"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


terça-feira, 4 de maio de 2010

Mockus par além dos mitos: mais guerra e privatização



Milton Caballero
Rádio Stereo Cafe
Fonte: Rebelion.org


Tal é o tamanho da crise que a Colômbia vive que muitos aderiram à campanha verde com os olhos fechados, porque acreditam que se deve fazer valer o voto útil, eleger o menos pior ou ao que consideram que, pelo menos, é ético.

A honestidade é uma regra fundamental de conduta. Neste ponto de vista há concordância geral. Mas não é suficiente. Todos os candidatos devem demonstrar a sua probidade. É o ponto de partida de qualquer campanha eleitoral decente.

A corrupção cresceu tanto no governo de Álvaro Uribe que a retidão parece ser agora a única forma de comparação dos candidatos à Presidência. No entanto, além dela deveria se ter em conta outras atitudes determinantes.

Entre outras coisas, porque em nome da transparência também se pode agir na contramão dos interesses coletivos. Por exemplo, entregar os bens públicos em detrimento do Erário sob a figura controversa da “capitalização”, assim como fez Antanas Mockus com uma parte da Companhia de Energia de Bogotá, não é consequênte.

E correr atrás de uma opção sem se importar o que seu líder propõe no fundo, além da forma, é uma decisão que pode ser cara. Não se trata de que o candidato ou seu partido se identifiquem em todos os pontos com o pensamento de cada eleitor. Mas sim nas questões fundamentais, que não se podem renunciar.

Os seguidores de Mockus vêm de duas áreas: 1ª. - uribistas que sabem que o ex-prefeito de Bogotá não representa qualquer risco para a continuidade da “segurança democrática”, e 2ª.- não uribistas, que o vêem como a única alternativa viável diante do poderio do Governo.

Os primeiros percebem a Mockus como uma alternativa diante da fadiga que lhes causa um mandato corrupto ao que, no entanto, tem acompanhado por oito anos perdoando-lhe tudo: a parapolítica, a yidispolítica, os “falsos positivos”, os escândalos do DAS, o Agro Ingresso Seguro, os privilégios para os filhos do Presidente e de tantos outros escândalos.

Para este primeiro grupo Mockus dá confiança, pois se sabe que o candidato verde dará continuidade à estratégia de confronto prolongado desenvolvida por Uribe e, além disso, é sabido que Mockus, por seu caráter neoliberal, seguira o caminho das privatizações e o fortalecimento da “confiança dos investidores”.

Isso explica a enorme simpatia que Mockus despertou nos jornalistas do estabelecimento, uribistas de primeira linha, assim como o inusitado impulso que vários dos grandes meios de comunicação estão dando a sua campanha, apoio que incide de forma determinante no seu crescimento nas pesquisas de opinião.

Os do segundo grupo, os não uribistas, sentem que Mockus é “a única forma de parar a Santos e seus falsos positivos” e desdenham a quem proponha debates para além das formas, como se não quisessem que estoure a bolha na qual parecem estar.

Este grupo inclui alguns que, na consulta interna do Polo, rejeitaram a candidatura de Carlos Gaviria e agora não hesitam em abandonar o navio ao ver que o escolhido, Gustavo Petro, ficou sem opções.


As interrogações

Assim, é importante ouvir as colocações de Mockus em relação a alguns dos assuntos medulares da realidade colombiana, pois está cercada de muitos mitos que retratam o candidato como um paradigma de mudança social que parece não ser real.

Eis algumas das perguntas que surgem sobre ele:

* O senhor gastará, assim como Uribe em 2009, 19,2 bilhões de dólares ao ano do Orçamento Nacional na “segurança democrática”, que prometeu continuar?
* O senhor privatizará 15% da Ecopetrol, a principal empresa do Estado, como proposto por Sergio Fajardo?
* Vender as entidades públicas mais produtivas é um instrumento válido para financiar a educação e outros âmbitos sociais?
* O senhor continua sendo partidário da cobrança escalonada de matriculas, como quando foi reitor da Universidade Nacional?
* O senhor continua acreditando que os decretos de Uribe sobre a saúde “são legítimos” e que a crise do setor pode ser resolvida com mais impostos?
* O aumento de impostos para todos os estratos é o caminho para resolver os problemas do país?
* Onde estão as grandes estratégias de proteção ambiental que supostamente é o forte de um Partido Verde?
* Seu apoio à reforma trabalhista de 2003, que atenta contra os direitos dos trabalhadores, ainda continua?
* Porque ficou à sombra do grupo Opção Centro, grupo amigo do senador processado Gil, e ptou por construir seu próprio partido?
* O senhor acredita mesmo que “as balas também são um recurso pedagógico”, como disse a pouco tempo?
* Por que se atemoriza diante das repreensões de Uribe e rezar para que ainda o considere “como um timoneiro firme da segurança democrática”?
* O seu firme não ao acordo humanitário se deve a isso?


1 .- Mockus e a Guerra: “um timoneiro firme”

Com relação ao conflito existente na Colômbia, por mais de 62 anos, Mockus não difere fundamentalmente da estratégia de Uribe. Como a maioria dos candidatos presidenciais, com suas nuances, apóia a estratégia de “segurança democrática” e exalta a confiança no estabelecimento.

Leiamos a avaliação que da sua posição sobre este assunto fez o presidente Uribe em 20 de junho de 2003, quando o condecorou com a Estrela da Polícia: “... encontrei no prefeito Mockus um timoneiro firme, sem vacilações nem titubeios”. [1]

Há poucos dias, Uribe caracterizou muito bem a Mockus quanto à sua forma de pensar, enquanto desenvolve uma campanha sectária e com aberta participação na política a favor do seu preferido, Juan Manuel Santos. O presidente tenta introduzir algumas dúvidas, mais de forma do que de fundo, sobre o candidato do Partido Verde.

“O prefeito Mockus tem apoiado a Força Pública em Bogotá com toda determinação, sem reserva e tem sido uma formidável combinação da pedagogia da convivência com o exercício firme da autoridade”, disse Uribe há apenas dez meses atrás.

Mockus respondeu às críticas recentemente feitas por Uribe mostrando-se surpreso, afirmando de forma submissa: “O senhor é o meu presidente, o senhor é meu presidente” e mudando o nome do programa “segurança democrática” de Uribe pelo de “legalidade democrática”. Mais uma questão de forma?

Em entrevista ao noticiário CM&, respondendo às críticas de Andrés Felipe Arias, Mockus soltou um argumento absurdo, mas sintomático sobre o conflito colombiano: “As balas também são uma ferramenta pedagógica!”. [2]

E o documento, através do qual efetivou sua aliança com Sergio Fajardo, ao identificar a violência como um dos problemas do país, não inclui nem uma palavra sequer de condena aos crimes cometidos durante o atual Governo. [3]

Tudo indica que para os uribistas que agora acompanham Mockus maciçamente, o exposto neste ponto lhes é indiferente, e é muito provável que também os não-uribistas façam vista grossa e não se importem com a sua rejeição ao acordo humanitário. Dirão que é uma questão de tática e acrescentarão que “os essencialismos são anacrônicos”.

Em termos claros e concretos, sem hesitação ou recursos anedóticos, a questão que muitos esperam que Mockus resolva é o que fará para tirar o país da guerra, se repetirá o gasto feito por Uribe em 2009 (19,2 bilhões de dólares do orçamento nacional) para o confronto. Será o mesmo caminho se eleito?


2 .- Mockus e a política: na busca de partido

A atitude do candidato diante da política foi idealizada e é apresentado como o adversário da politicagem tradicional. Para começar, devemos lembrar que, em 1998, ele foi candidato a vice-presidente de Noemi Sanín, que neste pleito é a candidata do Partido Conservador.

Mockus ainda anseia por essa aliança. “Tenho o meu lado muito conservador”, disse na entrevista a CM& citada acima, depois de reconhecer “o bom do Partido Conservador”.

Em 2006, este matemático de origem lituana, foi candidato presidencial da Aliança Social Indígena, ASI, e, no entanto, não escolheu seu vice-presidente entre as etnias nativas colombianas, como seria de esperar.

A escolhida naquela ocasião foi Maria Isabel Patiño, dirigente da Asocolflores, uma agremiação de grandes exportadores que são questionados pelo mal tratamento que os trabalhadores ligados a essa agroindústria recebem.

Sua votação em 2006 foi pequena: 146.583 votos, ou seja, 1,23% do total, enquanto Carlos Gaviria, candidato presidencial da esquerda, conseguiu 2.613.157 votos, 22% do total, percentagem semelhante à que Mockus atinge hoje nas pesquisas e pelas quais é apresentado como um fenômeno político.

Segundo a última pesquisa, feita por Ipsos-Napoleón Franco para a RCN e Semana, Mockus tem 20% de favoritismo, contra 30% do candidato direto do estabelecimento, Juan Manuel Santos, e 12% de Noemi Sanín.

Quatro anos atrás, Carlos Gaviria, com um perfil decididamente de esquerda, também despertou grande entusiasmo, que se refletiu em sua altíssima votação, maior do que a de Horacio Serpa, candidato liberal.

Também vale lembrar o contexto da participação de Gaviria: tratava-se de um confronto direto contra Uribe, que estava buscando a reeleição, com todo o poder da máquina estatal.

Não é verdade então que o favoritismo de um candidato visto como alternativo não tenha precedentes, como alegam os meios de comunicação de massas. E para voltar um pouco mais na história contemporânea, Galán, Jaramillo Ossa e Pardo Leal também despertaram expectativas inusitadas em seus momentos.

Mockus fez o seu caminho por não poucos cenários políticos, pois participou no movimento Sim Colômbia, de Noemi Sanín, fundou Visionários com Antanas, se achegou à ASI e desembarcou no Partido Opção Centro.

Com Enrique Peñalosa (apoiado por Uribe nas eleições de 2007 para a prefeitura de Bogotá), e Luis Eduardo Garzón derivou num grupo que já possuía representação na Câmara e que o exonerava da árdua tarefa de recolher assinaturas para se cadastrar.

Mas o partido Opção Center tem antecedentes: trata-se de um partido em que alguns dos seus líderes tiveram ligações com a Convergência Cidadã, uma coletividade já extinta por efeitos da parapolítica.

Vejamos como o portal La Silla Vacia apresentou, em setembro de 2009, os contatos dos “Três Tenores” com a orientação do partido centrista.

“Peñalosa, Mockus e Garzon não estavam dispostos a ‘aderir’ a este partido, e seu objetivo era entrar em condições de igualdade (para mandar). Eles também queriam esclarecer a exata medida da relação entre os dirigentes do Partido Verde Opção Centro com a Convergência Cidadã”. [4]

Segundo o mesmo portal, o partido teve origem nos ex-militantes do M-19, Héctor Elías Pineda e Carlos Ramón González, assim como em Daniel Garcia, filho de Néstor Garcia, também do M-19. “A estreita relação entre Gonzalez e outros membros com o ex-senador pelo departamento de Santander, Luis Alberto Gil, atualmente na cadeia por causa da parapolítica, e o apoio do partido às vontades de Gil em Santander criaram uma sombra sobre o partido”, diz o portal LA Silla Vacia na sua resenha.

Sobre essas sombras, ninguém voltou a se lembrar, e menor agora, quando o pequeno partido de centro em que Mockus e seus amigos se acomodaram há seis meses, perfila-se hoje como a segunda força eleitoral do país. Será que as sombras desapareceram ao calor da onda verde?


3 .- Mockus e a socio-economia: mais privatizações?

A maiores expectativas, especialmente entre os jovens, estão no campo das reformas sociais e econômicas. O acordo Mockus-Fajardo, que poderíamos supor como programa da chapa presidencial, não é nada explícito a este respeito.

Seu conteúdo é um amontoado de generalidades sem estratégias que qualquer político poderia assinar sem importar sua origem partidária ou ideológica. O que sim fica claro é a posição definitivamente neoliberal de Mockus, a mesma que aplicou nos seus mandatos de prefeito (1995-97 e 2001-03).

Partidário de aumento de impostos generalizados, sem distinção de classe. Isso é o que deixa ver no seu compromisso com Fajardo quando anuncia que pretendem “garantir o pagamento de impostos justos e adequados”. [5]

Está por se ver quão “justa e adequada” será a nova carga tributária que se implementaria em um governo seu, já que o ex-prefeito não é alheio a aceitar as exigências feitas por órgãos da banca internacional.

E a sua defesa da privatização de empresas estatais é conhecida também, com todas as sequelas em matéria de dilapidação do capital social acumulado nelas tem as decisões dessa natureza.

Por isso, a União Sindical Operária, USO, dirigiu-lhe uma carta na qual o questiona sobre a proposta de seu companheiro de chapa, Sergio Fajardo, no sentido de privatizar 15% da Ecopetrol, supostamente para financiar programas de educação.

“Esta proposta, além de ser contrária aos interesses nacionais, demonstra a pouca criatividade da sua campanha, pois continua com a política de privatizações implementada pelo governo de Uribe, que teve início com a autorização da venda de 20%da Ecopetrol”, diz a USO em sua carta. [6]

Depois de relembrar que as transferências geradas pela Ecopetrol para o orçamento nacional em 2009 foram, nada mais nada menos que, 18,66 bilhões de dólares, a USO pede à dupla Mockus-Fajardo que explique “o que representaria para o país a venda de 15% adicionais de Ecopetrol, uma vez que, em termos de rentabilidade social as utilidades futuras destes 15% iriam para o bolso dos novos proprietários e não para benefício do povo colombiano”. [7]

Mockus parece não se desesperar pelas desigualdades sociais. Usando uma das muitas anedotas que normalmente responde, lembrou recentemente que ele não se importaria de pagar salários milionários para os altos executivos se estes ajudarem a gerar empregos. [8]

O candidato verde desenvolve sua campanha, em qualquer caso, mostrando-se como o defensor da legalidade, discurso com o qual se pode validar toda classe de ações, até os atropelos cometidos pelas leis aprovadas pela classe dominante, como a nefasta reforma trabalhista de 2003 (Lei 789), que Mockus não questiona nem se propõe a modificar.

Tampouco se incomodou com os decretos de emergência social emitidos por Uribe, que a Corte Constitucional declarou inexequíveis (contrários à Constituição), na noite de sexta-feira 16 de Abril. Os considerou necessários.

"Era necessário declarar a emergência e buscar novos recursos, assim como poupar recursos... No seu conjunto, a ação é legítima, é necessária", respondeu Mockus em uma entrevista dada a La W Rádio. [9]

Assim que ficou sabendo da derrubada dos decretos, Mockus solidarizou-se com o Governo e disse que o apoiava em seu propósito de levar os decretos de emergência, tão nocivos para a saúde dos colombianos, ao Congresso a fim de que sua bancada os aprove rapidamente. Será que isso corresponde ao clamor nacional?

Da sua opção pelos impostos a todo o custo não tem dúvidas. Na entrevista referida afirmou: “temos que começar a pensar de onde sairá esse dinheiro [para a saúde] e esse dinheiro sai, necessariamente, em última instância, dos impostos”. [10]

A posição diante as desigualdades e as iniquidades é a linha que marca a diferença entre a direita, que as percebe como naturais e inevitáveis, e à esquerda, que as considera criadas pelas classes dominantes e extinguíveis pela ação dos movimentos sociais.

Mockus não parece perde o sono com essas desigualdades, não as questiona na raiz, para ele simplesmente existem e algo deve ser feito para combatê-las.

E para concluir, o que responde o candidato diante denúncias como as formuladas pelo pesquisador social Aurelio Suárez Montoya, para quem “gerações de estudantes da Universidade Nacional pagam altas matriculas ou suportam a exclusão desde que Mockus inventou a cobrança escalonada”. [11]

Seria muito importante que Mockus resolvesse as questões como as levantadas neste artigo e em muitos outros, como a ausência de propostas ecológicas de uma coletividade que se denomina ‘Partido Verde’.

Esperamos que o verde não fique apenas numa apresentação simbólica, que atrai muitas pessoas aferradas a uma esperança, mas que, no entanto, não fazem perguntas porque querem acreditar em alguém, mesmo que para isso se atenham somente aos seus sentimentos e não ao seu raciocínio.


Notas

[1] Ver discurso de Álvaro Uribe:
http://www.presidencia.gov.co/prensa_new/discursos/discursos2003/junio/ascenso.htm
[2] Assim o afirmou na entrevista com Yamit Amad, diretor do noticiário televisivo CM& em 14 de abril de 2010.
[3] A União Faz a Força, acordo de união entre o Partido Verde e o movimento Compromisso Cidadão.
[4] Três Ver o artigo ‘Os Três Mosqueteiros’ até que enfim encontraram opção no Centro: http://www.lasillavacia.com/historia/4214.
[5] A União Faz a Força ...
[6] Carta Pública da União Sindical Operária, USO, 09 de abril de 2010, assinada por Germán Osman Mantilla e Isnardo Lozano Gómez, presidente e secretário-geral, respectivamente.
[7] Idem.
[8] Entrevista com Yamit Amad ...
[9] Entrevista realizada em 11 de fevereiro de 2010 para La W Rádio.
[10] Entrevista para La W ...
[11] Ver o artigo: A História Negra dos ‘Verdes’, versão virtual, Bogotá, 06 de abril de 2010.