"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


quarta-feira, 5 de março de 2008

Toda a verdade sobre a morte de Raúl Reyes


Escrito por Decio Machado / Rebelión


As investigações desenvolvidas pelas autoridades equatorianas vão jogando luz sobre o que realmente sucedeu na madrugada do passado 1º de março, onde forças armadas colombianas abateram entre 20 e 22 guerrilheiros em território equatoriano. Emboscada na qual foi abatido o comandante Raúl Reyes, número 2 na estrutura de mando das FARC. As imagens, os testemunhos dos colonos da zona, as declarações de três guerrilheiras que se encontraram ainda com vida, os informes de balística e inteligência militar equatoriana vêm demonstrar o montão de mentiras declaradas pelo presidente colombiano, Álvaro Uribe, tanto ao presidente Rafael Correa, do Equador, como ao conjunto da comunidade internacional e aos meios de comunicação.



A versão colombiana.
Segundo a versão colombiana, se vinha perseguindo a frente 48 das FARC, com base numa informação que indicava que o líder guerrilheiro Raúl Reyes faria presença num povoado denominado Granada, próximo dos limites fronteiriços com Equador, porém ainda em território colombiano.


O ministro de Defesa colombiano, Juan Manuel Santos, indicou que, durante a dita operação, as forças armadas colombianas haviam sido atacadas desde um acampamento das FARC situado a 1.800 metros da fronteira, no interior do território equatoriano.


Indica-se que, então, a força aérea colombiana procedeu a localizar e atacar o acampamento guerrilheiro, tendo sempre em conta a ordem de não violar o espaço aéreo equatoriano, indicando que logo entrou a força armada colombiana para assegurar a zona e deixando a Polícia colombiana a cargo do acampamento atacado, até a chegada do exército equatoriano.


A verdade dos fatos.
As investigações que se estão desenvolvendo por parte das autoridades equatorianas demonstram que nunca houve combate por parte do comando atacado das FARC. Com exceção de três deles, que cumpriam funções de vigilância, os 18 falecidos estavam dormindo com roupa íntima, nenhum do comando guerrilheiro teve ocasião de entrar em combate ou render-se.


O armamento existente no acampamento estava empilhado, não tiveram a ocasião nem sequer de aceder a seus fuzis e granadas, foram massacrados enquanto dormiam.


Os testemunhos dos colonos da zona, assim como buracos desenvolvidos sobre o piso de terra do acampamento demonstram que se dispararam quatro bombas desde aviões colombianos que incursionaram sobre território equatoriano. Segundo as investigações de inteligência militar, estas se dispararam desde o sul do acampamento, o que quer dizer que os aviões haviam incursionado a mais de 10 quilômetros ao interior do território equatoriano, quando se procedeu ao ataque.


Após o lançamento de bombas desde estes aviões, incursionaram vários helicópteros, pertencentes à força aérea colombiana. Desde eles se continuou atacando o acampamento das FARC em território equatoriano. Dos ditos helicópteros descenderam comandos especiais que arremataram aos guerrilheiros, que ficaram feridos no acampamento, segundo se demonstra pelas balas que têm em seus corpos grande parte dos cadáveres dos guerrilheiros, muitos deles empilhados numa zona determinada do acampamento e assassinados pelas costas. Inclusive, as fotografias mostradas pelo governo colombiano do cadáver do comandante Raúl Reyes mostram como este tem um disparo na parte esquerda de sua cara.


As informações que provêm da inteligência militar equatoriana indicam que o espaço aéreo do Equador não só se violou na madrugada do 1º de março, senão que na madrugada do 2 há uma nova penetração de helicópteros com visores noturnos para sacar a membros das forças armadas e polícia colombiana que ainda se mantinham em território equatoriano.


A posição das árvores derrubadas no bombardeio, os múltiplos orifícios de disparos nas árvores, assim como a posição dos cadáveres vem demonstrar que, enquanto as FARC vigiavam o acampamento em sua posição norte, a que mira para a fronteira com Colômbia, a incursão aérea sobreveio do sul, o que indica que a força aérea colombiana invadiu sem permissão, sem notificar e transgredindo todo tipo de normativa internacional o espaço aéreo equatoriano.


Os depoimentos dos moradores da zona indicam que o ataque se prolongou desde aproximadamente passada a meia-noite até as seis da manhã do 1º de março.


A precisão do ataque demonstra também a utilização de uma importante tecnologia militar que também põe sobre a mesa a possibilidade da participação dos Estados Unidos no massacre, ao menos em tarefas de informação e localização do comando guerrilheiro.


Os depoimentos dos moradores falam da possibilidade de que os helicópteros colombianos tenham levado quatro cadáveres e não dois, os correspondentes a Raúl Reyes e Julián Conrado, como indicam as autoridades do país agressor. Por sua parte, o exército equatoriano não descarta a possibilidade de localizar algum cadáver mais na frondosa zona selvática onde se deu a matança.


A reação do presidente Correa.
Num ato de soberania e dignidade, o governo da República do Equador retirou seu embaixador em Bogotá, expulsou o embaixador da Colômbia em Quito, e mobilizou as tropas para a fronteira, ao mesmo tempo em que solicitou a reunião extraordinária da Assembléia Geral da OEA, da CAN e do MERCOSUL.


Rafael Correa chamou de mentiroso ao presidente Uribe, denunciando que havia sido notificado por parte deste sobre as 8,30 horas e enganado por seu homólogo colombiano, o qual justificou a incursão em território equatoriano pelo calor do combate.



Acusações desde Colômbia.
Que as FARC operam no Equador, é uma denúncia que tem sido permanente desde a chancelaria e da presidência da Colômbia, versão que se viu agravada após a liberação, em 27 de fevereiro, de quatro ex-congressistas colombianos por parte das FARC. Um deles, Luis Eladio Pérez, declarou a Radio Caracol que, no começo de seu cativeiro, esteve retido em território equatoriano, acrescentando que as FARC se abastecem de produtos provenientes de Equador, Brasil e Venezuela. “Eu dormi no Equador: com isso digo tudo. Usávamos botas de marca equatoriana, desodorantes, drogas brasileiras e sabões venezuelanos”, declara, no dia seguinte de sua libertação, Luís Eladio Pérez.

Por sua parte, o exército equatoriano, no transcurso do ano passado, descobriu vários acampamentos de abastecimento e descanso das FARC em território do Equador, sempre próximos da fronteira, e em um território muito difícil de controlar devido ao frondoso e extenso que é esta zona selvática que abarca ambos países.

Antecedentes nas relações entre Equador e Colômbia.
As relações entre Equador e Colômbia se haviam caracterizado, até agora, por um baixo nível de conflitividade desde a ascensão à presidência do Equador do economista Rafael Correa Delgado, a 15 de janeiro do ano passado.

Esta realidade não foi sempre assim, tendo havido situações muito tensas durante governos anteriores ao de Correa. Assim, no ano 2005, se deram um conjunto de situações que questionaram a soberania do Equador. Em julho desse ano, durante o mandato de Alfredo Palacios, Parra Gil, então chanceler do Equador, logo após uma reunião com Carolina Barco, então chanceler da Colômbia, questionou as fumigações das plantações de coca ordenadas desde Bogotá na linha fronteiriça comum. Apesar do dito questionamento e sem ter resposta positiva por parte de Colômbia, Equador votou a favor do colombiano Luís Moreno como presidente do BID por solicitação do governo colombiano e dos Estados Unidos. Precisamente Luís Moreno havia sido embaixador de Bogotá em Washington e foi questionado por participar na gestação do Plano Colômbia.

Outro fato que evidenciou uma postura de ambigüidade na relação histórica do Equador com respeito à Colômbia sucede quando, a 31 de julho de 2005, um repórter equatoriano denuncia que “... o exército do Equador se uniu à operação contra as frentes 21, 13 e 48 das FARC, que estariam escoltando o guerrilheiro Raúl Reyes e que têm bloqueado no departamento de Putumayo”. Esta informação foi confirmada pelo Major-General equatoriano Reinaldo Castellanos Trujillos.

Porém, a violação mais grave realizada pelo anterior governo de Alfredo Palacios a respeito da histórica neutralidade do Equador ante o conflito armado no país irmão se deu quando, nesse mesmo ano, um operativo coordenado de inteligência das polícias de Equador e Colômbia localizam e capturam em Quito a supostos guerrilheiros das FARC que estavam internados numa clínica. Essa coordenação existe, e o fato mais significativo desta realidade se deu quando, durante a presidência de Lucio Gutiérrez, no ano 2004, uma operação conjunta entre forças da ordem colombianas, equatorianas e estadunidenses permitiu a captura em Quito de Ricardo Palmera, mais conhecido por Simón Trinidad, agora processado e preso, com uma condenação de 60 anos, nos Estados Unidos, pela extradição facilitada pelo governo de Uribe.

Crise regional.
A pretensão de Álvaro Uribe de aplicar na luta contra o que ele define como “terrorismo” a mesma estratégia que utiliza Israel em seu combate contra o mundo árabe pode ter repercussões impredecibles no continente latino-americano.

O presidente da República Bolivariana de Venezuela, o comandante Hugo Chávez, ante a possibilidade de que o governo da Colômbia incursione e viole a soberania de Venezuela, tal e como o fez com o Equador, ordenou o fechamento definitivo de sua embaixada em Bogotá, assim como o reforçamento militar de toda a zona fronteiriça com a Colômbia. Espera-se nas próximas horas a expulsão do embaixador colombiano em Caracas.

“Senhor ministro de Defesa, mova 10 batalhões para a fronteira com a Colômbia, de imediato. Batalhões de tanques. A aviação militar que se desdobre. Nós não queremos guerra, porém não vamos permitir ao império norte-americano, que é o amo, e a seu cachorro, o presidente Uribe, e a oligarquia colombiana que venham nos dividir, que venham nos debilitar, não o vamos permitir”, ordenou o mandatário venezuelano.

Chávez ofereceu todo o respaldo necessário, em seu conflito diplomático com Colômbia, ao Equador, indicando: “Ponho a Venezuela em alerta e apoiaremos ao Equador em qualquer circunstância”.

Por sua parte, o presidente Correa se pôs em contato durante o domingo 2 de março com uma dezena de países com o fim de alcançar seu apoio e fazer-lhes partícipes da gravidade dos fatos ocorridos na incursão e no massacre colombiano em território do Equador.

A resposta do executivo colombiano não se fez esperar, e na mesma noite do 2 de março o diretor da Polícia, general Óscar Naranjo, revelou documentos preliminares pelos quais se pretende demonstrar que Raúl Reyes tinha contatos com o Ministro Coordenador de Defesa Interna e Externa do Equador, Gustavo Larrea. Estes documentos foram supostamente encontrados em três computadores expropriados pelo exército colombiano no acampamento onde foi assassinado Reyes.

Os objetivos de Uribe.
Apesar de que as FARC tornaram público um comunicado pelo qual indicam que o assassinato de Raúl Reyes não afetará as negociações pelo intercâmbio humanitário, o certo é que os objetivos do presidente Uribe são claros: bloquear o processo de entrega de reféns de tal maneira que fique bloqueada a possibilidade de devolução, por parte das FARC, de Ingrid Betancourt.
Se bem que a vontade do executivo colombiano de que Betancourt não regresse viva é uma realidade dificilmente questionável, o certo é que, após as declarações dos quatro ex-congressistas liberados no passado 27 de fevereiro, onde se indicava a vontade da seqüestrada de apresentar-se às eleições presidenciais na Colômbia com um programa de paz para este país, pôs muito nervoso a Uribe.

Paralelamente a isto, a intervenção colombiana no Equador pretende claramente converter o país vizinho numa espécie de Camboja, com respeito ao conflito militar colombiano.

A finalização do acordo subscrito por 10 anos entre os governos de Equador e Estados Unidos para a utilização, por parte das forças armadas norte-americanas da base de Manta, o qual expirará em fins do presente ano, e sobre o qual já se posicionou o presidente Correa, com respeito à sua vontade de não renová-lo, também é um elemento a ter em conta na escalada da crise diplomática na área andina.

A base de Manta é uma ferramenta fundamental dentro da estrutura e estratégia do Plano Colômbia e, ainda que o governo norte-americano não tenha feito declarações em firme sobre sua saída da base em fins de 2008, é evidente que forma parte de sua agenda de preocupações a respeito da nova política desenvolvida no Equador a partir da chegada ao poder da chamada “Revolução Cidadã”.


* Nota da ANNCOL - Brasil: os aviões Supertucanos e as bombas cluster usadas na operação, são de fabricação brasileira. As bombas cluster são condenadas e proibidas em todo o mundo, mas o Brasil se recusa em assinar os tratados de proibição.