"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


segunda-feira, 11 de julho de 2011

Entrevista com Alfonso Cano, Comandante em Chefe das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC-EP)

Entrevista pescada do Diário Liberdade que traduziu para o português a entrevista publicada pelo jornal espanhol Público no passado mês de maio com o dirigente revolucionário colombiano.

Alfonso Cano, cujo nome civil é Guillermo León Sáenz Vargas (Bogotá, 1948), é o comandante da guerrilha mais antiga do mundo. Nesta entrevista com Público, a primeira que concede a um meio de comunicação em 19 meses, o líder intelectual da guerrilha analisa a época de Álvaro Uribe e mantém que é difícil avançar no caminho para a resolução da guerra civil que dura já décadas com o novo mandatário Juan Manuel Santos. Cano respondeu às perguntas através de um questionário que devolveu assinado a 21 de maio de 2011 "nas montanhas da Colômbia".

Quais são as razões pelas quais as FARC lutam?

Nossos objetivos são a convivência democrática com justiça social e exercício pleno da soberania nacional, como resultado de um processo de participação cidadã em massa que dirija a Colômbia para o socialismo.

São a guerrilha mais antiga do mundo. Seguem vigentes os motivos pelos quais iniciaram sua luta armada ou estes mudaram com o tempo?

Nestes 47 anos desatou-se uma vertiginosa transformação na ciência e na tecnologia, elevaram-se os índices de crescimento econômico em muitos países, colapsou o modelo soviético de construção socialista e irrompeu imparável a República Popular da China. No entanto, apesar de todo isso e a muitas outras novidades transcendentes, a fome cresceu no planeta, as injustiças, as fendas sociais e os conflitos persistiram e aumentaram enquanto cerca de 10.000 indivíduos muito abastados decidem a sorte de milhares de milhões de pessoas. As FARC nascemos resistindo à violência oligárquica que utiliza sistematicamente o crime político para liquidar à oposição democrática e revolucionária; também como resposta camponesa e popular à agressão latifundiária e fazendeira que inundou de sangue os campos colombianos usurpando terras de camponeses e colonos, e nascemos também, como atitude digna e beligerante de rejeição à ingerência do Governo dos EUA na confrontação militar e na política interna de nossa pátria, três razões essenciais que gestaram as FARC tal como se assinala no Programa Agrário de Marquetalia elaborado e difundido em 1964. Uma simples olhada sobre a realidade colombiana de maio de 2011 mostra-nos que, apesar do contexto internacional indicado, estes três fatores germinais persistem e se agravam na atualidade.

Acha que é possível abrir um processo negociador com o presidente Juan Manuel Santos?

Com o esforço em comum de muitos setores progressistas e democráticos interessados em uma solução incruenta do conflito, sempre será possível construir cenários e iniciar conversas diretas de horizontes verdadeiros, com qualquer governo, incluindo ao atual, apesar de que este, começando com o seu mandato, reduziu as possibilidades, ao impor uma lei que fecha portas a diálogos dentro do país. Porém, somos otimistas sobre a eventualidade de o conseguir.

Ante a negativa do Governo de aceitar trocas de reféns por guerrilheiros presos, que planos tem para os sequestrados que seguem em poder das FARC?

Entendo que você se refere aos prisioneiros de guerra que temos em nosso poder, porque uma aproximação desapaixonada, rigorosa e objetiva ao tema, em uma confrontação política, social e militar de cerca de 47 anos, que enfrenta dois adversários deve aludir a prisioneiros de guerra que as partes capturam no devir desse confronto, não é? A negativa atual do governo à troca não tem por que fazer-nos desistir na aspiração de ter conosco, livres, os camaradas presos na atualidade e a que regressem a seus lares os prisioneiros, militares e polícias capturados em combate, que temos em nosso poder, a quem suas famílias também aspiram a ter de novo em seu seio. Por cima da indiferença do Estado sobre os próprios soldados, vamos perseverar. Sabe-se que enquanto perdurar uma confrontação, vai haver prisioneiros em poder das partes.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha é um organismo neutro encarregado de velar pelo cumprimento do direito internacional humanitário. Em seu último relatório indica que "enquanto as partes em conflito desenvolverem os confrontos armados em zonas rurais, a população que habita estas áreas vive em permanente perigo e está exposta a violações do DIH como: homicídios e/ou ataques a pessoas protegidas pelo DIH: desaparecimentos forçados; violência sexual; tomada de reféns; recrutamento forçado; maus tratos físicos e/ou psicológicos; e deslocação forçada. A falta de respeito ao princípio de distinção entre combatentes e civis, as pressões para colaborar gerando represálias diretas contra os civis, a ocupação de bens civis privados ou públicos e a contaminação por armas são outros fatores agravantes que afetam a vida das comunidades".

Quais destas violações cometem as FARC?

Para ser rigorosos teria que referir um a um os casos informados pelo CICR e como este não é o espaço adequado, posso lhe comentar que para nós, o primeiro e mais importante de nossa luta é a população, não só por razões de princípios políticos e ideológicos, mas práticos da guerra. Unicamente na medida que respondermos às necessidades objetivas da população em cada área, podemos resistir, crescer e avançar. Caso contrário é impossível.

Faz anos e dada a intensidade dos combates, difundimos umas normas de comportamento para que a população civil não permitisse sua utilização como escudo por parte da força pública que constrói quartéis no meio dos povoados, utiliza o transporte público para seus movimentos, situa caravanas de veículos militares no meio do transporte civil para suas deslocações por estradas, pernoita nas escolas e colégios, etc; práticas que a força pública utiliza, criando riscos à população.

Eventualmente unidades nossas podem violentar as normas, mas como estamos regidos por uns Estatutos, umas Normas e uns Regulamentos de Regime Disciplinar estrito, alicerçados em uma concepção revolucionária da vida, que harmonizam os relacionamentos entre combatentes e também, as nossas com a população civil garantindo uma profunda, sincera, harmônica e sólido relacionamento, tomamos os corretivos que assinalam nossos documentos.

Quanto ao DIH e a seus Protocolos adicionais, mantemos algumas reservas porque, em ocasiões, dificultam a aproximação de certas situações, dado que foi concebido e desenhado para conflitos entre nações e, apesar dos protocolos adicionais, não sempre proporciona o justo equilíbrio. Por exemplo, qualificar como "execuções extrajudiciais" a homicida, criminosa e sistemática prática das Forças Armadas oficiais da Colômbia durante os últimos 63 últimos anos, de assassinar civis, os vestir com roupa militar e colocar armas a seus cadáveres para os fazer passar como guerrilheiros "eliminados" em combate, em um país que diz ser um Estado de Direito e cuja legislação não prevê a pena de morte, possibilitou um tratamento benigno e celestino aos criminosos, que tem escamoteado uma condenação drástica, vertical, diáfana e oportuna ao terror desenvolvido pelo Estado colombiano desde faz mais de 47 anos.

A norma sobre o uso de armas não convencionais é uma regulamentação para a guerra entre nações que não pode abranger a movimentos populares como o nosso, que se armou desde um começo com paus e machados para se defender de uma agressão gestada e executada pelo Estado, com a contribuição militar, financeira e tecnológica da Casa Branca. Equivale a recriminar ao bíblico Davi porque utilizou pedras para defender da agressão do colosso Golias.

Valeria a pena trabalhar um cenário internacional onde analisar, desde diferentes ópticas, estas situações e outras do mesmo tenor e trocar conceitos sobre a "neutralidade" que acima de qualquer consideração, devem manter quem se reclamam suas garantes.

As FARC fazem uso de minas antipessoa, entre outras coisas contra operações de erradicação manual de cultivos de folha de coca. Por que continuam usando uma arma proibida pelo direito humanitário e que todo mundo lembrou em 1998 erradicar no Tratado de Ottawa ou a Convenção sobre a proibição de minas antipessoais?

Reitero-lhe que a respeito do armamento utilizado pela guerrilha em sua luta de resistência, na irregularidade de sua tática e como consequência da assimetría que carateriza uma confrontação como a colombiana, será necessário que em um cenário internacional largamente representativo, com a presença da guerrilha revolucionária com certeza, nos ocupemos de abordar este tema com objetividade, sem mentiras, buscando umas conclusões realistas que todos possamos acatar rigorosamente, incluindo aos governos. É ridículo, por qualificar de alguma maneira, que quando o Estado colombiano lança operativos contra insurgentes em uma proporção de 100 militares contra cada guerrilheiro, com bombardeios de abrandamento executados com milhares de toneladas de pentolita, realizados por uma aviação dotada de foguetes de todo tipo, metralhamentos das suas centenas de helicópteros gringos e russos de última tecnologia, fogo de artilharia com morteiros de 120 mm, saiam logo os altos comandos militares a se queixar e a denunciar, porque muitas de suas unidades caíram em campos minados em tão desigual teatro de operações. Ou, como também acontece, é criminoso forçar a civis a lhes servir como script em seus labores de rastreio e seguimento com consequências muitas vezes lamentáveis para quem foram obrigados. Ou, como acontece em outras ocasiões, é perversamente farisaico dar dinheiro a civis para que exerçam como bufos, quem buscando informação, muitas vezes é vítima da confrontação.

Sem dúvida, ninguém pode poupar esforços por separar a população civil do conflito. Isto deve ser privilegiado em todos e a cada um dos feitos com que se acometam como parte do conflito, mas como entender isto no caso da Colômbia, onde o governo nacional desatou uma intensa campanha para recrutar civis como informantes em troca de dinheiro, integrando um aparelho chamado Rede de Cooperantes, estarão-se cingindo às normas do DIH?. Ou existe uma contradição entre o seu discurso maniqueísta em frente à normatividade internacional e as políticas que desenvolve? São muitos os temas que deverá abocar uma reunião de atualização do DIH, na que seria vital a participação dos Estados Unidos de Norteamérica para também analisar a sindéresis entre as exigências que faz ao resto do mundo com respeito aos Direitos Humanos e sua prática quotidiana e universal.

Têm futuro as FARC se se mantiverem à margem do narcotráfico? Que relacionamentos têm agora com o cultivo e tráfico de drogas? É atualmente sua principal fonte de financiamento? Quanto dinheiro conseguem anualmente por este conceito?

Nossa luta por permanecer à margem do narcotráfico não foi fácil já que nos últimos 30 anos Colômbia foi permeada e contaminada, de pés a cabeça, pelos dinheiros do narcotráfico: as instituições do Estado sem exceção, a indústria, a banca, o comércio, a política, o desporto, o agro, a farándula, as forças militares e de polícia, e em general, o conjunto do tecido social.

A guerra contra as drogas decretada pela Casa Branca tem sido um fracasso, especialmente na Colômbia, pois deixou um enorme rasto de sangue, desintegração social e perda de valores substantivos da ética e a moral, enquanto a área semeada de coca oscila pendularmente entre as 90 mil e os 180 mil hectares e o país continua à cabeça do tráfico mundial, segundo relatórios de diversos organismos internacionais.

De tempo atrás, manifestamos nosso acordo com a legalização ou com a despenalização que, desde as épocas do prêmio nobel norte-americano Milton Friedman até hoje incluindo 4 ex-presidentes latino-americanos e grande quantidade de personalidades e organizações do mundo inteiro, se promove como saída realista para liquidar definitivamente os enormes lucros deste tráfico, manejar seu crescente consumo como um problema de saúde pública e desenvolver estratégias preventivas com a certeza de sua superação definitiva.

Em épocas do Caguán, em sessão especial ante embaixadores e representantes de diversos países e organismos multilaterais, apresentamos um plano detalhado para experimentar em uma área delimitada uma estratégia de substituição de cultivos que desestimulasse os camponeses cultivadores de coca e os ajudasse na criação de alternativas econômicas verdadeiras. Muitos narcotraficantes e dirigentes políticos dos partidos de governo opuseram-se à proposta e frustraram-na.

O narcotráfico não é um problema das FARC. É um fenômeno nacional, latino-americano e mundial, ao qual se deve fazer frente com uma estratégia nacional e convergente, encabeçada pelos primeiros responsáveis e também grandes vítimas deste câncer: os países desenvolvidos.

Gostava de ser taxativo nisto: nenhuma unidade fariana, de acordo aos documentos e decisões que nos regem, podem semear, processar, comerciar, vender ou consumir alucinógenos ou substâncias psicotrópicas.

Todo o resto que for dito é propaganda.

Deixando então de parte o narcotráfico, como se financiam as FARC?

As FARC - EP temos três fontes básicas de financiamento: contributos de amigos e simpatizantes que acham sinceramente no compromisso revolucionário das FARC e na causa pela qual lutamos; impostos que cobramos aos ricos, através da lei 002 e rendas geradas de investimentos que mantemos.

As FARC sofreram seus golpes mais duros durante o Governo de Uribe, como a Operação Xeque, a Operação Fénix, a Operação Camaleón... Em que situação se encontra a guerrilha? Quais são seus efetivos e do território controla?

Para sermos sinceros, o golpe mais sério e de maior transcendência que já recebemos foi depois da segunda conferência guerrilheira realizada em 1966, no departamento de Quindio, onde perdemos grande quantidade de combatentes e 70% das armas. Só até a quinta conferência, após muitos anos, pôde dizer o comandante Marulanda: "Por fim nos recuperamos do mal que quase nos liquida".

Operativos como Xeque, desenvolvido a partir da traição do chefe da unidade guerrilheira que vendeu os prisioneiros de guerra sob sua guarda, não tem as conotações promocionadas pelo Governo. Inumeráveis vezes já resgatamos nossos presos dos cárceres do Estado. São feitos de guerra que levam as partes a tomar novas medidas de segurança. Não modificam nem a conceção, nem os desenhos operacionais nem muito menos a estratégia de nossa força.

Nos últimos 9 anos, e como consequência da maior ingerência militar de Washington nos assuntos internos da Colômbia, a guerra se intensificou. Sofremos golpes. As mortes de Raúl, de Jorge, de Iván Rios e de muitos camaradas, doem-nos e geram-nos essa dor revolucionária que desata, incontenível, maior compromisso com nossos ideais de socialismo. Já as assimilamos. Com o legado e exemplo de nossos heróis e mártires, as novas promoções tomam seu posto e trincheira, novas promoções de revolucionários dispostos, como os mais antigos, a dar tudo, até a vida, pelos objetivos da Nova Colômbia.

Mas, sabe-se que em toda guerra há mortos, de ambos bandos , e a colombiana não é a exceção.

Também estes 9 anos, demonstraram o tamanho e a qualidade do compromisso das FARC com nossos ideais de mudança e de transformação revolucionária. Como é evidente nas partes militares também temos golpeado as forças militares e paramilitares do estado, as institucionais e as para institucionais, todas, incluindo aquelas que atiram a pedra e escondem a mão, que cinicamente dizem desconhecer a estratégia dos "falsos positivos", que negam ante os meios seu conluio com o narcoparamilitarismo, mas lhe abrem na escuridão da noite as portas secretas de seus palácios, mansões e fazendas para conspirar contra a convivência, a democracia e contra o povo.

As FARC mantemos nossa influência, sólida influência, nas áreas onde existimos, por todos os recantos da geografia nacional, nascida e alicerçada na justeza de nossas propostas políticas, em nosso trabalho e ajuda permanente às comunidades, respeito para todas elas e por nossa autoridade surgida do compromisso sincero do que não pretende nada em troca de seu esforço, salvo a satisfação de contribuir para a esperança do povo em sua própria capacidade de mobilização, organização, luta e em seu futuro bem-estar.

Não lhe posso comentar quantas unidades conformam as FARC – EP, porque somos uma organização irregular. Mas agimos, trabalhamos e lutamos em todo o território nacional.

O que tem de certo o alegado conteúdo do computador de Raúl Reyes?

Os elementos que puderam ter ficado funcionando, depois do bombardeio sobre a humanidade do Camarada Raúl e seu guarda, foram manipulados arbitrariamente pelo governo. Nem a própria INTERPOL quis ser comprometida com as manobras de Alvaro Uribe e manifestou publicamente, depois de uma detalhada análise, que tinha sido danificada a Corrente de Custodia, o que significa, em bom romance, que depois da morte de Raúl se manipularam os conteúdos do disco rígido "sobrevivente", se chegou a sobreviver depois de semelhante inferno de explosivos. Tratava-se de inventar e retorcer acontecimentos para extorquir as FARC e muitos amigos da paz da Colômbia com esse estilo muito particular que carateriza o senhor Alvaro Uribe e que impôs a toda sua administração. Nesta semana que termina, a Corte Suprema de Justiça declarou como ilegal qualquer prova levantada sobre os chamados computadores de Raúl Reyes, precisamente porque se manipularam os materiais supostamente encontrados e, além disso, foram desvirtuados os procedimentos judiciais.

Curiosamente, não trascenderam relatórios que nos chegavam e que o Comandante Raúl devia de conservar, por exemplo, sobre os pagamentos a altos oficiais da polícia, hoje generais, que fez o narcotraficante Wilber Varela e que comentou pessoal e detalhadamente a um de nossos comandantes no Vale do Cauca o coronel Danilo González, quem ainda em serviço ativo, buscou as FARC pretendendo a libertação de uns suspeitos que retinha; também não mencionaram relatórios precisos sobre a utilização plena do DAS por parte do paramilitarismo com a total anuência do Presidente da altura, nem dos encontros, uisque em mão, em Bogotá, de chefes paracos com "prestantes" personalidades linajudas para planificar as agressões contra a esquerda, nem outras muitas que fariam muito longa esta entrevista e que seguramente não incluíram nas cópias que foram presenteando, a alguns de seus governos amigos, à CIA, ao MI5 e ao MI6 ingleses, ao MOSSAD israelense e a outros que continuam publicitando inverosímeis histórias através de suas organizações de bolso.

Acha que o processo de desmobilização de paramilitares impulsionado pela lei de Justiça e paz foi bem sucedido? Qual é sua opinião sobre este processo?

Esse processo planificou-se e executou como uma farsa para deixar impunes os verdadeiros chefes do paramilitarismo depois que Álvaro Uribe, um deles, ganhou as eleições presidenciais no 2002.

Como abrangência, utilizaram narcotraficantes e sicários com ares de chefes contrainsurgentes, a quem prometeram estatus político e respeito a seus incalculáveis fortunas. Depois eliminaram-nos, em uma história que se recicla onde a aristocracia e alguns carreirista cometem crimes buscando o poder e a riqueza utilizando a criminosas e bandidos, a quem depois condenam, encarceram ou mandam assassinar em um repetido espetáculo de escárnio público.

O país sabe que o paramilitarismo é uma estratégia do estado para assassinar sistematicamente opositores, buscando ocultar o sangue que mancha até a medula às instituições públicas, por trás de bandos de sicários e delinquentes de aparência civil.

A oligarquia colombiana, impotente em sua luta contra os avanços da insurgência revolucionária, entregou-se à prática paramilitar à que posteriormente, nas décadas do 70, articulou com o nascente narcotráfico dando origem ao narcoparamilitarismo, engrandecido e consentido socialmente pelos poderosos durante longos anos, quem agora lutam por se safar do estigma e por lavar suas próprias porcarias.

Os narcos que acreditaram em suas palavras foram exibidos e promocionados como grandes chefes contrainsurgentes e depois, extraditados para os Estados Unidos com o fim dos silenciar. Tempo depois, quando de lá e pela pressão das vítimas procederam a confessar crimes, a mencionar seus compinchas, sócios, contatos, mecenas políticos e militares, a oligarquia utilizou seus meios para semear a dúvida: como achar um criminoso e não um aristocrata, um político tradicional ou um prestigioso general das Forças Militares?

A lei de justiça e paz, foi uma grande farsa, que passou pela venda de títulos como "comandantes paramilitares" a sicários narcotraficantes, passou também pelas fotos de grandes "desmobilizações" de desempregados e bandidos contratados para a ocasião com fuzis e armas compradas para a fotografia, e terminará com a absolvição de Álvaro Uribe, na comissão de acusações da Câmara de Representantes do Parlamento colombiano, salvo que os milhões de atingidos por esta criminosa estratégia lhe imprimam uma maior dinâmica a seus esforços e lutas e se receba maior solidariedade mundial. Só assim na Colômbia, como aconteceu na Argentina e outros países, poderá ser condenado também aos responsáveis materiais e intelectuais por negras e sangrentas noites em que afundaram o país.

Por que faz sentido a luta armada para as FARC e não a defesa através de vias democráticas dos ideais políticos e as transformações socioeconómicas que consideram necessárias?

Porque, na Colômbia, a oposição democrática e revolucionária é assassinada pela oligarquia. O massacre da União Patriótica é a mostra evidente.

Todo líder, qualquer organização não oligárquica que ameace os poderes estabelecidos, é assassinado ou a massacrado, como parte de uma estratégia oficial de Segurança Nacional. Os poderosos instituíram-na como caraterística da cultura política e agora a têm incorporado na conceção do Estado.

Extensos capítulos da história nacional que partem de setembro de 1828, quando as fações progringas colombianas de então atentaram contra o Libertador Simón Bolívar, até estes anos, passando pelo assassinato do Grande Marechal de Ayacucho, Antonio José de Sucre, do líder liberal Rafael Uribe Uribe, de Jorge Eliécer Gaitán, de Jaime Pardo Leal, de Luis Carlos Galã, de Bernardo Jaramillo Ossa, de Manuel Cepeda Vargas e de centenas de líderes mais, parecessem ratificar um velho e descarnado asserto popular: a oligarquia colombiana não entende senão a linguagem dos tiros.

Aqui nas FARC pensamos que apesar dessa histórica agressão antipopular que carateriza o devir nacional, é realista e inadiável trabalhar a construção de espaços de convergência, onde entre todos os colombianos construamos os acordos que alicercem a convivência democrática. O comandante Jacobo Arena fez questão de que o destino de Colômbia não podia ser a guerra civil, em consequência lutámos, uma e outra vez, por encontrar com os diferentes governos, a saída política ao conflito colombiano. NÃO se conseguiu porque a oligarquia pensa em rendiciones e nós em mudanças de fundo, democráticos, à vida institucional e às regras de convivência, mas não por isso, havemos de deixar de lutar por uma solução incruenta como essência de nossa conceção revolucionária e sustento da Nova Colômbia.

Que lições sacaram da criação da partido União Patriótica?

Foi uma experiência tão cheia de riqueza quanto dolorosa, que devemos analisar e referir permanentemente. Dentro de suas muitas lições lhe poderia mencionar algumas como o difícil que é avançar em um processo de solução política, quando a oligarquia colombiana mantém suas estratégias de paz dos sepulcros e Pax Romana, pois em frente a este projeto mostrou seu mesquindade e foi essencialmente sanguinária e cruel. Preferiu o assassinato de cerca de 5.000 dirigentes democráticos e revolucionários em uma razzia de corte hitleriano, que abrir espaços a todas as vertentes da esquerda, feito com que de se ter conseguido gerasse uma nova dinâmica na confrontação política e possibilitado a concreção integral dos Acordos da Uribe faz mais de 25 anos.

Com o extermínio da UP não só perdeu uma geração quase completa de dirigentes revolucionários, a maioria deles de grande dimensão política e imensos valores éticos, cuja ausência hoje é notória no palco público da nação como do continente, também se frustrou por muitos anos, a possibilidade de assinar um acordo de convivência.

A experiência da UP ensinou-nos que qualquer avanço para a paz que surja de acordos exige a transparência, que qualquer entrave seja esclarecido antes de subir um novo degrau, pois os Acordos da Uribe, origem da UP, foram sabotados pelo Alto Comando militar desde o primeiro momento apesar do qual, todos os comprometidos com ditos acordos, lutamos como Quixotes, por torná-los viáveis.

Mas consegue a assinatura de acordos de paz na Uribe em 1984 e garantir seu cumprimento total até culminá-los, foi impossível. De modo que os colombianos que empreendemos com grande otimismo e maior entusiasmo uma histórica jornada pela convivência, perdemos essa batalha civilizada em frente aos "inimigos ocultos da paz", que hoje já não se escondem tanto.

Um processo de paz bem sucedido tem como premissa inevitável o apoio lento, decidido, transparente e ativo, da maioria da população.

Não me cabe a menor duvida que as novas gerações de colombianos, em um futuro próximo, renderão honras e farão reconhecimento aos mártires da União Patriótica que "de peito aberto" lutaram por um melhor país para seus filhos, pela democracia e a convivência, com uma generosidade, um despreendimento e uma valentia instâncias.

Destacados líderes políticos da esquerda colombiana disseram a Público que acham que a existência como guerrilha das FARC é a responsável pela "direitização extrema" da sociedade colombiana, já que "esquerda" se associa a guerrilha. O senhor concorda?

Digamos genericamente, que se está à esquerda se se prioriza o social, a democracia popular e as mudanças revolucionárias, em oposição a quem privilegia o lucro econômico, o hegemonismo burguês e a defesa do statu quo. Não se trata só de estar ao lado esquerdo da direita, mas de defender integralmente interesses de classe, populares. Integralmente.

Sublinho e comento-lhe que não escutei a nenhum destacado dirigente, de esquerda, afirmar o que menciona em sua pergunta.

Na Colômbia há bastantes pessoas, muito importantes e muito consequentes, que com enorme responsabilidade e altura discrepam da luta armada revolucionária, se afastam dela, mas entendendo suas circunstâncias históricas, trabalham por encontrar os caminhos da solução política respeitando o compromisso de quem combatemos na insurgência e, priorizando seus debates contra a oligarquia e contra o neo colonialismo imperial, verdadeiros geradores da violência na Colômbia.

De repente existe quem militou na esquerda e já não defende suas posições originais e sim as do regime, como acontece em muitas partes do mundo. Terá que respeitar suas novas posturas, mas sem os inscrever como defensores dos interesses populares nem os localizar à esquerda no xadrez da política.

Também pode ser dado o caso de quem pretende ocultar suas próprias falhas, depois do esforço alheio.

A luta nossa desde Marquetalia é pela democracia, pela possibilidade verdadeira de desenvolver uma ação de massas, aberta, pelas mudanças revolucionárias e o socialismo. E esta opção, é a que tem sabotado a tiros a oligarquia colombiana.

Assassinaram Jorge Eliécer Gaitán, legislaram com o anticomunismo como suporte durante a ditadura militar, criaram a Frente Nacional bipartidarista para excluir e perseguir os revolucionários, e aprovaram uma Constituição em 1991, com elementos positivos em seu desenho e textos, que deixou intacta a concepção de Segurança Nacional do inimigo interno que existe desde faz um pouco mais 47 anos em nosso país. A mesma do paramilitarismo e os falsos positivos.

A direita, na Colômbia e em todo mundo, faz propaganda e difunde seus pretextos, reais ou fictícios, para confundir, atacar e desvirtuar as lutas populares por bem-estar e progresso social. E utiliza variedade de forma para isso, incluindo a muitos quem em algum dia algum dia foram ativistas da esquerda.

Nos tempos que correm, com o desenvolvimento dos meios de comunicação, não há confusão possível. Quem defendem a ordem existente, não o podem ocultar.

A confrontação na Colômbia prolongou-se demasiado. Lutar e clamar pela paz é expressão de um sentimento profundamente popular e revolucionário.

As FARC assinaram um pacto de não agressão com a guerrilha do ELN em dezembro de 2009. Que obstáculos teve em sua implementação?

Tanto o Comando Central do ELN como o Secretariado do Estado maior Central das FARC - EP, reconhecemos com sentido auto-crítico, o erro que significou não deter drástica, radical e oportunamente os problemas que se foram dando em diversas áreas do país, entre combatentes das duas forças, tempo atrás.

Agora, trabalhamos com enorme convicção revolucionária em todas essas áreas por superar, definitivamente, os problemas, o mal-entendidos, as emulações mal feitas e os confrontos. É um processo complexo, tendo em conta a conjuntura atual, de intensa confrontação política e militar com o Estado. Mas vamos avançando com solidez.

A autocrítica é a fundo e em isso estamos. Falta tempo, há muito terreno por percorrer mas avançamos em firme fazendo consciência, a todos os níveis de nossas organizações, que somos parte do mesmo contingente de luta popular, revolucionária, anti-imperialista, bolivariana e socialista. E que isso é o que fundamenta a forma de nos relacionar, as convergências que devemos trabalhar e lutar para elevar a novos níveis a necessária estratégia unitária dos revolucionários colombianos.

Recolhemos o legado do grande revolucionário, o sacerdote Camilo Torres Restrepo de enfatizar o que nos une. As divergências devemo-las ventilar e arejar com mecanismos que estamos criando para isso.

Estamos obrigados a ser exemplo de unidade. E de maturidade. Assim também contribuiremos à unidade popular dos colombianos, projetando nos fatos a prioridade "do bem comum" acima de qualquer interesse particular.

Falta-nos um bom caminho, mas já o começamos. E isso é o estratégico.

Segundo um auto da Audiência Nacional, dois depoimentos de antigos membros das FARC implicam o Exército de Hugo Chávez nos cursos de treino que a ETA deu aos guerrilheiros colombianos em solo venezuelano. Os relatos dos arrependidos fazem parte de um relatório da Delegacia Geral de Informação da Polícia. Na epígrafe do auto dedicada aos "fatos" descreve-se como em agosto de 2007 dois supostos membros da ETA deram na selva venezuelana dois cursos sobre manejo de explosivos a guerrilheiros das FARC. Tiveram no passado as FARC relacionamento com a ETA? Mantêm relacionamento na atualidade e, em caso afirmativo, em que consiste?

A experiência das FARC em matéria de explosivos tanto de seu fabrico, como de seu armazenamento e utilização é longa e abundante, o que desde faz muito tempo nos permite auto-fornecer-nos sem recorrermos a nenhum tipo de ajudas, simplesmente porque não o precisamos. Temos os nossos próprios instrutores. Assim de simples. Isto para recusar as afirmações sobre tais cursos com pessoal estrangeiro que só pretendem prejudicar o governo bolivariano da Venezuela.

Na Colômbia, a partir de oferecimento de dinheiro, viagens a Europa e rebaixa considerável de penas, alguns desertores, prestaram-se para testemunhar contra nós e favorecer políticas nacionais ou internacionais do governo de Álvaro Uribe. Mas como a mentira não perdura, as montagens que fabricaram a partir de milhares de falsos depoimentos se estão desmoronando. Todos cairão como castelos de naipes.

Por exemplo, atualmente fazem investigações penais e administrativas, da Promotoria e também da Procuradoria Geral da Nação, contra altos servidores públicos do governo Uribe e contra altos comandos militares da época, pelas comédias que montaram, farsas, falsas deserções cheias de infames afirmações como parte de sua ofensiva contra as FARC.

O mundo está-se inteirando como no departamento do Tolima também se recrutaram bandidos e desocupados, com quem "formaram" uma coluna guerrilheira, os vestiram com uniformes militares, dotaram-nos de alguns fuzis velhos e outros muitos de pau, chamaram aos jornalistas, tiraram fotos deles, falaram sobre uma diatribe sem fundamento, lhes deram algum dinheiro aos farsantes, difamaram sobre muitos cidadãos a quem depois encarceraram e, depois, felizes ratificaram que o fim do fim estava perto, incluindo ao presidente de então.

Disséssemos que essa foi uma tónica geral do governo colombiano anterior, buscando impor suas políticas fascistas, levantou todo tipo de alfândegas morais, legais, éticas, discrecionalmente, para se outorgar a licença de caluniar, difamar, mentir e inventar. Valeria a pena que a justiça espanhola verificasse e confrontasse a fundo as informações que lhe foram proporcionadas nesse então.

Nossos relacionamentos, que neste momento têm caráter clandestino, com grande quantidade de organizações democráticas e revolucionárias do mundo, armadas e civis, estão regidas pelas conclusões das Conferências Guerrilheiras que, como já assinalei, orientam sobre o não desenvolvimento de ações militares em outros países, respeitando a soberania da cada país e as lutas da cada povo.

É certo que as FARC pediram apoio à ETA para atentar contra várias pessoas, entre elas o presidente, Álvaro Uribe, quando visitasse Espanha ou a UE?

Essa é a propaganda que se fazia o mesmo Uribe, na Colômbia e no exterior, para projetar uma imagem de vítima.

As forças de segurança espanholas detiveram Remédios García Albert, considerada com ligações com as FARC. Têm as FARC vínculos com Remédios García Albert? Em caso afirmativo, em que consistem?

Não conheço vínculos de Remédios García com as FARC. A ela, refiro-a exclusivamente por uma menção jornalística das autoridades colombianas, durante o período de incontinência propagandística que sofreu o governo em torno do suposto computador do Comandante Raúl Reyes. Nunca dantes nem nunca depois a escutei nomear. Poderia afirmar, se de algo serve, que nos tempos das conversas de paz no Caguán, grande quantidade de pessoas vindas do mundo inteiro, a título individual ou como representantes de organizações de muito diversa índole ou de governos, estiveram presentes e trocaram opiniões com nossos representantes sobre o processo que se adiantava. Não poderia agregar nada mais sobre isso.

Que relacionamento mantêm com os governos de Cuba, Venezuela e Equador?

Se me permitir, prefiro evitar uma resposta alusiva a nossos relacionamentos com qualquer governo do mundo.

Acham que Espanha pode jogar algum papel na solução do conflito colombiano? Qual?

Sempre percebemos positivamente a participação da comunidade internacional na solução política do conflito. Mas, dadas suas caraterísticas atuais e as permanentes e agressivas declarações oficiais, é necessário que lhe dêmos tempo ao tempo.

O que sabe dos falsos positivos? Por que as FARC não difundiram mais revelações sobre esse tema?

O assassinato sistemático de civis em estado de indefensão por parte de militares e polícias, e sua posterior apresentação como "guerrilheiros caídos em combate", é uma prática institucional na Colômbia, desde o ano 1948.

Não é nada inovador nem muito menos. Faz parte de uma guerra suja desenvolvida pelo Estado colombiano contra "o inimigo interno" que também concebe e executa o assassinato seletivo de líderes políticos da oposição, de dirigentes sindicais comprometidos com os trabalhadores, o desaparecimento de ativistas revolucionários, as torturas, o terror e os massacres que intimidem e gerem medo, parálises, pânico e deslocação.

Todo isso se denunciou e se continua denunciando. Existem centenas de livros, milhares de denúncias, milhares de evidências e de provas que demonstram a responsabilidade do Estado colombiano no desenvolvimento desta estratégia, só que até agora, a comunidade internacional aceita a tese oficial que assinala como fatos isolados, sob a responsabilidade de algumas maçãs podres, esta criminosa prática institucional.

São centenas de milhares as vítimas civis da guerra suja que o Regime empreendeu, segundo afirma, em "defesa das instituições e do Estado de Direito".

Em meados dos anos setenta, a estratégia oligárquica de terror fundiu suas práticas paramilitares com o narcotráfico, sob a direção e chefia de poderosos empresários, destacadas personalidades da política tradicional e altos comandos militares, com o objetivo de intensificar seus crimes e entesourar dinheiro proveniente do narcotráfico, mas ocultando a seus verdadeiros chefes e orientadores.

Hoje, muitas evidências começam a sair à luz, desde as farsas dos cárceres atribuídos aos militares e políticos responsáveis por crimes atrozes, passando pela usurpação em massa de terras por parte de fazendeiros, militares, industriais e dirigentes dos partidos tradicionais, acordos políticos empapados de sangue entre gamonais e narcos, enriquecimento desmesurado e inusitadamente rápido de um reduzido setor social vinculado aos diferentes governos destes anos, institucionalidade permeada quase sem exceção por dinheiros mafiosos e ao serviço destes, até os nexos do alto governo com esta estratégia que pelo cedo visibiliza a duas de suas "eminentes" cabeças, o senhor Narváez e Álvaro Uribe Vélez.

E, embora até hoje não há militares condenados pelos chamados "falsos positivos", a sociedade avança na luta por chegar ao fundo do problema, por determinar a cada situação com precisão, castigar aos autores materiais e também aos autores intelectuais e determinadores, o que inevitavelmente atingirá a regulamentação militar existente, inspirada, concebida e desenhada baixo a ótica da Segurança Nacional apregoada por Washington desde os tempos da guerra fria, que foi um dos tema tabu na Constituinte de 1991 e causa de fundo dos milhares e milhares de mortos de todos estes anos. A Colômbia tem perdido muito tempo por esse veto que a oligarquia impôs nos conciliábulos daqueles anos.

Semelhante engano, não pode ser repetido. As soluções que requer o país são estruturais, se queremos a reconciliação sobre bases verdadeiras e não cerzir mais um remendo como aquele de 1991. Por isso também é transcendente que, se conseguirmos construir um novo cenário em função da solução incruenta, em algum momento possam participar representantes da força pública, onde seguramente muitos de seus integrantes, sem responsabilidades nas ruindades da guerra suja, também estarão clamando pela reconciliação e a reconstrução nacional.

A seguir à morte de Jorge Briceño em um bombardeio a 22 de setembro, o presidente Santos reiterou que já se enxergava o fim do fim das FARC. O que opina sobre isto?

Desde 1964, conhecemos tal declaração oficial em boca de diferentes presidentes e ministros de guerra, em ocasiões fazendo de agoureiros, outras vezes em forma de promessa e outras a maneira de ameaça, sempre com a pretensão de ocultar as raízes do conflito que fizeram necessária a existência das FARC.

Assim, justificaram a violência terrorista do Estado.

Assim, incrementaram ano após ano o orçamento militar e policial, para bem-estar dos generais e dos senhores da guerra.

Assim, ocultaram desde faz tempo sua própria incapacidade, sua intransigência e a profunda corrupção que corrói as instituições oficiais.

Assim, pretendem ocultar a sua vergonhosa e humilhante genuflexão em frente ao Pentágono Norte-americano e à Casa Branca.

Enquanto não abordarmos seriamente, entre todos, a busca de soluções aos problemas estruturais do país, a confrontação será inevitável. Umas vezes mais intensa, outras não tanto. Em alguns momentos com a iniciativa militar do Estado, em outros, com a iniciativa popular, em uma trágica ciclotimia que devemos superar, inteligentemente, com grandeza histórica.

Se prosseguir a confrontação, terá mais mortos. De ambos os lados. Mais tragédias para o povo. E não chegarão a paz e nem a convivência para a Colômbia.

Não se trata da morte de um ou de outro comandante guerrilheiro. O conflito não é assim tão simples. As circunstâncias históricas do país são muito particulares. A existência de guerra de guerrilhas revolucionárias na Colômbia não é consequência do voluntarismo de um punhado de valentes ou de uns aventureiros, ou de uns "terroristas" ou de uns "narcoterroristas", tais qualificativos podemos deixá-los para a propaganda oficial. A insurgência colombiana é reflexo do sumum de uma série de fatores estruturais que os diferentes governos não podem insistir, teimosa ee criminosamente, em desconhecer.

A oligarquia colombiana conformou uma força pública armada a mais de 500 mil homens, em um país de uns 45 milhões de habitantes com enormes necessidades e carências. Inaudito! Cerca da quinta parte do orçamento nacional que entra anualmente foram aprovados para despesas militares. Investiram-se quase $10.000 milhões de dólares de ajuda norte-americana no Plano Colômbia, para uma guerra fracassada. No entanto, a confrontação prossegue.

Quando bombardearam o acampamento do comandante Jorge Briceño, com quase uma centena de aeronaves que deixaram cair milhares e milhares de toneladas de explosivos durante muitos dias, em um dantesco inferno. Instalaram na periferia do local de tendas de campanha com espelhinhos e presentes e roupa nova, sapatos Reebock e Nike convidando aos guerrilheiros através de alto-falantes durante semanas, à traição e à deserção.

Todo o que obtiveram foi uma heroica resposta militar da guerrilha, colmatada de moral e de consciência revolucionária, que produziu centenas de baixas na força de ocupação oficial e o pedido em massa de entrada de novos guerrilheiros na região e em muitas outras zonas do País.

A proximidade da paz democrática, da convivência e da justiça social não pode ser medido em litros de sangue. Isso o sabe o país e certamente o presidente Santos.

Em seu último informe ONG colombiana Novo Arco Íris, que faz acompanhamento do desenvolvimento do conflito militar cruzando informações oficiais e de analistas, embora reconheça a supremacia aérea do governo, disse que os combates em terra lhes são notoriamente adversos.

Quais são os resultados reais deste longo confronto?

Quanto a isso, só quero assinalar que diariamente há combates e fatos de guerra entre a guerrilha revolucionária e a força pública institucional e parainstitucional na maioria dos 32 departamentos do País, onde se obtêm vitórias e em ocasiões também se recebem golpes, em uma confrontação que se prolongou no tempo e na qual a iniciativa militar se altera, se modifica, muda no tempo e nas diferentes áreas, mas não estrategicamente. Os partes militares, que fazemos públicos, quantificam os efeitos da guerra em nosso adversário e em nossas próprias fileiras com dados incontestáveis. Gostava de destacar que a ofensiva oficial atual iniciada desde faz algo mais de 11 anos, a partir do chamado Plano Colômbia, desenhado no Pentágono norte-americano, dirigido e financiado por eles e alimentado sem descanso por armamento de última geração desde Washington, fracassou. É a maior e mais prolongada operação contrainsurgente lançada no continente e é também a maior demonstração que a solução do conflito na Colômbia não passa pela Pax Romana.

Que condições exigem vocês hoje para se desmobilizarem?

Desmobilizar-se é sinónimo de inércia, é entrega covarde, é rendição e traição à causa popular e ao ideário revolucionário que cultivamos e lutamos pelas transformações sociais, é uma indignidade que leva implícita uma mensagem de desesperança ao povo que confia em nosso compromisso e proposta bolivariana.

Não temos nenhuma dúvida quanto à nossa obrigação de lutar permanentemente e sem desmaio, com convicção e otimismo, por nos acercar com certeza à solução política, incruenta, do conflito. Os colombianos, com a contribuição de países amigos, devemos construir um palco de diálogo onde alinhavar e tecer em comum um processo que conclua em acordos, cuja materialização incida contundente e irreversivelmente na liquidação das causas que em seu momento originaram o conflito armado e que hoje o nutrem abundantemente.

Uma vez erigido o palco, em um processo que também deve trabalhar a reconstrução da confiança entre as partes, teremos que conversar envelope os prisioneiros de guerra, militares, polícias e guerrilheiros em poder das partes, como uma feição política e humanitário que reclama prelação. E, em função de objetivos de longo fôlego, contamos como ponto de partida com uma ferramenta excecional qual é a Agenda Comum pela mudança para uma Nova Colômbia, assinada como acordo entre o Estado Colombiano e as FARC-EP, no Caguán.

Sem dúvida, o importante é construir o palco, com vontade de decisão política, pensando no país e em seu futuro, fazendo abstração das mentiras inventadas pela propaganda oficial que afastam a solução definitiva porque faz pensar ao estabelecimento com seus próprios desejos. E, nestes processos é indispensável manter a antena em terra.

Os dolorosamente frustrados tentativas que fizemos desde La Uribe em 1984 por encontrar caminhos civilizados, são evidência das enormes dificuldades que implica encontrar o caminho correto sem que isso implique resignação.

A Colômbia atravessa uma conjuntura crítica porque acabou há pouco o período do governo mais violento e corrupto da história nacional, encabeçado por Álvaro Uribe. Dezenas dos congressistas e dirigentes políticos que e fizeram campanha presidencial e participaram de sua gestão estão no cárcere, condenados como determinadores do narcoparamilitarismo, outros muitos enfrentam investigação preliminar por parte da Promotoria e do Corte Suprema de Justiça, vários de seus ministros também estão sindicados ou são pesquisados enquanto dezenas de comandos meios desta administração já estão encarcerados todos por corrupção e/ou paramilitarismo.

O véu vai cair logo. A camada de teflon construída pelos amigos de Uribe possibilitando o enriquecimento desmesurado deste círculo mafioso como fruto de uma incomensurável corrupção administrativa, a contemporização complacente de muitos com a estratégia e prática paramilitar que já se conhecia e sua fascistoide rejeição visceral a uma solução política do conflito, todo este vergonhoso véu, está a ponto de cair, o que abrirá novas perspetivas à civilidade e à democracia verdadeira.

Quando o país, além da violência e a corrupção, é açoitado pela natureza em forma de chuva inclemente, está reclamando a seus dirigentes grandeza e estatura histórica para contornar a difícil conjuntura e o projetar com força para o futuro.

Os ódios doentios espalhados pelo anterior governo, que polarizaram a Colômbia, estão vivendo os seus últimos momentos. Às competências que assumiu para evitar a lei como ruína está lhes pondo fim a Promotoria, os juízes e os Cortes. O ter retrotraído ao DAS aos tempos da tenebrosa POPOL, polícia política do regime nos anos 50 e aparelho criminoso do bolso presidencial, não será um crime impune.

A insistência uribista adensada na sua indicação das FARC como sendo terrorista não faz nem sombra à contundente verdade sobre a existência do conflito armado na Colômbia, contida no projeto da chamada Lei de vítimas, se tivermos em conta que foi sobre a tese mentirosa de inexistência do conflito, que Uribe construiu seu aparelho fascista.

Como revolucionários que entregamos tudo pelos nossos ideais e o bem-estar do povo, persistimos na solução política do conflito.