"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


sexta-feira, 6 de julho de 2012

As novas formas de golpismo na região

Com diferentes gradações, os especialistas consultados partilham críticas ao processo de remoção de Lugo, mas também assinalam que a fragilidade política do mandatário deposto contribuiu para o desenlace irregular da crise paraguaia.


A reportagem é de Sebastian Abrevaya, publicada no jornal Página/12, 04-07-2012. A tradução é do Cepat.

A destituição do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, abriu um debate entre intelectuais e políticos em relação às novas formas de golpismo na América Latina. Os presidentes da Unasul deliberaram na reunião, em Mendoza, que se tratou de “uma ruptura da ordem democrática” e, em concordância com o Protocolo de Ushuia, suspenderam a participação do Paraguai nesse bloco regional e também no Mercosul.

No entanto, a contundente e unânime resposta política regional não esgotou o debate intelectual que continua gerando controvérsias. O jornal Página/12 consultou os cientistas políticos Aníbal Pérez-Liñan e Amílcar Salas Oroño e, também, o diretor nacional eleitoral, Alejandro Tullio, que compartilharam das críticas ao processo de remoção de Lugo, mas também destacaram que a fragilidade política do mandatário deposto contribuiu para o desenlace irregular da crise paraguaia.

“É tentador chamar o que ocorreu no Paraguai de golpe de Estado, entretanto acredito que é um erro porque não permite entender claramente o que aconteceu. Não houve uma operação militar, contra o presidente eleito, como em Honduras, há três anos. No Paraguai, o Congresso abusou de sua autoridade constitucional para destituir o presidente”, sustenta Pérez-Liñán, doutor em Ciência Política da Universidade de Notre Dame e um dos maiores especialistas argentinos em política comparada latino-americana.

Além disso, Pérez-Liñán é autor do livro “Juicio político al presidente y nueva inestabilidad política en América Latina”, que analisa as crises presidenciais da região durante os últimos vinte anos, em que caíram 21 presidentes, havendo intervenção militar somente em três casos. Para Pérez-Liñán, “estender” a etiqueta de golpe de Estado leva a “um beco sem saída”, porque poderia decorrer que toda queda de um presidente fosse denunciada para a OEA como um golpe e, segundo maiorias circunstanciais, tornar-se um recurso de “intervenção arbitrária”.

“De qualquer modo, a queda de um presidente eleito é uma tragédia constitucional, mas a desmilitarização da política latino-americana, nos últimos vinte anos, é uma conquista que não deve ser ocultada por um jogo de palavras”, conclui o docente da Universidade de Pittsburgh que, embora tenha qualificado como “duvidoso” o processo de julgamento político, afirmou que sua legalidade está dada pela autoridade constitucional do Congresso para levá-lo adiante.

Numa outra perspectiva, para Salas Oroño, sem dúvidas, trata-se de um golpe de Estado, “tanto por falta de demonstração substantiva e articulada de argumentos, expostos no julgamento político, como pela ausência de uma possibilidade efetiva de defesa”. Doutor em Ciências Sociais da UBA e pesquisador do Instituto de Estudos da América Latina e do Caribe, subordinado a mesma universidade, Salas Oroño adverte que o caso paraguaio constitui um exemplo do que denomina como a implantação de uma “ideologia parlamentarista”, como um fenômeno construído com o esforço combinado das elites conservadoras, em cada país, em aliança com os meios de comunicação, “que forçam uma específica interpretação da realidade, desvalorizando a legitimidade dos poderes executivos”.

“De um lado estão determinados Poderes Executivos que, com maior ou menor determinação, se colocam como horizonte político desagregar os elementos tradicionais das dialéticas neoliberais. Do outro, Parlamentos que funcionam como refúgios institucionais para a reorganização política das diferentes oposições. O que não conseguem conquistar de outra forma, os setores opositores buscam através do Parlamento”, explica Salas Oroño.

Adotando esta ideia, para Salas Oroño o principal déficit do governo de Lugo deveria ser situado no plano político: “Em comparação com outros governos do Cone Sul, que também tem dívidas sociais, Lugo não conquistou, nem sequer, uma mudança nos realinhamentos das identidades político-partidárias. As fragilidades das fronteiras políticas, que ele traçou, não serviram nem para conter seus próprios aliados; no final, foi o Partido Liberal quem definiu a sorte do Presidente”, conclui.

Em semelhante sentido, o advogado e titular da Direção Nacional Eleitoral, Alejandro Tullio, questionou a atitude do Senado paraguaio e argumentou que na Constituição “há conceitos não explícitos porque seu significado está implícito”. Um desses significados implícitos é o de julgamento, “que requer ampla acusação factual, exercício substancial – não formal – do direito de defesa e, além disso, uma sentença fundamentada”. Para Tullio, o Senado, nos fatos, não julgou e nem sentenciou, mas decidiu e votou a destituição “num exercício autojustificativo, em que o fundamento da decisão é unicamente a faculdade legal de adotá-la”. Segundo Tullio, esta atitude do Senado está em conformidade com “uma espécie imprópria de revogação de mandato”, imprópria porque só quem concede o mandato é que pode revogá-lo, nesse caso, o povo paraguaio.

Ao final da análise, o debate não parece encontrar um desfecho comum. A qualificação como golpe de Estado depende, em grande medida, da ênfase dada às irregularidades, reconhecidas pelos intelectuais, ao processo de destituição, encabeçadas pela ausência de um exercício real do direito de defesa, falta de rigor na acusação realizada pela Câmara de Deputados e os prazos acelerados, que serviram para evitar o impacto da pressão internacional.

Esta análise está em sintonia com as palavras do secretário geral da OEA, o chileno José Miguel Insulza, que afirmou, em referência ao caso, que “o estrito apego à letra formal da norma não significa necessariamente o apego aos princípios”.