Brasil, Bolívia, Chile e Nicarágua são exemplos no combate à fome na América Latina
Por Crisina Fontenele
Adital
Segundo o recente
relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e
Agricultura (FAO), o percentual de pessoas atingidas pela fome na
América Latina e Caribe baixou de 14,7% para 5,5%. Nos últimos 20
anos, mais de 30 milhões de pessoas superaram a fome na região.
Desde 2002, a pobreza tem diminuído de 44% para 28%. As causas dos
resultados positivos estão relacionadas com investimentos em
políticas públicas focadas na redução da pobreza e da
desigualdade.
A experiência brasileira
O Brasil vem apresentando importantes reduções. Na década de 1990, o total de pessoas subalimentadas superava os 22 milhões, representando 14,8% da população. Atualmente, a taxa é inferior a 5%. Em 23 anos, o país diminuiu em 29,7% a pobreza e 17,4% a pobreza extrema. De acordo com o relatório, o resultado positivo responde a um contexto macroeconômico favorável, que permitiu políticas públicas e a participação de setores envolvidos no combate à fome.
Em entrevista a Adital, Marcelo Gonçalves, secretário-executivo do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)diz que o bom desempenho brasileiro é resultado de uma década de esforços conjuntos, que foram sendo aprimorados. Gonçalves destaca que a experiência brasileira é apontada como inovadora, sendo já premiada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma importante ferramenta de gestão social. Ele cita que o formato já é copiado em países da América Latina e da África.
Para ele, a inovação do Brasil nas políticas de combate à fome deve-se à intersetorialidade dos projetos, ao fortalecimento da renda da população mais pobre e à participação social. Ressalta que o fortalecimento da agricultura familiar, por meio de políticas de crédito, é importante para aumentar a disponibilidade de calorias de alimentos para a população. "A agricultura em larga escala produz apenas soja, milho, cana, enquanto a agricultura familiar gera os alimentos do dia-a-dia, como verduras, legumes, feijão”.
O fortalecimento da renda da população mais pobre também é outro fator decisivo no combate à fome. Gonçalves comenta que não adianta apenas ter disponibilidade de alimentos se não há disponibilidade de acesso aos produtos. Programas sociais, como o Bolsa Família, o aumento dos índices de emprego e a valorização do salário mínimo contribuíram para a ampliação da renda e para viabilizar o acesso aos alimentos. De acordo com o secretário do Consea, pesquisas apontam que, quando se aumenta a renda familiar, as pessoas preferem alimentos mais saudáveis. Portanto, outro reflexo positivo da elevação da renda é uma alimentação de mais qualidade.
A experiência
brasileira inclui ainda políticas voltadas para a alimentação
escolar. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) atende a
em torno de 43 milhões de estudantes todos os dias do ano letivo.
"Esta é uma refeição destaque ao longo do dia para as
crianças”. Gonçalves informa que 30% do Penai devem ser comprados
da agricultura familiar. "Percebemos, então, a união de duas
políticas que vão se comunicando num sistema de gestão
interligado”.
Ele comenta que o Brasil já saiu do Mapa da Fome, o que significa ter menos de 5% das pessoas em situação de insegurança alimentar. "Atualmente, devemos estar com uma taxa 1,7%, o que significa em torno de 3 milhões de pessoas nessa condição extrema, e isso ainda é muita gente”. O especialista diz que essas pessoas, geralmente, fazem parte de populações isoladas e bem específicas, como os povos indígenas – que são afetados em dobro pela insegurança alimentar - e comunidades tradicionais (quilombolas, extrativistas, ribeirinhos, pantaneiros). Para Gonçalves, também é preciso reconhecer que a população negra ainda enfrenta uma "carga mais pesada” de insegurança alimentar.
O próximo passo no combate à fome, diz ele, é focar em políticas públicas para essas populações específicas, além de manter as políticas universais já consolidadas.
América Latina e Caribe
De acordo com o relatório da FAO, a Bolívia reduziu a fome de 38% (1990-92) para 16% em 2014-16. No Chile, de 1990 a 2013, a pobreza passou de 38,6% para 7,8%, e a pobreza extrema de 13% a 2,5%. Na Argentina, Barbados, Costa Rica, Cuba, México e Uruguai, os índices de pessoas que sofrem com a fome estão abaixo de 5%.
Destaque para Nicarágua, um dos países que mais reduziram a fome nos últimos 25 anos. A taxa baixou de 54,4% (1990-92) para 16,6% (2014-16), forma 37,8 pontos percentuais.
O informe revela ainda que a agricultura familiar é a protagonista da segurança alimentar e nutricional, da redução da pobreza e da sustentabilidade do meio ambiente. Segundo a FAO, cerca de 500 milhões de propriedades familiares gerenciam a maior parte das terras agrícolas e 80% das que produzem alimentos são agricultores familiares.
A proposta da América Latina e Caribe é de ainda erradicar totalmente a fome antes de 2025, por meio da Iniciativa América Latina e Caribe sem Fome. A redução da fome na região alcançou as metas internacionais dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) e as da Cúpula Mundial da Alimentação (CMA). No total, 17 países lograram a meta ODM e 11 países alcançaram a meta da CMA, entre eles Argentina, Brasil, Chile, Cuba, Guiana, Nicarágua, Peru, República Dominicana, São Vicente e Granadinas, Uruguai e Venezuela.
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América Latina e Caribe, e Ásia
cumpriram a meta de redução da fome. África está com 55,1%,
enquanto a Oceania apresenta avanço de 19,1%. No total global, o
alcance é de 82,8% da meta.
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Segundo o representante regional da FAO, Raúl Benítez, "a história de êxito da região se sustenta na positiva situação macroeconômica durante as últimas décadas e o sólido e contínuo compromisso político dos países da América Latina e Caribe com a erradicação da fome”.
A luta contra a fome mudou de um olhar setorial para uma abordagem transversal e intersetorial. A situação ainda afeta mais de 34 milhões de pessoas na América Latina e Caribe. Os estudiosos destacam que esforços para erradicar a condição de subalimentação precisam continuar, apesar dos bons resultados. Em nível global, segundo o relatório, ainda 10,9% da população se encontra subalimentada.