BRASIL. A tormenta sistêmica já está aqui
(repartindo
a riqueza de apenas 85 famílias, se duplicaria para 3 bilhões de
pobres!)
Por Raúl Zebiche/ Resumen Latinoamericano/ 30 de Junho 2015.- A Grande São Paulo tem 22 milhões de habitantes, distribuídos em 39 municípios. É a maior cidade da América Latina e uma das mais populosas do mundo. No verão passado os reservatórios de água que a abastecem caíram a mínimos históricos de 5 por cento de sua capacidade. Houve cortes de água em algumas regiões e restrições em outras. A região vive o que os especialistas denominam de um ciclo de escassez de água que pode durar 20 ou 30 anos, algo bem diferente a uma seca pontual, como era habitual em outros períodos históricos em que não existia o que conhecemos como mudança climática. [Opera Mundi, 6 de maio de 2015]
O que estes dados indicam é que, com quase total certeza, em algum momento dos próximos anos haverá um drástico corte de água numa das megacidades do mundo, apesar inclusive das obras que o governo estadual está realizando às pressas, antes que comece um novo verão.
Ante
uma situação tão grave como esta, o Comando Militar do Sudeste
vem se mobilizando, realiza debates e operações militares. Não
para prover de água a população, mas sim para prevenir contra o
caos social ante um possível corte de água, já que consideram a
seca como um caso de segurança pública.
Em
27 de maio um comando de entre 70 e 100 militares armados com
metralhadoras ocupou as dependências da companhia Sabesp
[Saneamento Básico de São Paulo], prevendo uma eventual
necessidade de ocupação em caso de crise, segundo o comunicado do
exército [El
País,
27 de maio de 2015]. Toda a área do complexo da empresa é
considerada estratégica e a ação forma parte das atividades
militares preventivas para a preservação da ordem pública e
proteção das pessoas e do patrimônio, acrescenta o comunicado.
Um
mês antes, a 28 de abril, o Comando Militar organizou um debate
destinado a um público de oficiais, soldados e professores
universitários simpatizantes dos militares, em cuja mesa estava o
diretor da Sabesp, uma delegada da Federação das Indústrias de
São Paulo, um professor de engenharia e o chefe militar do sudeste.
O objetivo era traçar um panorama técnico, político e social
sobre a crise hídrica. A crônica assinala que a possibilidade de
um corte de água “provoca estremecimentos na cervical do
establishment
do estado”, que os militares consideram que a população ideal da
cidade deveria ser de somente 4 milhões e que o conglomerado urbano
pode ficar sem água a partir de julho deste ano.
O
diretor da Sabesp, Paulo Massato, foi muito claro ao considerar as
consequências sociais: Será o terror. Não haverá alimentação
nem energia elétrica. Será um cenário de fim do mundo. São
milhões de pessoas e explodirá o caos social. Não será só um
problema de desabastecimento de água. Será muito mais sério que
isso. [Opera
Mundi,
6 de maio de 2015]
Porém,
quem deu o alerta trágico foi o general João Camilo Pires de
Campos, o comandante militar do Sudeste, quem citou ao ex-presidente
da ditadura militar Ernesto Geisel [1974-1979]: Em épocas de vacas
magras, é necessário amarrar o bezerro. Para eles, o bezerro somos
os setores populares, como vemos.
As
revistas militares abordaram também o tema. Uma das mais
importantes destaca que em novembro passado a tensão era tão
grande que a polícia militar está levando os caminhões pipa com
escolta para alguns pontos da cidade, sobretudo na periferia, porque
setores populares apoiados por milícias estão atacando os
caminhões de abastecimento para saquear a água. [Defesanet,
30
de novembro de 2014]
Citando
cientistas sociais, Defesanet
assegura que grandes mudanças foram precedidas por alterações
climáticas, como a história nos mostra na Revolução Francesa, ao
tempo em que assegura que São Paulo mostra que as convulsões
sociais são uma constante nas grandes cidades.
Porém,
um dos fatos mais sintomáticos que a publicação revela é que,
desde outubro do ano passado, quando a seca fazia temer cortes de
água, o governo estava enviando militares para cursos com a SWAT
[Special Weapons And Tactics], polícia militar especializada em
manifestações nos Estados Unidos. E acrescenta que existe a
possibilidade “de grandes fluxos migratórios para regiões onde
ainda existe água [...], o que levaria ao esgotamento dos recursos
naturais, com gravíssimos conflitos sobre a água e a terra,
incluindo a propriedade privada”. [Defesanet,
27 de maio de 2015]Finalmente,
a revista alerta que a crise hídrica pode provocar insurreições,
levantamentos sociais graves e até revoluções armadas que
poderiam se estender a todo o estado de São Paulo e a estados
vizinhos como Rio de Janeiro e Minas Gerais, onde vivem 100 milhões
de pessoas.
Até
aqui o relato jornalístico sobre o pensamento dos militares e da
burocracia estatal. Só cabe acrescentar que, em plena crise, a
Sabesp difundiu uma lista de 537 clientes privilegiados que pagam
menos quanto mais água consomem [indústrias, shoppings,
redes como McDonald’s], que, em seu conjunto, consomem 3 por cento
da água da cidade e têm descontos de 75 por cento. Eles consomem o
equivalente a água utilizada por 115 mil famílias e foram os
maiores responsáveis pelo aumento de 5,4 por cento do consumo anual
de água. [El
País, 10
de março de 2015]
O
acima exposto mostra duas questões. Uma, que eles estão preparados
para uma situação muito grave, que têm previstas ações
militares e políticas para sair adiante em meio a um caos tremendo
que seria a falta de água. Dois, que o acesso a água é
insultantemente desigual: desde 2005 a água disponível para
grandes clientes aumentou 92 vezes em São Paulo.
Que
vamos fazer? É a pergunta que nos formulou o subcomandante
insurgente Moisés
durante a sementeira O
pensamento crítico frente à hidra capitalista.
É necessário que os movimentos levem a sério este tipo de
debates, em vez de se apegarem às agendas eleitorais, já que é
agora quando podemos fazer algo para mudar o mundo.
Fonte:
La Jornada Tradução de Joaquim Lisboa Neto