Entenda por que os médicos cubanos não são escravos
Brasil
247 - Autor
de uma série de artigos sobre a vinda dos médicos cubanos,
reunidos no 247 sob o título "O
que você precisa saber sobre médicos cubanos"
(leia
mais aqui),
o jornalista Hélio Doyle publicou neste domingo uma resposta clara
aos jornalistas e críticos do programa Mais Médicos que apontam
escravidão na vinda de profissionais de saúde daquele país. Leia
abaixo:
UM
POUCO MAIS SOBRE OS MÉDICOS CUBANOS
Parece
que o último argumento contra a contratação dos médicos cubanos é
a remuneração que vão receber. Pois é ridículo, quando
prevalecem fatos, indicadores internacionais e números, falar mal do
sistema de saúde e da qualidade dos médicos de Cuba. A revalidação
de diploma também não é argumento, pois os médicos estrangeiros
trabalharão em atividades definidas e por tempo determinado, nos
termos do programa do governo federal. Não tem o menor sentido,
também, dizer que os cubanos não se entenderão com os brasileiros
por causa da língua – primeiro, porque vários deles falam o
português e o portunhol, segundo porque os médicos cubanos estão
acostumados a trabalhar em países em que a lingua falada é o
inglês, o francês, o português e dialetos africanos, e nunca isso
foi entrave.
Resta,
assim, a forma de contratação e, mais uma vez sem medo do ridículo,
falam até de trabalho escravo. Essa restrição também não tem
procedência, nem por argumentos morais ou éticos (e em boa parte
hipócritas), nem com base na legislação brasileira e
internacional. Vamos a duas situações hipotéticas, embora ocorram
rotineiramente.
1
– Uma empreiteira brasileira é contratada por um governo de país
europeu para uma obra. Essa empreiteira vai receber euros por esse
trabalho e levar àquele país, por tempo determinado, alguns
engenheiros, geólogos, operários especializados e funcionários
administrativos, todos eles empregados na empreiteira no Brasil.
Encerrado o contrato no país europeu, todos voltarão ao Brasil com
seus empregos assegurados. Quem vai definir a remuneração desses
empregados da empreiteira e pagá-los, ela ou o governo do país
europeu? É óbvio que é a empreiteira.
2
– Os governos do Brasil e de um país africano assinam um acordo
para que uma empresa estatal brasileira envie profissionais de seu
quadro àquele país para dar assistência técnica a pequenos
agricultores. O governo brasileiro será remunerado em dólares pelo
governo africano. A estatal brasileira designará alguns de seus
funcionários para residir e trabalhar temporariamente no país
africano. Quem vai definir a remuneração dos servidores da empresa
estatal brasileira e lhes fará o pagamento, a estatal brasileira ou
o governo do país africano? É óbvio que é a empresa estatal
brasileira.
Por
que, então, tem de ser diferente com os médicos cubanos? Eles não
estão vindo para o Brasil como pessoas físicas, nem estão
desempregados. São servidores públicos do governo de Cuba,
trabalham para o Estado e por ele são remunerados. Quando termina a
missão no Brasil (ou em qualquer outros dos mais de 60 países em
que trabalham), voltam para Cuba e para seus empregos públicos.
Não
teria o menor sentido, assim, que esses médicos, formados em Cuba e
servidores públicos cubanos, fossem cedidos pelo governo de Cuba
para trabalhar no Brasil como se fossem pessoas físicas sendo
contratadas. Para isso, eles teriam de deixar seus postos no governo
de Cuba. Como não faria sentido que os empregados da empreiteira
contratada na Europa ou da estatal contratada na África assinassem
contratos e fossem remunerados diretamente pelos governos desses
países. Trata-se de uma prestação de serviços por parte de
Cuba, feita, como é natural, por profissionais dos quadros de saúde
daquele país.
A
outra crítica é quanto à remuneração dos médicos cubanos.
Embora menor do que a que receberão os brasileiros e estrangeiros
contratados como pessoas físicas, está dentro dos padrões de Cuba
e não discrepa substancialmente do que recebem seus colegas que
trabalham no arquipélago. É mais, mas não muito mais. Não tem o
menor sentido, na realidade cubana, que um médico de seus serviços
de saúde, trabalhando em outro país, receba R$ 10 mil mensais. E,
embora os críticos não aceitem, há em Cuba uma clara aceitação,
pela população, de que os recursos obtidos pela exportação de
bens e serviços (entre os quais o turismo e os serviços de educação
e saúde) sejam revertidos a todos, e não a uma minoria. O que Cuba
ganha com suas exportações de bens e serviços, depois de pagar aos
trabalhadores envolvidos, não vai para pessoas físicas, vai para o
Estado.
A
possibilidade de ganhar bem mais é que faz com que alguns médicos
cubanos prefiram deixar Cuba e trabalhar em outros países como
pessoas físicas. É normal que isso aconteça, em Cuba ou em
qualquer país (não estamos recebendo portugueses e espanhóis?) e
em qualquer atividade (quantos latino-americanos buscam emigrar para
países mais desenvolvidos?). Como é normal que muitos dos médicos
cubanos aprovem o sistema socialista em que vivem e se disponham a
cumprir as “missões internacionalistas” em qualquer parte do
mundo, independentemente de qual é o salário. Para eles, a medicina
se caracteriza pelo humanismo e pela solidariedade, e não pelo
lucro.
É
difícil entender isso pelos que aceitam passivamente, aprovam ou se
beneficiam da privatização e da mercantilização da medicina e da
assistência à saúde no Brasil.
Os
criticos dos médicos cubanos deveriam se preocupar com isso, que
ocorre no Brasil em pleno século XXI
Trabalho escravo em
empresa do agronegocio sediada no Brasil nos tempos atuais
Trabalho escravo no
Brasil - Século XIX