QUAL JUSTIÇA?
Existe
uma corrente no país que pretende institucionalizar a visão de que
a demora em alcançar acordos no ponto Vítimas da Mesa de
Conversações se origina num suposto temor das FARC-EP a abordar o
tema de justiça. A respeito disso é pertinente um esclarecimento,
pois não há nada mais equivocado: O ponto 5 da Agenda de Havana
contém dois numerais: Direitos Humanos e Verdade. Neste ano de
discussão conseguimos avançar em esboços referentes ao parágrafo
Verdade, discussão complexa que abordamos paralelamente com a de
aspectos do ponto 3 “Fim do Conflito”, que são os de cessar-fogo
bilateral e deixação de armas.
Questão
muito distinta é que ante a insistência governamental em atravessar
no processo temas de seu interesse particular, como o são as
iniciativas de justiça transicional, cuja solução em nada deveria
retardar a busca de saídas às necessidades das vítimas, as FARC-EP
tenhamos dado oportuna resposta, como queira que não nos fechamos à
discussão de propostas que pudessem contribuir para o fim do
conflito. Por isso apresentamos iniciativas que estão em marcha para
beneficiar o processo, como as medidas de desescalada do conflito, e
o sabotado cessar unilateral de fogos, em procura do armistício que
alivie a população inerme das dores da guerra.
Nossa
prioridade, isso sim, tem sido levar à Mesa as propostas que as
vítimas do conflito apresentaram. Nossas iniciativas estão em mãos
do governo, sem que depois de um ano de debates se tenha dado oriunda
das instituições alguma resposta que satisfaça as vítimas, exceto
o decreto 0303 de 2015 referente a desaparecimentos orçados.
Frente a
estas circunstâncias, devemos dizer que nenhuma desculpa há para
que não se concretizem medidas urgentes de reparação que apontem a
responder às exigências das vítimas; nenhuma justificativa há
para retardar um acordo sobre Comissão de Esclarecimento e Verdade,
assim como nenhum argumento racional pode ser esgrimido para escalar
a guerra em momentos nos quais falamos de paz. E se do que se trata é
de abordar o tema de justiça, de maneira transparente e oportuna
desde há tempos vimos expressando ideias precisas para assumir o
assunto.
Cremos
que um processo de paz não é um processo de submissão nem
rendição, também cremos que não se pode converter num processo
judicial ou de debute de um conceito de justiça punitivista na qual
o Estado possa atuar como juiz e parte. Nesta ordem de ideias,
reiteramos que nenhum marco jurídico unilateral é reconhecido pela
insurgência e muito menos concepções de justiça transicional que
dele se derivem; em Havana não se vai intercambiar impunidades
porque não é comparável o terrorismo de Estado ao exercício do
direito à rebelião; nenhum guerrilheiro está disposto a pagar
cárcere por haver exercido dito direito; ademais, se a algo se deve
referir o conceito justiça é ao estabelecimento da justiça social,
reparadora, prospectiva, pelo qual seria impensável a paz se não se
começa a desmantelar a doutrina da segurança nacional, a teoria do
inimigo interno e o paramilitarismo. E, finalmente, que é o Estado o
máximo responsável pela guerra e seus vitimizadores.
Nunca
daremos um voto de confiança ao sistema judicial colombiano nem a
simples promessa sem garantias de suas instituições corruptas,
porque não viemos a Havana para nos submeter. O mínimo para
alcançar a reconciliação é que se proceda com as mudanças
estruturais que acabem com a miséria, a desigualdade e a falta de
democracia.
Delegação
de Paz das FARC-EP
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Equipe
ANNCOL - Brasil