O PÓS-CAGUÁN
Alberto Pinzón Sánchez
Fonte: Anncol
Aqueles que sabem dizem que escrever sobre a história de uma palavra nunca é tempo desperdiçado. Porque o belo som nativo "Caguán", com a qual os indígenas dessa região amazônica nas encostas dos Andes ao sul da Colômbia, chamaram em seu mito de origem a esse tempestuoso rio; depois de uma intensa e longa campanha mediática passou a significar, dentro da chamada opinião pública própria e internacional, engano e frustração? A resposta é porque lá, durante o governo do presidente Pastrana (1998-2002), se desenvolveram, até a sua ruptura, os conhecido diálogos de paz entre o Estado colombiano e a guerrilha das FARC.
Qual é a razão, após 10 anos de experiências de diversos tipos, de não existir uma análise séria do ponto de vista das ciências sociais, que vá além da simplicidade contundente ou a superficialidade dita pelas duas partes, de que se tratou de um engano mútuo e premeditado desde o inicio destinado a fracassar?
Por que razão ou motivo, havendo tantas e tão boas analises, também de todos os tipos, que desentranharam e dissecaram, minuciosamente, a maioria de elementos contraditórios (que os estrutural-funcionalistas chamaram "tensões") do Plano Colômbia, como uma lei extraterritorial do Congresso dos EUA e conseguiram não a sua desativação total, mas se o seu repúdio geral; não existe uma única análise que o relacione intimamente com outros fenômenos sociais que ocorrem simultaneamente, como os diálogos de paz de El Caguán, nem com o Ascenso ou captura posterior do Estado por parte dos narcoparamilitares como uma solução imposta à crise econômica e de governabilidade do governo Samper, que, obviamente, foram os mais significativos fenômenos sociais vividos pelos colombianos naqueles anos e, posteriormente, determinaram o desenvolvimento social e político da Colômbia?
Estas perguntas apontam para tentar estabelecer um elo direto (invisível pela ciência oficial) entre: 1-A muito bem documentado e analisada crise interna (econômica e social) da Colômbia, tornou-se evidente no governo Samper por causa do financiamento da sua campanha com dinheiro proveniente do tráfico de drogas e que foi habilmente utilizada pelo governo Clinton para fazer avançar o ordenamento geoestratégico neoliberal e imperialista na região andino-amazônica, através do Plano Colômbia /Iniciativa Regional Andina. 2 - A ascensão e captura do Estado colombiano por parte do narcoparamilitarismo emergente como solução fascista para essa crise, e 3 - Com os diálogos de paz desenvolvidos na zona desmilitarizada de El Caguán.
Por que o governo de Pastrana desmilitarizou e entregou às FARC, uma região tão grande como El Caguán, quando Manuel Marulanda, em nome do Secretariado pedira apenas a região da cabeceira municipal de São Vicente? Era uma pergunta que, assombrados, muitos peritos militares e em resolução de conflitos internacionais se faziam. Ninguém suspeita porque era um segredo diplomático muito bem guardado, que veio à tona 10 anos depois em uma disputa típica entre Uribe Vélez e Pastrana, quando este teve que declarar publicamente que tinha sido um imposição do governo Clinton, como parte essencial do desenvolvimento do Plano Colômbia. (1)
Então, tornou-se visível uma espécie de tática com duas frentes, colombo-estadunidense, encaminhada, como os fatos posteriores o demonstraram: Por um lado, para tomar ar político e fazer a reengenharia militar urgente nas Forças Armadas que foram severamente golpeadas com a tomada guerrilheira das bases militares no sul do país, sintetizada no slogan militarista “agora sim os derrotaremos”, e por outro lado, mostrar que as FARC não tinham a capacidade para dirigir uma determinada área territorial que suas vitórias militares superdimensionadas anunciavam e, menos ainda, governar um Estado tão complexo como o colombiano.
Mas não era só isso: No caso (bem previsto) de que a guerrilha não aceitasse tornar-se uma "força para a erradicação da folha de coca", como estava planejado, ou que os diálogos de paz desenvolvidos sob a condição imposta por Pastrana de dialogar em meio à guerra, fracassaram, como de fato aconteceu; possuía-se a justificativa política perfeita para iniciar uma intensa campanha mediática dirigida não somente a satanizar moralmente a guerrilha, mas para criminalizá-la e para converter o sequestro no pior crime da humanidade, como aconteceu. Pior do que os crematórios, as poças de jacarés, ou as valas comuns utilizadas pelo seu aliado fascista para-Estatal, para desaparecer suas indefesas vítimas civis (falsos positivos) do terrorismo de Estado que hoje, após uma década de experiências em El Caguán, contemplamos apavorados.
Por que razão, uma vez quebrado o processo de paz de El Caguán e terminado o governo Pastrana, o Partido Conservador, liderado por ele, junta-se ao candidato regional emergente Álvaro Uribe Vélez, que após perder o primeiro turno das eleições contra o candidato liberal Horacio Serpa característico defensor de Samper, no segundo turno consegue, inexplicavelmente, se impor?
Será que não existe uma linha de continuidade muito forte (que não quer ser vista) entre Pastrana, Uribe Vélez, o Partido Conservador, que o manteve durante todo o tempo como parte de seu governo e a linha militarista, que se impôs hegemonicamente na Colômbia sobre o fracasso de El Caguán e com a conversa mole da “pronta” derrota da guerrilha, tem impedido o início de qualquer outro processo de diálogo com vista a encontrar uma solução política para o histórico conflito social e armado colombiano?
Como conclusão resumida a todas essas perguntas, chamou muito a atenção a opinião dada pessoalmente a Camilo González Posso pelo sucessor López Caballero, o filho predileto de López Michelsen, o maior profeta da oligarquia submissa e militarista colombiana, que participou, nomeado por Pastrana, como parte do Estado nas negociações de El Caguán e melhora o lema de seu pai e faz legível, uma década depois, a política do atual governo: "Falar sem negociar e parar no tempo, para enseguida derrotá-los e voltar a dialogar com os que sobrarem".(2)
Citações:
(1) http://www.semana.com/wf_InfoArticulo.aspx?idArt=108157
(2) González Posso, Camilo. El Caguán Irrepetible. § 7 º, em: http://www.indepaz.org.co