“Somos rebeldes, não narcotraficantes”
Recentemente,
escutamos o chefe da Delegação do Governo, doutor Humberto De la
Calle, e o Presidente Juan Manuel Santos referirem-se à necessidade
de reconhecer a natureza do delito político e suas conexões,
afirmando o mais básico acerca da rebelião, enquanto a que é um
direito fundamental, um direito humano, um direito dos povos.
Nesta
mesma semana, na Cúpula Ibero-americana, no México, novamente, o
primeiro mandatário aludiu ao delito político, porém associando-o
ao narcotráfico. Ao fazê-lo dessa maneira, confunde na mente dos
colombianos e de muitos no mundo a imagem do guerrilheiro com a do
narcotraficante, incorrendo numa distorção conceitual de fundo,
que, em vez de concitar apoio à causa da paz, gera confusão.
Esta
confusão que desfigura a luta altruísta, que implica o legítimo
desejo à rebelião, de alguma maneira aponta a assinalar as FARC-EP
como um grupo de narcotraficantes.
Neste
contexto, os argumentos dos altos funcionários do Estado, que
aparentemente estariam ordenados a ampliar os conexos ao delito
político, como parte das saídas jurídicas que viabilizem a paz, no
fundo o que buscam é o desprestígio de uma força rebelde que, por
princípio, considera nociva a existência do negócio capitalista do
narcotráfico.
As
FARC-EP temos exposto e assumido sempre, com responsabilidade e
interesse, o debate público sobre o fenômeno do narcotráfico como
um problema social e global, que requer o concurso das nações do
mundo para sua solução. De fato, o acordo parcial do quarto ponto
da Agenda de Diálogos assim o confere, e evidente é que está
construído a partir de nossas propostas mínimas que o país conhece
e que acusam ao setor financeiro, através da lavagem de ativos, como
seu motor fundamental.
O
delito político é outro assunto. A rebelião é delito político e
todo ato, toda conduta que se realize para fazê-la efetiva tem
caráter conexo.
A luta
de meio século das FARC-EP se prende às condutas de tipo político
e militar que configuram a rebelião; elas têm tido como objetivo
supremo avançar na construção de outra Colômbia, em liberdade e
democracia. E nisto se incluem os atos de financiamento que distintos
setores tocaram, incluídos traficantes de todo tipo de mercadorias
legais e ilegais, sem envolver-nos em procedimentos de cultivo de
maconha, coca ou amapola, nem em atividades de produção ou
comercialização de drogas de uso ilícito.
As
atividades realizadas pelas FARC-EP, todas, têm sido executadas em
função da rebelião, e assim ficou conferido e superado no pactuado
sobre o ponto 4º do Acordo Geral, “Solução ao problema das
drogas ilícitas”. De tal maneira que as acusações que nos liguem
ao narcotráfico são pérfidas e inúteis no processo da
reconciliação.
Nunca
admitimos nem admitiremos ser narcotraficantes ou que os fatos que
configuram o complexo fenômeno do narcotráfico se assimilem, em seu
conjunto, ao caráter que têm o delito político e a rebelião;
entre outras considerações, porque nunca poderíamos aceitar que um
negócio, qualquer que seja, destinado ao enriquecimento pessoal,
possa ser admitido como altruísta e revolucionário, menos ainda
quando neles estão articuladas verdadeiras organizações e redes
criminais transnacionais, cujo ninho é o poder financeiro mundial.
Para o caso da Colômbia, este poder se cristalizou em grupos
banqueiros, em cúpulas econômicas e políticas ligadas à lavagem
de ativos, à especulação, à construção, à indústria, ao
latifúndio, ao paramilitarismo, desde os tempos do Diretor da
Aeronáutica Civil, de janeiro de 1980 a agosto de 1982, que concedeu
centenas de licenças para circulação de aeronaves e pistas de
aterrisagem de capos do narcotráfico.
Assim
como as FARC-EP desenvolvem propostas na Mesa de Diálogos para
recuperar o campo transversal e transparente do delito político e
sua conexidade, diferenciando por razões éticas, políticas e
jurídicas um rebelde de um paramilitar, ou de um narcotraficante,
também vamos seguir insistindo no cumprimento de obrigações como a
que se consagrou no Acordo sobre drogas ilícitas, referida ao
tratamento penal diferenciado, para que o Estado não se enfureça
contra pequenos agricultores que estejam ou estiveram vinculados com
cultivos de uso ilícito, quando grandes narcotraficantes e
patrocinadores estão livres e acomodados nas benesses do poder.
Insistimos, portanto, no combate aos verdadeiros narcotraficantes,
que são os comercializadores e lavadores de dinheiro.
Com o
propósito de estabelecer critérios transparentes nesta matéria,
será muito benéfico que o governo cumpra com o compromisso do ponto
4.3.6 do acordo parcial referido a esta temática que expressa que
“No marco da discussão do ponto 5.2 da Agenda do Acordo Geral se
estabelecerá o mecanismo que deverá, entre outros, abordar o tema
do esclarecimento da relação entre produção e comercialização
de drogas ilícitas e conflito, incluindo a relação entre o
paramilitarismo e o narcotráfico...”.
Não
estamos contra construir uma saída política, jurídica, de diálogo,
de consenso social, nacional e internacional frente ao tema das
drogas e dos circuitos que se alimentam desse flagelo e que, ao mesmo
tempo, reforçam-no. Porém, a via não é relacionando o direito
universal à rebelião e a categoria do delito político e sua
conexidade ampla com um negócio de benefício pessoal lucrativo, que
é oposto às razões altruístas, à essência e ao ideário
humanista que as FARC-EP defendem.
DELEGAÇÃO
DE PAZ DAS FARC-EP
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Equipe
ANNCOL - Brasil