FARC-EP relançam proposta sobre Comissão de revisão e esclarecimento da verdade da história do conflito interno colombiano
Havana, Cuba Sede dos diálogos de paz, 20 de março de 2014
Em várias oportunidades expusemos a
necessidade de criar uma comissão que tenha como propósito o esclarecimento da
origem e da verdade da história do conflito interno colombiano. Os
representantes plenipotenciários do governo demoram em dar uma resposta a esta
petição. Essa atitude deixa de lado algo que é absolutamente necessário para
garantir o êxito do processo de paz. Perguntamos: Como se pode estabelecer
responsabilidades, ou como a mesa de diálogos pode abordar o tema das vítimas,
de sua reparação, do perdão e do compromisso de "nunca mais", se não
se estabelece como se deram os fatos de violência que derivaram em seis décadas
ou mais de conflito armado?
Presumir que as FARC-EP são os vitimários em um processo de conflito social interno que se inicia antes de sua própria criação, e afirmar que sobre elas recai toda a responsabilidade após a ocorrência de condutas e episódios violentos e desumanos provocados pelo próprio Estado e seus agentes oficiais e para-oficiais, é uma apreciação irreal, que mina a intenção de se chegar a uma reconciliação nacional definitiva. Têm sido múltiplos os agentes do terror e da morte em um conflito que se pretende deixar para história. Indivíduos e instituições e organizações públicas e privadas, foram e continuam sendo atores quer por ação ou omissão, quer como auspiciadores, quer como executantes de primeira linha, de condutas atrozes; atores responsáveis pela luta sangrenta fratricida, que aspiramos seja superada definitivamente.
Concluídos os conflitos internos ou
internacionais, criaram-se comissões relacionadas com a necessidade de
esclarecer fatos e circunstâncias próprias das contendas superadas. No entanto,
embora ainda prossiga o conflito interno da Colômbia, e tendo em vista as
conversações as conversações que se desenvolvem na cidade de Havana para
conseguir seu término definitivo, é imperativo que se estabeleçam múltiplas
responsabilidades dos diversos atores, sem o prejulgamento de que um só deles
há de ser o imputado e os demais implicados, seu juiz. Muito mais quando não
há, ou se pretende que não exista ou não se deu um vencedor nem um vencido.
Que fique claro, então, que as
FARC-EP repudiam esta absurda pretensão.
A comissão da verdade que se propõe e
que exigimos comedidamente que se proceda a integrá-la de imediato é um
instrumento sine qua non se se pretende, se se deseja chegar
exitosamente ao final do processo que nos ocupa. Não integrá-la e não dar-lhe
instrumentos para sua alta missão é minar o esforço em que estamos empenhados;
é dizer não à paz.
Integraram-se comissões da verdade ou
de similar finalidade, na Argentina, Uganda, Chile, El Salvador, Haiti, África
do Sul, Guatemala, Nigéria, Serra Leoa, Gana, Timor-Leste, Peru, Marrocos,
Libéria, Alemanha, Bolívia, Granada, Indonésia, Nepal, Panamá, Paraguai,
República Democrática do Congo, República Federativa da Iugoslávia, Sri Lanka,
para mencionar algumas. Torna-se atual que nos casos citados os modelos de
justiça transicional e as jurisdições conhecedoras dos crimes cometidos durante
os conflitos superados, as autoridades imputadas ou responsáveis por ação ou
por omissão não tiveram a seu cargo o julgamento de sua contraparte.
Desse modo, ninguém sensato e
conhecedor destes temas - é de se esperar que os plenipotenciários do governo
acompanhem o que, com efeito, é um axioma reconhecido universalmente -, pode
pensar que um Estado plenamente imputável possa recorrer ao princípio de
legalidade, por viciado que é seu proceder, para alegar suficiente autoridade e
capacidade para aplicar um iuspuniendi uma vez que jamais pode
ser juiz e parte.
Para estabelecer a realidade do que aconteceu na Colômbia durante tantas décadas de conflito social armado, sugerimos na mesa, de maneira reiterada, a integração da comissão para o esclarecimento da origem e da verdade da história da confrontação violenta. Sem que isso ocorra, o processo em que estamos termina sendo inócuo. Esta asseveração não requer de maior argumentação por sua lógica e pelo senso comum que lhe é abundante.
Para estabelecer a realidade do que aconteceu na Colômbia durante tantas décadas de conflito social armado, sugerimos na mesa, de maneira reiterada, a integração da comissão para o esclarecimento da origem e da verdade da história da confrontação violenta. Sem que isso ocorra, o processo em que estamos termina sendo inócuo. Esta asseveração não requer de maior argumentação por sua lógica e pelo senso comum que lhe é abundante.
Sem que se estabeleça a origem do conflito e sua verdade histórica, não pode haver paz, nem reconhecimento de suas vítimas, nem justiça nem reparação. Nenhuma das partes pode ser juiz, máxime quando pode haver sido vitimária. Em relação ao Estado colombiano e seus diferentes órgãos e membros, são incontáveis as acusações e sentenças judiciais que estabelecem a implicação de seus funcionários na comissão de graves crimes contra o direito internacional, bem como a responsabilidade do Estado neles, ao haver sido seus órgãos oficiais, braços e executores desses crimes em inumeráveis ocasiões.
Existem outros setores da sociedade,
como os partidos e círculos políticos hegemônicos, as associações de
latifundiários, de patronais, da grande indústria, das bananeiras, pecuaristas,
banqueiros e outros atores poderosos, que ainda quando pretendem desempenhar o
papel de meros espectadores, também têm sido vitimários; da mesma forma que as
empresas que possuem os meios de comunicação social, transformados da mesma
maneira em instrumentos da guerra oficial, não apenas desinformando ou
interpretando a notícia de acordo com o regime, mas também transmitindo o
pensamento e inclinação de seus proprietários, verdadeiras caixas de som da
versão do governante de plantão e dos interesses do grande capital nacional e
transnacional.
As razões anteriormente expostas são
sólidas razões pelas quais a paz requer um relato da história verdadeira do
conflito a fim de que se conheçam os fatos tal como ocorreram e vêm ocorrendo.
Sem verdade não há história; sem história não há consciência nacional. Se não
se conhece a verdade do passado não se pode construir uma paz duradoura. Um
Estado que evita sua história carece de capacidade para solucionar um conflito
como o colombiano e para garantir a não repetição do mesmo.
DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP
Tradução: Luiz Manuel Cano Prestes