Antes Honduras, agora Equador, depois...
Um ano depois do golpe de Estado em Honduras, os recentes acontecimentos no Equador demonstram que setores opostos às mudanças na região estão ativos e constituem uma ameaça para os processos democráticos em curso.
Por Carmen Esquivel
"Depois de Zelaya, o próximo sou eu", disse o presidente equatoriano, Rafael Correa, quando em junho de 2009 militares hondurenhos sequestraram o presidente Manuel Zelaya e o levaram à força à Costa Rica. A história lhe deu razão.
Apesar das peculiaridades de cada país, os acontecimentos de Honduras e do Equador têm um evidente paralelismo.
Ambas as conspirações têm entre seus protagonistas setores da ultradireita, apoiados pelos Estados Unidos, que diante da impossibilidade de chegar ao poder mediante eleições, tentam alcançá-lo de maneira violenta para não perder seus privilégios.
"Os que levantam a bandeira do socialismo estão na mira de forças da direita, cujo amo está em Washington", declarou o chefe de Estado da Venezuela, Hugo Chávez, ao saber do que acontecera no Equador.
Se voltamos ao 28 de junho do ano passado, recordaremos que Zelaya foi derrubado no mesmo dia em que ia ser realizada uma consulta para conhecer a opinião da cidadania sobre futuras reformas constitucionais.
Setores da oligarquia, que viram na consulta uma ameaça a seus interesses, tentaram enganar a opinião pública com o argumento de que a intenção do presidente era estender seu mandato para mais além de janeiro de 2010.
O que ocorreu agora no Equador evoca a ruptura institucional em Honduras.
Assim como Zelaya, Correa foi sequestrado e o pretexto para isso foi a Lei do Serviço Público, cujo conteúdo foi manipulado para desinformar os policiais insubordinados.
Se se tentou apresentar o que aconteceu em Honduras como uma sucessão presidencial, no Equador os grandes meios de comunicação internacionais falavam de uma simples sublevação policial.
Mas a detenção do presidente durante 12 horas em um hospital da polícia, as ações coordenadas em várias cidades e a tomada do aeroporto de Quito, puseram em evidência que se tratava de um plano para derrubar o governo.
Uma pesquisa realizada por Prensa Latina esta semana constatou que 66,7 por cento dos entrevistados consideraram os acontecimentos no Equador como uma tentativa de golpe de Estado e de magnicídio.
Afortunadamente no Equador, a firme posição de Correa, a mobilização do povo em defesa de seu presidente e a resposta do Comando Conjunto das Forças Armadas, abortaram a intentona.
Não ocorreu o mesmo em Honduras, onde a aliança de 10 poderosos grupos da oligarquia, com as forças armadas, a Procuradoria, o Congresso e a Corte Suprema de Justiça, conseguiram a derrubada de Zelaya e a imposição de um regime de fato.
Sem dúvidas, os acontecimentos em ambos os países, como outras tentativas de golpe de Estado similares na Venezuela (2002) e na Bolívia (2008), formam parte de uma estratégia para acabar com os processos de mudanças e desarticular os governos progressistas.
Tanto Zelaya como Correa incorporaram seus países à Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba), um mecanismo baseado na solidariedade, cooperação e complementaridade das economias e não no livre mercado.
No país centro-americano, onde 70 por cento da população vive na pobreza, Zelaya destinou amplos recursos para fomentar a produção na área rural, outorgou créditos a pequenos e médios produtores e estendeu os programas de saúde e educação.
No caso do Equador, durante o governo de Correa a educação e a saúde já são gratuitas, o gasto social se multiplicou e as bases estadunidenses foram retiradas.
O que ocorre quando um país ordena a saída de uma base militar dos Estados Unidos, minimiza sua relação com Washington, rechaça o modelo neoliberal e ao mesmo tempo aumenta sua cooperação com o Irã e a Venezuela? - perguntava a pesquisadora Eva Golinger.
Segundo a analista venezuelana-estadunidense, Washington começou a movimentar suas peças para desestabilizar Correa no ano passado, depois do golpe de Estado em Honduras.
Setores da ultradireita estadunidense manifestaram seu apoio ao ex-presidente Lúcio Gutiérrez, a quem Correa acusou de estar por trás da conspiração.
Washington também mantém contactos dentro das forças de segurança do Equador e um dos três coronéis presos por tentativa de assassinato contra o presidente, estudou na chamada Escola das Américas.
Um papel similar foi desempenhado antes, durante e depois do golpe em Honduras.
Depois do seu sequestro, Zelaya foi levado à base de Soto Cano (Palmerola), o Departamento de Estado se negou a qualificar o ocorrido como um golpe de Estado e congressistas estadunidenses visitaram o país para apoiar a ditadura de Roberto Micheletti.
Já se disse que a consumação do levante em Honduras e a impunidade de que gozam os responsáveis, são o caldo de cultura para a reedição de outras tentativas de derrubar governos democraticamente eleitos.
Somente a unidade dos povos em torno de seus governos, a posição de mecanismos de integração como a Alba e a Unasul e o rechaço da comunidade internacional, poderão impedir a repetição de outro fato semelhante na região.
*Chefe da Redação Centro-América e Caribe da Prensa Latina.