistadas nos aparelhos armados e policiais e aos grandes astutos da politicagem clientelista.
Santos, como seu antecessor, fracassaram na guerra contra insurgente para derrotar o povo.
É impossível que o inquilino da Casa de Nariño alcance a Paz, pois sua natureza regressiva lhe nega a lucidez necessária para dar o salto que a Colômbia necessita e permita deixar pra trás a violência feudal e narcocapitalista que nos destrói.
Essa é uma verdade arqui conhecida. Santos se esgotou e a Constituinte popular pela paz é a alternativa apropriada nestes momentos aziagos da Colômbia.
A Constituinte pela paz tem na unidade avançada no recente 4º Congresso do Polo um transcendental suporte.
Essa unidade, que os diálogos entre os chefes das FARC e do ELN em Cuba mostrou em outro momento, se articula à estratégia revolucionária essencial para dar o salto necessário em nossa sociedade.
É que a conquista da paz é uma bandeira revolucionária por excelência. A paz com democracia ampliada abre os caminhos do Socialismo e da solidariedade.
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Equipe ANNCOL - Brasil