Operação Europa: espionagem internacional do governo colombiano
Hernando Calvo Ospina
Rebelião
O Departamento Administrativo de Segurança, DAS, é uma agência de investigações que se reporta diretamente ao presidente da Colômbia.
Cerca de cinco anos atrás, alguns importantes meios de comunicação colombianos começaram a contar o que já se sabia entre as organizações de direitos humanos: os seus altos cargos encomendavam a chefes paramilitares o assassinato de opositores políticos (1).
Entre outros, foi publicado que um desses funcionários testemunhou perante a justiça dos EUA e da Venezuela, reconhecendo que muitas operações de "guerra suja" conduzida pelo DAS tinham sido financiadas com dinheiro proveniente do tráfico de cocaína (2).
Apesar de sua gravidade, estas informações foram ficando como tantas outras no panorama jurídico nacional.
Paralelamente ia-se conhecendo que, desde a sede da presidência, ordenara-se a espionagem ilegal de defensores dos direitos humanos, opositores políticos e jornalistas "classificados" de esquerda. Como talvez essas pessoas "colaboraram" com os “terroristas" da guerrilha, esses procedimentos continuaram sendo tratados como simples notícias. O sentimento começou a mudar ao se informar a espionagem de magistrados da Corte Suprema de Justiça e de dirigentes dos partidos tradicionais (3).
O clima foi esquentando quando se ordenou investigar a funcionários do DAS. Seu chefe supremo, o presidente da república, saiu na defesa destes e até se ofereceu para colocar as mãos no fogo por eles por ter certeza de sua inocência. Pouco depois, alguns foram enviados para a prisão. Então, o presidente Álvaro Uribe Vélez, disse que isso apenas servia á "estratégia desestabilizadora" dos "terroristas". Estas frases, constantemente repetidas, funcionaram como uma chantagem ameaçadora.
Até que, em 15 de abril, o popular diretor de jornalismo de RCN-Rádio, Juan Gossain, leu trechos de algumas páginas a que teve acesso e que faziam parte das encontradas pelo Corpo Técnico de Investigação, CTI, da Procuradoria-Geral da Nação durante uma incursão no DAS. Nelas comprovava-se que, desde 2005, preparou-se toda uma estratégia que ia desde a espionagem, desprestigio de opositores e ONGs, até o planejamento de atentados terroristas para depois culpar às organizações guerrilheiras.
Toda a essa informação estava contida em pastas classificadas como operações "Amazônia", "Transmilênio", "Bahia", "Halloween", "Arauca", "Intercâmbio”, Risaralda, "Internet" e "Europa".
Estes são alguns exemplos de seu conteúdo. "Desinformar a população que é a favor dos detratores do governo". "Gerar a divisão no seio dos movimentos de oposição. Impedir a materialização de cenários convocados pela oposição". “Neutralizar as ações desestabilizadoras das ONGs na Colômbia e no mundo". “Estratégias: descrédito e sabotagem. Ação: aliança com Serviços de Inteligência estrangeiros, comunicados e denuncias em páginas web, guerra jurídica". “Sabotagem: terrorismo, explosivos, incendiários, serviço público, tecnológico. Pressão: ameaças e chantagem". O jornalista, depois de ler isso, ensandecido disse: "Os colombianos temos o direito de saber quem foi que tentou transformar nosso país num Estado de policiais e de terroristas do Estado (...) Quem foi quem concebeu o plano macabro de perseguir adversários, reais ou imaginários, como se fossem criminosos? Quem está por trás disto? "Três detetives do DAS? Não me façam rir! (...) Queremos saber se o DAS é uma instituição respeitável do Estado ou é um covil de bandidos. Somente bandidos fazem isto: perseguir os outros, plantar bombas para culpar a oposição (...)”,(4).
"A Operação Europa"
Em 20 de abril, RCN-TV foi a que apresentou um resumo do conteúdo da pasta intitulada "Europa" (5), confirmando que as atividades da DAS ultrapassou as fronteiras, conforme tinha sido denunciado (6).
Foi dito na noticiário: "Os seguimentos, aparentemente ilegais, que o DAS realizou no estrangeiro contra aqueles que o governo considerava como inimigos ou opositores do governo, foram rotulados em uma pasta nomeada “Europa” (...) A Operação Europa teve como objetivo "neutralizar a influência do sistema jurídico europeu, Comissão de Direitos Humanos do Parlamento Europeu, Gabinete do Comissário para os Direitos Humanos das Nações Unidas e governos nacionais. "A única estratégia foi: o descrédito de tais entidades; e a ação: criar comunicados e denuncias em sites da internet e promover uma guerra jurídica contra essas entidades.
"A estratégia também incluiu viagens aos países onde foram realizados seminários, fóruns e workshops organizados por diversas ONGs, e sobre os quais foram elaborados relatórios confidenciais com suas respectivas conclusões, e um álbum fotográfico e clínico daqueles que participaram. (7)
RCN-TV também disse: "Nos arquivos recuperados pelo CTI no DAS incluem, por exemplo, cópias dos passaportes e dos históricos de vida de cidadãos europeus, centroamericanos e sulamericanos que visitaram a Colômbia, ou que estiveram em tais eventos.
"Segundo o dossiê, o DAS enviou à Europa seu funcionário Germán Villalba, que praticamente instalou uma filial em várias capitais do continente a partir dos quais dirigiu um grupo que fazia seguimentos, que incluíam gravações de áudio e vídeo, fotografias e registro dos itinerários dos chamados “alvos”, na sua maioria colombianos residentes na Europa ou que visitaram países como Suíça, França e Espanha, e que DAS rotulou como "opositores do atual governo colombiano", "agitadores contra Uribe em turnê". A partir da Europa, Germán Villalba enviava, via Internet, aos seus superiores em Bogotá, toda a informação compilada para ser arquivada na pasta como "Europa" (...).
"Uma pasta rotulada como ‘Parlamento Europeu’ chamou a atenção dos investigadores. Nela aparecem nomes de parlamentares europeus simpatizantes do governo colombiano e dos não-simpatizantes (...)".
Cesar Julio Valencia, presidente da Tribunal Civil da Corte Suprema de Justiça, após ouvir as declarações de alguns funcionários do DAS diante do Ministério Público, disse a RCN-TV que se sentia "horrorizado" ao constatar que a sede Presidencial "não somente era a destinatária dos seguimentos e interceptações ilegais, mas também dirigia, direcionava ou manipulava tais seguimentos ou escutas, como são chamados".
O presidente Álvaro Uribe Vélez limitou-se a disser que não sabia de nada.
A pergunta que deve ser feita é: o que as autoridades dos países europeus envolvidos sabem sobre isto?
Notas:
(1) O DAS e os paramilitares.
http://www.semana.com/noticias-portada/das-paras /91397.aspx
(2) Garcia, "ventilador" do DAS, declarará na Venezuela e nos EUA.
http://www.semana.com/noticias-justicia/garcia-ventilador-del-das-declarara-venezuela-eeuu/117785.aspx
(3) A DAS continua espionando.
http://www.semana.com/noticias-nacion/das-sigue-grabando/120991.aspx
Escândalo por denuncia da revista Semana devido a novos grampos do DAS.
http://www.semana.com/noticias-seguridad/escandalo-queixa-semana-em-new-chuzadas-desde-das/121052.aspx
(4) Editorial de Juan Gossain. Sobre os grampos do DAS.
http://www.rcnradio.com/node/22 862
(5) O dossiê dos grampos: Capítulo Europa.
http://www.canalrcnmsn.com/noticias/el_dossier_de_las_chuzadas_cap%C3%ADtulo_europa
(6) A trinca que conspira.
http://hcalvospina.free.fr/spip.php? article184
(7) Como “álbum clínico”, a Agência Central de Inteligência dos EUA, CIA, denomina o Estudo Psiquiátrico Pessoal (Psychiatric Personality Study, PPS), desde os anos cinquênta daqueles considerados "inimigos". Nele são incluídas as pesquisas de psicólogos, psiquiatras, jornalistas, etc, sobre a suposta personalidade e comportamento do investigado desde a infância, incluindo possíveis doenças e até preferências sexuais. Os "estudos" são feitos a partir da análise das palestras, trabalhos escritos e outras atividades realizadas pelo investigado. Uma extensão do tema em: Gordon Thomas. "As armas secretas da CIA". Ediciones B. Barcelona, 2007.
* Hernando Calvo Ospina. escritor e jornalista colombiano que reside na França. Colaborador do Le Monde Diplomatique. http://hcalvospina.free.fr/