Processo
de paz sob tensão: FARC denunciam manobra jurídica para
desfavorecer guerrilha
Por
Marcela Belchior, de Adital.
A Delegação de Paz das
Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exército do Povo
(FARC-EP) está sendo dura ao criticar uma suposta manobra jurídica
da Corte Constitucional do processo de paz. Em comunicado público, a
guerrilha mais importante em atividade no país denuncia o que seriam
"expedientes estranhos” à Mesa de Diálogo, novos elementos
incorporados ao processo, sendo considerados e aprovados como
instrumentos jurídicos da reconciliação nacional, sem passar pelo
crivo do grupo guerrilheiro.
O grupo armado refere-se ao marco jurídico para a
paz e a justiça transicional (Ato Legislativo 1º, de 2012) e sua
relativa sentença sobre participação política. Estes acrescentam
à Constituição da Colômbia dois artigos que estabelecem que "uma
lei estatutária poderá autorizar que, no marco de um processo de
paz, se dê um tratamento diferenciado para os distintos grupos
armados à margem da lei, que tenham sido parte do conflito interno e
também para os agentes do Estado”.Teoricamente, a negociação busca comum acordo entre as partes. Para a guerrilha, porém, tal movimento revela iniciativas unilaterais, que passariam por cima do procedimento de diálogo. Para as FARC, isso é motivo de alerta, uma vez que ignora o Acordo Geral e sua agenda, a realidade histórica do conflito armado interno, desconsidera a responsabilidade criminal do Estado da Colômbia e limita os direitos dos rebeldes à participação política.
"Desde o princípio dos diálogos, entendemos que nos encontramos em pé de igualdade frente ao Acordo Geral mencionado. Nenhuma das partes pode revogar direitos exclusivos para definir unilateralmente temas que não têm sido abordados na mesa de conversações”, argumenta as FARC. "Muito menos tomar para si atribuições que, antecipadamente e sem consulta, possam conduzir à aplicação de políticas ou fórmulas jurídicas que, por sua natureza, possa convertê-los em parte e juiz”, complementa guerrilha.
As FARC entendem que tal consideração dá margem para afastar qualquer responsabilidade do Estado no conflito armado e tratar como autores apenas os chamados Grupos Armados Organizados à Margem da Lei (GAOML). "Sabem os juristas que, em certas ocasiões, sob pretexto de enriquecer a ciência do Direito, que não é uma ciência exata, são formuladas falsidades para torná-las premissas verdadeiras a fim de poderem satisfazer situações concretas”, avalia a guerrilha.
As FARC participam da Mesa de Diálogo com o governo federal colombiano, que se estabelece desde o fim de 2012, em Havana, capital da Cuba. Eles discutem os termos do "Acordo geral para o fim do conflito e a construção de uma paz estável e duradoura”, para começar a superar, após cerca de 60 anos, o conflito armado em território colombiano.
"Rechaçamos, uma vez mais, o emaranhado jurídico que vem sendo semeado nos campos de paz, com o desejo de fazer dos diálogos de Havana um mecanismo inútil. Desconhecemos o Ato Legislativo 1º, de 2012, (...) porque não foi consensual”, afirmam as FARC. "Nada está acordado até que tudo esteja acordado”, assevera a guerrilha.
Debate sobre vítimas
No momento, o ciclo de negociação debate sobre as vítimas do conflito, tendo a guerrilha destacado a necessidade de um esforço da Promotoria para reparar as vítimas por uma década. As FARC garantem colaborar para assumirem suas responsabilidades nesse quesito.