Colômbia necessita de política eficaz de atendimento às vítimas de conflitos
Leandra Felipe
Correspondente
da Agência Brasil/EBC
Bogotá – A Colômbia vive um dos
mais antigos conflitos armados e tem um histórico de massacres e
crimes de direitos humanos e de lesa-humanidade. O desafio no país é
colocar as vítimas no centro da temática da solução de conflitos.
“Mais que as identificar, investigar, atribuir e reconhecer
responsabilidades, o Estado deve ser capaz de atender às pessoas e
de promover ações eficazes no pós-trauma”. Essa é a visão do
professor e cientista político colombiano Alejo Vargas Velásquez,
um dos palestrantes do Fórum Mundial de Direitos Humanos (FMDH), que
ocorrerá em Brasília, de 10 a 13 de dezembro.
Doutor em Ciências Políticas, e
diretor do Centro de Pensamento e Seguimento ao Diálogo de Paz da
Universidade Nacional da Colômbia, Alejo Vargas tem dez livros
publicados e é coautor de mais 50 livros. Ele participará do painel
Defesa dos Direitos Humanos e o Enfrentamento às Violências.
Previsto para a programação do
quarto dia do FMDH (13), o painel abordará o tema do enfrentamento
às violências e as políticas públicas de atendimento às vítimas.
Alejo conversou com a Agência Brasil sobre o assunto e os desafios
que não só a Colômbia, mas também outros países
latino-americanos enfrentam.
A primeira dificuldade encontrada
para lidar com a defesa de direitos humanos é qualificar quem é a
vítima. “Uma vítima de um roubo de carro, cujo assaltante tenha
agido com violência, não é tipicamente uma vítima de direitos
humanos dentro do que, internacionalmente, são considerados crimes
de direitos humanos”, pondera.
Alejo explica que a complexidade está
no fato de que, comumente, os crimes ligados ao Estado, ao
narcotráfico, ou às guerras são aqueles tradicionalmente
considerados como violações de direitos humanos. Perguntado sobre
casos de crimes de violência contra a mulher, por exemplo, em casos
de abuso sexual ou violência dentro da família, ele explicou que
não é a crueldade que define se houve ou não violação de
direitos humanos, mas os atores envolvidos e o contexto.
“Mas isso não quer dizer que a
vítima de um crime sexual não tenha tido violados seus direitos,
sua dignidade. Só que, em termos de convenção internacional, casos
de violência urbana devem ser cuidados de maneira diferente”,
argumenta.
O professor reconhece que, em países
com uma alta taxa de criminalidade e grande presença de grupos
armados, fica difícil fazer essa distinção. A Colômbia é um
exemplo disso. Por um lado, o país tem vítimas de violações de
direitos humanos pelos atores do conflito - Estado, guerrilhas,
paramilitares - e por outro tem grupos que controlam crimes comuns e
o narcotráfico.
Alejo acrescenta que, para uma vítima
das chamadas bacrins - gangues que controlam o narcotráfico e a
mineração ilegal em algumas regiões colombianas - ainda não há
respaldo legal de reconhecimento porque a Lei de Vítimas e
Restituição de Terras, em vigor desde 2011, não cita esses grupos.
“Assim, se uma comunidade é
deslocada internamente ou sofre um massacre por um desses grupos, ela
não terá o respaldo legal que uma vítima do conflito armado, das
Farc [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia] ou de
paramilitares já tem”, explica.
Ele acrescentou que a dinâmica muda
também conforme a realidade de cada região. No caso colombiano, o
foco é o conflito armado, mas em países da América Central e no
México já não há o fator guerra civil. Nesses lugares, há um
cenário em que o Estado parece não ter controle sobre cartéis de
drogas e a ação de organizações criminosas que controlam o
tráfico de drogas e de pessoas.
Na Colômbia, ele vê de maneira
positiva as ações adotadas nos últimos dez anos e, especialmente,
depois que a lei entrou em vigor. O país já tem um acompanhamento e
a busca pela reparação, inclusive pela participação das vítimas
nesse processo.
“Ainda há muito o que fazer e há
uma brecha entre o que a lei determina e o que é executado. Há
muito o que melhorar, mas já estamos caminhando sob a perspectiva de
colocar as vítimas no centro das atenções”, disse o professor.
Edição: Marcos Chagas