"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


quinta-feira, 31 de julho de 2014

Timoleón Jiménez, Comandante-Chefe das FARC, põe Santos contra a parede: Quem responderá pelo crime atroz de Alfonso Cano?


O Presidente Santos tem se dedicado a repetir que a ordem de execução foi emitida diretamente por ele após ter sido consultado a respeito.

Na noite de 4 de novembro de 2011 a Colômbia e o resto do mundo foram surpreendidos pela notícia da morte do Comandante Alfonso Cano após uma operação militar no estado do Cauca. Sucessivamente foram saindo à luz os pormenores do acontecido, descrito como um intenso bombardeio aéreo, acompanhado de uma longa metralhada, que terminou deixando isolado e indefeso o chefe guerrilheiro desde as primeiras horas da manhã.
Nessas condições, as forças especiais e as tropas que desembarcaram dos helicópteros artilhados terminaram por localizar ao Comandante das FARC, quando se encontrava solitário no meio do terreno coberto de ervas ruins. Disso existem numerosas evidências, fornecidas à imprensa por diversos porta-vozes oficiais. Se sabe pelo mesmo que, no momento de enfrentar-se com a morte, o martirizado líder revolucionário se encontrava em absoluto estado de indefensabilidade.
Em conformidade com a opinião de numerosos assessores e expertos nas diversas vertentes do direito internacional, nessas circunstâncias, um numeroso grupo de combatentes treinados com rigor nas mais exigentes situações da guerra, viriam a compor uma força absolutamente desproporcional ante um adversário impotente. Alfonso Cano deveria ter sido capturado e entregue aos juízes para ser submetido a uma causa penal com adequação às leis.
Assim o expressou com inusitada coragem civil monsenhor Monsalve, arcebispo de Cali, uns tantos dias depois de acontecidos os fatos. Desde logo que atrever-se em Colômbia a levantar um dedo acusador contra as forças militares e o governo nacional gera a imediata avalanche do sem-número de defensores da ordem estabelecida, encabeçados como sempre por algum general furioso e a fixação de comentaristas e editorialistas da grande imprensa apegados ao crime.
Para que qualquer outro cidadão que tente posar de herói relembre de imediato a sua família e aos interesses pessoais antes de atrever-se a expor sua própria vida ao perigo. Que assim é este país, provam-no milhões de vítimas. E uma insurgência armada com mais de meio século de história. Os guerrilheiros podemos dizer o que está vedado à maioria intimidada, e é por isso que procedo a referir aqui o que tanta gente comenta em voz baixa.
O Presidente Santos, após conhecer a notícia, não só reconheceu ter chorado de felicidade ao inteirar-se como também que, à medida que sua soberba foi crescendo, se dedicou a publicar que a ordem havia sido emitida diretamente por ele depois de ter sido consultado a respeito. Em sua mais recente obsessão pela reeleição, repetiu-o muitas vezes, incluído o dia 13 de junho de 2014, ante as câmeras de televisão, após o qual encenou um arrebatamento de satisfação.
Dizem os que sabem que a primeira obrigação que um Presidente adquire ao tomar posse é a de cumprir e fazer cumprir a Constituição Nacional e as leis da República, das quais fazem parte os tratados e convênios internacionais subscritos pelo país. E expressam também os sérios interrogantes que gera a pobre argumentação presidencial segundo a qual sua ordem de matar Cano obedeceu ao fato de que estamos em guerra. Reiterada confissão que exclui dúvidas.
Fundamentam sua argumentação em disposições como estas. O artigo 4 do Protocolo II adicional aos Convênios de Genebra, de obrigatória aceitação nos conflitos armados sem caráter internacional, dispõe que quem tenha deixado de participar nas hostilidades tem direito a que se respeite sua pessoa e a ser tratado com humanidade em toda circunstância. Expressamente proíbe ordenar que não haja sobreviventes. Por acaso Alfonso não era?
O mesmo Protocolo dispõe sobre a disposição de matar por fora do combate. O qual envolve, por elementar lógica, dar a ordem de fazê-lo. Por outro lado, se recorda que o artigo 145 do Código Penal Colombiano considera como um ato de barbárie matar feridos ou enfermos. Cabe incluir aqui a um solitário Alfonso Cano, sobrevivente de um brutal bombardeio e metralhada, aturdido e quase cego, reduzido e rodeado pela enorme tropa inimiga?
Por sua parte, a ordem de não deixar sobreviventes é elevada à categoria de crime de guerra no Estatuto da Corte Penal Internacional, artigo 8, numeral 2, literal I, que frequentemente é invocado pelo governo colombiano como advertência jurídica contra a insurgência, enquanto norma de obrigatório acatamento em nosso país. E que dizer do literal VI, que considera um crime privar um prisioneiro de guerra de seu direito a um julgamento legítimo e imparcial?
O Presidente Santos e seus assessores deveriam levar em conta que a Convenção Americana de Direitos Humanos ou Pacto de San José de 1969 só admite a pena de morte como consequência de uma sentença judicial devidamente executoriada, emitida por tribunal competente, em conformidade com uma lei anterior que estabeleça tal pena e ditada com antecipação ao delito que se imputa.
Sem mencionar a Constituição Nacional de 1991, tão esgrimida por seus defensores como máxima consagração democrática na história de nosso país, em cujo artigo 11 se consagra a inviolabilidade do direito à vida e a proibição da pena de morte. É claro que tão formais garantias não passam de ser uma fórmula propagandística num Estado que assassina oficialmente, com premeditação e traição, porque essas são, segundo o Presidente, as regras do jogo.
O Presidente Santos reconheceu, ante a opinião pública, que efetivamente deu a ordem de executar extrajudicialmente um prisioneiro de guerra ferido, desarmado e fora de combate, com o que, ademais, adiantava conversações para iniciar um processo de paz. O Presidente dirige constitucionalmente a força pública e dispõe dela como comandante supremo, assumindo inclusive se considera conveniente a direção das operações de guerra.
Deste e dos inumeráveis crimes sucedidos neste país haverá que tratar nos debates que sobre o tema de vítimas se iniciará proximamente em Havana. Os crimes de Estado configuram uma nefasta tradição em Colômbia e são eles os causadores diretos da prolongada e heroica rebeldia armada de milhares de colombianos. Na Mesa nos traçamos como máxima que não chegamos para pactuar impunidades. Estará Santos disposto a responder por seu crime confesso?


Montanhas de Colômbia, 27 de julho de 2014.