Só um magnicídio poria em perigo o processo de paz: De Zubiría
Por
Augusto Aponte
O
integrante da Comissão Histórica crê que Constituinte é a melhor
via para ratificar a paz.
Uma
grande expectativa se gerou em torno da
discussão entre
o Governo e as Farc pelo tema de se o processo de paz é irreversível
ou não.
No
seio da Comissão Histórica do Conflito e suas Vítimas, criado em
Havana, saiu uma voz alertando sobre o perigo que poderiam correr os
acordos por uma trama que se estaria planejando entre setores
inimigos dos diálogos.
Sergio
Zubiría, licenciado em Filosofia e mestre em História, disse a
Kienyke.com que a única coisa que faria desequilibrar o processo de
paz a estas alturas é um magnicídio. “Por exemplo, um magnicídio
contra os comandantes em Havana, ou o assassinato do ex-presidente
Uribe, e isto não é nada descabido”, indicou.
Ainda
que tenha assegurado que não quer ser uma ave de mau agouro, de
Zubiría assinalou que há que tomar todas as medidas de segurança e
estar alertas nesta última fase do processo de paz, que, segundo
disse, é a mais difícil.
Por
que é a mais difícil?
De
Zubiría, quem é um dos doze integrantes da Comissão Histórica do
Conflito e suas Vítimas, assinalou que como os acordos estão em sua
parte final, os inimigos dos mesmos assestarão baterias contra eles.
Ademais, assinalou que as discussões em Havana ficarão mais
intensas porque se está debatendo o desarmamento e a reinserção,
junto com a participação política.
Além
disso, assinalou que, apesar das demonstrações de boa vontade de
ambas as partes, o processo não tem estado isento de problemas e
inconvenientes. “Há muitos elementos esperançosos, porém ao
mesmo tempo vemos elementos como a ruptura da trégua, setores de
extrema direita que não querem envolver-se no processo; vemos que a
própria Comissão Assessora da Paz tem elementos de falta de
representatividade”.
Frente
a este último tema, o filósofo e historiador manifestou que “não
há grêmios dos próprios terra-tenentes, não há associações
campesinas, tampouco há representação de partidos políticos”.
No
entanto, Sergio de Zubiría ressaltou os acordos alcançados até o
momento entre o Governo e as Farc, ainda que admitiu que não se
trata de uma reforma estrutural, manifestou que é um passo positivo
para reconhecer a população mais vulnerável do país e repará-las.
“O
que se pactua em Havana no primeiro ponto não é uma reforma agrária
e sim um fundo de terras para entrega gratuita aos campesinos
despossuídos. Aspiramos a que seja um fundo de três a cinco milhões
de hectares, para que os mais pobres voltem das cidades para o
campo”, disse.
Frente
ao tema da representação política no pós conflito, ressaltou que
a discussão se centrou na criação de uma circunscrição especial
na Câmara de Representantes para aquelas “zonas que foram as mais
ensanguentadas, onde não participarão os partidos tradicionais mas
sim novos movimentos sociais e campesinos, deixando por fora também
as Farc. Isto abre a possibilidade de participação política a
grupos que nunca chegaram ao Congresso”, disse.
A
respeito de se os chefes guerrilheiros desmobilizados devem pagar
cárcere, o integrante da Comissão Histórica do Conflito se mostrou
em desacordo com esta tese.
“Não
é em todo processo de negociação que há que ir para o cárcere,
está o exemplo do Nepal, Filipinas, das guerrilhas da América
Central, nos que por ser um delito político, uma rebelião, não
pagaram nenhum dia de cárcere; simplesmente repararam à sociedade
com verdade, com reparações simbólicas. Em Colômbia, de que nos
tem servido que tenha ido para o cárcere um grupo de paramilitares?,
de que tem servido às vítimas? Há uma visão punitiva, vingativa,
de que a única forma de fazer justiça é a retaliação”,
assinalou.
Assegurou
que as vítimas em Havana não pediram cárcere para os guerrilheiros
e sim um cessar-fogo bilateral.
Por
último, no tema de como devem ser ratificados os acordos, de Zubiría
assegurou que para as reformas que o pós conflito necessita é
necessário convocar uma Assembleia Nacional Constituinte.
“Há
que reconhecer que para ratificar os acordos em Havana há mecanismos
mistos; há umas coisas que poderiam ir a referendo e outros deveriam
ir a uma Assembleia Constituinte, como, por exemplo, para o caso da
educação, da justiça, pois o do equilíbrio de poderes apenas são
paninhos de água morna, o que se necessita é abrir um debate grande
em Colômbia”, manifestou.
Comissão
Histórica do Conflito e suas Vítimas
Para
que foi criada esta Comissão? Sergio de Zubiría explicou como
nasceu esta ideia:
Em
agosto de 2014, a mesa de Havana chegou a um acordo para criar uma
comissão histórica para esclarecer as raízes do conflito. Uma vez
que se chegou ao acordo de seu funcionamento e das perguntas que
tinha que responder, se começou a criar uma lista de intelectuais e
acadêmicos que poderiam contribuir com essa comissão.
Tanto
as Farc como o Governo designaram doze membros que ao término de
quatro meses devia, cada um, escrever um informe de 40 páginas que
respondessem as seguintes perguntas: Qual foi a origem e as causas do
conflito armado? Quais são os fatores e condições da persistência
do conflito? Quais têm sido os impactos maiores na população? e
Quais são as responsabilidades?
Os
informes foram entregues a dois relatores: o ex-reitor da
Universidade Nacional Víctor Manuel Moncayo e o embaixador da
Colômbia em Haia, Eduardo Pizarro León-Gómez. As duas relatorias
fizeram um só informe com os doze informes entregues inicialmente, e
este contou com mais de 800 páginas.
O
que cada integrante da comissão tinha que fazer era ler, recopilar e
estudar trabalhos investigativos já elaborados. “Eu escolhi um
grupo de historiadores, escritores, sociólogos, politicólogos que
já fizeram trabalhos consolidados para responder as quatro perguntas
formuladas. Fiz referência a Germán Colmenares, Álvaro Tirado
Mejía, Marco Palacios. Depois, o que fiz foi organizar os autores
dependendo da intencionalidade das perguntas, e sistematizar teses,
elaborar críticas sobre a guia”, explicou.
No
entanto, o analista assinalou que esta comissão histórica não tem
precedente nos processos de negociação a nível mundial, pois se
compôs sem que se tenha acabado o conflito, e o que busca é dar
insumos para que sejam levados em conta pela comissão da verdade,
que teria que ser criada com a firma do acordo.
De
fato, dias atrás as Farc advertiram ao Governo que as conclusões
que a Comissão Histórica apresentou têm que ser levadas em conta e
não convertê-las numa mera saudação à bandeira.
Segundo
indicou Sergio de Zubiría, as causas do conflito armado são
profundas e múltiplas. “Desde o primeiro informe de 1962, que é
originário do debate, se fala da multicausalidade e da complexidade
do mesmo. Assuntos que poderiam ser resolvidos a partir de reformas
sociais, agrárias, porém que não se fizeram ou se adiaram, foram
se acumulando as causas e o conflito foi se tornando mais grave”.
Assegurou,
ademais, que “hoje em dia, as causas do conflito não são
exatamente iguais, porém, sim, tem havido uma persistência das
mesmas causas da origem da confrontação armada [...] e da maior
impunidade em Colômbia seria deixar intactas as causas que
desencadearam o conflito armado”.
Por
outro lado, de Zubiría ressaltou a cúpula mundial sobre paz que se
levará a cabo em Bogotá de seis a dez de abril e a grande marcha
nacional pela paz, “na qual se aspira que cheguem a Bogotá cerca
de 200 mil pessoas, campesinos, indígenas,
afrodescendentes”.
Kienyke
--
Kienyke
--
Equipe
ANNCOL - Brasil