"A LUTA DE UM POVO, UM POVO EM LUTA!"

Agência de Notícias Nova Colômbia (em espanhol)

Este material pode ser reproduzido livremente, desde que citada a fonte.

A violência do Governo Colombiano não soluciona os problemas do Povo, especialmente os problemas dos camponeses.

Pelo contrário, os agrava.


segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Farc se dirige aos colombianos pela Paz e anuncia libertação unilateral de seis prisioneiros de guerra

"Celebramos que sua alusão aos prisioneiros de guerra esteja desprovida deste “humanitarismo distorcido” disseminado pelos meios de comunicação, que vê apenas os prisioneiros de um lado, ignorando que se trata de duas partes em conflito. Este enfoque ajuda na busca de uma solução realista do problema, para o qual...”.
Secretariado das Farc.


ANNCOL publica a carta em sua totalidade para todos os nossos leitores:

***

Senhores

COLOMBIANOS PELA PAZ

Bogotá


“Apesar de serem alarmantes as conseqüências da resistência ao poder, não é menos certo que existe na natureza do homem social um direito inalienável que legitima a insurreição”.
Simón Bolívar

Compatriotas:

Com esta reflexão do pai de nossas repúblicas, o Libertador Simón Bolívar, -que ajuda a compreender preocupações coletivas- damos continuidade ao intercâmbio epistolar respondendo aos temas abordados em sua carta do dia 27 de novembro.

Concordamos com vocês que a discussão sobre a guerra e a paz na Colômbia não pode ignorar fenômenos que estremecem hoje a consciência nacional. Os denominados eufemisticamente “falsos positivos” –que deveriam ser chamados de assassinatos de civis não-combatentes executados pelo Estado- são, como vocês acertadamente o percebem, manifestação dolorosa da guerra suja que vive a Colômbia. Constituem um reluzente grito de vitória da “segurança democrática” do presidente Uribe, que sempre mediu o êxito dessa política –em seu componente militar- em litros de sangue.

Não pode ser considerado como um acontecimento isolado o que obedece a uma orientação pontual do Ministério da Defesa e da Presidência, repetida sistematicamente a nível nacional em todas as guarnições.

É impossível desvirtuar que os milhares de civis assassinados para serem representados noticiosamente como guerrilheiros mortos em combate, o foram pelo estímulo dos ascensos e recompensas oferecidas pelo governo aos militares. Assim como é um acontecimento destacável, que depois do conhecimento público sobre tal genocídio, o Ministério da Defesa não voltou a publicas suas orgulhosas cifras de “mortos em combate” com as que sustentavam sua fantasiosa “derrota da insurgência” e o “fim do conflito”. A consciência da nação deve impedir que este tipo de crime de lesa humanidade que o Estado comete termine na impunidade. A destituição de alguns altos comandos militares por tais acontecimentos deve ser complementada com uma responsabilidade penal, o que muito seguramente, fará com que as cortes e tribunais dos povoados sintam a “segurança democrática” – desenvolvimento da fascista Doutrina de Segurança Nacional –no bano dos réus.

Tal como vocês destacam, a escalada do conflito –que têm relação direta com a ingerência crescente do governo dos Estados Unidos no conflito interno colombiano- vem acompanhada de uma maior degradação. Devemos fazer algo para escaparmos dessa maldição que parece nos perseguir desde a destruição da Colômbia de Bolívar e de sua grande obra legislativa concebida visando o bem comum.

Desde meados do século passado, a degradação gerada pelo Estado não para de crescer em espiral. Os mesmo métodos brutais que ceifaram a vida de 300 mil colombianos na década de 50, agora mais refinados, seguem vitimizando a população, esquartejando com moto-serras, enterrando em valas comuns, deslocando milhões de camponeses para apoderar-se de suas terras, “empapelando” juridicamente os cidadãos, até alcançar o nível de barbárie das “partes positivas”.

Recordamos a resposta do comandante das FARC Manuel Marulanda a uma pergunta sobre a humanização da guerra: “a melhor maneira de humanizar a guerra é acabá-la”. Hoje, seguimos com a mesma percepção, e para isso é indispensável a mudança das injustas estruturas.

Celebramos que sua alusão aos prisioneiros de guerra esteja desprovida deste “humanitarismo distorcido” disseminado pelos meios de comunicação, que vê apenas os prisioneiros de um lado, ignorando que se trata de duas partes em conflito. Este enfoque ajuda na busca de uma solução realista do problema, para o qual reiteramos nossa determinação e vontade de alcançá-la.

Nesse esforço coletivo, é importante avançar na identificação e precisão dos temas objeto de nossas reflexões para ganhar certezas na busca por soluções. Por exemplo: em um conflito armado e social como o que vive a Colômbia há mais de 40 anos, integrantes da força pública devidamente armados, treinados e uniformizados combatem diariamente, de diferentes formas e em diferentes cenários, com a guerrilha revolucionária, apresentando baixas de ambas as partes, como ocorre em toda confrontação bélica. Finalmente uma delas obtém a vitória e faz prisioneiros da parte em conflito. Isto ocorreu, ocorre e inevitavelmente continuará ocorrendo, aqui e em todo lugar do mundo, enquanto durarem os conflitos. Este tipo de capturados são prisioneiros de guerra. Essa é sua categoria dentro do conflito. A não ser que pretendam, como no caso do governo de Álvaro Uribe, negar a existência do conflito.

A proposta de Manuel Marulanda Vélez ao congresso, de aprovar uma lei permanente que deixe aberta a possibilidade da troca, cobra plena vigência nestas circunstâncias. Evitaria um cativeiro prolongado e doloroso. Nesse mesmo sentido, e com implicações de diversas ordens, temos planejado em diversas oportunidades, a conveniência de um reconhecimento das FARC-EP como força beligerante. Acontece também a detenção de pessoas com algum tipo de representação política, que tomaram partido envolvendo-se abertamente em favor da guerra e em crimes contra setores populares, vinculados com o militarismo e o paramilitarismo como demonstra todo o processo da para-política, o que, com suas ações, golpeiam o povo, o tesouro e os bens públicos. Estes, diante da reconhecida impunidade do regime na lógica dos de baixo, devem responder por sua conduta. E acontece também o fenômeno da retenção de pessoas com objetivos econômicos, que tem múltiplos autores: policiais, militares, DAS (polícia política colombiana), paramilitares, delinqüência comum e membros da insurgência. Na responsabilidade que nos cabe e, entendendo as dificuldades que nos acarreta, fazemos esta reflexão: como se financia uma confrontação como a colombiana? Como faz, por exemplo o Estado? Decreta cargas impositivas generais, Impostos de guerra, empréstimos das empresas transnacionais, entre as quais se destacam: BP, Chevron – Texaco OXI, Drummond, Chiquita Brands (antiga United Fruit Company), Repsol, Monsanto, Coca-Cola, etc; mas fundamentalmente financia a guerra com ajuda econômica, militar e tecnológica do governo dos Estados Unidos. Colômbia é o primeiro receptor desta “ajuda” no hemisfério, o qual se paga com a soberania. O proeminente sociólogo estadunidense James Petras estima que Washington investiu no Plano Colômbia mais de 10 bilhões de dólares nos últimos 6 anos. É uma desproporção de recursos econômicos e de meios para uma guerra injusta contra um povo.

No espírito de minimizar o impacto sobre os não-combatentes, as FARC expediram a Lei 002 sobre tributação, que cobra um imposto para a paz àquelas pessoas naturais ou jurídicas cujo patrimônio seja superior a um milhão de dólares e que, apenas em última instância, contempla o recurso da retenção.

A guerra, a medida que se generaliza, produz efeitos dolorosos e não-desejados. Com franqueza lhes comentamos que não está dentro de nosso ideário nem em nossos princípios a eternização destes métodos. De fato, temos nos manifestado estando envolvidos em diálogos que buscaram a paz com anteriores governos, como bem o ressaltam em sua nota.

Os temas desta missiva são mais que oportunos para sugerir-lhes o quão importante seria abrir um amplo debate sobre a situação de milhares de presos políticos encarcerados após prisões em massa utilizadas para atemorizar e dissuadir o apoio popular às forças insurgentes. São milhares os cidadãos acusados de rebelião e terrorismo através de armadilhas da inteligência militar e do pagamento de gordas recompensas. Esta reflexão coletiva deveria incluir também os desaparecimentos forçados de pessoas, a mais estarrecedora forma de seqüestro existente executada pelo Estado, e que a perda de liberdade agrega na perda da vida após espantosas torturas em meio a plena impunidade.

Finalmente, vocês nos pedem, visando um eventual intercâmbio humanitário, avançar em algumas reflexões acerca de como “desenhar cenários onde seja possível debater com a sociedade alternativas políticas para encontrar um caminha de transição rumo a uma sociedade justa e equitativa”.

Sobre isto, estamos propondo, através do manifesto das FARC-EP e da Plataforma Bolivariana pela Nova Colômbia, um encontro das forças políticas e sociais interessadas na mudança, que nos permita delinear de maneira consensual um grande acordo nacional rumo à paz, para construir coletivamente alternativas políticas à guerra e à injustiça social. Estamos seguros de que nós e milhões de colombianos seria maravilhoso ver florescer um novo governo, produto dessde pacto social, que convoque ao diálogo de paz com participação das organizações políticas e sociais do país, que leve suas conclusões a uma assembléia nacional constituinte, para que o tratado de paz alcançado tenha também sustentação constitucional.

Como demonstração ferrenha da vontade que nos acompanha e como gesto que busca gerar condições favoráveis à troca humanitária, anunciamos a próxima libertação unilateral de seis prisioneiros em duas etapas. Estes serão entregues a vocês, como “colombianos pela paz da Colômbia”, encabeçados pela senadora Piedad Córdoba. Primeiro, serão libertados três agentes da polícia e um soldado, em seguida, o senhor Alan Jara e o deputado Sigifredo López. As condições de modo, tempo e lugar serão explicadas em seu devido momento.

Recebam nossa cordial saudação.

Secretariado do Estado-Maior Central das FARC-EP

Montanhas da Colômbia,


17 de dezembro de 2008

O comunicado, em espanhol, encontra-se em Anncol.eu.

Esta resposta faz parte de uma série de discussões entre os intelectuais e a guerrilha colombiana.
A ordem do diálogo, desde sua primeira carta, encontra-se assim:

1- Carta dirigida ao Secretariado das FARC, por membros da sociedade civil colombiana.
2- Carta das FARC aos colombianos apoidores da solução política para os problemas da guerra
3- Intercâmbio epistolar Colombianos e as FARC