As FARC-Exército do Povo. Meio século de luta pela paz.
Por Miguel
Urbano Rodrigues
31 de maio
de 2013
O
comunicado conjunto divulgado em Havana no dia 26 de maio pelas
delegações das FARC-EP e pelo governo de Bogotá significou a
abertura de um novo ciclo de diálogos de paz iniciados naquela
cidade.
Depois de
seis meses de conversações difíceis, os representantes da
guerrilha e do executivo colombiano assinaram um acordo para a
“Reforma Rural Integral”, primeiro ponto da Agenda em debate.
O
documento aprovado prevê transformações radicais no mundo agrário.
A maioria das principais exigências das FARC foi aprovada. Entre
elas, a relativa ao acesso ao uso da terra, à formalização da
propriedade, às terras improdutivas, aos programas de
desenvolvimento social (educação, habitação, erradicação da
pobreza), ao estímulo à produção agropecuária, ao Fundo de
terras pela Paz, ao ambiente.
No dia 11
de junho as delegações iniciam a discussão do segundo ponto da
Agenda: a Participação Política, que abarca o tema crucial da
Democracia.
O
presidente Juan Manuel Santos afirmou que está empenhado na
continuação do processo “com prudência e responsabilidade”.
Em uma
Declaração emitida simultaneamente em Havana, as FARC-EP consideram
positivo o acordo alcançado sobre a Reforma Agrária, mas alertam
sobre as dificuldades do diálogo na Mesa de Negociações, sobre os
pontos restantes da Agenda, especialmente os relativos à droga, ao
cessar fogo e armamentos e à reintegração das populações
expulsas de seus territórios.
As FARC
estão conscientes de que a conquista da paz é inseparável do
desmonte da oligarquia que utiliza o Estado como instrumento de sua
política de classe, marcada por uma repressão feroz.
É
significativo que quando cresce o apoio popular às iniciativas do
Movimento Colombiano pela Paz, liderado pela ex-Senadora Piedad
Córdoba, alguns ministros – entre eles Fernando Carrillo e o do
Interior – falem outra linguagem, sugerindo o fim das conversações
se antes do Natal não for assinado um Acordo Global.
O alto
comando das Forças Armadas também se empenha em sabotar os debates
de Havana – apoiados por Noruega e Cuba – intensificando a
guerra. Os 50 Drones – aviões assassinos sem piloto –
recentemente adquiridos já haviam sido utilizados em bombardeios em
La Macarena, Orito, Saravena e Catatumbo.
A posição
de Barack Obama é, como habitual, ambígua e hipócrita. Diz apoiar
os diálogos para a Paz, mas envia o vice-presidente Joe Biden a
Bogotá para derramar elogios sobre o governo da Colômbia, seu
melhor aliado na América Latina, e expressar ali o desejo dos EUA de
aderir à chamada Aliança do Pacífico. Cabe esclarecer que esta
estranha aliança foi concebida em Washington para funcionar como
contraponto ao Mercosul. Por ora, a integram México, Chile, Colômbia
e Peru, países cujos governos desenvolvem políticas de submissão
ao imperialismo estadunidense.
O apoio
militar à guerra contra as FARC-EP prossegue. Os EUA que já
investiram mais de oito bilhões de euros no financiamento do Plano
Colômbia, instalaram no país sete novas bases militares desde o
início da Administração Obama.
Meio
século de luta
Ao
contrário da imagem edênica de país próspero em acelerado
desenvolvimento pela ação de um governo democrático e
progressista, imagem que Juan Manuel Santos difundiu em sua visita a
Europa, a situação na Colômbia continua degradando-se.
O
paramilitarismo permanece impune com raras exceções. A corrupção
desenfreada e a miséria, na capital e nas grandes cidades, são
crescentes. As mais numerosas e bem equipadas forças armadas da
América Latina – meio milhão de militares – absorvem uma
quantia colossal do orçamento. A fome, endêmica em muitas regiões,
afeta oito milhões de pessoas. 15.000 crianças morrem anualmente
antes dos cinco anos por desnutrição. Dirigentes sindicais são
assassinados cotidianamente todos os meses. Mas o número de
multimilionários aumenta a cada ano em uma das sociedades mais
desiguais do mundo.
As
FARC-EP, fundadas em Marquetalia depois de combates épicos na
ruptura de um cerco, acabam de comemorar 49 anos de existência e de
luta ininterrupta.
Incluídas
pela União Europeia e pela ONU na lista de organizações
terroristas, caluniadas, acusadas de narcotraficantes por um
presidente, Álvaro Uribe Vélez (aliado de Pablo Escobar, o rei da
coca), as FARC se assumem como organização revolucionária,
marxista-leninista.
“Somos
povo – afirmam – que empunha as armas contra as armas do poder e
contra a repressão”.
Moderadamente
otimistas, tudo fazem para que as conversações de Havana permitam a
concretização das aspirações de paz do povo colombiano.
Mas não
esquecem que uma das cláusulas da Agenda estabelece que o Acordo
Geral de Paz somente será possível se todos os pontos nele
incluídos forem aprovados. O rechaço de qualquer deles implicará a
anulação dos demais.
Por si só,
essa exigência esclarece a falta de transparência e da má fé que
foram permanentes nas posições dos delegados do governo na Mesa de
Negociações.
Hoje, como
sempre, as FARC-EP defendem uma solução política cujo desenlace
será a Paz definitiva em uma Colômbia democrática.
Eles
creem como Bolívar que as Forças Armadas devem ser o povo em armas,
um instrumento da defesa da soberania nacional. Usa-las contra o
povo, como ocorre na Colômbia, é um crime monstruoso.