"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


domingo, 31 de maio de 2015

Em Guapi (Cauca).- Massacre de guerrilheiros em trégua


Por Carlos Lozano Guillén, Diretor do Semanário VOZ
Santos não cumpre com os eleitores que votaram nele para levar adiante o acordo de paz. O pérfido assassinato de 27 guerrilheiros em trégua unilateral no Cauca deixa ferida a paz. Cessar-fogo bilateral é indispensável.
A quinta-feira 21 de maio do presente ano foi um dia fatídico para a paz da Colômbia. Antes do meridiano, em horas da madrugada, sobre um acampamento da Frente 29 das FARC-EP no meio da selva, na jurisdição de San Agustín, município de Guapi, Cauca, ao sudoeste do país, com costa no Oceano Pacífico e banhado pelo rio Guapi, vários aviões Tucano de fabricação brasileira lançaram toneladas de bombas que caíram sobre a humanidade dos insurgentes, que dormiam desprevenidos nas condições do cessar-fogo unilateral decretado pela organização guerrilheira desde o dia 20 de dezembro do ano passado.
No acampamento se propagou a dor e a morte. Não houve combate. Foi um massacre de homens e mulheres inermes que estavam em trégua. Os restos despedaçados dos 27 guerrilheiros assassinados ficaram espalhados em vários metros nas redondezas pelo efeito letal das bombas militares. Um menor de idade ficou ferido vítima do demencial bombardeio. A operação foi batizada como “Marcel 19” e quis ser justificada com falsas historietas pelos mandos militares, ainda que alguns meios oficialistas a assinalem como a necessária resposta aos fatos trágicos em Buenos Aires, Cauca, quando a guerrilha das FARC-EP atacou unidades da Força Pública que promoviam ações ofensivas contra insurgentes.


Afetam a população civil
O Governo, os militares e a “grande imprensa” que celebram o massacre como “golpe contundente” para nada registram os chamados efeitos colaterais, denunciados pela comunidade. Devido aos bombardeios e metralhamentos indiscriminados, que se prolongaram durante os dias 21, 22 e 23 de maio, criando medo e aflição nos territórios ancestrais dos Conselhos Comunitários de Alto Guapi e Baixo Guapi, veredas San Agustín, La Junta, San Vicente, El Rosario, El Naranjo e Temuey, há 352 pessoas deslocadas, entre elas numerosas mulheres, menores de idade e anciãos. A maioria procede das veredas San Agustín, Las Juntas e Balsitas.
O presidente Juan Manuel Santos apresentou, rodeado pelo ministro de Defesa demissionário Juan Carlos Pinzón e dos altos mandos militares, “o êxito da operação, ação legítima do Estado”. Mais tarde anunciou que os bombardeios continuarão, como de fato ocorreu na sexta-feira 22 de maio em jurisdição do município de Remedios, Antioquia, e desafiante disse que “estamos preparados” ante a ruptura do cessar-fogo unilateral.
Em aparente mudança de tom perguntou às FARC: “Quantos mortos mais necessitamos para entender que chegou a hora da paz?”. Para alguns, a frase, plagiada, cheirava a cinismo. Depois da ruptura dos diálogos do Caguán, o comandante Alfonso Cano, assassinado também no governo de Santos nas montanhas do Cauca quando era interlocutor para a aproximação na perspectiva de diálogos de paz com o Governo, foi ele quem disse essa mesma frase lapidar: “Com certeza tornaremos a nos reunir depois de milhares de mortos mais”. São esses vaivéns na chamada política de paz do Governo. Fala de paz em Havana, porém faz a guerra em Colômbia e não só contra a insurgência como também contra as organizações sociais; um dia fala em tom conciliador, outro com agressividade e ameaças. Assim é difícil construir a paz.
O massacre de Guapi está em estudo de expertos e analistas sobre o Direito Internacional Humanitário. Foi um ato desproporcionado e assimétrico numa guerra em que o Estado crê que vale tudo para acabar com a insurgência. As guerras têm limites legais e éticos, este ato se afasta destes parâmetros. Sob a doutrina gringa da segurança nacional, em Colômbia se impôs o conceito do “conflito de baixa intensidade” e consequentemente do “inimigo interno”, o mesmo que os Estados Unidos aplicam nas guerras de rapina no Oriente Médio e outras latitudes. Se atua sem nenhum critério de proporcionalidade e sem respeitar o DIH. Santos reconhece o conflito porém não aceita as obrigações que essa decisão lhe impõem.

Artificio e estatística oficial
O artifício do Governo Nacional, apoiado pela “grande imprensa”, é simples: “Estamos dialogando em meio à guerra”, diz; porém, quando os resultados lhe são adversos, fica colérico e adota medidas que lesam o processo. É a antiga e banal lei da farsa. Se lhes disse o comandante Pastor Alape: “[Nossa posição] é completamente diferente das incoerências do governo, que por uma parte diz que o debate da paz se deve dar em meio à confrontação, porém, quando se dá um fato em que as estruturas do Estado não saem exitosas, adota petulância”.
Outro artifício é o argumento de que foram as FARC-EP as que violaram o cessar-fogo unilateral, como o assegura o ministro do Interior Juan Fernando Cristo, ou que nunca a acataram segundo o informe do Centro de Recursos para a Análise do Conflito [Cerac]. Ambos desconhecem outras versões mais sérias, não próximas às FARC-EP, como a Fundação Paz e Reconciliação e a Defensoria do Povo que reconhecem que a intensidade do conflito diminuiu com o cessar unilateral. A Frente Ampla pela Paz, vedora de que este fora acatado por todos os integrantes da guerrilha, certificou, pelo menos em três ocasiões, o respeito à mesma.


O dano está feito

Ambas as partes asseguraram que permanecerão na mesa, em meio a um país polarizado, porque, enquanto uns apoiam ao presidente Santos, entre estes, de maneira indecente, os grandes meios de comunicação que usam e abusam de seu poder; outros creem que o governo se equivocou. “Há coisas que são valorizadas só quando são perdidas e possivelmente é o que passará com esta trégua”, diz a revista Semana em circulação com a manchete de que “A paz está ferida”. No país crescem os chamados ao cessar-fogo bilateral, a baixar a intensidade do conflito e a persistir nos diálogos de Havana. Disseram-no as Nações Unidas e outros organismos internacionais. Mais que pressionar “soluções prontas”, como diz a chanceler Maria Ángela Holguín, agora assessora da delegação governamental, o que a comunidade internacional quer é que não se perca esta oportunidade de pactuar o acordo de paz definitivo.
Porém o dano está feito. Em sua prepotência, Santos pensou que o cessar-fogo unilateral era um sinal de fraqueza da guerrilha. As FARC-EP decidiram suspender o cessar unilateral de fogos. Desde janeiro do presente ano, o Secretariado vinha advertindo que em várias regiões a Força Pública estava atacando os acampamentos de guerrilheiros em trégua. Os militares aproveitaram-na para obter vantagem militar. Demonstraram que na cúpula há aqueles que se opõem à saída política dialogada.
Não estava em nossa perspectiva a suspensão da determinação do cessar-fogo unilateral e por tempo indeterminado proclamado a 20 de dezembro de 2014 como um gesto humanitário e de desescalada do conflito, porém a incoerência do governo Santos conseguiu-o, depois de 5 meses de ofensivas terrestres e aéreas contra nossas estruturas em todo o país”, assinala o comunicado do Secretariado das FARC-EP.
Demonstrando que não existe nenhum espírito de revanche, o mesmo comunicado registra: “Doem-nos por igual as mortes de guerrilheiros e soldados, filos de um mesmo povo e procedentes de famílias pobres. Devemos parar este dessangramento. Contra nossa vontade, temos que prosseguir o diálogo em meio à confrontação. Ainda que Santos anuncia que manterá a ofensiva, insistiremos na necessidade de acordar o quanto antes, para a saúde do processo de paz e evitar novas vitimizações, o cessar-fogo bilateral que com tanta insistência as maiorias nacionais têm reivindicado”.
Cabe relembrar nestes momentos difíceis dos diálogos de Havana as proféticas palavras de Otto Morales Benitez, homem de paz, falecido no sábado 23 de maio do presente ano: “Há inimigos ocultos da paz, dentro e fora do Governo”. Que os há, os há!
Fonte: wwwpcc.org
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Equipe ANNCOL - Brasil