"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


sexta-feira, 21 de março de 2014

“Freixo” da Colômbia é deposto pelo presidente e tornado inelegível por 15 anos


Prefeito que estatizou a coleta de lixo e combateu milícias da ultra-direita é destituído pelo presidente Juan Manuel Santos e declarado inelegível por 15 anos. Gustavo Petro é a maior figura pública da oposição colombiana e seria candidato à presidência da república.

Por Thiago Ávila em 20/03/2014.

A Colômbia é um país altamente desconhecido pelo povo brasileiro. Pouco se sabe de sua história e suas lutas além do que diz o senso comum e a campanha criminalizadora dos Estados Unidos e das agências de notícias internacionais. Este país vive um conflito ininterrupto há 64 anos e possui 13 bases estadunidenses instaladas em seu país. É também o terceiro país que mais recebe ajuda militar dos Estados Unidos e cumpre um papel chave na política imperialista de Washington, que não permite a existência de qualquer movimento de oposição, mesmo que seja na esfera institucional.

No último dia 19 de março o prefeito de Bogotá, Gustavo Petro, do Pólo Democrático Alternativo (uma espécie de partido de Frente Ampla que surgiu em 2005 no auge dos governos de Álvaro Uribe/Bush), foi destituído e punido com inegibilidade por 15 anos pelo presidente Juan Manuel Santos e o Procurador Geral Alejandro Ordonez. Trata-se de um golpe da direita para impedir a participação política no país, que anseia por mudanças após 66 anos de conflito e Terrorismo de Estado.

O motivo alegado foi um processo de improbidade administrativa quando, em 2012, a cidade ficou três dias sem a coleta de lixo, por conta do boicote das empresas privadas que estavam sendo substituídas por um modelo público de coleta. Segundo o prefeito, que foi guerrilheiro do M-19 em sua juventude, esta medida era fundamental para reverter os contratos fraudulentos e a evasão de dinheiro público que acontecia neste setor, além de garantir maiores direitos aos trabalhadores da limpeza urbana e um serviço de maior qualidade à população com iniciativas de coleta seletiva e outras ações que visam a sustentabilidade e o respeito ao meio-ambiente. A destituição foi levada a cabo pelo Inspetor Geral Alejandro Ordonez, notório opositor do casamento gay no país e das negociações de paz com as FARC. O próprio boicote foi uma tentativa de reverter a manutenção do modelo público no setor, seguindo o modo de agir das oligarquias em outros países como a Venezuela (com o desabastecimento), Bolívia, entre outros.

Esta ação é um golpe claro aos diálogos de paz com a guerrilha, que estão acontecendo em Havana. A Delegação de Paz das FARC, liderada por Iván Márquez, número dois da guerrilha, manifestou-se dizendo que “se trata de uma absurda decisão política do presidente que toma a Prefeitura de Bogotá através de um golpe, que gera um impacto muito negativo na mesa de diálogos e afeta gravemente a confiança e a certeza em torno do que se está aprovando”.

“Nos traz muitas dúvidas e interrogações em torno da eficácia dos acordos parciais sobre o tema da participação política”, afirmou Iván Márquez relembrando o consenso alcançado no ano passado sobre este ponto, o segundo da agenda de diálogos de paz. Segundo o movimento guerrilheiro, trata-se de uma medida com claro propósito eleitoral, como o que depôs a senadora Piedad Córdoba em 2010, tornando-a também inelegível por 18 anos, quando foram alegadas ligações dela com a guerrilha, durante suas intervenções em favor do Intercâmbio Humanitário e o início das negociações de paz. Piedad Córdoba, assim como Gustavo Petro, era a mais provável candidata de seu partido às eleições presidenciais na Colômbia, com consideráveis chances de vitória. Ambos são alvos frequentes de ameaças e atentados contra sua vida e vivem rodeados de seguranças.

O Ministro da Justiça, Alfonso Gomez Mendez, espantado com o acontecido, disse à imprensa: “Nós precisamos revisar a norma constitucional que permite a destituição de um oficial escolhido por voto popular”. Segundo a Constituição deste país, a Procuradoria Geral possui o poder de pedir a destituição de funcionários do Estado, inclusive os que foram escolhidos democraticamente. A medida precisa ser referendada pelo presidente em exercício, no caso, seu adversário político Juan Manuel Santos, que não hesitou em dar executar a destituição.

O mandado de Gustavo Petro iniciou-se em 2012 e iria até o final de 2015. Ele também já ocupou o mandato de senador, exercendo um papel chave no escândalo que desmascarou diversos políticos da ultra-direita e suas ligações com o paramilitarismo e os esquadrões da morte. É uma história de incrível semelhança com a do deputado brasileiro Marcelo Freixo, que também já foi alvo de dezenas de ameaças de morte e atentados contra sua vida. O golpe dado pelo presidente colombiano também torna-se mais gritante, se comparado à situação vivida pelo Rio de Janeiro no carnaval diante da greve dos garis. Se, no Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes fez de tudo para criminalizar os trabalhadores e negar-lhes direitos, na Colômbia Petro fazia o contrário: tornava público o serviço para que pudesse realizar as reformas necessárias neste setor.

A justiça colombiana já negou todas os últimos recursos de amparo que poderiam reverter a decisão e, considerando os antecedentes da história colombiana de repressão e impedimento da participação política, as chances de reversão não são nada animadoras. Nesta terça-feira, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos convocou uma reunião para a próxima segunda-feira e, de antemão, solicitou ao governo colombiano que “suspenda imediatamente os efeitos da decisão emitida e ratificada pela Procuradoria Geral da Nação, a fim de garantir os direitos políticos do senhor Gustavo Francisco Petro Urrego”. O governo colombiano já recusou sua participação nesta reunião. Caso mantenha a decisão, será a primeira vez desde a criação da CIDH que o governo colombiano não assistiria à Comissão em Washington. Dependendo agora completamente de uma decisão internacional favorável, Petro se manifestou dizendo que “não sabemos se o sistema interamericano nos protege ou não. Se não o faz, não restará para nós um único centímetro quadrado de justiça”.

Relembrando a necessidade de seguir na luta, Gustavo Petro disse: “Quero que Bogotá não perca o otimismo. Tenham a segurança de que NÃO PASSARÃO. Tranquilidade e Força”. Ao final da tarde de ontem, dezenas de milhares de manifestantes lotaram a praça Bolívar e as ruas adjacentes, no centro de Bogotá, exigindo a restituição do prefeito ao cargo. Foi a maior demonstração de apoio a um prefeito da capital do país andino em décadas.

É dever de cada um e cada uma de nós acompanhar atentamente o que acontece neste país irmão, pois diz respeito diretamente ao nosso futuro. A Paz na Colômbia é um passo fundamental para derrotar o imperialismo em nosso continente e retomar o processo de integração através dos povos pelos quais viveram Che, Bolívar, José Martí, Abreu e Lima, Sandino, Zapata, Farabundo e tantas e tantos outros internacionalistas latinoamericanos.

*Thiago Ávila é historiador do conflito colombiano e da América Latina e membro da Insurgência.
20/03/2014