"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


quinta-feira, 23 de outubro de 2014

As coisas não serão como a oligarquia sonha





«No país se configura a cada dia com maior força um amplo movimento social e político que trabalha por uma paz muito diferente da que o regime pensa»


A tropa dos grupos narco paramilitares pertencia ao povo raso. E sua missão era estripar seres humanos, capturar compatriotas inconformistas para atirá-los aos fossos de jacarés ou despedaçá-los com motosserras, assassinar suas vítimas com armas de fogo para depois lhes amputar a cabeça e fixá-la em varas expostas à passagem de outros moradores, saquear seus bens e incendiar suas propriedades, desterrá-los à força de cometer as mais espantosas atrocidades.
Atuavam acreditando serem os bons. Forças armadas, organismos de inteligência, personagens de grande superioridade social, destacados colunistas da grande imprensa, figuras políticas reconhecidas, jornalistas estrela do rádio e da televisão, todos se uniam para expressar a necessidade de reconhecer a justiça das razões do paramilitarismo e a urgência de outorgar-lhe reconhecimento político. Assim, a massa sanguinária que aterrorizava boa parte do país se sentia redentora.
O esforço conjunto do estabelecimento produziu seus efeitos e as posições afins ao extermínio adquiriram carta de apresentação social, se tornaram de bom recibo. Não foram só os membros de base dos grupos paramilitares os que, sobrevivendo em condições difíceis, resultaram envolvidos na engrenagem do terror. Também uma considerável massa de colombianos rasos, sobretudo das grandes cidades, terminou seduzida pelo discurso da segurança e da guerra.
Da solapada atitude militarista de Andrés Pastrana se passou ao desenfreado totalitarismo de Álvaro Uribe, em ombros do agrupamento nacional da ultra direita triunfante nas eleições. As forças militares e de polícia, conduzidas já sem fingimento algum desde Washington pelos estrategistas do Pentágono, da CIA e da DEA, passaram a tomar o controle do país por meio da violência brutal de suas operações, e terminaram elevadas à categoria de heróis da pátria.
Se reforçaram em níveis impensáveis seu orçamento e pé de força, ao tempo em que a tecnologia e o apoio dos USA, da Grã-Bretanha e de Israel apontaram a apresentá-las como invencíveis, inclusive no concerto regional. Tudo isso, somado à apoteose do paramilitarismo e da investida midiática generalizada a favor do ódio, imprimiu em boa parte dos colombianos uma mentalidade agressiva e intolerante. Exemplo disso são as recentes declarações do hacker Sepúlveda.
Devemos reconhecer, efetivamente, que a política do terror terminou por fazer-se a um lugar no ânimo de boa parte de nosso povo. Muitos denominaram-no direitização do país. A fachada democrática da institucionalidade colombiana não consegue dissimular a realidade dominante da violência e do medo. A oligarquia sabe que resulta impossível dominar toda a população pela força, há que ganhar parte dela, e dedica muitos recursos a isso.
Se fala do partido político das forças armadas. Seu meio milhão de integrantes, privilegiados em muitos aspectos, em comparação com o resto da população trabalhadora, não só é doutrinado em suas escolas de formação e prática cotidiana como também gira ao redor de um grande entorno ideológico que envolve as suas famílias, amizades mais próximas e a milhares de aposentados e seus chegados. Fazem política diariamente com suas emissoras e operações cívico militares.
Se os nazistas acusaram os judeus bolcheviques como responsáveis pela tragédia econômica e social da Alemanha, a direita colombiana fez o mesmo com os que chamaram terroristas das FARC e seus cúmplices. O ambiente psicológico criado a partir da Presidência e reforçado pela mídia, pelas forças armadas, pelos empresários, pela classe política, pelos grupos narco paramilitares e por seus financiadores, entre outros, induziram o país à cegueira e à indiferença.
Os assassinatos, os massacres, os horrores da violência militar e narco paramilitar foram perdendo sua dimensão de espanto. Se acaso passaram a ser tristes episódios isolados, por outro lado, todos tinham que se estremecer pela barbárie do acionar guerrilheiro e o grau de desumanidade de seus comandantes. Nessa direção apontou a estratégia política das classes no poder: apagar ou minimizar o horror oficial e narco paramilitar com o suposto horror guerrilheiro.
O narco paramilitarismo podia ser convertido em movimento político com garantia de impunidade. As reforçadas forças armadas poderiam cumprir o vazio deixado por aquele. Assim sobreveio o processo com os primeiros, a chamada lei de justiça e paz e a farsa de sua desmobilização, enquanto que para as segundas se implementaram o Plano Patriota e seus complementos, ao tempo em que se institucionalizavam os falsos positivos e se promoveram suas frequentes matanças.
A frenética obsessão de Adolf Hitler terminou por conduzir o mundo à Segunda Guerra Mundial e a Alemanha à sua destruição total. As classes no poder aprendem as lições, assim que, com tudo e agradecer sua gestão ao Presidente Uribe, combinaram na necessidade de substitui-lo antes que terminasse por incendiar o continente com seu visceral ódio às FARC, Venezuela e Cuba. Nos ombros da ultra direita, chegou um mais moderado Santos a culminar a obra.
Os diálogos de paz, como está mais que demonstrado, não foram uma concessão sua. Uribe já os havia proposto, ainda que se indigne ao recordá-lo. Para o projeto da ultra direita sempre esteve claro que, após a redução militar das FARC e sua ruína política por conta da gigantesca campanha midiática de descrédito, havia que abrir uma mesa de conversações com o propósito de conseguir a firma de sua rendição. É sua maneira de entender a paz.
Por isso, não nos surpreende o modo como pretendem superar o tema de vítimas em discussão na Mesa de Havana. Buscam com que os sistemáticos crimes das forças armadas e do narco paramilitarismo não tenham espaço ali. Em seu parecer, isso já foi solucionado, o governo expediu uma lei para essas vítimas, o que há que tratar e castigar são nossos supostos crimes. Ademais de cínica, a oligarquia colombiana se equivoca outra vez conosco.
Como insurgência revolucionária rechaçamos frontalmente qualquer imputação criminal. Os alçados em armas, definitivamente, não somos delinquentes. Ao dar cara às vítimas, reconhecemos que no exercício de nosso acionar se sucederam erros imponderáveis, que lamentamos profundamente. Os quais estamos dispostos a reconhecer e explicar. Porém, nós não elegemos o levantamento armado, fomos obrigados e ele pela fúria assassina da oligarquia liberal conservadora.
É ela a chamada a responder por esta guerra, suas consequências e seus milhões de atrocidades. Ainda que todavia conte com parte do povo: o partido das forças armadas e do narcotráfico, as hostes do caciquismo e dos beneficiários da esmola social, as clientelas partidárias e os que vendem o voto. Porém, o grosso da opinião que antes acreditou em sua propaganda se encontra desencantado pela realidade em que vive. Os anos de guerra total agravaram seus problemas.
No país se configura, a cada dia com maior força, acima do silêncio midiático, um amplo movimento social e político que trabalha por uma paz muito diferente da que o regime pensa. Essa lógica imperialista da força bruta, tão ao gosto da classe dominante colombiana, que outorga um suposto direito a fazer o que seja em defesa de seus interesses, desperta um profundo rechaço em todos os povos do mundo. É ela a chamada ao lixeiro da história.
Montanhas de Colômbia, outubro de 2014.