FARC: “Soluções são políticas, não jurídicas”
As
FARC recolhem propostas em torno dos temas que ainda estão por se
discutir. Ratificam a importância de ter firmado a Declaração de
Princípios. Esclarecer a origem do conflito e suas causas será um
pilar para levar a bom termo um acordo. “Não negociamos
impunidades”.
Carlos
A. Lozano Guillén
Enviado
especial
A
Delegação da Paz das FARC-EP está preparando o arsenal de
propostas para os temas que restam na discussão da mesa de Havana,
que na hora da verdade equivalem à metade da agenda combinada no
“Acordo Geral para a terminação do conflito e a construção da
paz estável e duradoura”.
Seus
integrantes estão em acampamento de primeiro grau, ainda que, isso
sim, não lhes tiram a atenção das partidas do Mundial de Futebol
no Brasil. Enquanto conversávamos com Iván Márquez e Ricardo
Téllez, no passado sábado 21 de junho, na “Casa de Piedra”,
escritório da Delegação de Paz, não perdiam de vista o jogo entre
Argentina e Irã, em que, ao final, em tempo adicional, ganhou a
forte equipe sul-americana pela mínima diferença. Deu a impressão
de que Márquez e Téllez vacilavam entre apoiar ao irmão
latino-americano ou ao mais fraco, neste caso o Irã, um país com um
governo que resiste ao império gringo.
“Estamos
trabalhando em várias opiniões e propostas, não só sobre o tema
das vítimas como também sobre os três que restam”, anuncia Iván
Márquez, chefe da Delegação de Paz das FARC-EP. Uma comissão
técnica trabalhará sobre o “fim do conflito” e continua o
debate de como blindar os acordos parciais para preservá-los. “Nisto
jogará um papel fundamental o bloco de constitucionalidade à luz
dos tratados especiais, consagrado na Constituição Política”,
diz Márquez.
No
momento da conversação não se conhecia a data do reinício da
rodada sobre vítimas. “Nos disseram que a delegação do Governo
chegará em 23 de junho, porém não sabemos nada de concreto”.
“Porém,
estamos preparados para começar”, estabeleceram. O ponto de
partida é a designação da Comissão de Esclarecimento da Origem do
Conflito. Para as FARC-EP é fundamental, porque é a única maneira
de estabelecer quando começou, sob que causas, quais foram suas
incidências, quem são as vítimas e, consequentemente, estabelecer
as responsabilidades.
“Não
negociamos impunidades”
Para
Iván Márquez, “não viemos para negociar impunidades, porque este
é um problema político e não jurídico”. Daí a importância que
dão à comissão acordada na Declaração de Princípios. Deve ser
uma só comissão, poderão ser 12 integrantes, a metade proposta
pelo Governo e a outra metade pelas FARC, sob a condição de que
sejam acadêmicos reputados, de idoneidade moral e conhecedores do
tema. Terão que apresentar um só informe que ajude a esclarecer a
origem do conflito e as causas do mesmo.
Lhes
perguntamos como fica o processo depois das eleições presidenciais
e asseguram que a maioria do país, numas eleições em que a metade
dos cidadãos não participou, respaldou a paz com mudanças
democráticas e reformas políticas e sociais. Do ponto de vista
deles, não avalizou o projeto de Zuluaga, porém tampouco o de
Santos. “O país quer uma paz inclusiva, com ampla participação
dos colombianos”, dizem.
Preveem
um maior respaldo nacional e internacional pela paz em Colômbia.
Virá em breve um pronunciamento muito claro e concreto do Vaticano,
disseram, sem dar mais detalhes. Porém, que haverá, haverá. O
resultado das urnas, no [nível] nacional, compromete as duas partes,
não só a guerrilha, como pretendem dizer desde o lado governamental
e de alguns meios de comunicação.
Blindar
acordos parciais
É
necessário blindar os acordos parciais. Devem ser elevados a acordos
especiais. É a maneira de salvá-los e de que tenham ação
imediata, porque a democratização da vida nacional não depende
exclusivamente dos resultados e esforços de Havana. É a voz de
consagrados juristas nacionais e internacionais que se pronunciam e
ajudam nesta direção.
Advertem
que as liberdades e o fortalecimento político democrático não
dependem do acordo final, são parte do conceito global do pluralismo
ideológico e das garantias para a participação política em pé de
igualdade. Se algo demonstraram os comícios eleitorais de
corporações públicas e presidenciais, são os enormes vazios do
regime eleitoral, campeiam a fraude, a compra-e-venda de votos, o uso
da máquina pública e
o “vale-tudo” dos partidos do estabelecimento, sem excluir a
Unidade Nacional e o uribismo.
Para Márquez, o
anterior é forçado, é o que se depreende dos resultados eleitorais
e do clamor pela paz com democracia e justiça social. “O governo
não pode ser incoerente”, porque não lhes avalizaram a vacilação
e as concessões aos inimigos da paz, assinala. Para as FARC-EP, hoje
está mais perto do que antes o acordo final, porém falta um longo
caminho para percorrer.
O Acordo
de Princípios
sobre Vítimas
é importante. Também, é
chave a participação das organizações humanitárias e,
a composição da Comissão
de Esclarecimento.
Por aí é necessário começar, porque de suas conclusões sairão
as etapas históricas inequívocas de como abordar o tema. Porém,
o que está muito claro
é a pretensão do estabelecimento, de
impedir que na Mesa de Conversações seja tratado em profundidade o
Ponto da Agenda sobre as Vítimas. Sem dúvida, esse ponto é um tema
de singular importância para entender e visibilizar as causas da
violência e do levantamento armado da insurgência.
Infelizmente, o governo
conta com a ajuda de umas supostas “organizações
de vítimas”, de
aproveitadores e
negociantes da tragédia do conflito.
O
tema militar
Ainda
que Márquez e Téllez prefiram ser discretos devido à
confidencialidade de certas discussões, não ocultam a preocupação
pelas tranqueiras do Governo Nacional ao debate de temas
transcendentais, como a reforma das Forças Militares. Para ninguém
é um segredo o alto grau de decomposição interna de que padecem e
de seus vínculos com a guerra suja contra a esquerda e as
organizações sociais e populares. Não é casual que membros ativos
dos estamentos militares e de polícia tenham apoiado de forma aberta
o candidato da guerra, Óscar Iván Zuluaga.
Disse
Pablo Catatumbo ao jornalista Alfredo Molano Jimeno em El Espectador
do passado domingo 22 de junho:
“[...]
ainda
há fortes
setores militaristas dentro da oficialidade, fortalecidos e
influenciados pelo pensamento fascista que Uribe representa. São
estes os que se opuseram e se opõem fervorosamente à busca de uma
solução política ao conflito, antepondo seus interesses pessoais
aos interesses da Nação. Porém, essa opção é a que, pouco a
pouco, tem sido derrotada pela opinião nacional que se inclina pela
paz”.
“Não é possível a
paz com umas Forças Armadas manejadas por este tipo de inimigos
dela. É o cúmulo, por exemplo, que na sede de Acore –do qual há
fotos- se reúnam grupos neonazistas, que realizem atos públicos a
favor do fascismo, que destruam murais emblemáticos em homenagem às
vítimas, e por parte do Governo ninguém diga nada”.
Fonte:
ww.semanariovoz.com