Manuel Zelaya: "se necessário, o povo defenderá nas ruas a sua vitória nas urnas"
Deposto por um golpe militar patrocinado pelos EUA em 2009, Zelaya enfatizou que "as urnas falaram em defesa de uma mudança profunda".
Exigimos
que se respeite a decisão do povo de que Xiomara Castro seja a sua
presidenta. Não importa o que façam, porque esse processo se
iniciou e ninguém vai pará-lo”, afirmou o coordenador do Partido
Livre (Liberdade e Refundação), Manuel Zelaya. Junto a centenas de
militantes, o ex-presidente destacou durante coletiva de imprensa
nesta segunda-feira (25) em Tegucigalpa que, “se necessário, o
povo defenderá nas ruas a sua vitória nas urnas”.
Deposto
por um golpe militar patrocinado pelos EUA em 2009, Zelaya enfatizou
que “as urnas falaram em defesa de uma mudança profunda” e
denunciou que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) age em função dos
interesses da oligarquia vende-pátria, representada pelo candidato
Juan Orlando Hernández, do Partido (Anti) Nacional.
“O
Tribunal não está contabilizando 1.900 atas, cerca de 400 mil
votos, de zonas em que o Partido Livre ganhou amplamente. Estamos
prontos para comparar as atas que temos com as que chegaram do TSE.
Que eles demonstrem o contrário, que perdemos. Nunca poderiam
fazê-lo”, acrescentou Zelaya, aplaudido de pé.
Segundo
Zelaya, a disposição do Partido Livre não é a de “conclamar a
sublevação, mas de garantir direitos, que não se negociam”. “Por
que o Tribunal aparta 20% das urnas em seu resultado? Basta ter um
mínimo de inteligência para explicar”, condenou o ex-presidente,
com a militância respondendo em coro: “vamos às ruas!”.
A
presidenta eleita, Xiomara Castro, dedicou a vitória aos “homens e
mulheres que entregaram sua vida por esta causa, aos jovens que
doaram seu sangue pela liberdade da Pátria e de todo o povo
hondurenho”. “Os dados que recebemos de todo o país com a
contagem das atas eleitorais confirmam que sou a presidenta da
Honduras. Não vou decepcionar, cumpriremos da primeira a última
palavra empenhada”, agradeceu.
Rechaço
à fraude
O
candidato do Partido Anti-Corrupção (PAC), Salvador Nasralla,
também rechaçou a fraude: “Os resultados estão dramaticamente
violentados e não correspondem à realidade”. Nasralla, um
apresentador de televisão, asseverou que o partido governista
utilizou dois call centers para produzir e escanear atas
falsas. Elas seriam enviadas ao centro de apuração, adulterando os
resultados. “Tenho todas as provas e já apresentei uma denúncia à
fiscalização. Além disso, o partido do governo comprou muitos dos
representantes de mesa do meu partido, para que se retirassem do
centro de votação e não defendessem nossos votos”, disse.
Reforçando esta denúncia, a TV
Globo de Honduras divulgou entrevistas com inúmeros fiscais que
comercializaram suas credenciais partidárias para o Partido
Nacional. A reflexão é elementar: pela legislação eleitoral, as
mais de 16 mil urnas necessitariam de pelo menos 32 mil pessoas de
cada partido, entre fiscais e suplentes. Tais agremiações deveriam
ter, portanto, pelo menos esses dois votos. Abertas as urnas, os
partidos que atuaram como legenda de aluguel, todos juntos, não
somaram sequer 1% dos votos. Formados para isolar o Partido Livre,
seus “representantes” atuaram para controlar as mesas eleitorais
e armar a fraude.
"Graves evidência de fraude"
Foi o que viu a delegação de
observadores da Confederação Sindical Internacional (CSI), que
apontou a existência de “graves evidências de uma fraude
eleitoral”. “Durante todo o dia recebemos denúncias de diversas
formas de manipulação e compra de votos, ameaças e outros atos de
violência contra os fiscais e os eleitores do Livre”, informou a
CSI, ressaltando que “alguns deles foram testemunhados pelos
representantes da missão, assim como pelas várias organizações
internacionais aqui vindas para observar as eleições”.
Também nesta segunda-feira à tarde,
no Comitê de Familiares de Detidos e Desaparecidos de Honduras
(Cofadeh), a canadense Laura Carter, dirigente do Industrial Global
Union, apontou a existência de “uma série de irregularidades, que
podem ter impacto determinante nos números divulgados pelo TSE".
Laura informou que na zona de São Miguel, na região metropolitana
de Tegucigalpa, que conta com 50 mil votantes, força expressiva de
Xiomara, nada menos do que 400 eleitores apareceram como "mortos"
- sendo retirados da lista, sem poder votar - e outros mil
simplesmente "desapareceram do registro".
Marcelina Samaniego, representante da
Internacional dos Trabalhadores da Construção e da Madeira (ICM),
denunciou “a sonegação de informações e o não envio das
planilhas de votação”. Como na região de San Pedro Sula,
onde Xiomara liderava, esclareceu Marcelina, o jovem que manejava o
computador e centralizava o processo lhe disse ter "orientações
claras" para atrasar o envio de urnas desfavoráveis. "Nós
não podíamos ter acesso e a Força Pública e a Militar estavam ali
para respaldar o que eles dissessem", acrescentou.
Denis
Roberto Aguilar Gomez, fiscal do Partido Livre na Escola Tomas
Alvarez na mesa 9357, no bairro Nova Esperança, na região
metropolitana de Tegucigalpa, foi agredido por 20 fascistas do
Partido Nacional. Quando foi denunciar aos policiais militares acabou
sendo detido ilegalmente e agredido, por ser de oposição. "Me
torturaram dentro da escola", relatou, mostrando as marcas da
agressão.
Perseguição
e intimidação
Às vésperas das eleições de
domingo (24), o governo hondurenho utilizou policiais militares e da
migração para perseguir e intimidar observadores internacionais,
identificados como simpatizantes de Xiomara. Personalidades como
Rigoberta Menchú, prêmio Nobel da Paz, foram impedidas até de
entrar no país. Ao mesmo tempo, os golpistas convidaram 23
organizações de extrema direita para acompanhar o pleito.
Na cidade
de El Progreso, próxima a San Pedro Sula, um dos principais polos da
resistência ao golpe contra Zelaya, cinco soldados da Migração,
fortemente armados, entraram no centro de capacitação da Igreja em
busca de “salvadorenhos”. Terceira principal cidade do país, El
Progreso é o berço de Roberto Micheletti, ditador alçado ao poder
em 2009.
Na capital, Tegucigalpa, prefeitos e
parlamentares da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional
(FMLN), que governa El Salvador, também foram abordados e
constrangidos por policiais a poucos metros do Honduras Maya, hotel
em que estamos hospedados.
Nesta segunda, soldados fortemente
armados voltaram a cercar o hotel, tentando impedir um protesto
pacífico contra a fraude eleitoral, condenada em coro como um novo
golpe. “Mídia vendida, conta-nos bem, não somos um, não somos
cem”, alertaram os manifestantes, repudiando a manipulação dos
grandes conglomerados de comunicação em favor dos golpistas.