Honduras: destituição desencadeia crise política
A confrontação entre o presidente de Honduras, Manuel Zelaya, e o Congresso e a Corte Suprema do país em torno da destituição do chefe do Estado Maior das Forças Armadas abriu grave crise política em meio a acusações do governo de que seus oponentes prepararam um golpe de Estado.
Ontem, a Corte Suprema do país centro-americano considerou "ilegal" a destituição do chefe do Estado Maior das Forças Armadas, general Romeo Vásquez, determinada no dia anterior por Zelaya. A decisão também foi revertida pelo Congresso, com apoio do divido Partido Liberal, do presidente.
O presidente reiterou que manterá a demissão. A pedido de Zelaya, o Conselho Permanente da OEA (Organização dos Estados Americanos) tratará o tema em reunião hoje.
O pano de fundo do choque entre os Poderes em Honduras é a determinação de Zelaya de realizar uma pesquisa de opinião nacional que abriria caminho para seu projeto de convocar uma Assembleia Constituinte. A Carta vigente é 1982.
Se a população se disser favorável a uma nova Carta na consulta, o governo incluiria, então, uma "quarta urna" na eleição geral de novembro. Além de elegerem presidente, deputados e prefeitos, os hondurenhos votariam em um referendo sobre a Constituinte.
A Justiça e as autoridades eleitorais disseram que a pesquisa é ilegal. Baseado nessa decisão, o general Romeo Vásquez se recusou a dar apoio logístico à pesquisa, a ser realizada no domingo pelo IBGE local na forma de um referendo não vinculante. Pela recusa, foi destituído por Zelaya.
O presidente diz que a Constituição atual não reflete as necessidades do país, mas seus críticos sugerem que o objetivo do malabarismo jurídico é introduzir a reeleição na Constituição, hoje proibida. Zelaya deixa o cargo em janeiro.
Ontem, ele prometeu levar à frente a consulta e, acompanhado por centenas de apoiadores, entrou em uma instalação da Força Aérea hondurenha para retirar urnas e cédulas da pesquisa. O Ministério Público havia ordenado a apreensão do material.
"Não querem deixar que o povo seja consultado", disse Zelaya, que acusou a Corte Suprema do país de "criar um Estado militar e um Estado civil".
Apoios
Nesta sexta-feira, países-membros da Aliança Bolivariana para so Povos da nossa Américas (Alba) manifestaram seu apoio ao presidente de Honduras e anunciaram que se mobilizarão caso haja tentativa de golpe de Estado. Os países do bloco expressaram, em uma mensagem oficial, seu "mais firme respaldo" ao governo de Zelaya "em suas justas e decididas ações para defender o direito do povo hondurenho a expressar sua vontade soberana e a incentivar um processo de transformação social".
O bloco "declara que se mobilizará, junto ao digno povo hondurenho, diante de qualquer tentativa da oligarquia de romper a ordem constitucional e democrática".
Nesta quinta, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, denunciou a tentativa de golpe e disse que não ficará "de braços cruzados" diante da situação em Honduras.
"Ontem mesmo falei com Evo [Morales, presidente da Bolívia]. Estamos dispostos a fazer o que tiver que fazer para que seja respeitada a soberania e a vontade do povo de Honduras", revelou Chávez.
Do Partido Liberal, Zelaya liderou a adesão de Honduras à Alba (Aliança Bolivariana para as Américas) em 2008. Antes mais ligado à elite econômica do país, ele aproximou-se de sindicatos e do movimento indígena e ganhou simpatia de parte dos 70% de pobres do país ao aumentar em 60% o salário mínimo desde 2006.
Zelaya também recebeu o apoio do ex-presidente cubano, Fidel Castro, que comparou o mandatário hondurenho ao ex-líder chileno Salvado Allende, que morreu em 1973, durante o golpe de Estado que colocou Augusto Pinochet no poder.
"Foi impressionante vê-lo discursando ao povo de Honduras. Denunciava energicamente a agressiva tentativa reacionária de impedir uma importante consulta popular", analisou Fidel em um artigo publicado hoje na imprensa cubana. Leia abaixo a íntegra:
Reflexões do companheiro Fidel
Um gesto que não será esquecido
Faço uma parada no trabalho que estava elaborando há duas semanas sobre um episódio histórico, para me solidarizar com o presidente constitucional de Honduras, José Manuel Zelaya.
Foi impressionante vê-lo pela Telesul, discursando para o povo de Honduras. Denunciava energicamente a grosseira tentativa reacionária de impedir uma importante consulta popular.
Essa é a "democracia" que defende o imperialismo. Zelaya não cometeu a menor violação da lei. Não realizou um ato de força. É o presidente e comandante-geral das Forças Armadas de Honduras. O que ali acontecer será um teste para a OEA e para a atual administração dos Estados Unidos.
Ontem, foi realizada uma reunião da Alba em Maracai, no estado venezuelano de Arágua. Os líderes latino-americanos e caribenhos que ali falaram, brilharam tanto por sua eloquência como por sua dignidade.
Hoje escutava os sólidos argumentos do presidente Hugo Chávez denunciando a ação golpista através da Venezolana de Televisión.
Ignoramos o que acontecerá nesta noite ou amanhã em Honduras, mas a conduta valente de Zelaya passará à história.
Suas palavras nos faziam lembrar o discurso do presidente Salvador Allende enquanto os aviões de guerra bombardeavam o Palácio Presidencial, onde morreu heroicamente em 11 de setembro de 1973.
Desta vez víamos outro presidente latino-americano entrando com o povo numa base aérea para reclamar as cédulas para uma consulta popular, confiscadas espuriamente.
Assim age um presidente e comandante-geral.
O povo de Honduras jamais esquecerá esse gesto!
Fidel Castro Ruz
25 de junho de 2009
(tomado de Vermelho.org.br)