Mancuso, o Paramilitares e a Corporação Novo Arco-íris.
Será a Suécia o penúltimo país do mundo em reconhecer que a Colômbia é governada por um criminoso?
[Carlos Andrés Gómez*/ANNCOL]
A Corporação Novo Arco-íris com o auspício e o dinheiro da Agência Sueca de cooperação Internacional para o Desenvolvimento ASDI (SIDA em siglas suecas), - sem esquecer que o governo da Suécia se comprometeu com a administração de Álvaro Uribe a acompanhar o “processo de negociação” com os paramilitares ou esquadrões da morte da Colômbia – realizou durante mais ou menos dois anos uma investigação cujo título é “Paramilitares e Políticos”. (http://www.nuevoarcoiris.org.co/local/Arca_En_pdf.pdf).
Este estudo foi apresentado por diferentes meios e alguns analistas de esquerda como uma análise de alta qualidade investigativa, e sobretudo, esclarecedor do papel que jogaram os paramilitares ou esquadrões de morte no último sangrento e horrendo período da vida colombiana.
O estudo corresponde ao período infausto e desumano dos últimos anos da história colombiana. Etapa em que os narco-paramilitares, com a anuência, colaboração e proteção governamental, vêm levando a cabo e cometendo atos criminais atrozes de lesa humanidade: torturas, violações, desaparecimentos, desquartizamentos, assassinatos e masacres de mulheres, crianças e anciãos inocentes; incendiaram povos inteiros e expulsaram-nos de suas casas e parcelas próximas de quatro milhões de colombianos, toda essa barbárie vem se perpetrando contra humildes camponeses, sindicalistas, ativistas populares e de bairros, assim como contra políticos de esquerda e de oposição que se negam a que a corrupta oligarquia colombiana siga deixando o povo colombiano na absoluta miséria.
Mas analisemos quais são as premissas, de que se trata e a que contribui este tipo de estudos prudentes, como o que nos apresenta a Corporação Novo Arco-Íris (a partir de agora Arco Íris). O estudo propõe as seguintes premissas como eixo de investigação:
Uma, os paramilitares em seu processo de expansão ganharam várias guerras regionais e estabeleceram um controle militar férreo do território; tem além disso a necessidade de intervir nas campanhas eleitorais e a clara intenção de faze-lo. Buscam uma influência decisiva na política regional e nacional para entrar com maior segurança rumo a umas negociações de paz (grifos meus). Dois, as elites políticas regionais em seu afã de resistir às mudanças democráticas em nível nacional e aos intentos de negociações com as guerrilhas, também têm necessidade de apoiar-se no ator armado ilegal, mostram a clara intenção de buscar esse respaldo e estão dispostas a responder a algumas exigências dos paramilitares.
Antes é bom anotar que em qualquer investigação séria e de qualidade quando se parte de uma hipótese falsa o lógico é que seus resultados sejam falsos, ou o contrário, de uma hipótese verdadeira seu resultado deve ser verdadeiro, se é que não ocorreu um erro em seu processo investigativo.
Neste caso, Arco Íris, sabendo que se propõe algumas hipóteses falsas apresenta alguns resultados que não se ajustam à validade científica, e o mais surpreendente de tudo, são malabarismos intelectuais que fazem para apresentar algumas conclusões que aparentemente demonstram que o narco-paramilitarismo é um fenômeno isolado da institucionalidade estatal, e que este é fundamentalmente “contra-insurgente’ como conseqüência dos “desmandos da guerrilha”, mas em que pesem estes malabarismos acadêmicos não atingem seu objetivo, mesmo que muitos puderam haver caído na armadilha. Vejamos porque:
A primeira premissa argumenta que o narco-paramilitarismo ganhou várias guerras contra a subversão e que vê além disso a necessidade de intervir na política eleitoral para buscar uma “influência decisiva na política regional e nacional para entrar com maior segurança rumo a algumas negociações de paz”. É dizer, segundo a argumentação dos investigadores de arco-íris, que desde o início os paramilitares se deram a tarefa e ocupar regiões completas do país a sangue e fogo, que assassinaram e torturaram e que desalojaram e roubaram a milhares de humildes camponeses suas pequenas parcelas para chegar a algumas negociações de paz com o governo! Isto além de ser falso, o que pretende esta ridícula argumentação é encobrir realidades e verdades, como a que o paramilitarismo é um projeto e se expandiu com tanta rapidez, já que contava com a proteção e a coordenação de importantes setores militares, políticos, industriais e empresariais nacionais e estrangeiros, banqueiros, latifundiários, assim como também do dinheiro do narcotráfico.
O grave do assunto não que os investigadores não contaram com informação valiosa de primeira mão, mas o manejo que se faz desta para desvirtuar o verdadeiro rol do paramilitarismo na Colômbia nos últimos 30 anos. Por isso, do anterior, surge a segunda premissa falsa, a qual reza que devido às mudanças democráticas em nível nacional que propunham a Constituição de 1991 e às tentativas de negociação do governo Andrés Pastrana com as FARC, “as elites regionais tiveram a necessidade de apoiar-se neste ator armado e ilegal”. Ainda que seja certo que as corruptas elites regionais se oponham a mudanças democráticas, e que estas patrocinam e se alimentam da guerra contra o povo colombiano não fica de tudo claro o exposto por Arco Íris; pois proposto assim, pareceria indicar, em primeiro lugar, que antes de 1991 o paramilitarismo não era um problema, e em segundo lugar, que as elites regionais se viram obrigadas, ante os ventos de mudança e de paz, a apoiar-se no narco-paramilitarismo para garantir seus privilégios antidemocráticos que lhes permitiu perpetuar e contar com estruturas de poder de discriminação social, econômica e política.
Arco Íris nega por completo que são precisamente essas mesmas elites regionais e nacionais como classe burguesa as que dão vida ao projeto narco-paramilitar, no entanto, isso de que essas elites “buscavam seu respaldo e que estavam dispostas a responder a algumas exigências dos paramilitares”, não se ajusta à verdade, mas é tudo o contrário, são estes grupos criminosos armados os que têm que adequar-se, por sua mesma razão de ser, às exigências de seus criadores: as elites regionais e nacionais.
Este último golpe de esquadrões da morte ou paramilitares – para não falar dos ‘pássaros’, os ‘chauvitas’ dos anos 50 e 60 do século passado – são criados no início dos anos de 1980 baixo a tutela da anterior Constituição, dos chefes, das máfias do narcotráfico, de caciques e latifundiários, de setores das forças armadas, de políticos, e para colocar em marcha seus propósitos não duvidaram em trazer mercenários estrangeiros para seu treinamento.
Esta política narco-paramilitar de Estado em seu desenvolvimento terá mudanças e ajustes segundo as variantes condições políticas, sociais, históricas do momento que assim vão exigindo para sua gestação, criação, implantação e desdobramento. Este primeiro momento de implementação “ilegal” recairá sobre os ombros dos chefes da máfia, os latifundiários e setores das forças armadas da zona petrolífera do Magdalena Médio, que vai até seu primeiro grande período de legalização sob o oculto mafioso “sistema de seguridade” a mãos de Álvaro Uribe: as Conviver.
E que coisa mais estranha! A localização de todos esses grupos de narco-paracos começou a dar-se, opera e crescer em zonas e corredores ricos em recursos naturais: petróleo, gás, carvão, água; em regiões nas quais se planejam megaprojetos; em regiões como o Uraba onde existem grandes extensões de plantação de banana controladas por empresas estrangeiras.
É aí, no Uraba, que se coloca em marcha o maior e criminoso experimento paramilitar, como resultado disso vão sobressair dos macabros personagens: Carlos Castaño, quem afirmava que “a missão era derrotar a guerrilha. Libertar o norte do país primeiro e logo marchar rumo ao sul”. E o “carniceiro de Uraba” o general do exército Rito Alejo do Rio.
Em que pese os narco-paracos aportem ferramentas de análise a Arco Íris, os responsáveis da investigação, Leon Valencia, desmobilizado do ELN que fez agrados ao projeto uribista na eleição presidencial passada e, Maurício Romero, aluno predileto do CINEP, optam por excluí-las e aparcá-las, para não ver o que os próprios protagonistas afirmam, que todo este desarranjo nacional responde a um projeto e a uma política de Estado. Simplesmente ficam pelos ramos, quando não se propõe sem nenhuma vergonha que os narco-paracos são um ator violento que por meio do terror tenta impor a seus verdadeiros criadores e chefes o projeto que estes criaram, esquecendo que os paracos são simples subalternos.
Mas esta eclíptica teoria que sustenta Arco Íris, por aquelas coisas da dura realidade, em dias recentes recebeu contundentes produndas estocadas, que a rebateram sem dar-lhe a possiblidade de que esta falsa teoria se converta em “verdade acadêmica”. A primeira, é a bem documentada exposição que fizera Gustavo Petro no “Debate da Para-Política em Antioquia” (Ver vídeo aqui [http://www.elcolombiano.com/proyectos/videos/videos/petro.htm]) no Senado da República em 18 de abril. E a segunda, as declarações que fez o chefe paramilitar Salvatore Mancuso diante da Fiscalização da Justiça e Paz, , (El Tiempo, mayo 15, 2007 [http://www.eltiempo.com/justicia/juicio_paras/paramilitares/ARTICULO-WEB-NOTA_INTERIOR-3557334.html]).
Petro propõe o debate que o paramilitarismo é a conjunção de vários sistemas: um sistema de política clientelista, um sistema fazendário (caciques, latifundiários, banqueiros), o narcotráfico e setores do Estado, que buscam o controle territorial, baseado em três pilares: uma aliança anti-comunista de um setor das forças armadas e setores da elite política e econômica, grupos e justiça privada de ‘limpeza social’ e as máfias do narcotráfico. Com esta tese o que Petro afirma é que o narco-paramilitarismo não é outra coisa senão uma política de Estado para garantir a segurança mafiosa do Estado.
Ao debate de Gustavo Petro o que se pode criticar é a falta de haver relacionado o paramilitarismo com as doutrinas de segurança dos EE.UU, tema que nem mencionam os investigadores da CNAI; pois é ali, onde realmente se definem as linhas gerais das políticas que devem seguir as elites governamentais de países como a Colômbia. É bom lembrar que várias doutrinas de segurança impostas por Washington, e que devem ser seguidas pelos Estados sob sua influência, propõe a criação desse tipo de grupos paramilitares, mas existe uma em especial a “Doutrina Guerra de Baixa Intensidade”, dada a conhecer nos anos 80, que em um de seus pilares se esboça que a raiz das experiências obtidas em conflitos em que estiveram implicados Estados e forças militares afeitas aos interesses dos Estados Unidos, levou a que esses exércitos se vissem comprometidos em graves violações dos direitos humanos e em crimes de lesa humanidade; no entanto, para evitar que se seguisse assinalando às forças de segurança estatais de tais direitos, o que havia de fazer era criar grupos paramilitares auspiciados e organizados por estas, para que se encarguem de realizar o “trabalho sujo” das Forças Militares.
Por sua parte Salvatore Mancuso em sua versão livre afirma que “o paramilitarismo é uma política de Estado” e que está nos regulamentos. Sou uma prova ferrenha”. E para sustentar Mancuso, enumerou e fez menção de manuais de contraguerrilha do Exército desde 1963 até meados dos anos 90 e de testemunhas de militares.
Finalmente podemos ver que, em que pese os sutis esforços de Arco Íris de vender a nós a idéia de que os paramilitares haviam perpetrado o bárbaro holocausto colombiano com o objetivo de chegar a algumas negociações de paz com o governo, mas que antes haviam tido que submeter às elites regionais para consolidar seu poder político, não conta teoricamente com fundamento algum capaz de enfrentar as primeiras declarações do próprio Mancuso. O que pode fazer a Corporação Novo Arco Íris é propor um novo ‘estudo científico’ no qual propõe aos suecos que suas investigações são “capazes de demonstrar que as verdades reveladas por Mancuso são falsas quando estas vão contra os representantes da oligarquia e das elites do poder econômico, social, militar, religioso e político colombiano”, certamente que estes serão suficientes para outros anos de investigação.
*Analista em Estudos Latinoamericanos.
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