Tarzaniando
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conflito armado
Combinando meus estudos de medicina com a metodologia antropológica de "campo" que acabava de aprender, logrei realmente que os indígenas desta região, Tukanos, Wananos, Sirianos e Paratapuyos me levassem a lugares insuspeitos e até então desconhecidos ou vedados a outros olhos. Escreve Pinzón Sánchez.
[Alberto Pinzón Sánchez/ANNCOL]
No inicio dos anos 70, os estudantes de Antropología da U. Nacional das primeiras promoções, descrevíamos com o verbo "Tarzaniar" o individual e obrigatório trabalho de campo com o qual devíamos obter o diploma. Não havia nada mais que improvisação. Nenhum plano acadêmico, nem nada que se lhe parecesse. Muito menos existia financiamento oficial ou privado para isso. O país começava a olhar as Selvas e seus povoadores indígenas e colonos para integrar-los plenamente na "economia de mercado" do país, e se assistia ao intenso debate, em muita medida, induzido pela cúria católica, contra a agência protestante encoberta do governo estadunidense nesses territórios chamada "Instituto Lingüístico de Verano", trazida uma década atrás pelo Vice-rei USA Mr. Lleras Camargo.
Fiz minha tese da realidade que se vivia nas Selvas do Vaupes e Guaviare por aqueles anos, vivendo, ou melhor, sobrevivendo, pela minha conta por espaço de um ano. Pouco depois, meu amigo Arturo Alape considerou que essa monografia era publicável e a editou com o título *Monopólios, Missionários e destruição de Indígenas*. Combinando meus estudos de medicina com a metodologia antropológica de "campo" que acabava de aprender, logrei realmente que os indígenas desta região, Tukanos, Wananos, Sirianos e Piratapuyos me levassem a lugares insuspeitos e até então desconhecidos ou vedados a outros olhos.
A realidade era que, ao ciclo da escravidão e do extermínio indígena que vinha desde os séculos 18 e 19, exacerbado pela febre da borracha e descrita belamente na Vorágine por J. E. Rivera, e em Toá pelo médico Uribe Piedrahita, seguia igual ou pior. Agora, a tudo isto se lhe sobrepunha a exploração e dominação religiosa (católica e protestante). O outro ciclo sinistro, o da coca, que chegou uns 7 anos depois e se impôs desde as grandes cidades do interior, não se conhecia ainda.
Ainda lembro com sobressalto a impressão que me causou chegar à pista de aterrissagem abandonada que a Rubber Corporation havia construído em 1942, próximo do estrondo ensurdecedor das cascatas do rio Vaupes em Yuruparí. Nesse momento era um baldio selvático ou "fazenda sem limites" de quem fora o chofer particular do Sr. embaixador dos Estados Unidos em Bogotá e se fazia chamar, pelos indígenas que escravizava, por "Tio Barbas". Fumava num cachimbo de barro sedimento do pó de café, e acariciando sua rala barba, me disse, depois de conhecer minha procedência e trabalho, com um sotaque boyasence inconfundível:
- "Doutor, caminhe, lhe mostro outra maravilha".
Caminhamos por uma difícil e tortuosa trilha até chegar à esplanada do que foi a pista de posso. Era um imenso plantio de palma azeiteira (dendê). Perguntei-lhe como levava os frutos até o mercado, se não havia transporte pesado por terra ou ar. Disse-me: "Não necessito transportar-los. E me mostrou uma grande vara de porcos domésticos peludos e quase pretos, regressados a um estado semi-selvagem, que, subidos pelos curtos troncos das palmas, devoravam sem descansar as bolotas e coquinhos azeiteiros da plantação. – "Uma vez que estão gordos, os índios os caçam, salgamos a carne e defumamos, e com o toucinho fazemos manteiga. Isso, sim, é que tem mercado. Aqui chega todo mundo a comprar", me disse gargalhando.
Nunca haveria podido imaginar, nunca!, que 36 anos depois e à raiz da perdida guerra de rapina pelo petróleo no Iraque e das mudanças democráticas em Petróleos Venezuelanos S.A., os mega-cultivos de palma azeiteira se convertessem na agenda energética "alternativa" do Complexo Militar-Industrial-Financeiro dos Estados Unidos e, menos ainda, que o presidente Uribe, da Colômbia, fora um dos maiores grandes cultivadores de palma azeiteira (dendê) e o maior "cruzado" dos mega-projetos para produzir biocombustíveis, que substituem com motor-serra e fossas comuns, a
verdadeira Selva andino-amazônica pelo árido e espantoso deserto verde da palma africana, no que só podem sobreviver sem escravidão, esses quiméricos porcos selvagens trepadores, desenvolvidos por "Tio Barbas".
Enlace original
[Alberto Pinzón Sánchez/ANNCOL]
No inicio dos anos 70, os estudantes de Antropología da U. Nacional das primeiras promoções, descrevíamos com o verbo "Tarzaniar" o individual e obrigatório trabalho de campo com o qual devíamos obter o diploma. Não havia nada mais que improvisação. Nenhum plano acadêmico, nem nada que se lhe parecesse. Muito menos existia financiamento oficial ou privado para isso. O país começava a olhar as Selvas e seus povoadores indígenas e colonos para integrar-los plenamente na "economia de mercado" do país, e se assistia ao intenso debate, em muita medida, induzido pela cúria católica, contra a agência protestante encoberta do governo estadunidense nesses territórios chamada "Instituto Lingüístico de Verano", trazida uma década atrás pelo Vice-rei USA Mr. Lleras Camargo.
Fiz minha tese da realidade que se vivia nas Selvas do Vaupes e Guaviare por aqueles anos, vivendo, ou melhor, sobrevivendo, pela minha conta por espaço de um ano. Pouco depois, meu amigo Arturo Alape considerou que essa monografia era publicável e a editou com o título *Monopólios, Missionários e destruição de Indígenas*. Combinando meus estudos de medicina com a metodologia antropológica de "campo" que acabava de aprender, logrei realmente que os indígenas desta região, Tukanos, Wananos, Sirianos e Piratapuyos me levassem a lugares insuspeitos e até então desconhecidos ou vedados a outros olhos.
A realidade era que, ao ciclo da escravidão e do extermínio indígena que vinha desde os séculos 18 e 19, exacerbado pela febre da borracha e descrita belamente na Vorágine por J. E. Rivera, e em Toá pelo médico Uribe Piedrahita, seguia igual ou pior. Agora, a tudo isto se lhe sobrepunha a exploração e dominação religiosa (católica e protestante). O outro ciclo sinistro, o da coca, que chegou uns 7 anos depois e se impôs desde as grandes cidades do interior, não se conhecia ainda.
Ainda lembro com sobressalto a impressão que me causou chegar à pista de aterrissagem abandonada que a Rubber Corporation havia construído em 1942, próximo do estrondo ensurdecedor das cascatas do rio Vaupes em Yuruparí. Nesse momento era um baldio selvático ou "fazenda sem limites" de quem fora o chofer particular do Sr. embaixador dos Estados Unidos em Bogotá e se fazia chamar, pelos indígenas que escravizava, por "Tio Barbas". Fumava num cachimbo de barro sedimento do pó de café, e acariciando sua rala barba, me disse, depois de conhecer minha procedência e trabalho, com um sotaque boyasence inconfundível:
- "Doutor, caminhe, lhe mostro outra maravilha".
Caminhamos por uma difícil e tortuosa trilha até chegar à esplanada do que foi a pista de posso. Era um imenso plantio de palma azeiteira (dendê). Perguntei-lhe como levava os frutos até o mercado, se não havia transporte pesado por terra ou ar. Disse-me: "Não necessito transportar-los. E me mostrou uma grande vara de porcos domésticos peludos e quase pretos, regressados a um estado semi-selvagem, que, subidos pelos curtos troncos das palmas, devoravam sem descansar as bolotas e coquinhos azeiteiros da plantação. – "Uma vez que estão gordos, os índios os caçam, salgamos a carne e defumamos, e com o toucinho fazemos manteiga. Isso, sim, é que tem mercado. Aqui chega todo mundo a comprar", me disse gargalhando.
Nunca haveria podido imaginar, nunca!, que 36 anos depois e à raiz da perdida guerra de rapina pelo petróleo no Iraque e das mudanças democráticas em Petróleos Venezuelanos S.A., os mega-cultivos de palma azeiteira se convertessem na agenda energética "alternativa" do Complexo Militar-Industrial-Financeiro dos Estados Unidos e, menos ainda, que o presidente Uribe, da Colômbia, fora um dos maiores grandes cultivadores de palma azeiteira (dendê) e o maior "cruzado" dos mega-projetos para produzir biocombustíveis, que substituem com motor-serra e fossas comuns, a
verdadeira Selva andino-amazônica pelo árido e espantoso deserto verde da palma africana, no que só podem sobreviver sem escravidão, esses quiméricos porcos selvagens trepadores, desenvolvidos por "Tio Barbas".
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