As FARC opinam sobre o debate ao tema das vítimas do conflito em La Habana
La
Habana, Cuba, sede dos diálogos de Paz. Agosto de 2014
COMUNICADO
Uma
vez celebrados os Fóruns Nacionais sobre Vítimas e divulgado o
ocorrido nestes, a Delegação de Paz das FARC-EP quer manifestar sua
preocupação pela ideia que está se transmitindo à opinião
pública e à sociedade colombiana, através de diferentes
instituições do Estado e dos meios de comunicação, sobre a
realidade das vítimas provocadas durante os mais de 65 anos que já
dura o atual conflito colombiano.
Omitindo
manifestar os critérios que sobre vitimização em Colômbia temos
as FARC-EP, pomos de manifesto os seguintes fatos objetivos que
entendemos são compartilhados por qualquer observador rigoroso da
realidade colombiana e que deveriam ambientar qualquer debate sobre
as vítimas do conflito:
- O atual conflito colombiano é anterior à existência das organizações guerrilheiras, FARC-EP e ELN. A geração de vítimas no conflito é, portanto, anterior à existência das organizações que atualmente conversam com o governo nacional sobre o fim do conflito.
- No caso concreto das FARC-EP, esta organização é constituída em suas origens por campesinos vítimas da violência realizada no campo colombiano a partir dos anos 40 do século passado.
- As estatísticas e estudos mais rigorosos sobre vitimização em Colômbia põem de manifesto o perfil das vítimas, os fatos vitimizantes padecidos e os agentes de vitimização. Qualquer discussão sobre vítimas que tente ignorar a dita realidade, entendemos que não se corresponderia com a realidade das vítimas em nosso país.
- As principais instituições que elaboraram as anteriores estatísticas e estudos sobre vítimas, de forma continuada no tempo e rigorosa atendendo a metodologias de investigação em ciências sociais pacificamente aceitadas pela comunidade acadêmica internacional são: a base de dados do CINEP “Noite e Névoa”, os informes sobre violações de direitos humanos em Colômbia publicados anualmente pelo Escritório em Colômbia do Alto Comissionado para os Direitos Humanos das NNUU, e as bases de dados do Grupo de Memória Histórica.
- As anteriores bases de dados e Informes coincidem em termos gerais nas porcentagens de agentes vitimários e fatos vitimizantes, sendo a realidade descrita a seguinte: 75% das violações aos direitos humanos e ao DIH que causaram vítimas em Colômbia são atribuíveis a agentes paramilitares e agentes do Estado. Aproximadamente 45% das violações são atribuíveis a grupos paramilitares e 30% são atribuíveis a agentes do Estado, fundamentalmente forças militares e de polícia. Com relação aos restantes 25%, aproximadamente 17% são imputáveis às organizações guerrilheiras e os 8% restantes se imputam a agentes não identificados, narcotraficantes e organizações de delinquentes comuns.
Pelo acima exposto, os critérios que devem presidir a seleção e escolha das vítimas que acorram à Mesa de Conversações de Havana para expor o relativo a sua vitimização devem refletir fielmente a realidade das vítimas em Colômbia, e, portanto, deve recolher na medida do possível a realidade descrita nos anteriores estudos, informes e estatísticas. Qualquer composição que difira do anterior responderia a critérios de convivência política das partes, porém em absoluto responderiam à realidade que sobre vitimização tem padecido a sociedade colombiana.
As FARC-EP fazemos nossa a definição de vítimas estabelecida nos pontos 8 e 9 da Resolução 60/147 da Assembleia Geral das NNUU datada de 16 de dezembro de 2005:
“8.
Aos efeitos do presente documento, se entenderá por vítima a toda
pessoa que tenha sofrido danos, individual ou coletivamente,
incluídas lesões físicas ou mentais, sofrimento emocional, perdas
econômicas ou menosprezo substancial de seus direitos fundamentais,
como consequência de ações ou omissões que constituam uma
violação manifesta das normas internacionais de direitos humanos ou
uma violação grave do direito internacional humanitário. Quando
corresponda, e em conformidade com o direito interno, o termo
“vítima” também compreenderá a família imediata ou as pessoas
a cargo da vítima direta e as pessoas que tenham sofrido danos ao
intervir para prestar assistência a vítimas em perigo ou para
impedir a vitimização.
9. Uma
pessoa será considerada vítima com independência de se o autor da
violação foi identificado, apreendido, julgado ou condenado e da
relação familiar que possa existir entre o autor e a vítima.”
As
FARC-EP não acreditamos adequado construir um marco de debate sobre
a realidade das vítimas do conflito colombiano que ignore o
anteriormente exposto, ou que evite aceitar as definições sobre
vítimas formuladas pela comunidade internacional, e admitidas
unanimemente pela comunidade jurídica internacional.
Por
isso, entendemos que a metodologia de participação das vítimas na
Mesa de Havana deve definir-se atendendo aos critérios que sobre
fatos vitimizantes são aceitados pelas organizações de direitos
humanos, organizações internacionais e a comunidade jurídica
internacional, evitando assim qualquer manipulação ou politização
das vítimas.
Cremos
que vem sendo urgente levar à prática os critérios de seleção de
vítimas estabelecidos no comunicado conjunto nº 39 datado de 17 de
julho de 2014 adotado na Mesa de Conversações, com a finalidade de
não demorar a recepção de vítimas em Havana. Compreendemos a
demora que as instituições encarregadas da seleção de vítimas
estão tendo no processo de seleção conforme aos critérios
estabelecidos no citado comunicado conjunto nº 39, e pedimos que se
concretize com o objetivo de que a Mesa possa abordar o relativo ao
último dos critérios estabelecidos pelas partes, isto é: “A Mesa
revisará o funcionamento do mecanismo de seleção em cada uma das
visitas e fará as recomendações que sejam necessárias”.
Pelo
anterior, entendemos que qualquer metodologia de seleção das
vítimas que devem ser recebidas em Havana deve responder, como
manifestamos desde o início deste processo, aos seguintes critérios:
- Vítimas provocadas por agentes não combatentes: causadas por agentes políticos, econômicos e sociais: Vítimas de abuso de poder. Vítimas provocadas em processos de vitimização coletiva a territórios e comunidades. Mega projetos.
• Vítimas
de violações ao DIH: utilização de substâncias químicas como o
glifosato, homicídios de combatentes por fora de combate, uso
abusivo da força, artefatos explosivos e minas, ataques a população
civil, violência sexual como arma de guerra, massacres, recrutamento
forçado e de menores de quinze anos.
- Vítimas de violações aos Direitos Humanos: tortura, desaparecimentos forçados, privações de liberdade de civis; perseguição política, sindical, a dirigentes sociais e a defensores dos ddhh, genocídio político, execuções extrajudiciais, assassinatos seletivos, detenções arbitrárias.
• Vítimas
do deslocamento forçado e no exílio.
• Combatentes
afetados pelo conflito: prisioneiros de guerra em poder de ambos os
contendores; violações aos diretos dos combatentes fora de combate.
Danos provocados aos combatentes por infrações do DIH.
Delegação
de Paz das FARC-EP