‘2015 vai ser o ano da paz'
Por
Juán Francisco Valbuena G.
Diretor
do semanário 'Voz' diz que prepara um livro com intimidades dos
diálogos.
Carlos Lozano, diretor do semanário de esquerda Voz e um dos homens que mais se aproximou do processo de paz desde seus inícios, dedicou estas últimas semanas a recompilar algumas intimidades dessas primeiras aproximações entre o Governo e as Farc, as quais publicará num livro que virá à luz antes de março.
Carlos Lozano, diretor do semanário de esquerda Voz e um dos homens que mais se aproximou do processo de paz desde seus inícios, dedicou estas últimas semanas a recompilar algumas intimidades dessas primeiras aproximações entre o Governo e as Farc, as quais publicará num livro que virá à luz antes de março.
Em
meio a essas recordações, Lozano reservou um espaço para dialogar
com EL TIEMPO e expor seus pontos de vista sobre o que se poderia
esperar das negociações de Havana neste 2015.
Diz,
por exemplo, que, se se chega ao final do conflito, é claro que as
Farc têm que “deixar as armas” e não podem fazer política com
elas, e que, se neste ano há acordo sobre vítimas, o processo
chegará a um ponto “irreversível”.
Como
vai seu livro sobre os diálogos de Havana?
Bem.
Quero contar algumas coisas que não são conhecidas sobre como foram
as primeiras aproximações e espero publicá-lo antes de março.
Como
vê o momento atual do processo de paz?
Vejo-o
num bom ponto, ainda que todavia não [esteja] no momento da
irreversibilidade. Penso que ainda há que cuidá-lo muito, e,
evidentemente, pedir que tanto o Governo Nacional como a guerrilha
das Farc ponham todo o seu empenho para que continuem construindo o
caminho da paz estável e duradoura. Creio que 2014 nos deixa um bom
saldo com todos os acordos parciais que foram conquistados e que já
são conhecidos, e que estamos num bom ponto para disparar no novo
ano. Há razões para sermos otimistas em que 2015 vai ser o ano da
paz.
Que
tanto afetou a confiança das partes o sequestro do general Alzate e
a suspensão dos diálogos?
Creio
que foi um mal precedente. Foi negativo ter suspenso os diálogos
pela situação trágica do general Alzate. Essa foi uma decisão que
se tomou sob uma enorme pressão da extrema-direita. Esse incidente
tinha que ser resolvido, evidentemente, porém não sobre a base de
pôr em perigo o processo de paz. Isto afetou a confiança e é o que
há que tratar de reconstruir, porém penso que com os resultados do
ano passado há razões para crer que começamos 2015 recobrando essa
confiança perdida.
Este
tipo de incidentes deve ser separado do desenvolvimento dos diálogos?
O
que creio é que chegou o momento da trégua, do cessar-fogo e das
hostilidades bilateral. Creio que as Farc tomaram a iniciativa com o
declaratório de uma trégua unilateral e por tempo indeterminado, o
qual é altamente positivo, porém que vai ter sempre um risco e é
que a contraparte não fez um gesto correspondente e isto faz com que
esse cessar-fogo unilateral seja frágil. Isto salvaria o processo
destes ruídos da guerra.
Há
aqueles que pensam que o proposto pelas Farc, de não atacar sempre e
quando não as ataquem, é tratar de levar o Governo a um
cessar-bilateral, que você opina?
Não
creio que seja uma pressão, é simplesmente pôr o ponto onde é. As
Farc estão dizendo que estão dispostas a um cessar-fogo unilateral
e por tempo indeterminado, porém que também esperam que se lhes
respeite porque, se não, isto se converteria –há que dizê-lo
assim- numa vantagem para a Força Pública desde o ponto de vista
militar.
Que
temas há pendentes no processo para este ano?
Basicamente,
são três. Já está praticamente resolvida a parte de discussão
sobre vítimas. Se ouviu 60 delas, que, mesmo que não representam a
todo o universo de afetados pelo conflito, sim a um setor muito
importante deste. Falta agora a discussão para chegar a uns acordos
nesse tema e creio que o abordarão em janeiro.
Qual
é o segundo?
O
assunto do fim do conflito, que tem uma série de elementos
importantes, como a deixação de armas, componente militar,
garantias para a guerrilha e como se vai resolver o conflito desde o
ponto de vista jurídico, porque este é um tema político e
jurídico.
E
o terceiro?
Finalmente,
ficaria o ponto de como se vão ratificar e implementar os acordos,
no qual há diversas propostas. Creio que, chegando a um acordo
quanto às vítimas e do que disso se derivaria, se poderia chegar ao
ponto da irreversibilidade.
Por
que é tão otimista?
Porque
creio que neste ano é quando se poderá chegar aos acordos sobre os
pontos que faltam [vítimas, fim do conflito e referenda] e também
sobre outros que ainda estão pendentes. Se há acordo sobre estes
temas, creio que o caminho ficaria liberado para um pacto final, o
qual não necessariamente se daria daqui a outubro ou novembro de
2015, pode ser começando em 2016, não me atrevo a falar de tempos,
porém creio, sim, que este ano será decisivo.
Deve
haver deixação ou entrega de armas por parte das Farc?
Nesse
tema há algo de fundo. O Governo e as Farc firmaram –no acordo de
Havana- acolher o conceito de deixação de armas. A entrega de armas
significa a derrota de quem as está entregando, a claudicação, e
creio que esse não foi o sentido do diálogo de Cuba. O próprio
Governo falou desde um princípio de uma paz digna e com respeito:
digna para a guerrilha e para o Estado; falou também de que não
houvesse nenhum tipo de vantagem para nenhuma das partes e por isso
se escolheu o conceito de deixação de armas, que implica que as
Farc não vão mantê-las nem que continuarão atuando na política,
depois de firmada a paz, com elas nas mãos.
E
que opções há para a deixação das armas?
Isso
deve ser decidido pelas partes, que caminho as armas vão tomar, se
se vão lançar ao mar, se se vão entregar a um terceiro país, se
se vão afundá-las, enfim; são as partes que vão combinar, a
acordar o que fazer com as armas, uma vez que se firme o fim do
conflito, porém é evidente que estas têm que desaparecer, uma vez
que haja um acordo de paz estável e duradoura.
‘Presença
de ‘Gómez’ imprimirá peso ao processo?
Que
opinião tem da chegada de ‘Joaquín Gómez’ a Havana?
É
muito importante pelo que ele significa nas Farc. É um de seus
comandantes mais veteranos e jogou um papel muito destacado nos
diálogos de El Caguán. Creio que sua presença imprime peso e
dinamismo ao processo, como a de outros membros do secretariado.
Ademais, creio que, de uma vez por todas, ficam desvirtuados os
rumores de certos analistas no sentido de que ‘Joaquín Gómez’
era o grande inimigo dos diálogos e que estava em rebeldia. Já
hoje, ‘Joaquín Gómez’ é um protagonista dos diálogos, revela
que há coesão nas Farc e que todos estão comprometidos. Isso tem
que dar confiança e segurança ao país, no sentido de que os
acordos aos quais se chegue em Cuba vão ser cumpridos pela absoluta
maioria dessa guerrilha.
‘Joaquín
Gómez’ pode significar a aproximação ao processo de uma ala das
Farc que está relacionada com o narcotráfico?
Essa
é outra fábula, a das Farc narcotraficante e cartel. Os próprios
porta-vozes da guerrilha têm explicado este assunto e seu vínculo
com este tema. O que tem ocorrido é que, devido ao fato de que esse
fenômeno tem sido uma realidade em zonas onde as Farc estão, elas
intervieram para cobrar um imposto e dar umas licenças, e que esse
dinheiro lhes sirva para sua sustentação. Não vou entrar a
qualificar se isso está bem ou está mal, porém, o que, sim, quero
que fique claro é que, desde meu ponto de vista, há que deixar de
insistir em que as Farc são narcotraficantes, até o ponto de que o
próprio Governo disse que está estudando a possibilidade de que
isto se considere um delito conexo com o delito político, à
rebelião, que creio que é o mais pertinente.
Com
a chegada de ‘Joaquín Gómez’, todo o secretariado passou por
lá, que opinião, de sua parte, merece esse fato?
Isto
significa que todo o secretariado das Farc está comprometido com a
paz, que a decisão de adiantar o diálogo foi tomada por toda essa
insistência
e, de alguma maneira, foi a melhor homenagem que fizeram a ‘Alfonso
Cano’, quem iniciou esses primeiros contatos com o Governo em
segredo, e que, a pesar de sua morte, seus herdeiros na direção
desta organização mantiveram essa política.
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Equipe
ANNCOL – Brasil