Guerrilheiros, a transformar o Estado desde a luta política não armada?
Por
Fidel Rondón, integrante da Delegação de Paz das FARC-EP
Ver
a partir da ótica revolucionária, com desconfiança, o hipotético
cenário meramente político para a ação das guerrilhas tem apoios
muito valiosos, e o país o sabe. Com mirada ao recente passado
constatamos que a história está cheia de exemplos sobre
descumprimento de acordos, ademais de traições à esquerda
revolucionária oriundas do poder, logo que depôs as armas.
No
entanto, no acionar político, na luta política e na interpretação
acertada do suceder político, encontramos a essência do sentido
revolucionário das FARC-EP, onde as armas têm sido a ferramenta
para a construção de um novo país, em meio às forças da direita
reacionária que têm impedido que floresça outra opção de Governo
diferente da deles.
A
discussão sobre a participação política das FARC-EP, sem armas,
depois da firma do acordo final em Havana, põe a nós guerrilheiros
a refletir sobre esta atraente possibilidade, porém também a
relembrar temores passados.
No
ano de 1986, muitos colombianos, guerrilheiros uns poucos e muitos
sem sê-lo, apostamos numa perspectiva política sob o âmbito da
esquerda, com uma proposta para melhorar os costumes políticos e por
um novo modelo de desenvolvimento econômico no campo, reforma
urbana, reformas ao vetusto sistema eleitoral buscando a
transformação das guerrilhas num novo movimento político. Tudo ia
bem, até quando a oligarquia liberal-conservadora viu neste
experimento uma ameaça real a seus interesses. E começou o
genocídio que o país conhece.
Há
preceitos constitucionais vigentes que consagram os direitos e as
garantias para exercer a oposição política e para o acesso
equitativo dos candidatos da esquerda revolucionária aos meios
massivos de comunicação, porém não são cumpridos, porque não há
interesse nos encarregados de sua defesa para que se deem essas
garantias. Assim tem sido, sempre. Na União Patriótica, sob a égide
da Constituição de 1986, o Governo Barco se comprometeu a defender
nossos direitos. Não o fez, ou não pôde, e começaram a cair
assassinados vereadores, deputados e congressistas que um dia
acreditaram nas “garantias para exercer a oposição política
legal ao sistema”.
É
indubitável que em Havana começa a tomar forma um acordo sobre
participação política, direitos e garantias para os novos
movimentos que surjam depois da firma do Acordo Final, ademais das
medidas para promover maior participação na política de todos os
setores, em igualdade de condições e com garantias de segurança.
Porém vem a dúvida: como alcançar tanta beleza sem uma
reestruturação democrática do Estado e sua reforma política que
inclua a revisão, reforma e democratização do sistema político
eleitoral? Como conseguir a democratização do acesso à informação
e à comunicação que impeça a monopolização dos meios massivos
de comunicação, que são o veículo pelo qual se aproximam as
campanhas políticas à população?
No
entanto, os sobreviventes do genocídio da União Patriótica que
buscamos “asilo” nas guerrilhas estamos prestos, com esperança,
a deixar as armas de lado e sair à tribuna novamente a expor
massivamente nosso projeto de país, a construir desde a vereda,
desde a barriada
e dos lugarejos da Colômbia a democracia avançada que encaminhe
nossa nação pelo caminho do socialismo, isto se o processo integral
e simultâneo para o final do conflito, ademais dos Direitos Humanos
das vítimas e da verdade, consegue se articular dentro do todo do
Acordo Final.
Em
suma, começa a tomar forma a participação política legal e aberta
das FARC-EP, já não é só uma ilusão. Os guerrilheiros, homens e
mulheres valentes que têm combatido as Forças Militares e a
Polícia, se aprestam a travar, com a mesma coragem, a luta política
pelas transformações e ideais que defenderam com as armas. Que
desafio! Sem as armas, só com o poder da palavra e a convicção que
dá a razão das ideias, nos enfrentaremos ao poderoso aparelho
político dos partidos da direita.
Equipe
ANNCOL - Brasil