"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

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A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Manifesto das FARC

Compatriotas:

1 A dignidade nos está convocando à resistência em unidade frente ao governo foragido, ilegítimo e ilegal que tomou o Palácio de Nariño, à convergência e ao Acordo Nacional para superar a profunda crise institucional e de governabilidade que abate o país e para traçar caminhos corretos rumo à paz duradoura.

A Colômbia merece respeito. Não podemos mais tolerar essa máfia narco-paramilitar de latifundiários e pecuaristas, narcotraficantes e empresários que, com o apoio militar do governo dos Estados Unidos e o bombardeio dos meios de informação, converteram a Colômbia em um inferno da guerra, os massacres, as detenções em massa de cidadãos, os desaparecimentos, a miséria e o saque, e de todos os desaforos do terrorismo de Estado.

2 O governo de Uribe marcha no compasso das diretrizes de Washington e das exigências de poderosos chefes narco-paramilitares como Salvatore-Mancuso, Jorge 40, Castaño, Cuco Vanoy, Isaza, Báez, Macaco, Don Berna, El Alemán, Giraldo, El Tuso, Gordo Lindo e outros sinistros personagens da moto-serra e cocaína, sócios do Presidente. Essa máfia financiou com maletas repletas de dólares as duas campanhas presidenciais de Uribe.

Sim, eles o elegeram, e são eles que mandam.

Impuseram, à ponta de fusil, de terror e de fraudes eleitorais, dezenas de congressistas, governadores e prefeitos que atuaram como marionetes do paramilitarismo na política e no governo. Como acreditavam serem donos do país, não tiveram vergonha nenhuma em proclamar com fins de vitória que haviam conseguido eleger 35% do atual congresso, o que equivale a uns 80 representantes e senadores. Esses mesmos votos contaminados levaram Uribe à Presidência da República, e por isso e muito mais, seu mandato é ilegítimo e ilegal.

Este governo está erguido sobre milhares de valas comuns e massacres, sobre terras despojadas e milhões de deslocados, sobre lágrimas e luto... Nada foi feito sem a aprovação ou a participação das forças armadas oficiais.

Toda a cúpula do Estado, a começar pelo próprio Uribe, chefe principal dos “paracos”, está invadida pelo monstro da narco-para-política que tomou a Colômbia. O Vice-presidente foi o inspirador do bloco paramilitar que atuou sobre a capital. O comando do exército e a polícia não pode negar que sempre atuou em parceria para delinqüir com eles. O ministro de Defesa conspirou com Carlos Castaño. A ex-chanceller Araújo era amiga de Jorge 40. O ex-chefe do DAS, Jorge Noguera, além de montar com eles a conhecida fraude eleitoral a favor de Uribe, lhes fornecia a lista dos dirigentes sindicais e populares que deviam assassinar.

Os chefes paramilitares estavam mandando no país e Uribe não dizia nada. Roubaram os recursos da saúde. Morderam todos os contratos que viam pela frente. Saquearam os orçamentos estaduais e municipais. Começaram até a cobrar impostos...

O Acordo de Ralito, pacto das trevas entre o governo e seus paramilitares, foi o pacto da impunidade, onde o governo se comprometeu a garantir penas irrisórias e simbólicas, participação na política, a não-extradição, o respeito às suas riquezas mal adquiridas através do despojo, o narcotráfico e a lavagem de dinheiro.

Esse é o motivo que compeliu o Presidente Uribe ao desacato e ao desafio insólito frente a providência da Corte Suprema de Justiça que afirmou que o paramilitarismo e a orquestra para delinqüir não é sedição. Ele entende que sem o rótulo artificial de delito político que pretendiam tirar do paramilitarismo para santificá-lo, estariam acabando com a mais importante opção de impunidade com a qual contava, não apenas para favorecer aos paramilitares, mas para eximir o Estado, genitor dessa desumana estratégia contra-insurgente na qual também estão envolvidas a CIA e o DEA.

Uribe bem que mereceu o repúdio dos povos que, em suas viagens internacionais, o recebem comm gritos de “assassino, assasino: que renuncie por ser paramilitar, por ser ilegítimo, por ser ilegal”.

Qualquer governo do mundo em tais circunstâncias já teria caído sem remédio. E os colombianos não somos menos para tolerar semelhantes governantes, mesmo que contem com o respaldo do governo dos Estados Unidos.

3 A Colômbia está sendo violentada também pela política de Segurança Democrática, desenhada por Washington como desenvolvimento da velha Doutrina de Segurança Nacional e como estratégia de predomínio do império sobre os povos de Nossa América. Em essência, esta política –explicada pelo general Craddock do Comando Sul- busca, nos marcos da recolonização neoliberal, assegurar o investimento e o espólio das transnacionais, mediante a aplicação de leis severas e a força, para reprimir e aniquilar a resistência dos povos e a inconformidade social.

Não podemos permanecer impassíveis frente a esta política que já começa a ser executada também por outros governos do hemisfério.

No caso da Colômbia, a Segurança Democrática tem como componente militar o Plano Patriota, cujo objetivo principal é a derrota militar da guerrilha das FARC, ou em seu defeito a redução de sua vontade de luta para levá-la subjugada à mesa de negociações. Desde então não se sentem tranqüilos com esta alternativa de poder construída pelo povo como resistência a décadas de violência estatal e de opressão.

“Com este objetivo de derrotar a guerrilha mobilizaram dezenas de batalhões e brigadas móveis para o sul e lançaram grandes e repetidas operações em outras áreas do país. Instalaram postos de comando com oficiais gringos em Larandia e Três Esquinas, Caquetá, nos arredores da Amazônia que almejavam. Ativaram satélites espiões e aparatos com tecnologia militar de ponta. Realizaram cercos estratégicos, bloquearam zonas camponesas, deslocaram a população, assassinaram e desapareceram com civis, incendiaram parcelas, roubaram gado, bombardearam dia e noite, trilharam selva e cordilheiras, e não puderam, em cinco anos, mostra um só resultado contundente. Apenas o desgaste inútil e o esfacelamento da vontade de luta das tropas oficiais que morrem na selva ou saem machucados dela, porque assim quer um louco guerreirista que vocifera em Bogotá e culpa generais por ausência de resultados ou partes de vitória.
Da pólvora e do calor das batalhas está surgindo uma força guerrilheira de novo tipo, fogueada nas manobras inimigas e no choque com as novas tecnologias da operatividade contra-insurgente, guerrilha que é verdadeiro poder de fogo político e militar a serviço da causa popular.

Mas paralelamente ao desenvolvimento do Plano Patriota nos distintos teatros de operações, o governo vai consolidando o crime de opinião, a repressão da consciência, até chegar a prender mais de 150 mil cidadãos, acusando-os de simpatizar com a guerrilha. Em ares de dissuadir o respaldo ao projeto político e social da insurgência está sendo ceifado na Colômbia o direito universal à opção política. Não bastou eliminar fisicamente a toda uma geração de revolucionários que se incorporaram à União Patriótica como alternativa legal de mudança; agora querem impor um pensamento, o da nova inquisição, da direitoa e o fascismo. Um pensamento que criminalizará o protesto social com o conto de que, por trás de toda mobilização popular contra as políticas do governo, está a guerrilha. Um autoritarismo que quer acabar com a autonomia e a independência das outras instâncias do poder público para estabelecer, sem sobressaltos constitucionais, o reino da tirania, que apenas tolera as oposições que não proponham a mudança do status quo, das estruturas da opressão.

4 Essa direita fascista ativou o orçamento da nação em função da guerra e o resultado é o desastre social. Crianças que morrem de fome, crescimento da pobreza e da marginalização, abandono total dos projetos de construção de moradia popular, a maioria da população sem serviços de água, luz e saneamento básico. Indiferença do governo frente à carência de escolas, colégios e professores, porque optou pela privatização desse serviço, assim como da saúde.
Recorte das transferências que paraliza o desenvolvimento das regiões. Venda de empresas rentáveis do Estado para conseguir mais recursos para a guerra. Privatização paulatina de empresas estratégicas como ECOPETROL. Incremento dos índices de desemprego e sub-emprego ao impulso da flexibilização trabalhista que pisoteia os direitos dos trabalhadores e dispara os lucros dos empresários. Fome e alto custo de vida é o que geram as políticas do Estado contra a massa popular. Perspectivas de aprofundamento da crise social com a aprovação do TLC que agride a pátria, a soberania e a qualidade de vida dos colombianos.

A perfídia com a qual atua o Estado deve ser respondida com a mobilização do povo em ações de rua e bloqueio de estradas que paralizem o país em demanda dos direitos conculcados para constatar na luta de massas a força dos de baixo e para buscar a convergência de todos os setores democráticos sob uma só bandeira política e social, com o objetivo de formar um novo governo que trabalhe pela paz, a justiça social e o resgate da dignidade e a soberania do povo da Colômbia.

5 Para a construção desta alternativa, colocamos à consideração do país, de suas organizações políticas e sociais, de todo o povo, a Plataforma Bolivariana pela Nova Colômbia para abrir a discussão e o intercâmbio em torno das bandeiras e do programa de um novo governo que sugerimos que seja patriótico, democrático, bolivariano, rumo a uma nova ordem social, comprometido na solução política do grave conflito que o país vive.

Um novo governo que materialize o projeto político e social do Libertador, que forme um novo Exército Bolivariano para a defesa da pátria e as garantias sociais. Uma nova ordem, edificada sobre a democracia e a soberania do povo, que agregue aos ramos do popder público o poder moral e eleitoral, que institua o congresso unitário e o referendo revogatório do mandato. Um novo sistema de governo que castigue com severidade a corrupção e a impunidade, que ponha fim à política neoliberal, que estimule a produção em suas diversas modalidades, que assuma o controle dos setores estratégicos, que faça respeitar nossa soberania sobre os recursos naturais e que implemente políticas eficazes de preservação do meio-ambiente. Um governo que trabalhe pela gratuidade da educação em todos os níveis, que instrumente a redenção social, a justiça agrária, que renegocie os contratos com as transnacionais que sejam lesivos para a nação, que deixe sem vigência os pactos militares, tratados e convênios que maculem a soberania da pátria, que não extradite nacionais, que se negue ao pagamento da dívida externa naqueles empréstimos viciados de dolo em todas as suas fases. Um governo cuja divisa em política internacional seja a Pátria Grande e o socialismo e que priorize as tarefas da integração dos povos de Nossa América. Por isso a política de fronteiras das FARC opta pela irmandade e não pela confrontação com os exércitos dos países vizinhos. Nossa luta é de resistência e libertação frente ao regime opressor colombiano.

É hora de analisar e selecionar o caminho que nos conduza à paz, à independência, à justiça social, à democracia, e à unidade como caminho para sobreviver e enfrentar com êxito as políticas dos impérios.

6 A paz é um processo, um bem comum que requer de todos a preparação do terreno para que germine. Não se consegue a paz da noite para o dia. São necessárias novas estruturas econômicas, políticas e sociais que a sustentem, mudanças como as que sugere a Plataforma Bolivariana pela Nova Colômbia.

Não haverá a paz dos sepulcros. Todos os planos militares das oligarquias e o império para exterminar a insurgência desde o LASO (Latin American Security Operation) executado em Marquetalia, até o Patriota, fracassaram porque o levante armado por causas sociais, econômicas e políticas não se derrota com bombas ou com chumbo, nem tecnologias recém-criadas.

Por canalhice ou demagogia eleitoreira, Uribe anunciou estar disposto a oficializar uma zona de encontro para assinar a paz em três meses. 43 anos de confrontação não se superam em tão curto tempo. A problemática política, econômica, social, cultural, ambiental e de soberania do país não pode ser resolvida em 3 meses, a não ser que alguma das partes tenha derrotado a outra, e este não é o caso. Uribe não é o homem para a paz na Colômbia. Não está programado pelos gringos para isso. Um tipo que sequer reconhece a existência do conflito armado não chegará à paz por nenhum caminho. Apenas um novo governo patriótico e democrático, soberano, poderá conseguir a paz negociada, não um governo fantoche da Casa Branca. Seria necessário um governo compenetrado com a necessidade da paz, que apoiado no povo e no interesse nacional tome a decisão de voltar suas tropas aos quartéis, de reduzir drasticamente o orçamento para a guerra em prol dos investimentos sociais e de exigir a saída do país das tropas e assessores estadunidenses intrometidos no conflito interno e fator atiçador da guerra, para avançar nos diálogos de paz.

7 A paz merece todos os esforços e sacrifícios do país e começa com o consenso de suas forças fundamentais, de suas organizações políticas e sociais, para criar entre todos uma nova alternativa política de poder que se converta em governo soberano e digno, altivo frente a Washington, empenhado na maior quantidade de felicidade possível para o povo, segundo o mandato do Libertador.

É necessário começar o quanto antes a troca humanitária e o reencontro de todos os atores da transformação social e a paz, inclusive a guerrilha, em torno dessa perspectiva. Aqueles que, a partir da servidão do stablishment, pregam a exclusão da insurgência com rebuscados argumentos, o fazem para induzir a formação de uma alternativa na qual ela seja uma presa fácil dos poderosos exploradores de sempre.
Propomos que se iniciem o mais breve possível os primeiros contatos clandestinos, com ou sem o consentimento do governo, para criar pautas e para ir esboçando coletivamente alguns traços programáticos para a redenção da Colômbia.

Convidamos a este diálogo os dirigentes revolucionários, os setores democráticos dos partidos, os setores avançados do clero, os militares patriotas e bolivarianos, os líderes operários e camponeses, estudantes, líderes comunitários, indígenas, os negros, os educadores, as mulheres... a todos e a todas as lideranças populares, para juntar anseios e empreender juntos o caminho rumo a Nova Colômbia.

8 O objetivo é a criação de uma alternativa para a mudança, surgida de um Grande Acordo Nacional pela paz, a justiça, a soberania e o decoro da nação, que se proponha um novo governo para salvar a Colômbia do abismo, para recuperar a dignidade maculada pelo governo foragido de fascistas narco-paramilitares abençoados por Washington, uma nova condução dos destinos da pátria que substitua a repressiva e exploradora Segurança Democrática do império e a política neoliberal, que resgate a soberania do povo, reestruture o Estado com a finalidade de garantir o bem comum e forme um Exército Bolivariano guiado pelo amor ao povo, a justiça social e a defesa da pátria. Enfim, um governo que convoque uma Assembléia Nacional Constituinte para criarmos uma nova Constituição que referende as mudanças a favor do povo, rumo a paz e a convivência, a verdadeira democracia, a soberania e a integração solidária dos povos, como mandatos emanados desse grande Pacto Social.

Não nos resta outra alternativa senão buscarmos unidos o caminho para sair da obscura noite orientados pelo vislumbre da justiça e a alvorada nova da Grã-Colômbia.

Rumo a Nova Colômbia, Acordo Nacional pela Paz
Secretariado do Estado-Maior Central das FARC

Montanhas da Colômbia, setembro de 2007