O presídio político nos Estados Unidos [IXX] Ciberativismo, nova forma de protesto social
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- - Serviço Informativo "Alai-amlatina" - - -
Por
Salvador
Capote
ALAI AMLATINA, 03/12/2013.- Em 15 de novembro de 2013, o intruso informático [“hacker”] Jeremy Hammond, vinculado com Anonymous, foi sentenciado a 10 anos de prisão e mais 3 anos de liberdade supervisionada, por realizar ataques cibernéticos a várias agências governamentais e corporações, em particular a “Strategic Forcasting Inc.”, mais conhecida por “Stratfor”, companhia privada de inteligência global.
ALAI AMLATINA, 03/12/2013.- Em 15 de novembro de 2013, o intruso informático [“hacker”] Jeremy Hammond, vinculado com Anonymous, foi sentenciado a 10 anos de prisão e mais 3 anos de liberdade supervisionada, por realizar ataques cibernéticos a várias agências governamentais e corporações, em particular a “Strategic Forcasting Inc.”, mais conhecida por “Stratfor”, companhia privada de inteligência global.
Hammond
transferiu correios eletrônicos de Stratfor ao grupo anti segredos
WikiLeaks. Os documentos publicados até agora se relacionam com
clientes como Goldman Sachs e Coca-Cola. Seu ciberativismo foi
motivado pela preocupação ante o crescente papel que desempenham
firmas privadas na obtenção de inteligência tanto dentro dos
Estados Unidos como no exterior.
“Como
resultado do ciberataque a Stratfor – declarou Hammond na corte –
se conhecem agora alguns dos perigos da indústria de inteligência
privada’.
Hammond,
com o pseudônimo de “Anarcaos”, subtraiu, num de seus ataques a
Stratfor, 200 gigabaites de informação confidencial e pôs seus
computadores fora de serviço durante seis semanas. Sarah Kinster,
advogada de Hammond, alegou que nada do feito por este tinha por
objetivo lucros pessoais e suas ações não eram outra coisa que uma
nova forma de protesto.
Os
Estados Unidos são o país dos segredos de Estado. A cada ano
classifica quantidades colossais de informação. Cada documento
secreto que se relaciona com um trabalho sujo realizado pela CIA,
pelo FBI ou outra agência
governamental
gera novos documentos secretos que se referem às ações posteriores
imprescindíveis para ocultar a ação ilegal primária, do mesmo
modo que uma pessoa mentirosa está obrigada a seguir mentindo para
evitar que descubram suas patranhas.
O
fato de que nunca antes a direção política dos Estados Unidos se
comportou de maneira tão distanciada da ética, tanto na esfera
nacional como na internacional, e nunca, portanto, se viu em maior
necessidade de ocultar tanta informação a seus cidadãos, dá
origem a uma nova forma de protesto social, a de pôr em conhecimento
da população o que se mantém em segredo, não porque tenha valor
algum para a segurança nacional, mas sim porque, conhecidas, se
colocariam a descoberto as manipulações e mentiras da
administração.
Esta
forma de luta começou a cobrar importância na década de 1970. Nos
anos recentes, ao invadir o ciberespaço, expõe novos problemas
filosóficos e éticos não resolvidos totalmente, ao tempo em que se
mostra como um campo de ação de incomensuráveis possibilidades. O
ciberativismo, que possui entre suas armas o ciberataque [“hack”],
ainda que eu prefira o termo ciberinfiltração, pode ser uma
ferramenta formidável no contraponto entre o segredo e a
transparência, para inclinar a balança para esta última. Tírios e
troianos, evidentemente, podem utilizar a seu favor a intromissão
eletrônica, porém a vulnerabilidade está de parte do que mais e
piores segredos necessite ocultar, o qual coloca o império em
situação extremamente desvantajosa.
Porém,
examinemos brevemente a experiência acumulada. O escândalo, em
março de 1971, quando os documentos contidos na sede do FBI em
Media, Pennsylvania, foram publicados, obrigou a pôr fim ao sinistro
programa COINTEL, utilizado para reprimir a todos os movimentos
progressistas.
Entre
os mais de mil documentos que vieram à luz e demonstravam que o FBI
dedicava grande parte de seu tempo, pessoal e recursos materiais não
à investigação de crimes, mas sim à vigilância de grupos que se
opunham à guerra ou lutavam por seus direitos civis, se publicou um
memorando que instruía a todos os agentes nos procedimentos a
utilizar, como checagem e assédio constantes, interceptação de
comunicações telefônicas, medidas coercitivas para obrigar à
delação, infiltração de agentes provocadores etc, com o objetivo
de semear a paranoia entre os grupos da Nova Esquerda [“New Left”],
o qual, obviamente, não é função de agências oficiais num país
que se supõe democrático.
Em
1967, o secretário de Defesa Robert McNamara ordenou um estudo sobre
a guerra do Vietnã, que se converteu num conjunto de 7.000 páginas
de documentos “Top Secret” chamado ‘Pentagon Papers” [Papéis
do Pentágono]. O trabalho terminou nos primeiros meses de 1969.
Daniel
Ellsberg, que trabalhou como assessor do Departamento de Defesa
durante a escalada da guerra no Vietnã e tinha acesso a documentos
classificados em seu caráter de assessor da Corporação Rand [1],
soube, ao ler o documento, tudo o que se havia ocultado à opinião
pública norte-americana com a finalidade de escalar uma guerra
injusta, desnecessária e impossível de ganhar, e decidiu produzir
cópias dos documentos, com ajuda de seu colega na Rand, Anthony
Russo, as quais entregou a vários senadores e, posteriormente, ao
New York Times, que começou a publicá-las em junho de 1971. Se
soube, então, a história de como os Estados Unidos se haviam
atolado, à revelia do Congresso, numa guerra não declarada que
começou com a ajuda aos colonialistas franceses entre 1940 e 1950.
Os
Papéis do Pentágono não continham material algum que pudesse ser
útil ao inimigo; no entanto, a administração acusou Ellsberg de
conspiração para cometer espionagem e outras denúncias. A
motivação, na realidade, era política. Os Papéis do Pentágono
constituíam uma prova incontestável de que tanto Lyndon Johnson
como Richard Nixon haviam mentido para o povo norte-americano para
que [este] aceitasse a guerra e sua escalada.
Um
dos exemplos históricos mais ilustrativos dos abusos do grande júri
foi o assédio dos investigadores federais a Daniel Ellsberg, a seus
familiares e a todas as pessoas relacionadas com ele. As “sub
penas” ou ordens de comparecimento obrigatório foram utilizadas
como instrumento de repressão e castigo, inclusive contra o filho de
Ellsberg, de 15 anos de idade.
A
11 de maio de 1973, a sólida defesa dos advogados de Ellsberg, por
uma parte, e a grosseira atuação do governo com seus métodos
coercitivos ou ilegais para a obtenção de evidências, por outra,
determinaram que o juiz de distrito William Byrne rechaçasse todas
as acusações contra Ellsberg e Russo.
O
desespero da administração Nixon por impedir novos filtros e por
obter informação que desacreditasse a Ellsberg conduziu à criação
dos “plumbers” [chumbeiros] da Casa Branca e a muitos dos abusos
que ficaram conhecidos posteriormente ao produzir-se o escândalo de
Watergate. Depois da exoneração de Ellsberg, o fiscal William
Merrill revelou a este que existiu um complô para “incapacitá-lo
totalmente”, que na linguagem da máfia significava assassiná-lo.
Esta ação seria executada pelo próprio pessoal do Watergate,
incluindo a um grupo de terroristas cubano-americanos de Miami a
serviço da CIA. [2]
A
etapa cibernética na difusão de informações secretas é iniciada
pelo jornalista australiano Julián Assange, fundador e editor de
WikiLeaks, que adquire notoriedade internacional a partir de 2010. A
difamação e a perseguição não tardaram em chegar e Assange teve
que refugiar-se, desde 19 de junho de 2012, na Embaixada do Equador
em Londres para evitar a extradição para a Suécia e a subsequente
extradição para os Estados Unidos, onde seria processado por
divulgar centenas de milhares de documentos classificados
diplomáticos e militares.
Assange
e o grupo musical porto-riquenho Calle 13 lançaram no dia 13 de
novembro o tema “Multi_Viral”, sobre a manipulação informática
dos meios de comunicação. “Querem deter o incêndio que se
propaga, porém há fogos que com água não se apagam”, diz a
letra do rap.
Chelsea
Elizabeth Manning [Bradley Edward anteriormente], soldado do Exército
dos Estados Unidos, foi escalado como analista de inteligência de
uma unidade militar destacada no Iraque, onde teve acesso a bases de
dados classificados. Nos inícios de 2010, filtrou para WikiLeaks um
grande volume de material secreto, que incluía vídeos do genocida
ataque aéreo do 12 de julho de 2007 sobre Bagdá, do massacre de
Granai de 4 de maio de 2009 no Afeganistão, 250.000 cabogramas
diplomáticos estadunidenses e 500.000 informes do Exército
conhecidos como “Iraq War log” e “Afgan War log”. Grande
parte deste material foi publicado por WikiLeaks ou seus meios afins.
Em
julho de 2013 Manning foi condenado, por violação da Lei de
Espionagem e outras acusações, a 35 anos de prisão, com
possibilidade de liberdade condicional [“parole”] em oito anos.
Manning cumprirá sua sentença na instalação penitenciária de
máxima segurança conhecida como “U. S. Disciplinary Barracks”,
em Fort Leavenworth.
Edward
Snowden, ex-empregado da CIA e da NSA, entregou ao Washington Post, a
The Guardian e outras publicações uns 200.000 documentos
classificados, os quais puseram a descoberto o programa de vigilância
massiva da NSA e, em menor grau, das agências homólogas em
Grã-Bretanha [GCHQ], Israel [ISNU], Canadá [CSE] e Noruega [NIS].
Em maio de 2013 saíram à luz pública os programas de vigilância
na Internet, como PRISM, XKeyscore e Tempora, e nas comunicações
telefônicas. Acusado de espionagem e de roubo de propriedade
governamental, Snowden é considerado um fugitivo pelas autoridades
norte-americanas e vive atualmente na Rússia, na qualidade de
asilado temporário.
Apesar
da repressão e das cada vez mais rigorosas medidas de controle dos
fluxos de informação, não será possível deter os filtros. Isto
se deve a uma contradição insolúvel do sistema. Se um governo atua
à margem das normas de convivência internacional, terá
necessariamente que guardar o segredo de suas atividades e, quanto
maior e mais abrangente seja a quantidade de informação
classificada, maior número de pessoas terá que ser autorizado para
o acesso a ela, pois, de outro modo, a maquinaria burocrática do
Estado não poderia funcionar e, por conseguinte, maior será o
número de pessoas que terão conhecimento dos maus manejos da
administração e que estarão dispostas a denunciá-los.
Os
ciberativistas, incluindo seus guerreiros clandestinos, os
ciberinfiltrados, têm a possibilidade e a vantagem de não atuar
sós, mas sim formando parte de redes mundiais que não estão
limitadas por distâncias nem fronteiras e nas quais os participantes
se comunicam entre si de maneira instantânea. Estes cibergladiadores
nutrirão certamente as fileiras dos prisioneiros políticos,
principalmente nos Estados Unidos, porém os vampiros da política e
da guerra perecerão ou terão que aprender a viver à luz do dia.
Ellsberg
como precursor e, mais tarde, Assange, Manning, Snowden, Hammond e
muitos outros converteram em obsoletas as regras de jogo dos serviços
de inteligência e apagaram o sonho imperial de uma Internet global,
a rede única abaixo de Deus e do Tio Sam, pois todo mundo já sabe
que os Estados Unidos buscam o controle da Internet para obter o
domínio total da informação, e é um axioma consagrado pelo tempo
que quem tem a informação tem o poder.
tradução: Joaquim Lisboa Neto
Notas:
(1) Rand (Research And Development) Corporation. Tanque de pensar que en sus orígenes tuvo como función principal ofrecer a las fuerzas armadas de Estados Unidos los resultados de sus investigaciones y análisis en política global.
(2) Democracy Now: Entrevista a John Dean y a Daniel Ellsberg, 27 de abril de 2006.
URL de este artículo: http://alainet.org/active/69486
Otros documentos de esta serie:
http://alainet.org/active/show_author.phtml?autor_apellido=Capote&autor_nombre=Salvador
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tradução: Joaquim Lisboa Neto
Notas:
(1) Rand (Research And Development) Corporation. Tanque de pensar que en sus orígenes tuvo como función principal ofrecer a las fuerzas armadas de Estados Unidos los resultados de sus investigaciones y análisis en política global.
(2) Democracy Now: Entrevista a John Dean y a Daniel Ellsberg, 27 de abril de 2006.
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