“MUDAR O PT PARA CONTINUAR MUDANDO O BRASIL
- Por Rui
Falcão
Companheiros e companheiras
O PT nasceu para ser diferente. E
foi. O PT nasceu para mudar o Brasil. E mudou. Desde o início de
nossa trajetória, em 1980, adotamos um novo modo de fazer política
que contribuiu de maneira decisiva para ampliar e aprofundar a
democracia no país. Crescemos lutando para que os excluídos
tivessem voz e vez. Junto com os movimentos mais representativos da
sociedade, resistimos ao injusto modelo neoliberal e conseguimos
impedir que privatizassem completamente o patrimônio público
brasileiro, construído com o sacrifício de gerações. E, a partir
de 2003, chegando pelo voto popular ao governo federal, promovemos
uma verdadeira – e pacífica – revolução social, que, pela
primeira vez, colocou a inclusão dos mais pobres e o combate à
desigualdade no centro da agenda nacional, libertando da fome e da
miséria 36 milhões de pessoas, e provando que o país podia crescer
em benefício de todos.
A contribuição do PT ao país é,
pois, concreta, evidente, inegável. Ninguém de boa fé pode deixar
de reconhecê-la. Pesquisadores e estudiosos de todo o mundo afirmam
que, sem o PT, a história do Brasil pós-ditadura seria
incomparavelmente menos democrática e justa. Ao implantar um novo
modelo de desenvolvimento, baseado na solidariedade social, e
combater com tanto sucesso a pobreza e a exclusão, o PT cumpriu uma
notável missão ética e civilizatória, levando a população
brasileira a atingir um patamar inédito de dignidade e cidadania.
Por que, então, somos hoje alvo da
mais feroz campanha de desmoralização já lançada contra um
partido político no Brasil? A quem serve esse verdadeiro massacre
político e midiático? Quais são os seus reais objetivos?
É preciso dizer com toda a
clareza: o ódio dos conservadores ao PT não é causado por nossos
erros políticos, mas por causa dos nossos extraordinários acertos
sociais, que contrariaram interesses poderosos e desafiaram
preconceitos seculares.
Mas não podemos ignorar que nossas
falhas e insuficiências políticas também contribuíram para
desgastar a imagem do Partido, que passou a ser visto por muitos como
uma legenda igual às outras, em descompasso com a sua história
profundamente inovadora e com as expectativas que sempre despertamos
na sociedade.
Para corrigir tais falhas, sem
abrir mão das enormes conquistas sociais que obtivemos, e
continuar impulsionando o país no rumo da prosperidade e da
justiça, é preciso fazer uma reflexão autocrítica e
enfrentar com humildade e coragem os desafios atuais – como o
PT sempre foi capaz de fazer ao longo de sua caminhada.
Essa reflexão deve ser
compartilhada não só com a militância petista, mas com os milhões
de brasileiros e brasileiras que acreditam na luta por uma sociedade
cada vez mais livre, justa e igualitária. Pois, o que está em jogo
não é apenas a imagem de um partido, por mais importante que ele
seja, mas o direito inalienável que tem o nosso país de continuar
avançando no seu projeto de desenvolvimento soberano e sustentável.
A Grande Transformação - Nestes
primeiros anos do século XXI, o Brasil despertou a atenção do
mundo pela combinação virtuosa de um projeto sustentável de
desenvolvimento nacional com um movimento de inclusão social sem
precedentes, na vigência da democracia e das liberdades
fundamentais. Só muito raramente se consegue que esses três fatores
– econômico, social e político – coincidam no tempo das nações,
criando oportunidades de progresso material e humano para o conjunto
do País, tornando possível realizar sonhos coletivos longamente
acalentados.
É, de fato, extraordinário que
uma nação marcada secularmente pela desigualdade e
concentração de renda, pela dependência econômica e por
sistemas políticos autoritários e excludentes, tenha conseguido
realizar tudo o que realizamos nos últimos 12 anos. A começar
pela mais ética e simbólica de todas as transformações, que foi
acabar com a fome em nosso país.
Esse novo Brasil, mais justo e mais
democrático, é o resultado de uma grande aliança, liderada pelo
PT, que envolveu partidos, movimentos sociais e amplos setores da
sociedade num diálogo intenso e permanente.
Pela primeira vez as grandes
políticas públicas passaram a ser elaboradas com forte participação
cidadã. Os trabalhadores da cidade e do campo, as mulheres, os
negros, os indígenas, a intelectualidade, a juventude, os
defensores dos direitos humanos e da diversidade sexual e os
ambientalistas assumiram um protagonismo efetivo nas definições de
governo, por meio de conferências, conselhos e mesas permanentes de
negociação. A sociedade civil deixou de ser mero objeto para
tornar-se autêntico sujeito das escolhas do país, trazendo um sopro
renovador e criativo para a vida pública.
E, sobretudo, os pobres e os
assalariados foram instalados no coração de todas as políticas e
ações do governo.
O Brasil que saiu do Mapa da Fome
das Nações Unidas é o mesmo Brasil que se tornou uma das maiores
economias globais; que dobrou a produção agrícola e se tornou um
dos maiores exportadores mundiais de alimentos; que está entre os
primeiros na indústria aeronáutica, de automóveis, de petróleo,
na indústria química, de cimento, celulose, de vestuário,
calçados, bebidas, na siderurgia, entre outros setores; que tem uma
das mais sólidas posições em termos de reservas internacionais e
se tornou um dos cinco maiores destinos de investimento externo
direto no mundo.
É o mesmo Brasil que dobrou para 7
milhões as matrículas nas universidades, adotando as cotas para
negros, indígenas e alunos de escolas públicas; que democratizou o
acesso ao crédito e garantiu aumento real e constante dos salários;
que criou 21 milhões de empregos formais, que assentou e criou
condições para milhões de famílias produzirem no campo. Que
começou a corrigir o injustificável desequilíbrio entre as
regiões, levando obras de infraestrutura e grandes investimentos
produtivos ao Nordeste e ao Norte do país. E que foi capaz de fazer
tudo isso recuperando e garantindo a estabilidade econômica.
É um país que despertou a
confiança de seu povo e conquistou o respeito internacional. Que
passou a praticar, sem arrogância nem subserviência, uma política
externa soberana, voltada para a integração latino-americana e
caribenha, a cooperação com os povos da África e a parceria com os
BRICS, sem prejuízo das suas tradicionais relações com a Europa e
a América do Norte.
O PT Contra a Corrupção –
A corrupção, tanto privada
como pública, é um problema grave para qualquer país e, por isso,
deve ser combatida com o máximo rigor, em caráter permanente. Seja
no âmbito municipal, estadual ou federal, ela fere um dos princípios
básicos da democracia, que é a igualdade de direitos – a
isonomia – entre as empresas, as entidades, os indivíduos.
Deturpa a vida econômica e civil, premiando indevidamente a
concorrência desleal, os cartéis e monopólios, em prejuízo do
legítimo interesse coletivo. A corrupção é um veneno moral, que
degrada as pessoas e contamina a sociedade. Nenhum país conseguiu
eliminar completamente a corrupção, mas é possível – e
necessário – reduzir drasticamente essa prática, punindo
duramente os que dela se valem, tornando-a cada vez mais difícil e
arriscada.
O PT pode se orgulhar também de
ter promovido, nesses 12 anos, os mais significativos avanços na
adoção de práticas republicanas, de transparência do Estado e de
combate à corrupção na esfera pública. Já no primeiro dia de
governo, em janeiro de 2003, criamos a Controladoria Geral da União,
institucionalizando em nível ministerial a fiscalização
sistemática sobre a aplicação de recursos federais.
Adotamos como regra o pregão
eletrônico, reduzindo a possibilidade de fraudes em licitações.
Criamos o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspeitas,
excluindo dos contratos públicos fornecedores que cometeram
ilícitos. O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF)
passou a monitorar movimentações atípicas envolvendo agentes
públicos. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE),
fortalecido por nova legislação, intensificou a atuação no
combate aos cartéis.
Criamos o Portal da Transparência,
que recebe mais de 1 milhão de consultas por mês e que foi
considerado pela ONU uma das cinco melhores práticas de combate à
corrupção em todo o mundo. Aprovamos a Lei de Acesso à Informação,
que colocou o Brasil entre os países que praticam os mais avançados
princípios de governança. Editamos o Decreto 5.497/2005 que
reservou para servidores concursados 50% dos cargos no nível DAS-4 e
75% nos níveis DAS-1, DAS-2 e DAS-3, que antes eram de nomeação
totalmente livre. Portanto, ao contrário das mentiras difundidas
pelos nossos adversários, o governo do PT foi o primeiro a tomar
medidas concretas para combater de fato o aparelhamento partidário
do Estado.
O Congresso Nacional aprovou, nesse
período, a Lei que regulamenta o conflito de interesses no Executivo
Federal, coibindo condutas abusivas de servidores; a Lei
Anticorrupção, que estabelece penas para empresas corruptoras, e a
nova Lei contra organizações criminosas, que regulamenta a chamada
delação premiada.
No último dia 16 de março,
consolidando esse esforço de 12 anos, a presidenta Dilma Rousseff
enviou ao Congresso, com pedido de urgência na votação, o projeto
de Lei que pune enriquecimento ilícito de servidores, o projeto que
institui a ação de perda de bens obtidos ilegalmente, a extensão
do critério da Ficha Limpa às nomeações para cargos de confiança
nos três Poderes e o projeto que criminaliza a prática de caixa
dois nas eleições.
Nosso compromisso de combater a
corrupção nunca foi abstrato. Afirmamos, na prática, o princípio
constitucional da autonomia do Ministério Público, respeitando as
indicações para o cargo de Procurador-Geral da República definidas
nas eleições da Associação Nacional do Ministério Público.
Recorde-se que o Procurador-Geral do governo do PSDB arquivou 217
inquéritos criminais envolvendo autoridades e engavetou outros 242,
de um total de 626 denúncias recebidas. Por isso era chamado, com
toda razão, de engavetador-geral da República.
Ao contrário do que se fazia
anteriormente, passamos a escolher a direção do Departamento de
Polícia Federal por critério de mérito. Além de garantir a sua
autonomia, nosso governo aumentou significativamente o orçamento da
PF, ampliou o quadro de agentes e delegados, investiu em melhores
salários e novos equipamentos. Criamos as delegacias especializadas
no combate à corrupção e desvio de recursos públicos, que já são
17 em todo o país.
Nenhuma análise objetiva, isenta
de sectarismo partidário, deixará de constatar que esse conjunto de
medidas de controle e transparência, implantado pelos governos do
PT, cria fortes obstáculos para o desvio de recursos públicos.
Mas não podemos deixar de fazer a
nós mesmo uma pergunta crucial: se fomos tão ousados e determinados
para acabar com a fome, reduzir fortemente a pobreza e as
desigualdades sociais e regionais, gerar milhões de empregos,
fortalecer de modo tão evidente o controle a transparência na
administração pública federal – por que não tivemos a mesma
ousadia e determinação para reformar o sistema político
brasileiro, como reivindica a maioria da população, e estabelecer
novos padrões de conduta na vida pública do país?
Reformar a Política brasileira
sempre foi um compromisso programático do PT. Sempre sustentamos que
é preciso corrigir antigas e notórias distorções do sistema
partidário e eleitoral, para que ele se torne mais ético e
representativo da sociedade, e também mais aberto à participação
cidadã. Ao longo da sua história, como se sabe, o PT fez diversas
tentativas nesse sentido, em parceria com outros partidos
progressistas, entidades da sociedade civil e movimentos sociais. Em
2004, por exemplo, apresentamos no Congresso Nacional um conjunto de
propostas com este objetivo– entre elas, o financiamento público
exclusivo das campanhas eleitorais – que conseguimos levar a
votação em 2006, mas foi derrotado pela maioria dos partidos.
A verdade, no entanto, é que, não
tendo conseguido mudar o sistema político, acabamos por nos adaptar
a ele, passando a reproduzir os comportamentos dos partidos
tradicionais que tanto criticamos.
Financiamento empresarial, a raiz
do mal - Apesar de previsto na legislação e, portanto,
praticado legalmente por todos os partidos, o financiamento
empresarial é danoso à independência e à lisura da atividade
política.
Não é porque todos os partidos,
sem exceção, o praticam que ele se torna menos nocivo,
principalmente a partidos como o nosso, que nasceram para lutar não
só pela justiça social, mas também por uma política mais limpa e
digna.
A Lei 9.504 de 1997, que eliminou
todos os limites para as contribuições de empresas, escancarou as
portas dos partidos para a influência do poder econômico. Ela foi
aprovada num Congresso dominado pela base do governo de então – o
PSDB e o atual DEM – na mesma época em que a Constituição foi
alterada para permitir a reeleição do ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso.
O financiamento empresarial
propiciou que as campanhas se tornassem cada vez mais caras e
sofisticadas, o que por si só é uma distorção antidemocrática.
Nesse contexto, o financiamento de campanhas tornou-se elemento
central das relações entre partidos, especialmente na formação de
acordos e coligações entre as maiores legendas e seus aliados.
A raiz do mal já poderia ter
sido extirpada, desde 2014, se tivesse sido respeitada a vontade dos
seis ministros do Supremo Tribunal Federal que votaram pela
inconstitucionalidade do financiamento empresarial, em ação
proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil. O entendimento da
maioria, no entanto, foi sobrestado pelo pedido de vistas de um único
ministro, que vem manobrando declaradamente há mais de um ano para
manter o status quo.
Mesmo combatendo o financiamento
empresarial, nos debates públicos e no Congresso, o PT praticou, nos
últimos anos, o que a legislação permite. Recebemos contribuições
de empresas, dentro da lei, e fizemos campanhas caras, tão caras
quanto as dos demais partidos, que nos criticam de maneira hipócrita.
Basta tomar o exemplo das empresas
investigadas na chamada Operação Lava-jato. Nas eleições de 2014,
o conjunto dessas 16 empresas fez contribuições a 19 partidos
diferentes, no valor total de R$ 222 milhões. Os valores destinados
ao PT e ao PSDB são muito semelhantes: R$ 56 milhões e R$ 54
milhões, respectivamente.
Um partido diferente, como o PT
sempre foi, não pode continuar acomodado a esta situação.
Publicamente e no Congresso Nacional, propomos o financiamento
público exclusivo das campanhas. Mas, enquanto ele não se
viabiliza, ou até que não se vede o financiamento empresarial,
temos de agir, mais uma vez, com ousadia e coragem. Trata-se de
repudiar concretamente o rebaixamento da política pelo financiamento
empresarial. Dar o exemplo, que é o mais forte dos argumentos, na
política e na vida. Por isso, estamos propondo que, a partir de
agora, as instâncias do PT não mais aceitem contribuições de
empresas para sua sustentação.
Essa é uma decisão difícil de
ser tomada por um grande partido, especialmente quando ele tem a
responsabilidade de defender um projeto histórico de transformação
do país. Mas é um passo necessário, que vai nos diferenciar
novamente das estruturas viciadas que sempre criticamos, do sistema
político que o PT nasceu para modificar. Nós sabemos que só vale a
pena fazer política de cabeça erguida, e isso implica em romper com
uma prática que a sociedade já condenou.
Por isso propomos ao Diretório
Nacional:
- Suspender, imediatamente, o
recebimento de qualquer tipo de contribuição de empresas;
- Levar essa proposta a debate e
deliberação no V Congresso do PT;
- Conclamar os partidos aliados a
se unirem ao PT nessa opção;
- Fortalecer ainda mais a
mobilização política e social por uma reforma política que
estabeleça o financiamento público exclusivo das campanhas
eleitorais.
A partir desse exemplo, estaremos
contribuindo para recuperar a credibilidade da Política como agente
de mudança social. Estaremos dizendo ao nosso povo que é
possível mudar e melhorar a política, ao invés de simplesmente
negá-la como fazem os manipuladores e os autoritários.
E estaremos dando um passo
importante para revigorar internamente o PT, pois o financiamento
empresarial foi a porta de entrada no partido de muitos desvios da
política tradicional, que tanto criticamos.
A concentração quase exclusiva da
atividade partidária na disputa político-eleitoral-institucional
acarretou um duplo desvio. Primeiro, abriu um imenso vazio
teórico, de análise, reflexões e iniciativas sobre o que vem
acontecendo no Brasil e no mundo. Segundo, porque a conquista de
votos não tem se misturado à luta de massas, de tal sorte que se
possam criar condições de construir uma força política organizada
e estável, um verdadeiro bloco histórico capaz de inverter a
correlação desfavorável na sociedade e de impulsionar mudanças
estruturais.
É preciso mudar o PT para
continuar mudando o Brasil.
A tentativa de criminalizar o
PT - Há quase dez anos as
elites conservadoras tentam arbitrariamente criminalizar o PT e seus
legítimos governos, desrespeitando o que existe de mais sagrado na
democracia – o voto popular e o Estado de Direito.
Quando ganhamos pela primeira vez
as eleições presidenciais, em 2002, as oligarquias dominantes
tentaram inicialmente nos cooptar para a sua fracassada agenda
neoliberal. Queriam domesticar o nosso partido para que ele não
cumprisse os seus compromissos de vida com os trabalhadores e os
pobres, e se limitasse a gerir sem mudar uma das sociedades mais
cruéis e injustas do planeta. Queriam fazer conosco o que já tinham
feito com governos anteriores, impondo ao país, por meio de seus
monopólios de comunicação, a agenda antipopular e antinacional
rejeitada nas urnas.
Não puderam deixar de reconhecer,
naturalmente, a seriedade e a capacidade de sacrifício com que
enfrentamos a crise herdada dos governos tucanos, debelando a
inflação de dois dígitos e o descontrole fiscal que havia elevado
a dívida pública a 62% do PIB. Mas quando dissemos, no final de
2004, ao livrar o país da tutela do FMI, que o necessário rigor
fiscal e monetário não era incompatível com desenvolvimento,
geração de empregos, aumentos salariais, distribuição de renda e
inclusão social, começaram a voltar-se contra nós.
Quando perceberam que o Estado, sob
a nossa liderança, não serviria mais unicamente aos privilegiados,
e sim a toda a população, sobretudo aos mais carentes, e que as
elites deixariam de se beneficiar com exclusividade dos fundos
públicos, desencadearam contra o PT e o governo federal uma
verdadeira campanha de cerco e aniquilamento que agora se
intensifica.
Incapazes de nos derrotar nas
urnas, os eternos “donos do poder” – na expressão lapidar do
grande jurista Raymundo Faoro – apelaram para campanhas de
desmoralização e intimidação, como haviam feito com Getúlio
Vargas, em 1954; em 1955, com Juscelino Kubitschek – de quem
diziam: “JK não pode ser candidato; se for, não pode ser eleito;
se eleito, não pode tomar posse; se empossado, não pode governar”
– e, em 1964, com João Goulart, quando mergulharam o País nas
trevas da ditadura civil-militar.
Campanhas urdidas e coordenadas em
nível de estado maior pelas classes dominantes tanto foram exitosas
no Brasil como lá fora. Seja para destruir governos democráticos,
seja para proscrever partidos de esquerda ou para censurar ideias e
movimentos progressistas. Ainda de memória recente, embora do século
passado, a odiosa praga do macarthismo nos Estados Unidos e o forjado
incêndio do Reichstag, na Alemanha dos anos 1930, que abriu caminho
para a ascensão de Hitler.
Com método, obstinação e grandes
recursos midiáticos, as classes dominantes transformam o boato em
notícia, a suspeita em denúncia, a calúnia em verdade.
Hierarquizam calculadamente o noticiário, destacando e apresentando
de forma escandalosa os desvios imputados a pessoas do nosso partido,
não importando que sejam reais ou inventados. Omitem ou escondem,
seletivamente, as denúncias contra os partidos que os servem, por
mais graves que sejam. Tentam cobrir o PT com a lama de sua
hipocrisia.
Aqueles que sempre se beneficiaram
das distorções do sistema e que construíram sua riqueza e poder à
sombra da ditadura, passaram a nos atribuir todas as mazelas crônicas
da política brasileira. Quando descobriam que nosso Partido é
sério, mas não é domesticável, colocaram o PT, e só o PT, no
banco dos réus. Mesmo que para isso tenha sido necessário torturar
os fatos, violar a jurisprudência e afrontar a consciência jurídica
do país, como ocorreu em vários momentos da Ação Penal 470.
Nenhum outro partido sofreu uma
campanha de desmoralização tão furiosa quanto a que se fez contra
o PT ao longo daquela ação penal. Nada se fez, minimamente
comparável, em relação a escândalos como a corrupção nas obras
do Metrô nos governos do PSDB de São Paulo, ou do desvio de
dinheiro público para campanhas eleitorais do PSDB e do DEM na Lista
de Furnas e nos chamados mensalões de Minas e do Distrito Federal.
Em 2005, acharam que bastaria
fazer-nos “sangrar até morrer” e que, assim, o poder voltaria
naturalmente a suas mãos. Estavam convencidos de que o sonho de um
governo popular no país seria algo passageiro e irrelevante.
A ação penal 470 foi utilizada,
ao longo de quase sete anos, para desgastar a imagem do PT e tentar
criminalizá-lo. O julgamento daquela ação ocorreu com
inédita pressão da mídia sobre os membros do STF e a prevalência
de aberrações jurídicas como a aplicação da tese do “domínio
do fato”, repelida pelo seu próprio autor, o jurista alemão Cal
Roxin. Desde então, tornou-se desnecessário apresentar provas ou
garantir o contraditório, quando se trata de apontar o dedo contra o
PT.
Foi nesse ambiente de
arbitrariedade que o PT e o nosso governo tornaram-se alvos políticos
da chamada Operação Lava-Jato. Conduzida por agentes do Estado que
sequer disfarçam seu engajamento partidário, essa operação
avançou pela trilha de violência jurídica aberta no julgamento da
AP 470. Criminosos apanhados numa rede de evasão fiscal e lavagem de
dinheiro – há muito conhecida pelo Judiciário e pelo Ministério
Público do Paraná – são premiados com privilégios penais e até
financeiros, em troca de depoimentos que possam incriminar o PT e o
governo. Bandidos reincidentes são transformados em heróis, fazendo
acusações sem provas, bastando que apontem para o PT e o governo.
É essencial para o país
investigar desvios na Petrobras – e em qualquer outro setor – e
punir com rigor quem os tenha comprovadamente cometido. Mas fica cada
dia mais evidente o proveito político-partidário a que a
investigação tem servido. Por que razão elas não se estendem às
conexões do esquema com políticos e governos da oposição – que
são muitas e notórias. Por que o vazamento seletivo de depoimentos
capazes de manchar o PT, e tão somente o PT?
A transformação de um processo em
espetáculo de mídia, o constrangimento que se tenta impor ao
direito de defesa, a abolição do princípio da presunção de
inocência e as arbitrariedades cometidas, supostamente em nome do
combate à corrupção, constituem uma ameaça não ao PT, mas à
consciência jurídica da Nação. Estamos assistindo ao nascimento
de um estado de exceção dentro do estado de direito, e contra isso
o PT lutará, ao lado das forças democráticas da sociedade.”