Uma
alegria estar em Cuba, disse o destacado intelectual brasileiro e
teólogo da libertação ao comentar a visita do Papa Francisco
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por
Juana Carrasco
19
de Setembro de 2015
Para
mim é uma alegria estar em Cuba por ocasião da visita do Papa
Francisco; com esta categórica frase iniciou o reconhecido teólogo
da libertação e intelectual brasileiro Frei Betto seu encontro com
dezenas de jornalistas nacionais e estrangeiros na Sala de Imprensa
instalada no Hotel Nacional de Havana para o importante evento.
Poucos
países da América latina tiveram a oportunidade de receber a visita
de três Papas em tão breve espaço de tempo, os três últimos, e
isto desperta ciúmes de alguns países com maior população
católica, assegurou, fazendo referência a que só o Brasil é a
outra nação que teve esta honra, significando a importância que se
concede a um país de grande religiosidade como a maior das Antilhas,
«ainda que não é um país predominantemente católico».
Mais
adiante catalogaria esta visita como um «presente ao povo de Cuba»,
como também é um presente ao povo estadunidense a visita que
realizará a esse país de 22 a 28 de setembro. «Uma visita que será
mais complicada», afirmou sobre essa segunda etapa deste giro papal,
porque assinalou que «estão em processo eleitoral».
Frei
Betto assinalou em suas breves palavras introdutórias da rodada de
imprensa, na qual foi «assediado» por numerosas perguntas, que
Francisco é um Papa que está fazendo uma revolução dentro da
Igreja Católica, continuando o que fez em seu momento João XXIII, e
mencionou a encíclica Louvado seja o Senhor, onde abordou com
profundidade os problemas meioambientais, suas causas, e como a
deterioração do habitat humano afeta com peso maior aos mais pobres
deste mundo.
Impacta
sua aproximação com os pobres, assegurou Frei Betto sobre o Sumo
Pontífice, porque «tem a fé de Jesus».
Em
resposta a uma primeira pergunta, indagatória que o levou a seu
livro Fidel e a Religião, o destacado intelectual relembrou
que em abril deste ano esteve também na Ilha para o 30º aniversário
da entrevista que fizera em 1985 com o Líder da Revolução. Cuba,
afirmou, um país com 11 milhões de habitantes, publicou uma edição
de 1 300 000 [um milhão e trezentos mil!-n.t.] exemplares,
para dar a entender o interesse do tema entre os cubanos, «um povo
muito religioso, não propriamente católico», o que disse, se
parece com a Bahia, no Brasil, onde há uma mistura de catolicismo
com religiões de origem africana.
Ressaltou
que efetivamente houve desavenças entre a Revolução e a Igreja
Católica nos primeiros anos depois do triunfo de 1959, porém não
com as igrejas cristãs. Aludiu a que poucos relembram que na Sierra
Maestra houve um sacerdote católico, o padre Sardiñas, quem foi
Comandante da Revolução, e o Papa lhe autorizou a utilizar uma
batina verde-oliva.
Frei
Betto assinalou que no início da Revolução muitos católicos se
opuseram às mudanças em Cuba e que um padre levou 14.000 crianças
para os Estados Unidos «porque disse que aqui iria se quitar a
pátria potestade», em alusão ao que se conheceu historicamente
como a Operação Peter Pan.
O
livro Fidel e a Religião extirpou o mito e os preconceitos de
católicos e comunistas, pontualizou, ao tempo em que nessa
característica sua de exemplificar com fatos e anedotas, disse que a
festa de São Lázaro, a mais massiva manifestação religiosa em
Havana, que é o 17 de dezembro, coincidiu com o dia do anúncio
pelos Presidentes Raúl e Obama do propósito de restabelecer as
relações, o que considerou «um milagre de São Lázaro», e o dia
do aniversário do Papa Francisco.
Frei
Betto recordou seu primeiro encontro com Fidel em Nicarágua e suas
perguntas de então e as reflexões do Comandante. O Estado e o
Partido Comunista de Cuba destacaram mais tarde sua condição de
laicos, relembrou.
O
Papa e a nova esquerda latino-americana
Teria
que perguntar
ao Papa Francisco sua opinião sobre as esquerdas latino-americanas,
assim começou sua resposta sobre o particular e refletiu que há
muitos Governos progressistas ou da nova esquerda, «e a que conheço
está muito feliz com o Papa Francisco» por sua opção pelos pobres
e sua denúncia das causas das injustiças e não só dos efeitos.
Nenhum
Papa foi tão contundente como Francisco em sua encíclica Laudato
Si, onde afirma que o preço mais pesado da degradação
ecológica é pago pelos pobres, reiterou.
Em
relação à posição do Sumo Pontífice quanto ao bloqueio dos
Estados Unidos contra Cuba e o processo de relações de ambas as
nações, assegurou Frei Betto que «fez demasiado como estadista»,
em forma discreta e com muita habilidade.
Há
um reconhecimento do Papa Francisco à soberania e a independência
de Cuba pelo fato de vir primeiro a Cuba e depois aos Estados Unidos,
assegurou, relembrando que quando da visita de Benedito XVI houve
muita pressão por parte do então presidente Bush para que não
viesse e em seguida que condenasse a Revolução, e o Papa «esteve
cinco dias aqui e reconheceu os valores e conquistas da Revolução».
Agora
vem Francisco, disse, num momento em que Obama reconheceu o fracasso
do bloqueio, num discurso que, destacou, ele compara com o do
ex-presidente estadunidense que reconheceu a derrota no Vietnã.
«Este
povo, heroicamente, resistiu ao bloqueio», reafirmou Frei Betto, e
acrescentou que esse bloqueio foi condenado pelos bispos cubanos e
pelos Papas João Paulo II e Benedito XVI e agora tem feito
Francisco.
Fazendo
referência ao encontro que manteve com Fidel no último abril e o
refletido com ele, afirmou que Obama mudou seus métodos, ainda tem
que mudar seus objetivos. Tem que extinguir o bloqueio e devolver
Guantánamo. Por que o Papa Francisco vai a Holguín?, se perguntou
Frei Betto, por causa da sua proximidade com a Base Naval de
Guantánamo, «há que observar seu discurso ali», alertou.
Relembrou
as palavras de João Paulo II quando disse aqui «Eu espero que Cuba
se abra ao mundo e o mundo se abra a Cuba», e isso tem sucedido,
considerou.
Abordou
também a postura do Papa Francisco sobre a Teologia da Libertação,
sobre a qual, disse, outros Papas fizeram advertências, porém nunca
foi condenada. Agora estamos em luz verde, utilizando uma analogia
com as luzes do trânsito para caracterizar a atualidade acerca do
apoio da Teologia da Libertação à luta das comunidades por seus
direitos.
«O
Papa está no caminho de Jesus», destacou, e relembrava que aqueles
que seguem essa posição junto aos mais pobres somos filhos de um
prisioneiro político, de quem esteve preso, foi torturado e
condenado a morrer numa cruz por isso, e não morreu de uma queda de
um camelo numa esquina de Jerusalém, ironizou Frei Betto para
significar qual é o caminho de Jesus. A Igreja tem o papel de
preservar os verdadeiros valores e direitos humanos.
Acerca
do que pode ocorrer em Cuba com o restabelecimento das relações
diplomáticas com os Estados Unidos, disse que não tinha uma bola de
cristal, porém que, com a chegada de tanto turista, haveria um
choque entre o tsunami consumista e os valores da austeridade cubana,
destacando que muitos americanos querem comprar tudo e querem viajar
pelo mundo sem sair dos Estados Unidos, com seus hotéis e lojas em
cada esquina.
Afirmou
Frei Betto que o cubano é um «povo que desenvolveu valores
evangélicos, que são valores humanos; a solidariedade, compartilhar
os bens», e agradeceu a Deus que seus dois líderes históricos
estejam vivos até hoje. Fez referência especial às boas relações
de ambos com a Igreja e ao que chamou a admiração recíproca entre
o Cardeal Jaime Ortega e o Presidente Raúl Castro.
«Um
povo, destacou Frei Betto, que tem orgulho de defender sua Revolução
e seus valores», reafirmou, ao mesmo tempo em que advertia seu
desejo de «que este consumismo não danifique a austeridade cubana».
Como
epílogo de suas respostas à imprensa, se referiu a uma das
atividades do Papa Francisco neste giro por Cuba e Estados Unidos: o
Congresso da Família na Filadélfia.
Também
afirmou que há fronteiras físicas e virtuais, fronteiras da
segregação e da discriminação que se veem na África, por
exemplo, e provocam a imigração; e em referência a nosso país
certificou que não foi Cuba que dividiu a família, mas sim a
hostilidade permanente dos Estados Unidos e o bloqueio.
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Tradução
de Joaquim Lisboa Neto