"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


quinta-feira, 11 de outubro de 2012

FARC-EP: “O triunfo de um povo é o triunfo de todos”

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IMPRENSA POPULAR APRESENTA ENTREVISTA EXCLUSIVA COM OS REPRESENTANTES
DAS FARC-EP NA MESA DE DIÁLOGO COM O GOVERNO COLOMBIANO

O jornal Imprensa Popular entrevistou com exclusividade em Havana,
capital de Cuba, os representantes da Equipe de Diálogo das FARC-EP
Marco León Calarcá, Hermes Aguilar e Ricardo Teles, que participam dos
diálogos de paz entre a insurgência e o governo colombiano. Confira, a
seguir, a íntegra da entrevista:

IMPRENSA POPULAR - Camaradas, é uma honra para nós do Partido
Comunista Brasileiro e do jornal Imprensa Popular poder realizar essa
entrevista com a Equipe de Diálogo das FARC-EP neste momento tão
transcendental para a história da Colômbia e para os rumos da América
Latina. Na sua opinião, o que devem fazer os internacionalistas
brasileiros para colaborar na busca da almejada paz com justiça social
na Colômbia?

Marco - Primeiramente, enviamos as saudações das FARC ao povo
brasileiro através do Partido Comunista Brasileiro. Pensamos que a
solidariedade é inerente à paz. Neste momento estamos claros de que o
processo e a possibilidade de construir os caminhos para a paz são um
triunfo do movimento popular - do qual fazemos parte. Assim como
conseguimos abrir a porta, necessitamos ajuda para mantê-la aberta e
avançar.

E não somente dos internacionalistas brasileiros, mas de todos os
povos do mundo, porque inclusive pensamos que temos a necessidade de
paz em todo o mundo. A paz é um direito essencial, e a única
possibilidade de avançar na construção de sociedades dignas que
merecem os povos, que merecemos nós, também. Porque é conhecido o
nível de exploração dos povos, que é um nível de exploração ao que se
somam a repressão, a violência, os assassinatos, a impunidade. Isso
configura uma imagem do que foi a história da Colômbia, e é uma
história que se repete. Lá os ventos de mudança são também os ventos
de transformação da Nossa América. Por essa razão e importância, eu
não concordo em que o processo poderia ser mais rápido, mais lento,
que deva se ceder ante tal ou qual coisa.

É inquestionável que existem em nossa América algumas mudanças,
algumas expectativas de que em realidade alguns governos estariam
representando os interesses da população. Mas, ainda existem países
onde esses ventos de mudança não sopram, enfrentam barreiras que os
detêm.

E há ventos e ventos, que respondem a qualquer mudança de tempo ou
posição. E os acordos com freqüência são os que explicam qualquer tipo
de facilidade para essas mudanças. Não obstante acabam por ser
arrumados de acordo com a história do mundo e a conjuntura atual.

IP - Qual deveria ser a postura do Brasil e da Unasul nesse momento?

Hermes - Sem dúvida, o Brasil, pelas suas dimensões e grau de
desenvolvimento é muito representativo na América Latina. Pode-se
dizer que em um futuro não muito distante, as decisões do Brasil serão
determinantes, pois novos elementos geoestratégicos estão aparecendo
no ambiente político do Continente. Através, tanto do MERCOSUL quanto
da UNASUL se estão estabelecendo novas relações entre governos, povos
e exércitos dos países que os integram, relações que nada têm a ver
com a prepotente e dominadora doutrina Monroe que diz “América para os
americanos”. Hoje tudo passa pelo Brasil. Ademais, devemos levar em
conta outros organismos que têm a ver com esse processo de integração,
como a CELAC, na qual se integram Cuba e toda América Latina. Esse
processo começa a formar um forte movimento em nosso Continente.

Na Colômbia há, infelizmente, uma das “democracias” mais atrasadas,
por não ter modificado em nada sua forma de funcionar. Nunca houve uma
possibilidade de abertura, sequer na democracia burguesa.

E vejam bem.... já os EUA não conseguem impor sua dominação como
antes. Basta lembrar a amarga experiência de ver com seus próprios
olhos a derrota contundente de seu projeto conhecido como ALCA. Mas,
não deixa de tentar recuperar o terreno perdido, mediante a estratégia
do "não mas sim". Quem não lembra do golpe de Estado na Venezuela?

No Haiti, lembrem, aproveitaram uma tragédia terrível para invadir seu
território com milhares de soldados, quando o que necessita o povo
desse país são médicos (as), enfermeiros (as), água, comida, barracas,
remédios, hospitais de campanha, ambulâncias, etc, etc, etc. Algo tem
por trás dessa invasão.

Depois, a bola da vez foi Honduras: golpe de Estado. E seguindo nessa
linha, temos mais recentemente o golpe de Estado no Paraguai. Por
outra parte, continuam a instalar Bases Militares em nosso Continente.
Há países que aceitam ceder território; outros, com atitude digna e
soberana, lhe dizem: não. E não podemos esquecer que por ai anda a
Quarta Frota. Fazendo o que?

Os EUA ficam nervosos quando observam o espírito soberano e de
independência que têm a integração e a complementariedade de nossos
países, assim como a consciência política e a luta anti-imperialista
dos seus povos. E mais, ainda, estão muito preocupados, pois sabem das
grandes possibilidades que América Latina unida tem para fazer
excelentes planos de desenvolvimento a serem incluídos na agenda
geoestratégica mundial, já que conta com as maiores reservas de
recursos naturais determinantes para a sobrevivência da Humanidade. E,
em todo isso, o Brasil tem uma grande missão a cumprir.

IP - E como, de fato, você avalia a atuação do Brasil e da UNASUL
nesse episódio específico de diálogos para a paz na Colômbia e ao
longo dos últimos anos?

Ricardo - Aproveito a oportunidade de estar falando com os camaradas
do Partido Comunista Brasileiro para enviar uma calorosa, ampla e
generosa saudação aos revolucionários e ao povo do Brasil. Sentimos o
calor e a solidariedade dos brasileiros através de todos esses anos de
intensa luta na Colômbia, incluindo os dez últimos anos de uma guerra
que foi incrementada pelo senhor Uribe Velez.

Nesse processo, recebemos a solidariedade efetiva e o calor do povo
brasileiro, principalmente quando no Brasil Olivério Medina, um dos
nossos dirigentes, foi detido. Foi o povo brasileiro quem impediu que
fosse extraditado, sendo que os comunistas e revolucionários
brasileiros tiveram um papel determinante, impedindo que nosso
companheiro hoje estivesse na prisão pagando por delitos que não
cometeu. Agora, sobre a UNASUL e os outros organismos que estão
surgindo, é uma nova forma de fazer diplomacia na América Latina. Os
EUA já não podem fazer em nosso Continente o que tradicionalmente
vinham fazendo. Os organismos fundados como fantoches, a exemplo da
OEA, estão nesse momento ultrapassados, e na nova diplomacia vão
ganhando mais força os povos que começam a se despertar para o
processo de unidade latino-americana e caribenha.

Nesse sentido a UNASUL, a ALBA, a CELAC vão jogar um papel decisivo
para impedir que os EUA sigam dominando nossos países como vinham
fazendo.

Existe uma questão que não é conhecida, mas nessa aproximação entre as
FARC e o governo colombiano, generosamente o governo do Brasil
ofereceu seu território para que se iniciassem os diálogos discretos e
secretos entre as duas partes. Também, na recente crise entre Colômbia
e Venezuela o governo brasileiro, assim como o cubano, teve papel
determinante para evitar uma guerra. Dessa forma, acreditamos que a
UNASUL tem um papel fundamental nesse momento de inicio dos diálogos.

Num futuro próximo é possível esperar que a UNASUL e o Brasil venham a
fazer parte da mesa de diálogo para acompanhar o processo.

Além disso, o Brasil poderia participar de um grupo de países amigos
pela paz na Colômbia, porque esse processo não afeta somente o
território colombiano, é um assunto regional. O Brasil tem um papel
importante para a paz no Continente.

IP - Que garantias são necessárias para que não venha a se repetir o
que ocorreu com a União Patriótica e o assassinato de milhares de
lutadores no passado?

Marco - A garantia necessária, a única condição indispensável para que
não ocorra o que aconteceu com a União Patriótica é a vontade política
da classe dominante colombiana, que abandone o esquema da doutrina da
Segurança Nacional que, para a vergonha do país, é a única nação que a
segue aplicando agora com o nome de Segurança Democrática, porque não
existe a possibilidade real de conter os assassinos do povo.

O que existe é a pressão popular, existe a defesa popular, mas então
cairemos no mesmo: para defender o caminho da paz temos que nos armar
para acabar com esses grupos paramilitares que funcionam a mando das
forças oficiais. Então, é um problema de vontade política, para que de
verdade se olhe para o futuro da pátria construído em conjunto com as
forças populares.

Do contrário seria, então, levar ao fracasso qualquer tentativa de
paz. É que nós como insurgência, as FARC, somos resultado e
consequência dessa violência oficial. Nós não fazemos a guerra porque
gostamos da guerra, já que para nós a guerra não é um fim. Desde 1964,
em um dos primeiros documentos que publicaram os marquetalianos - como
chamamos os nossos fundadores - com o título de Programa Agrário dos
Guerrilheiros, que afirma que somos revolucionários e buscamos a
transformação pela via democrática e de massas. Mas essa porta nos foi
fechada violentamente. No entanto, como somos revolucionários e temos
um objetivo, tivemos que buscar outra forma de luta, a luta armada.

Mas nós desde nossa origem temos mantido erguida a bandeira da paz,
que sempre foi nossa vontade - assim como é agora -, que sempre foi
nossa convicção. Já o outro lado até agora não teve convicção.
Esperamos que agora, com condições diferentes (me referia
anteriormente aos ares de mudança no continente, à movimentação social
que existe em Colômbia) para forçar a oligarquia a modificar seu
método de fazer política, porque nos acusam de violentos, mas são eles
que desde a época da independência utilizam o assassinato como arma
política.

Em 1830 assassinaram o Marechal Antonio José de Sucre e se recordamos
a história sempre recorreram à violência para tratar de calar o povo,
para tratar de impedir as mudanças. Então, desse ponto de vista,
existe uma força popular que veremos se consegue convencê-los a não
utilizar a violência, porque se recorrem à violência então não
poderemos construir a paz, já que até agora as condições que nos
obrigam a estar armados não mudaram, pelo contrário, se agravam. Nós
queremos solucionar essas condições e que a violência não seja
aplicada contra o nosso povo, porque temos claro que a violência
reacionária sempre terá como resposta a violência revolucionária.

IP - O governo Santos teria como cumprir essas garantias necessárias
para o processo de paz?

Hermes - Vamos sentar à mesa para tratar dessas questões. Nos
encontros exploratórios que foram feitos durante 6 meses as duas
partes se sentaram à mesa para construir uma agenda de diálogos sobre
o problema nacional. Isso quer dizer que haverá uma batalha, não no
campo de guerra, mas em uma mesa em que o movimento guerrilheiro
estará na defesa de todo povo colombiano, colocando os temas
necessários para que a violência não siga. Trataremos nos diálogos com
o governo as causas da violência e buscaremos os caminhos para
solucioná-las.

Se o governo somente tiver como objetivo submeter o movimento a uma
desmobilização não iremos avançar: a única garantia para que se
conquiste a paz na Colômbia é o combate às causas da violência, dando
condições dignas de vida para o povo. Hoje a Colômbia é um dos países
mais desiguais do planeta, com a maioria do povo vivendo na pobreza e
a oligarquia nadando em enormes riquezas. Nos momentos anteriores ao
diálogo o paramilitarismo chegou ao seu auge, tendo ligações diretas
com políticos, latifundiários, empresários e militares, sempre tendo
como pano de fundo o narcotráfico.

Cerca de 80% dos políticos colombianos têm ligação com a
narcopolítica, assim como muitos oficiais das Forças Armadas, alguns
tendo inclusive sido condenados nos EUA por ter ligação com o
narcotráfico. Se o governo tentar repetir o que ocorreu anteriormente
seria um desastre para o país, como já foi demonstrado no passado.

A guerra forjada pelo governo e pelo paramilitarismo tem sido muito
cruel para o povo colombiano, que sofre com os assassinatos e
desaparições de sindicalistas, camponeses, estudantes, líderes
comunitários, além dos que morrem em combate por uma solução política
às injustiças. O governo não tem alternativa senão a de iniciar o
diálogo com a insurgência e com o povo, porque a outra via apenas
aprofundará a crise. Além do mais, existe uma crise de partidos e um
movimento que vem diariamente se fortalecendo, chamado Marcha
Patriótica, que pode garantir a sustentação desse novo processo.

A Marcha Patriótica tem modificado profundamente o cotidiano nacional
e objetiva conquistar direitos que beneficiem o povo. Este processo de
diálogo deve necessariamente estar acompanhado pelo povo e suas
organizações, pois é o único capaz de obrigar o Estado a fazer as
mudanças urgentes. É somente o povo organizado que pode conquistar as
transformações necessárias em benefício da maioria.

IP - E como está hoje a mobilização popular para pressionar o governo
e exigir conquistas nos diversos aspectos relacionados com a paz?

Hermes - Neste momento existe uma grande força dos setores populares e
do movimento revolucionário. Nós das FARC não somos apenas
guerrilheiros. Desenvolvemos um trabalho político clandestino em
diversos setores da sociedade colombiana, desde o Partido Comunista
Clandestino, junto ao movimento operário, juvenil, camponês,
comunitário, cultural, etc. Em cada brecha na sociedade colombiana
existem revolucionários trabalhando e aportando para o processo.

Hoje vemos marchas na Colômbia que não se viam desde 1948, construídas
por mais de 2 mil organizações camponesas, afrodescendentes,
indígenas, sindicais, estudantis, culturais e artísticas, que chegaram
a mobilizar cerca de 2 milhões de colombianos e colombianas: o
movimento Marcha Patriótica. O movimento vem se organizando em nível
nacional, em cada região da Colômbia, realizando marchas e
mobilizações nacionais, regionais e locais, o que mostra seu intenso
processo de consolidação como força política.

A juventude também tem feito um belo trabalho. Recentemente os
estudantes enfrentaram uma lei que avançaria na privatização da
educação superior e venceram o governo. É um momento importante, em
que o povo tem mostrado às classes dominantes a sua imensa força.

IP - Para finalizar, que mensagem gostariam de enviar aos militantes
do PCB e, em especial, à juventude comunista no Brasil e a outros
internacionalistas?

Ricardo - Certamente por sorte vocês, por sua juventude, não haviam
nascido quando aconteceu o golpe de Estado e a ditadura pavorosa que o
Brasil sofreu e que logo se espalhou por todo o continente. Aí a
juventude brasileira deu uma cota muito grande de sangue enfrentando a
ditadura.

Atualmente a juventude brasileira também enfrenta grandes batalhas
para melhorar as condições de vida de seu povo. Certamente vocês não
vivem uma guerra aberta de caráter militar contra o Estado, mas
existem outras formas de luta, de organização popular, desde que o
Estado burguês permite esse tipo de organização sem o risco de serem
assassinados. É justa a participação em qualquer atividade de tipo
legal, ocupando as contradições dos grandes ou pequenos espaços
existentes no estado burguês.

A juventude colombiana, ao contrário, nos últimos 60 anos nunca pôde
ter um dia de paz ou de sossego, e por isso milhares de jovens se
viram obrigados a empunhar as armas. Jovens que nesse momento poderiam
estar na universidade, no colégio, na escola, preparando-se para as
batalhas do futuro.

Nós, de longe, observamos a juventude brasileira, que se manifesta
através de seu folclore, da arte, do esporte; temos visto seus
cantores, seus estudantes, seus artistas. Uma juventude que tem muita
criatividade, que deve aproveitar muito o tempo para o estudo, para
sua formação, e colocar todo isso a serviço de seu povo, evitar a
postura de caráter egoísta, o individualismo, e os valores que se
perderam devido às políticas neoliberais.

Acredito que a Juventude Comunista deve ser e é exemplo de dignidade,
de valores que a sociedade e o mundo necessitam hoje mais do que
nunca. Nenhum de nós queremos que nenhum jovem do mundo passe por
situações degradantes e acredito que a juventude está sendo chamada a
construir um mundo mais digno, um mundo melhor, com trabalho, com
educação, com saúde, com pleno desenvolvimento físico e espiritual do
ser humano.

Esta é a nossa mensagem dos guerrilheiros colombianos para os
militantes do PCB e para a juventude comunista e, através de vocês, a
todo o povo brasileiro, em especial a toda a juventude trabalhadora,
homens e mulheres.

Marco - Para finalizar, gostaria de dizer que é necessária a
solidariedade na luta dos povos, porque o triunfo de um povo é o
triunfo de todos, e a derrota de um é a derrota de todos. Assim, é
importante esse processo de organização. Que em nossa voz, em nossas
respostas, vá o espírito da Guerrilherada Fariana, desses milhares de
guerrilheiros e guerrilheiras que continuamos lutando pela paz e
cumprindo com nossa tarefa de avançar nossa revolução em benefício de
todos os povos do mundo.

Hermes - Eu gostaria de saudar o militantes do PCB e da UJC, e a todos
os amigos que nos têm apoiado todos esses anos, com essa solidariedade
comunista, combativa, que todos devemos ter. Nós, guerrilheiros,
sempre estamos atentos para que a luta no Brasil, a luta de qualquer
país seja nossa luta. Essa experiência que estamos adquirindo com a
mesa de diálogo e outras experiências que possam surgir, queremos
compartilhar com outros países, como Brasil, com os companheiros que
ousam e que combatem a cada dia procurando melhorar o país.

E no nosso coração fica a palavra de ordem:

Contra o imperialismo, pela pátria; contra a oligarquia, pelo povo:
somos as FARC - Exército do Povo, até a vitória final!.

Entrevista exclusiva ao Imprensa Popular (jornal do Partido Comunista
Brasileiro)