"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


sábado, 21 de fevereiro de 2009

Desde a margem da independência

"O exercício da profissão me lançou há uns anos a este tema das pessoas que estão em poder da guerrilha, dos guerrilheiros que estão presos e desejava terminar uma espécie de, talvez soe meio pretensioso, uma espécie de retrospectiva sobre o assunto".

JEBotero.

”O que fiz, o fiz pensando em salvar a operação de liberação das pessoas que estavam ali”, assim responde jornalista colombiano Jorge Enrique Botero, testemunha e protagonista da entrega na selva de três militares e um policial, esclarecendo por que comunicou ao mundo o que seus olhos presenciavam sobre o processo que Colombianos e Colombianas pela Paz impulsionaram da mão de Piedad Córdoba para tirar do cativeiro os retidos pelas FARC.

Botero, intérprete deste ofício conhecido como jornalismo, compromisso e identidade frente a anos de conflito na Colômbia, considerou em entrevista exclusiva ao site da teleSUR, que fez "uma grande contribuição permitindo que o mundo conhecesse o que estava se passando ali na selva, para que isto tivesse um final feliz". Insiste em que "atuou com responsabilidade frente a um feito que estava a ponto de naufragar".As palavras de Jorge Enrique Botero desse 1º de fevereiro deram a volta ao mundo, mas o som dos aviões colombianos sobre a zona de resgate bordearam um caminho marcado pela convicção de um grupo de colombianos que clamam pela saída pacífica aos anos de conflito desta nação do sul e que assumiram como bandeira o diálogo epistolar com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia.
Nesse 1º de fevereiro o processo de liberação se viu ameaçado pelo descumprimento de uma promessa governamental. Mas uma câmera, com uns quantos anos de uso, rompeu com o que pôde ser o silêncio frente a um processo de liberação com um só beneficiário, o povo colombiano.
O enfrentamento do governo colombiano com aqueles que exercem o jornalismo neste país demonstra bem.
Para o jornalista colombiano o mais grave deste enfrentamento e das declarações que o Governo central emite é que isso se produz em um país onde "muitas pessoas entendem essas palavras como uma ordem para atuar. Então aí é onde vem o grande risco, não só para o exercício da liberdade de imprensa, mas para a vida daqueles que foram acusados".
A Fundação para Liberdade de Imprensa na Colômbia resenha no seu site que em 2008 pelo menos 180 jornalistas foram vítimas de degradação, obstrução ao trabalho jornalístico, atentado contra infra-estrutura, exílio e ferimentos em serviço.
Ante este palco Jorge Enrique Botero cota que "o jornalismo colombiano vive momentos muito difíceis. Por uma parte está o perigo que cerca os jornalistas constantemente, principalmente aos que estão exercendo sua profissão de maneira independente e por sérias ameaças que vêm desde a alta cúpula do governo, desde o próprio Presidente".
"O presidente Uribe alardeia que durante seu governo se diminuiu o número de assassinatos de jornalistas, mas o mesmo dia que alardeia disso pendura uma lápide no pescoço de três jornalistas, que acusa de ser propagandistas do terrorismo, cúmplices da guerrilha, então isso cria um clima muito difícil para o exercício da profissão", adverte Botero.Acrescenta que o outro problema que vive o jornalismo colombiano é que há uma concentração de poder midiático em pouquíssimas mãos e essa concentração está ao serviço de um projeto político "que é o projeto da guerra, o projeto de descartar uma solução política a 50 anos de guerra, são 50 anos de guerra que não resolvemos pela via militar, nem introduzindo milhões de dólares".

E daí acontece que um jornalista rompe o cerco e cumpre seu dever de contar. Desde o Governo colombiano o tema do papel dos comunicadores se reavivou depois da conversação que Botero sustentou com esta corrente multiestatal, teleSUR, nesse 1º de fevereiro. O Executivo questiona se os jornalistas devem assumir uma posição, de se o contato com grupos ou indivíduos à margem da lei transforma os repórteres nos seus cúmplices e se deve ou não entrevistar seqüestrados quando estão em mãos de seus captores.
Uribe disse que "uma coisa são aqueles amigos do terrorismo que agem como jornalistas, e outra coisa são os jornalistas". Consultado sobre esta postura Jorge Enrique Botero considerou que "seria preciso perguntar-lhe ao Governo em que consiste a suposta ação de propagandear o terrorismo, mas é curioso que para eles ser propagandista do terrorismo seja, por exemplo, entrevistar a um guerrilheiro".
Neste sentido, considerou importante que frente à postura do Executivo se faça um debate "ético" sobre o tema da profissão e as fontes.
"Se estamos em um conflito e há duas partes por que vai ser transgressão o fato de entrevistar uma das partes?".
As tradicionais normas do jornalismo falam da contrastação e verificação de fontes. Do espaço para que os setores envolvidos apresentem seus argumentos, na Colômbia, sob o sistema atual, esta teoria jornalística pode inclusive fazer ao comunicador parte "do cartaz intelectual das FARC" tal e como o advertiu o presidente Álvaro Uribe referindo-se a que em um país que vive entre autodefesas, guerrilhas, cartazes e uma política de segurança democrática, entrevistam os atores do conflito armado.
Botero, que não se sente aludido e considera que as declarações do primeiro governante são "desafortunadas" por "estigmatizar as pessoas que pensam diferente", esclarece que "um bloco intelectual é o que diz ele (Uribe), aludindo que as FARC tem blocos: Bloco Sul, Bloco Caribe, Bloco Oriente, então ele diz Bloco Intelectual".
A polêmica deixa descobertas as dificuldades que devem enfrentar diariamente os jornalistas em um país que vive um conflito armado e com uma crescente polarização política. As garantias para que exerçam este trabalho fica em letra morta, papel queimado quando os ataques e violações aos direitos partem desde o próprio Executivo.
Quando um jornalista é detido e pela via da força se pretende tomar o produto de horas de trabalho em que lugar fica o livre exercício do jornalismo? Sobre este tema Botero apresenta o exemplo do também jornalista colombiano Hollman Morris.
"Por exemplo, Hollman foi detido umas horas antes de chegar em Bogotá, tentaram remover o seu material. Há assédios, intimidações permanentes, por tanto eu diria que há umas garantias no papel, muitas garantias para aqueles que estão na linha oficial e muito poucas para aqueles que exercem o jornalismo desde a margem da independência".
Não há partes. Não há conflito. Essa é a bandeira avançada do governo colombiano apesar de que a realidade se movimente "desde a margem da independência".
"Nós jornalistas temos que nos movimentar não na imaginação mas sobre a realidade. Por que só pode sair uma parte? Isso é um debate ético que eu acho que é preciso acontecer. Acho que a chegada de teleSUR ao ar nas suas versões de televisão e nas suas versões de internet é o que pôs novamente na mesa a discussão do tema da ética e das fontes", diz Botero.
O jornalista considera que "teleSUR apelou a outras fontes, não somente no caso da Colômbia, teleSUR deu a voz e a palavra a gente que nunca a teve e isso é o que tem incomodado certos setores e faz com que seja pertinente hoje em dia renovar o debate da ética do jornalismo, um jornalismo capaz de equilibrar a informação e de dar-lhe a palavra e de permitir que todas as fontes tenham espaço nos microfones, nas câmeras, nas páginas dos jornais".
Este autor do "O homem de Ferro", "Últimas Notícias da Guerra" e "Espera-me no Céu, Capitão", livros premiados internacionalmente, diz sentir-se "meio condenado" nesta etapa de sua vida a seguir certos temas.
"O exercício da profissão me lançou há uns anos a este tema das pessoas que estão em poder da guerrilha, dos guerrilheiros que estão presos e desejava terminar uma espécie de, talvez soe meio pretensioso, uma espécie de retrospectiva sobre o assunto".
Pensa que "isso se fechará como círculo vital" para sua vida e profissão. "O dia em que sair a última pessoa que está em cativeiro e acontecer o intercâmbio entre as partes, já aí será o dia em que me dedique exclusivamente ao tema do futebol porque a farândula não me atrai muito".
Este homem de figura magra e olhar profundo cria e compartilha o seu dom da palavra. Seu desejo insaciável por contar faz com que neste momento espere pela publicação nos Estados Unidos de um livro titulado "Into the Jungle" escrito com duas colegas norte-americanas e que aborda o tema do cativeiro dos três norte-americanos que estiveram em poder das FARC quase seis anos e que foram libertados na Operação Xeque.
Botero trabalha em um livro sobre as guerrilheiras presas na prisão do Bom Pastor em Bogotá. Sobre este novo livro assinala que está há três anos trabalhando com as guerrilheiras e que "foi uma experiência jornalística maravilhosa porque quase que o estamos escrevendo a cem mãos, acho que muito dificilmente é possível que um encontre histórias de vida tão cheias de ação e de situações extraordinárias e extremas".
Botero como jornalista cria, gera, contribui, não reduz. Indaga e chega a fundo para falar e escrever com a segurança que dá a certeza do conhecido. E lhe pede a Uribe que "retire suas palavras, que primeiro se de conta da desafortunadas que foram suas palavras, não só pelas ameaças que pendem sobre minha vida com mais força que antes, mas porque esse não é clima que um deve criar e menos um Presidente, não pode criar esse clima de estigmatização, de assinalamentos".
"Me parece que há um grande dano à liberdade de expressão, à liberdade de imprensa e um grande dano também ao prestígio de nosso ofício, ao jornalismo há um grande dano, e lhe diria que é muito irônico que ele fale de shows midiáticos quando o governo propiciou um verdadeiro festival midiático, quando sucedeu a Operação Xeque, que o governo propiciou um show midiático com a violação destes quatro membros da polícia levando-os à Casa de Nariño, então que se ponha de acordo que ele não pode estar criticando a outros o que ele faz em abundância".
Por: Yeimy Ramirezsite da teleSUR
19 de fevereiro de 2009

FONTE: http://www.telesurtv.net/noticias/afondo/especiales/entrevista_botero/#