O sicariato
"Às vezes, matar era como cortar flores. É como se alguém tivesse tido cinqüenta noivas na vida, só se recorda de algumas. Pode ser que tenha muitos mortos nas costas, porém só se recorda de alguns".
Por MAURICIO BOTERO MONTOYA, tomado de El Nuevo Siglo
O notável assassino Pedro Bonito, chefe do Bloco Bananeiro das AUC durante o governo de Álvaro Uribe e em sua terceira jornada de versão livre, ante a Unidade de Justiça e Paz em Medellín, disse em impulso poético à atônita fiscal: "Às vezes matar era como cortar flores. É como se alguém tivesse tido cinqüenta noivas na vida, só se recorda de algumas. Pode ser que tenha muitos mortos nas costas, mas só se recorda de alguns".
A fiscal interrompeu a audiência para recuperar-se, segundo a agência de notícias culturais Livros e Letras. Esta versão lírica de uma atrocidade tem também variantes prosaicas. Um conhecido advogado ia receber poder de certo chefe. Eram doze da noite quando chegou a seu apartamento um sujeito. Lhe advertiu que se aceitasse o poder seria, logo, morto. O advogado surpreendido lhe perguntou primeiro como estava inteirado do assunto, e segundo o que o motivava a advertir-lhe.
O sujeito recordou ao advogado que este havia impedido no ano anterior o desalojamento de uma viúva que era a mãe do portador da advertência. Que guardava gratidão por esse fato. E se apresentou como um sicário. O advogado seguiu o conselho, ainda vive.
Continuou tratando ao sicário, quem lhe manifestou que havia ultimado a mais de mil pessoas. Que tinha fama de eficaz. Que não sentia responsabilidade ou culpabilidade alguma por esses assassinatos. Que a sua é uma profissão e ele um profissional que supre uma necessidade social. Faz um serviço e pronto. Isto, que parece uma fábula urbana do inconsciente coletivo, ocorreu. É real.
Este ambiente tanático, patibular, da sociedade colombiana, está bem retratado na novela, agora telenovela, O Cartel dos delatores. Nela o respeito dos mafiosos pela justiça estadunidense contrasta com o escárnio com que miram a nacional. O acelerado processo recente que encabeça a Corte Suprema contra mafiosos e paramilitares merece o apoio cívico. O incômodo que evidencia o governo pela morte do chefe Pablo Escobar, primo-irmão do principal conselheiro presidencial, não deve impedir-nos de respaldar as instituições. O Executivo tem avassalado o Legislativo via suborno, segundo uma sentenciada corrupção. Agora pretende intimidar com o insulto o Ramo Judicial. Neste ambiente patibular e reeleicionista é necessário reagir.
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