Ignacio Ramonet: a maior batalha da esquerda na América Latina é contra o ‘golpe midiático’
Por Pedro Aguiar.
A avaliação foi feita pelo jornalista e professor Ignacio Ramonet, ex-editor do jornal Le Monde Diplomatique, na palestra de abertura do congresso "Comunicação e integração latino-americana”, realizado entre os dias 22 e 23 de julho, em Quito, capital do Equador.
Organizado pelo Ciespal (Centro Internacional de Estudos Superiores da Comunicação para a América Latina), o evento comemorou os 10 anos de fundação daTelesur, canal multinacional de televisão mantido por diversos governos da região. Fundada por iniciativa de Chávez, três anos após o golpe de Estado fracassado, a emissora nasceu com o papel de promover uma alternativa à cobertura das notícias latino-americanas, feita por jornalistas e comunicadores da própria região.
"Nos últimos 15 anos, todos os governos progressistas que chegaram ao poder democraticamente na região vêm sendo mantidos por via eleitoral. Nenhum deles foi derrotado nas urnas. Por isso, a resistência à mudança vem sendo cada vez mais brutal, apelando para novos tipos de golpes, alguns com fachada judicial, parlamentar, e sempre com forte ajuda da mídia”, afirmou Ramonet, lembrando os casos do Paraguai, Honduras e as investidas recentes na Argentina e no Brasil.
Ao lado de Ramonet, a presidenta da empresa, Patricia Villegas, lembrou que as principais coberturas do canal até agora foram justamente em países que não participam do consórcio, como a campanha militar contra a guerrilha das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e o golpe contra o presidente Manuel Zelaya, em Honduras, em 2009.
"Naquele momento, o mundo só pôde acompanhar o que acontecia em Honduras, minuto a minuto, graças ao sinal da Telesur. Porque as emissoras privadas globais ou não estavam lá, e as que estavam preferiam ignorar”, disse.
Para Ramonet, o grande mérito da Telesur, ao longo dessa década, foi oferecer "uma outra leitura” sobre os acontecimentos da América Latina e do mundo, fugindo das perspectivas de redes privadas, como a CNN e e Fox News, que, para ele, seguem praticamente a mesma linha.
O maior confronto enfrentado na América Latina atualmente é "a batalha midiática”, desde pelo menos o ano de 2002, quando a tentativa frustrada de derrubar Hugo Chávez, na Venezuela, deu início a um novo tipo de golpe de Estado, o "golpe midiático”. Este transfere aos meios de comunicação privados o papel de partido político nas oposições aos governos da "guinada à esquerda”.
A avaliação foi feita pelo jornalista e professor Ignacio Ramonet, ex-editor do jornal Le Monde Diplomatique, na palestra de abertura do congresso "Comunicação e integração latino-americana”, realizado entre os dias 22 e 23 de julho, em Quito, capital do Equador.
Organizado pelo Ciespal (Centro Internacional de Estudos Superiores da Comunicação para a América Latina), o evento comemorou os 10 anos de fundação daTelesur, canal multinacional de televisão mantido por diversos governos da região. Fundada por iniciativa de Chávez, três anos após o golpe de Estado fracassado, a emissora nasceu com o papel de promover uma alternativa à cobertura das notícias latino-americanas, feita por jornalistas e comunicadores da própria região.
"Nos últimos 15 anos, todos os governos progressistas que chegaram ao poder democraticamente na região vêm sendo mantidos por via eleitoral. Nenhum deles foi derrotado nas urnas. Por isso, a resistência à mudança vem sendo cada vez mais brutal, apelando para novos tipos de golpes, alguns com fachada judicial, parlamentar, e sempre com forte ajuda da mídia”, afirmou Ramonet, lembrando os casos do Paraguai, Honduras e as investidas recentes na Argentina e no Brasil.
Ao lado de Ramonet, a presidenta da empresa, Patricia Villegas, lembrou que as principais coberturas do canal até agora foram justamente em países que não participam do consórcio, como a campanha militar contra a guerrilha das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e o golpe contra o presidente Manuel Zelaya, em Honduras, em 2009.
"Naquele momento, o mundo só pôde acompanhar o que acontecia em Honduras, minuto a minuto, graças ao sinal da Telesur. Porque as emissoras privadas globais ou não estavam lá, e as que estavam preferiam ignorar”, disse.
Para Ramonet, o grande mérito da Telesur, ao longo dessa década, foi oferecer "uma outra leitura” sobre os acontecimentos da América Latina e do mundo, fugindo das perspectivas de redes privadas, como a CNN e e Fox News, que, para ele, seguem praticamente a mesma linha.
"Estou convicto de que a CNN vai desaparecer, não por falta de capital, mas por falta de audiência”, declarou Ramonet, falando por teleconferência de Caracas para a plateia de jornalistas, intelectuais e estudantes reunida no auditório equatoriano. "A Telesur não tem concorrência. Esse é o sonho de qualquer canal. Porque as outras fazem mais ou menos a mesma coisa”.
‘Convergência digital’
Segundo o jornalista — que é espanhol, mas vive radicado na França desde 1972 —, a maior mudança na comunicação nos últimos 10 anos foi a integração das várias plataformas, a chamada "convergência digital”: smartphones, tablets e computadores, que roubaram da televisão o posto de tela principal da mídia. E se antes as inovações tecnológicas estouravam primeiro nas cidades ricas da Europa e dos Estados Unidos, aponta Ramonet, agora, já são disseminadas simultaneamente nas grandes metrópoles da América Latina e de outras regiões em desenvolvimento.
"As novas plataformas abandonam a continuidade que obrigava o espectador a assistir tudo linearmente; agora, ele pode ver o que quiser, na ordem que quiser. Os canais que se adaptarem melhor são os que têm mais chance de sobreviver”, aponta.
Patricia Villegas enfatizou que a adaptação às novas plataformas é uma de suas maiores preocupações na Telesur. "Não adianta fazer conteúdos-espelho, que se repetem de forma idêntica na TV, na web, no Facebook, no Twitter. Os conteúdos precisam ser complementares e diferentes porque o público os consome de formas diferentes”, disse ela.
Além do décimo aniversário, completado na última sexta-feira, 24, a Telesur celebra também um ano desde o início da produção de conteúdos em inglês. "Não estamos traduzindo informações, mas produzindo diretamente em inglês”, enfatizou Patricia Villegas. Segundo ela, a entrada na esfera anglófona sinaliza a intenção da empresa em ampliar sua presença global. Por enquanto restrita ao site e às redes sociais, a Telesur em inglês espera iniciar, em breve, transmissões também como canal de televisão, com sede em Quito.
Sul geopolítico
"Na América Latina, vários intelectuais e lideranças políticas têm o vício de só verem a relação regional com o ‘gigante do norte’, os Estados Unidos. Mas também é extremamente importante considerar nossa relação com a China, a África, o Oriente Médio. A Telesur tem a tarefa de transportar a missão progressista da América Latina para o resto do mundo”, disse Ramonet.
Justamente por isso, Villegas diz que o canal continua expandindo seu universo de pautas para outras regiões, como aconteceu com o ataque da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte, a aliança militar ocidental) à Líbia, em 2011, e, mais recentemente, na crise financeira da Grécia, quando o canal enviou jornalistas para Atenas e investiu na cobertura ao vivo. "Às vezes, perguntam aos nossos repórteres: ‘O que vocês estão fazendo aqui?’. Estamos aqui porque a nossa ideia de ‘sul’ não é apenas geográfica, mas, principalmente, geopolítica. Enxergamos a informação como um serviço, e não como mercadoria”.
"Durante muito tempo na América Latina, o jornalismo era um privilégio das emissoras privadas, e as TVs públicas ficavam relegadas à programação educativa, cultural e folclórica. Daí a importância de investir em produzir informação numa tela pública. Não se trata de um monólogo do Estado, mas de dar voz também aos grupos comunitários, como indígenas e afrodescendentes, contra a folclorização dessas comunidades”, concluiu Patricia Villegas.
Da teoria à prática
A proposta do congresso em Quito é ser não apenas acadêmico, mas também proporcionar a troca de experiências práticas em jornalismo e gestão de mídia voltada para a integração regional, ambos sob uma perspectiva crítica. A ideia é que professores, intelectuais e estudantes de fato dialoguem com jornalistas, diretores de emissoras e agências de notícias e gestores públicos do setor.
"É fundamental a teoria que reflete sobre a prática para dar-lhe sentido e compreender melhor a realidade para fazer diferente”, comentou Ramonet.
O diretor do Ciespal, o
espanhol Francisco Sierra, lembrou, na fala de abertura, que a
tentativa de descrédito sobre a Telesur e outras mídias públicas,
assim como contra as iniciativas de regulação e democratização da
mídia pelos governos da "guinada à esquerda”, lembra muito o
ataque da mídia privada feito contra a campanha da Nova Ordem
Mundial da Informação e Comunicação (Nomic) e o Relatório
MacBride da Unesco (Órgão da ONU para Educação, a Ciência e a
Cultura), entre os anos 1970 e 1980.
Ele recordou o legado do
comunicólogo boliviano Luis Ramiro Beltrán, falecido na semana
passada, que não apenas teorizou sobre a comunicação
latino-americana, mas ajudou a promover fóruns e encontros
internacionais, para criar iniciativas práticas de alternativas
midiáticas na região naquela mesma época.
Nos dois dias do evento,
que reuniu mais de 400 pessoas, também estiveram presentes outros
nomes do pensamento crítico da região, como o argentino Atilio
Borón, do Clacso (Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais), e
o colombiano Omar Rincón, do Ceper (Centro de Estudos de Jornalismo,
em espanhol). Mais de 100 trabalhos acadêmicos foram inscritos para
apresentação. Entre eles, o do geógrafo André Pasti, doutorando
pela Universidade de São Paulo (USP), que discute a trajetória das
lutas pela democratização da comunicação no Brasil.
"É importantíssimo
aprendermos e nos inspirarmos com os processos de democratização da
comunicação em curso em outros países da América Latina. O
congresso permite esse diálogo”, disse Pasti a Opera Mundi.
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Fontes: Adital e Opera
mundi